A Melhor Pior História do Mundo escrita por BRAD PINTO


Capítulo 1
A Melhor Pior História do Mundo




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Domingo, 5 de março de 2017         

Todo. Santo. Dia. Eu já estava com dor de cabeça só de imaginar que seria obrigado a agüentar Carlos Prado cinco vezes por semana e quatro horas por dia. Que saco. A voz dele me irrita, só não mais do que as coisas que ele fala, em sua maioria mentiras. E ele não tem o mínimo senso do ridículo, como pode? O pouco tempo que já passei com ele já me dava vontade de socá-lo. Aquela frase “o inferno são os outros” nunca fez tanto sentido, mas seria melhor se ajustada para “o inferno é Carlos Prado”.

            Ele era da minha cidade e se mudou para Sorocaba na mesma época que eu para fazer cursinho pré vestibular. Não bastasse isso, ele se matriculou no mesmo que eu, de tantos cursinhos em Sorocaba. No mesmo horário. Na mesma sala. Será uma mera coincidência ou é Deus tentando me provar algo? Eu devo ter jogado pedra na cruz, sei lá. Acho que a única solução vai ser matar ele mesmo... Brincadeira. Ou não.

Sexta-feira, 10 de março de 2017

            Sexta-feira, ou como gosto de chamar: sexta-cheira. Primeira semana de aula acabou, felizmente. Os professores e a sala são legais, pelo que vi até agora. Mas tem aquele porém de um metro e oitenta chamado Carlos Prado. E o pior é que como somos conhecidos ele sentou perto de mim e estamos conversando, mas eu não o suporto, simplesmente chato demais, vai tomar no cu. E ainda não para quieto um segundo e age como se fosse o gostosão (ele parece um ornitorrinco) (eu não sei como é um ornitorrinco, mas ele é feio demais). Muita falsidade da parte dele vir ser meu amigo, ele sabe que eu o odeio e ele me odeia também. Desgraçado. Velho, além de tudo isso ele consegue ser incrivelmente burro – ele fala “estrupo” e ainda quer prestar vestibular pra medicina. Onde já se viu um médico burro desse jeito?

            Enfim, Matheus me chamou pra sair hoje numa balada. Música pop, gays e bebida barata − é disso que o jovem precisa. No meu caso precisa também de um circulo social. Saí da cidade dos meus pais com dois amigos, mas não me culpo, afinal aquele lugar só tem cowboy desmiolado e menina hétero que se acha a última bolacha do pacote por ter buceta. E, poxa, nenhuma gay. Agora que estou longe dos pais e numa cidade grande me sinto preparado para finalmente começar a viver a vida como eu mereço: enchendo o cu de álcool e piranhando muito. Nome: Lucas. Profissão: gostosa.

Quinta-feira, 23 de março de 2017

Coloquei um alargador e um piercing na sobrancelha. Mandei foto pra minha mãe e ela se encontra muito puta da vida comigo, mas eu sabia que seria assim. Ela não pode mais me impedir de fazer o que eu quero, mas também não pode ficar sabendo de metade das coisas que eu faço; se eu contasse para ela, de duas, uma: ou ela me matava ou morria de infarto, então é melhor que ela fique por lá na cidadezinha de cowboy e eu aqui. Tudo que me segurei pra fazer por lá, estou fazendo em dobro aqui, isso é que é vida.

Ah, tem um menino bonitinho na minha sala chamado Hugo, ele começou a andar comigo e com Carlos. Ele é muito legal e inteligente, gostei bastante dele, e pra melhorar ainda é gay, já me deu fogo de ficar com ele... mas como nem tudo são rosas nessa caralha de vida eu tenho certeza que o Carlos pensa a mesma coisa e está de olho nele também. E como sempre esse menino ta me dando nos nervos, na moral, não consigo conversar com ele por mais de cinco minutos, ainda mais que ele fala gritando e conta um monte de mentira. Ele adora falar indiretamente o quanto ele é rico e não sei o que, mas eu sei que ele não: Carlos não é nada do que diz ser. Eu tenho que parar de falar dele, isso aqui ta virando um diário sobre esse puto.

