Everyday is Halloween escrita por Cassey Monstrance


Capítulo 1
Mea Culpa




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 Em South Park, pouco importava qual era a estação. Mesmo que estivessem em pleno outono, a noite era fria como em todas as outras.

 O céu noturno só não era totalmente negro devido à presença de nuvens. O frio era intenso o bastante para conseguirem enxergar suas respirações. Todavia, mediante os ânimos dos jovens empolgados, a temperatura próxima de zero pouco importava.

 Quatro rapazes, conforme andavam juntos pela mesma calçada, ouviam principalmente os sons de seus próprios passos. Após 15 minutos caminhando ou mais, finalmente tinham o primeiro indicativo do que os esperava: o som distante de uma música eletrônica macabra, sufocado pela cacofonia de múltiplas conversas e pelas paredes bem revestidas de uma grande mansão. Nesta noite de Halloween, por ser a maior casa na cidade, a comemoração seria na morada dos Black.

 Afinal, os que antes tinham entre 9 e 10 anos de idade agora estavam no entorno dos 13. Há muito haviam abandonado a escola elementar, agora compondo a tão aguardada Middle School. Dali a pouco mais de um ano alcançariam o ensino médio, a temida High School, onde começariam a compor oficialmente o que fariam no futuro a partir da grade curricular.

 No ponto de vista tolo e comum de um pré-adolescente, nenhum deles era mais criança. Dali em diante, deveriam provar a tudo e a todos que já podiam ser tratados como pessoas maduras. Bater de porta em porta para pedir doces, como tanto gostavam e faziam, já não soava mais como uma atitude de adulto.

 

 Era a primeira vez em que as antigas crianças da cidade substituíam a tradição do Halloween por uma grande festa. Por ter sido Token o primeiro a propor um evento desse tipo, todos puderam ter a mesma garantia: esta seria uma noite épica, talvez a melhor em suas vidas. Para os pais, a proposta era particularmente interessante: desde que esta festa não servisse bebida alcoólica para menores, lhes parecia muito mais seguro que, em vez de andarem pelas ruas libertinamente, seus filhos estivessem bem protegidos sob um mesmo teto.

 

 Essa festa seria definitivamente marcante. Para tanto, o quarteto que bem conhecemos fez total questão de encontrar e trabalhar nas melhores fantasias possíveis.

 Stan Marsh era O Corvo: protagonista de filme e quadrinhos de mesmo nome. Com uma pintura facial impecável, roupas pretas com rasgos e os cabelos escuros levemente maiores comparados à altura de anos atrás, seu personagem era nítido para quem conhecesse.

 Kyle Broflovski estava caracterizado como Freddy Krueger, o invasor de sonhos de A Hora do Pesadelo. Sob um chapéu fedora, sua cabeleira ruiva e quase sólida mantida curta conforme os anos estava semiexposta. Com direito a uma maquiagem cênica repleta de rugas, possuía em suas vestes tanto as luvas cheias de lâminas quanto o suéter listrado característicos do icônico vilão do terror oitentista.

 Kenny McCormick, por sua vez, apelou para algo mais criativo. Sua fantasia se tratava de um Doutor da Praga dos tempos medievais: um longo robe negro que o cobria desde ao redor da cabeça até seus pés, um chapéu redondo porém retilíneo no topo e uma máscara típica que cobria todo o seu rosto, assemelhando-se ao longo bico de um pássaro. Definitivamente assustadora e mórbida, mas que atrapalharia bastante no entendimento de quem fosse ouvi-lo falar.

 E Eric Cartman, ao contrário dos demais... Sem sombra de dúvidas fez a escolha mais decepcionante. Certamente, a menos original. Para esta noite, estava vestido simplesmente feito um vampiro clássico. Ou, em termos ainda mais específicos, o célebre Conde Drácula.

 

 De fato, um vampiro era uma opção de fantasia pouco surpreendente. Indubitavelmente haveriam vários outros vampiros na festa, desde os mais tradicionais até os mais modernos. Principalmente vindos do grupo dos Vampiros de South Park, que até então permanece vivo – ou morto, dependendo do ponto de vista. Sua cartada mestre, no entanto, estava no trabalho bem feito: o esmero, status e elegância embutidos no traje.

 O tecido da capa que por pouco não se arrastava no chão, negra no exterior e vermelha como sangue no interior, era da melhor qualidade. O smoking e a joia presa ao colarinho de três cores, tamanho o cuidado de produção, eram dignos de alfaiates e joalheiros magistrais. Seu cabelo castanho, bem fixo e caprichosamente penteado para trás, era acompanhado de uma extensão pontiaguda muito bem desenhada e aplicada no centro da testa. Em seu rosto havia algum pó para fazê-lo pálido, e para completar, em seus caninos superiores estavam próteses temporárias, demarcando fielmente seu caráter vampírico.

 Em suma, para Eric não importava se ele não fosse exclusivo. Contanto que ele fosse o melhor.

 

 O destino estava logo à frente. Os portões dos Black estavam abertos para público, por onde vários conhecidos e desconhecidos fantasiados passavam. A música temática estava mais nítida, suas ansiedades estavam em alta, algo em seus estômagos se revirava. Assim como os demais, caminhavam em direção da mansão aos fundos. E para a surpresa geral, constataram que a festa se estendia ao lado de fora.

 

 — Puta merda — disse Stan avistando a quantidade inacreditável de pré-adolescentes ao redor da casa. — Quantos vocês acham que tem nesse lugar?

 

 — Eu chutaria que a escola inteira e intrusos de outras escolas. — presumiu Kyle. — Tem pessoas que nunca vi na vida, talvez gente de outra cidade.

 

 — O que vocês esperavam? — proferiu o mais gordinho em relação aos outros. Seus caninos pontiagudos atrapalhando ligeiramente na dicção. — Farra, casa de rico e comida de graça, isso é um chamariz pra pobre. — dito isso, virou-se para Kenny e sussurrou discretamente: — Fez o negócio que eu te falei?

 

 Sem dizer nada e na mesma discrição, o McCormick abriu uma pequena aba sob o bico de sua máscara. De acordo, ergueram um para o outro um polegar positivo.

 Nos tempos da Peste Negra, tal máscara era usada para guardar ervas aromáticas medicinais, pois acreditava-se que a praga era transmitida pelo ar. Kenny, no entanto, pretendia usá-la para algo muito mais funcional: guardar todo tipo de doce e comida que fosse possível, podendo comê-los aos poucos pelo resto da semana.

 

 Se desvencilhando por entre dezenas de outros pré-adolescentes, finalmente os quatro passaram pela porta de entrada. Em maioria, os presentes fantasiados seguravam copos de plástico