            Amanhã sairei com Matheus novamente pra balada. Na moral, eu amei conhecer ele porque ele é doido da cabeça igual a mim, por isso a gente se deu tão bem. E a gente conversa o dia todo no WhatsApp, ele me entende muito bem e eu não ligo de contar as coisas pra ele. Amizade de verdade.

Quarta-feira, 12 de abril de 2017

            Meu Deus do céu, o que ta acontecendo comigo? Eu to começando a gostar do Hugo e ainda nem aconteceu nada entre a gente. Não pode isso, eu não posso me apaixonar. Eu tenho que resistir! Foda que ele é lindo...

Terça-feira, 18 de abril de 2017

            Ah mas eu vou quebrar Carlos Prado no soco. Ele simplesmente não olha mais na minha cara e ME ESNOBA, simplesmente passa por mim no corredor e não olha mais na minha cara. Se não fosse por umas meninas sentadas no fundo eu não conversaria com quase ninguém do cursinho mais. O Hugo foi sentar na frente da sala pra prestar mais atenção e o otário do Carlos foi junto. Eu tenho certeza que ele também quer pega-lo; mas eu me garanto porque ele é feio. Outra coisa que me deixa indignado: como as pessoas conseguem gostar dele? Ele não tem dificuldade em fazer amizade porque fala com todo mundo, mesmo só falando bosta. Mas eu sei que as amizades que ele faz não são amizades de verdade, porque ninguém agüentaria ele. Coitado do Hugo, deve estar chorando todo dia antes de ir pro curso pensando que vai ter que agüentar o Carlos. Eu choraria.

Sexta-feira, 21 de abril de 2017

Hoje a aula até que foi legal. Na verdade eu não sei porque eu matei. Dois caras da sala chamaram Hugo, Carlos e eu pra fumar maconha no telhado do prédio do cursinho. Eles disseram que conheciam um dos zeladores e conseguiram tirar uma cópia das chaves, então a gente foi lá escondido, fumamos e ficamos tirando uma panca (como dizem os jovens). Menos o Carlos, ele não fumou, disse que não estava afim hoje, mas ficou falando que já tinha usado um monte de droga. Um saco. Eu o ignorei e fiquei conversando com Hugo meu namorado que ainda não sabe que é meu namorado. Cara, ele ta tão na minha... Eu acho...

E mais uma vez lá vai eu saindo com Matheus beber corote e ir pra balada. Já virou lei, toda semana o mesmo role, mas é legal. Conheci um monte de gente legal e beijei várias bocas. Só alegria.

Terça-feira, 5 de maio de 2017

            NA MORAL EU TO MUITO FELIZ NESSA CARALHA. EU BEIJEI O FILHO DA PITA DO HUGO CARALHO. É ISSO PORRA. ESTAMOS OFICIALMENTE CASADOS. FOI LÁ NO TELHADO DO CURSINHO ENQUANTO A GENTE TAVA CHAPADO SOB A LUZ DO LUAR. FOI ROMANTICO. FOI LINDO. NA MORAL DEUS É TOP. COMO TIRA LETRAS GRANDES.

Quinta-feira, 7 de maio de 2017

            Carlos me ignorando todo dia e eu só sei rir. Eu acho que ele ficou sabendo que fiquei com o Hugo e deve me odiar. Foda-se kkkkk. Ele ta achando uns amigos novos mas ninguém suporta ele por muito tempo. Enquanto isso Hugo e eu ficamos de novo e estamos conversando. Os humilhados foram exaltados...

Quarta-feira, 21 de maio de 2017

            Meu Deus do céu, eu vou cometer um crime de ódio.

            Esses dias eu to 200% estressado com praticamente tudo e hoje fui obrigado a ouvir de uma menina que o Carlos contou pro Caio, um amigo nosso, que eu tava iludindo o Hugo. NÃO FAZ NEM SENTIDO. Arrombado do caralho fica inventando mentira de mim, mas eu deixei quieto e nem falei com ele sobre. Só de imaginar conversar com ele já tenho vontade de gorfar. Quero que chegue sexta-feira logo, marquei com Matheus de fumar maconha e beber em casa.

            Matheus já é quase um clone meu só que diferente, e eu dele. Eu conto de tudo que ta acontecendo comigo e ele conta dele, e a gente se ajuda a resolver os problemas. Apesar de que agora eu to mais “casado” com Hugo, aí a gente acabou que passou um tempo sem se ver, mas continua a mesma coisa. Espero.

Segunda-feira, 25 de maio de 2017

             Aí, na moral, Carlos está praticamente implorando por um tiro de bazuca no cu. Mesmo conhecendo ele há quatro anos eu nunca tive tanta raiva dele quanto hoje. O Hugo disse que o Caio contou pra ele que eu o estava traindo. E adivinha quem disse isso pra ela? Carlos!!!!!!!!!! Filho da puta, mano. Sem condições. A gente nem namora e ele fica falando essas merdas. Tem vinte dias que eu fiquei com Hugo a primeira vez, olha a merda que ele inventa. Fui perguntar pro Caio e ele me disse que o Carlos falou que me odeia mesmo. Pois é, não vai ter jeito, vou ter que sair no soco com esse desgraçado.

Quarta-feira, 27 de maio de 2017

            Eu nem sei o que falar, mas vamos lá.

            Aproveitei que Hugo tinha faltado e a primeira coisa que fiz quando cheguei na sala foi chamar o Carlos de canto e convidar ele pra fumar maconha no telhado comigo. Eu não tinha maconha. Nem a chave do telhado. Ele topou. Durante o intervalo, eu consegui ser ligeiro e roubar a chave do telhado do estojo do menino da sala sem ninguém ver (qual a chance dele ter guardado a chave no estojo justo hoje?).

Depois do intervalo, quando os corredores estavam mais vazios, a gente foi. Chegando lá, ele tava falando não sei o que não sei o que lá do quão bem ele tinha ido no simulado e eu peguei um paiol e acendi fingindo que era maconha. Ele disse que aquela maconha era estranha, eu disse que era industrializada e importada do Paraguai de um primo meu – e ele realmente acreditou. Quando eu já estava enjoado da voz dele (o que não demorou muito) fui direto ao assunto. Vou tentar escrever o diálogo de acordo com o que eu lembro, mas já adianto que foi uma das conversas mais bizarras que já tive. Eu comecei:

− Carlos, que história é essa que você ta inventando coisa de mim e do Hugo?

(Leia a próxima fala com voz de taquara rachada para se aproximar mais da realidade).

− Como assim? Fiz nada não.

− Então por que vieram me falar que você falou merda de mim?

− Eu não falei nada de você, por que eu faria isso?

− Porque você é falso!!!!! – eu gritei.

− Eu? E você não??? Você acha que eu não sei que você fala mal de mim?

− Falo mesmo, caralho, vai se foder você é a pessoa mais mentirosa que eu conheço. Adora ficar pagando de rico mas eu sei que você é um fudido do caralho.

Nessa hora minha linda rostinha já estava explodindo de raiva e eu sabia que a veia em minha testa de outdoor estava saltada, compartilhando do mesmo sentimento.

− Você não sabe nada de mim, garoto, vai tomar no cu.

− Eu sei que você é um lixo humano! Uma poc fodida invejosa do caralho. E ainda por cima é estúpido para caralho. Você nunca vai passar em medicina. E, ah, é estupRo que fala. Além de burro você é burro pra caralho.

− Vai se foder, quem você pensa que é pra falar assim comigo?

− Você é apaixonadinho no Hugo, não é? Eu sei que você é e ficou putinho porque eu fiquei com ele e você não.

− Você não sabe de NADA – ele deu um grito que deu pra ouvir provavelmente até lá do Espírito Santo.

− Você é apaixonado nele – eu ri. – Que mico. Enquanto você sofre por ele eu mamo a rola d...

Nisso, Carlos me deu um tapa. Sim, um tapa. Não foi forte, nem pegou em cheio, mas foi o suficiente pra jogar meu paiol comprado de varejo no chão. Eu apenas encarei aquele filhote de Satã nos olhos profundamente por uns segundos e parti pra cima também. Desferi socos e ele também, mas sabemos que gays foram feitas para dançar Firework na balada e não para brigar, então se algum de nós acertou mais de um soco foi muito. Caímos e rolamos no chão, ainda gritando um com o outro. Lembro de ter sido gratificante pensar em minha mente “caralho, eu to saindo no soco com Carlos Prado”.

O Carlos então se levantou e CUSPIU NA MINHA CARA. A audácia desse filho da puta...

Nisso um ódio sobrenatural subiu para o meu rosto e eu não conseguia mais me controlar. Eu simplesmente avancei pra cima dele e o empurrei... pra fora do telhado. Eu o joguei do telhado de um prédio de quatro andares. Eu consegui ver em câmera lenta a expressão dele de desespero caindo do telhado e descendo até o chão (não do jeito que ele gostaria). Nisso o corpo dele atingiu um carro e ele morreu.

Eu matei ele.

Eu matei Carlos Prado.

Fiquei sem reação por alguns segundos, apenas olhando e pensando no que tinha acabado de acontecer. A rua estava vazia, mas o alarme do carro disparou. Ouvi um grito vindo de algum lugar lá embaixo e me recolhi.

Naquela hora um turbilhão de pensamentos passava pela minha mente sobre o que fazer. Será que eu devo contar o que aconteceu?, algum resto de sanidade habitado em mim pensou. Ah, me respeita, eu sou gostosa demais pra ir pra cadeia.

Joguei a chave do telhado lá embaixo, peguei meu paiol e desci. Fui pra rua e já havia se instalado o caos: gente chorando, gritando, e uma multidão formada em volta do corpo tentando socorrer. Eu apenas mantive a serenidade no rosto e observei de longe enquanto fumava meu paiol – a adrenalina se encontrava muito alta, precisava abaixar um pouco a pressão.

Nada como um homicídio sob a luz do luar.

Sexta-feira, 28 de maio de 2018

            Eu juro que não era intenção matá-lo, mas aconteceu, né. A culpa não é minha se ele foi fraquinho e não conseguiu resistir uma quedinha de quatro andares.

            Estão achando que ele se matou, o cursinho ta de luto, as aulas foram suspensas sem previsão de quando voltar, não só as minhas mas como de toda a instituição, claramente. O Facebook ta uma loucura com todo mundo postando imagem de luto e só dá as falsas online que também odiavam ele postando texto em homenagem. Eu fiquei na minha sem postar nada e curti tudo o que postavam.

            Hoje é meu primeiro dia como homicida e fui consumido por um sentimento estranho, uma felicidade estranha. Eu juro que andei saltitando praticamente enquanto ia ao mercado comprar corote (você não achou que eu ia desperdiçar minha sexta-feira em casa de luto por causa de CARLOS PRADO né). Infelizmente nem todos compartilham da minha felicidade, Hugo, por exemplo, se encontra inconsolável, confuso, pipipi pópópó. Ele teve a audácia de dizer que eu peguei pesado falando mal dele porque “a gente nunca sabe o que está acontecendo com o outro”; eu fingi toda e disse apenas “ué como que eu ia saber, caralho”; ele mandou um texto e eu ignorei. Óbvio que eu não ia contar o que realmente havia conhecido, então é melhor que ele ache que o Carlos cansou de si mesmo e resolveu bater as botas. Enquanto isso, #fui ficar de #luto pelo #Carlos bebendo #corote e fumando #maconha com minha #amiga #Matheus.

Segunda-feira, 9 de junho de 2017

            As aulas voltaram e tava um clima muito pesado na sala. Várias pessoas choraram como se, nossa, amassem o menino. Bando de hipócrita, metade dos que choraram já tinham zoado ele comigo. Teve uma palestra sobre valorização da vida com uma foto enorme dele no palco do lado do palestrante. Eu ri por dentro porque pegaram uma foto HORRÍVEL dele que provavelmente devia ser da formatura do colegial. Nem mesmo morto ele conseguiu parecer um pouco mais bonito. Eu chamo isso de feiúra póstuma.

            E pra ajudar, Hugo tem me evitado. Não me responde direito, não falou muito comigo na aula. Depois da palestra eu o puxei pro canto e perguntei o por quê dele estar estranho comigo. Ele me disse que quem estava estranho era eu, e que nem parecia que eu estava triste e ainda teve a AUDÁCIA de perguntar todo bravo se eu tinha derrubado pelo menos uma lágrima pelo Carlos. Quase que eu respondi “meu amor, você acha mesmo que eu vou gastar minha saliva chorando por aquele homem”, mas não pegaria bem, então apenas disse que sim, que havia passado uma semana chorando. Não foi o suficiente pra ele. O Hugo é muito sensível, gays né... brincadeira, mas eu preciso dar um jeito de me resolver com ele porque eu percebi que realmente gosto dele, só vou deixar a poeira abaixar um pouco pra poder conversar melhor.

            Até morto esse desgraçado do Carlos complica minha vida.

Quinta-feira, 22 de junho de 2017

             Me resolvi com Hugo finalmente. Como? Pesquisei no YouTube um tutorial de como chorar, chamei ele pra ir pro parque, puxei o assunto do Carlos e chorei as lágrimas mais falsas já soltas por um ser humano na história da humanidade. Ele acreditou e nos resolvemos. A parte triste é que não poderemos realizar minha ideia de transar no telhado do cursinho porque seria “desrespeitoso” com Carlos. Por mim fazia uma orgia de Sense8 em cima do túmulo dele até.

Sexta-feira, 23 de junho de 2017

             Hoje meu cu trancou num nível...

            A polícia foi no curso e fez umas perguntas para cada um da sala e, obviamente, focaram em mim porque eu conheço Carlos há mais tempo que todo mundo lá e por sermos da mesma cidade. Felizmente fui abençoado com o dom da mentira. Perguntaram onde eu estava quando Carlos supostamente se jogou e eu respondi que estava matando aula no pátio porque estava nervoso com Hugo que estava passando mal aquele dia e eu não conseguia ficar na aula. Antes do intervalo daquele dia eu realmente havia matado aula no pátio como sempre faço, então se perguntassem pra alguém que trabalha na cantina a pessoa iria confirmar com certeza.

            Vou sair com Hugo depois, vamos pra balada e depois se Deus quiser fazer o lepo lepo.

Domingo, 24 de junho de 2017

            Não fizemos o lepo lepo.

            Na verdade, acho que estraguei tudo com ele. Fomos pra balada, enchemos o cu de álcool e por algumas horas estava tudo lindo e maravilhoso ao som de Movimento da Sanfoninha até que ele decidiu falar sobre quem? Carlos. Sim, a bicha não supera esse cadáver filho da putaaaaaaaaaaaa. Mas o melhor foi o que ele me contou. Disse que o Carlos havia escrito uma carta SE DECLARANDO pra ele que dizia que ele tinha se apaixonado à primeira vista e que ele achava Hugo uma pessoa incrível. Na moral? Que mico, hein Carlos. Quando ele me disse isso eu ri e de novo Hugo ficou bravo por eu estar rindo (não pode nem zoar quem ta morto mais). Tivemos outra discussãozinha e ele foi embora sozinho pra casa dele. Fiquei puto no fumódromo por um tempo mas aí entrei pra pista de novo e achei alguém para beijar pois santa no soy.

            Às vezes acho que sou muito frio, hoje mesmo eu estava pensando nisso. Será que não era pra eu estar sentindo o mínimo de remorso por tudo? Não precisa responder porque eu sei que era mas eu realmente não consigo. Carlos mexia tanto comigo que pra mim foi como tirar um peso das costas. Um peso morto. Literalmente.

            Ontem eu saí com Matheus, chapamos muito. Mesmo. Tanto que eu até contei pra ele a verdade sobre Carlos. Disse que foi acidente, que estava muito arrependido, mas que não tinha coragem de assumir meu ato porque obviamente tinha medo das conseqüências. Eu me arrependo de ter dito, obviamente. Mas ele me entendeu e não me julgou. Gays sensatas pisam...

Quarta-feira, dia 27 de junho

            Meu Deus do cu. Fodeu. Muito. To escrevendo de dentro do banheiro de um bar de esquina em São Paulo. Eu to fodido.

            Terça à noite Hugo me chamou no telhado do cursinho e eu fui. Ele queria falar comigo sobre Carlos (PRA VARIAR). Foi mais ou menos assim a conversa:

            − Você nunca contou sua história com ele.

            − Não tem nada demais, a gente se odiava mas nunca tinha chegado a brigar ou fazer algo um para o outro.

            − Mas por que vocês se odiavam?

            − Eu não sei. Acredito que da mesma forma que existe paixão à primeira vista pode existir ódio à primeira vista. Mas ele me irritava muito, você sabe.

            − Onde você tava na hora que ele morreu?

            − No pátio, conversando com você pelo zap, já disse.

            − Ah, verdade... o estranho é que aquele dia das entrevistas da polícia eu perguntei que horas ele havia morrido, eles me responderam um horário. Fui olhar no WhatsApp e nesse horário você não tinha mandado mensagem nenhuma, por um período de meia hora mais ou menos

            Ora ora, temos um Xeroque Holmes aqui (à essa altura meu cu já não deixava entrar agulha nenhuma e olha que isso é difícil quando se trata do meu cu).

            − Onde você ta querendo chegar?

            − Eu falei com os seguranças que precisava checar umas imagens das câmeras porque queria saber se haviam roubado meu celular e consegui ver imagens daquela noite. Do pátio. Da hora que o Carlos morreu. E você não estava lá.

            Eu já tava quase empurrando ele do telhado também de tanto desespero que tinha dentro de mim.

            − O que você quer dizer com isso?

            − A pergunta é o que você tem a me dizer sobre isso, Lucas?

            − Você ta me acusando de ter matado o Carlos???? Eu odiava ele, mas eu nunca chegaria a esse ponto, você me conhece – alguém traga meu Oscar de melhor atriz AGORA.

            − Eu não te conheço muito bem, na verdade. Mas uma coisa eu percebi, você me falava mal do Carlos sempre que podia enquanto ele nunca abriu a boca pra falar mal de você.

            − Ainda bem porque se eu soubesse que ele falou mal de mim eu quebrava os dentes dele.

            − Tá vendo como você é hipócrita? Você matou ele, Lucas?

            − Hugo, pelo amor de Deus, eu não sou um assassino, caralho!

            − A indiferença que você teve em relação à morte dele foi o que mais me assustou, vocês se conheciam há anos.

            − Eu odiava ele.

            − Você matou ele?

            Ele me perguntou dessa vez olhando em meus lindos olhos e ficou um silencio profundo por alguns instantes... eu simplesmente chupei o pau da barraca e falei:

            − Quer saber, matei mesmo esse filho da puta. Se pudesse mataria de novo. Moleque chato do caralho. Eu tenho dó é do capeta que vai ter que agüentar ele.

            Ver a expressão no rosto nem tão lindo mais de Hugo foi uma das melhores coisas da minha vida, logo abaixo do episódio de Chaves que eles entram na casa da Bruxa do 71. Ele ficou horrorizado, de queixo caído e boca aberta; passadíssima a bicha. Depois de alguns instantes, ele conseguiu falar:

            − Você... é doente... eu não acredito...

            − E eu não acredito que você ta fazendo esse rebuliço todo por causa daquele moleque chato.

            − Lucas, era uma vida... você é um psicopata... eu não acredito.

            − Ah dar meia hora de cu, vai.

Até aí tudo bem. Nisso ele se afastou ainda incrédulo. Ficou a uma boa distância e tirou do bolso o celular... gravando... tudo... kjlnfvirnwvujnvjunhvujasirwnhvijuwrtnjvivrivne!!!!!!!!!!!!!!!!!! Quando eu percebi do que se tratava eu fiquei horrorizado, sem reação. Fui apunhalado nas costas pelo meu próprio namorado que nem era meu namorado de verdade. Foi um baque...

− Hugo...

− Acabou pra você.

− Pelo amor de nosso senhor todo poderoso Jesus Cristo, o que você vai fazer com isso?

− Te entregar. Você não vai matar alguém e se safar.

− Depois de tudo que passamos juntos...?

− Não tem nem três meses que a gente se conhece, e assassino tem mais que se fuder mesmo.

Minhas pernas estavam tremendo e eu estava completamente assustado. Eu não sabia como reagir, não tinha mais o que fazer (o Hugo se encontrava longe demais da beira para que eu conseguisse empurrá-lo). Minha única solução foi correr o mais rápido possível. Mas antes de descer, me subiu uma imensa raiva, que nem no dia em que matei Carlos, então eu apenas virei e meu último neurônio restante fez com que eu gritasse:

− Seja feliz mamando a piroquinha decomposta do Carlos!

Fugi do curso, cheguei o mais rápido possível em casa, desesperado. Não tinha muito o que fazer. Fiz as malas, peguei dinheiro, o essencial e saí correndo de casa. Passei na casa do Matheus e contei tudo o que tinha acontecido aos gritos. Ele disse que eu tinha que fugir, era a única opção caso eu não quisesse ser preso. Respirei com calma por alguns minutos e decidi fugir mesmo. Antes que eu fosse embora, porém, Matheus me parou, me entregou um corote e disse com uma lágrima escorrendo no rosto:

− Toma Brad, é pra você viver mais.

Nesse momento escorreu uma lágrima em minha linda rosta foragida e eu sabia que poderia contar com Matheus Sabtos para tudo.

Fugi pra rodoviária, mas não tinha dinheiro pra comprar passagem pra longe, só pra capital. Comprei, cheguei lá, dormi num canto atrás de um arbusto. Estou sem rumo e foragido. Não está sendo fácil.

Domingo, 1 de julho de 2017

            Manas, a fama chega para todas! Eu sou o criminoso mais procurado do estado. Consegui entrar na internet pelo computador de uma biblioteca e vi várias postagens avisando que eu era um assassino à solta e que as pessoas tinham que tomar cuidado. Minha foto apareceu no Jornal Nacional!!!!!! Consegui ver a reportagem e eles pegaram uma foto minha que postei no Facebook ano passado que eu to num churrasco segurando uma Brahma (eles cortaram a Brahma), eu fiquei feliz porque to muito lindo nessa foto, na moral, chupa Carlos. Em suma, está todo mundo preocupado com o paradeiro do assassino, mas mal imaginam que o mesmo teve que se prostituir por um Big Mac ontem na Avenida Paulista.

Meus dias como foragido foram cheios de emoção, fugindo da polícia, dormindo na rua, pedindo esmola e bebendo com mendigos. Era disso que eu precisava, dessas emoções e aventuras, que nem quando matei aquele otário. Tinha esquecido como era se sentir tão bem... Vou continuar foragido por um tempo, mas não tenho ideia do que fazer à longo prazo. Preciso comprar uma passagem pra longe o mais rápido possível. Quem sabe pra fora do país até. Argentina, parece um lugar legal, ou algum lugar na América Central, tipo o Chile.

Mas é claro que eu não posso fugir sem antes dar minha cartada final. Hugo, me aguarde, eu vou te proporcionar o tão esperado encontro que Carlos queria ter com você, mas você não vai gostar tanto assim, se é que me entende... (eu quis dizer que vou matar ele pros leigos em interpretação).

Nome: Lucas. Profissão: gostosa. Hobby: assassina.


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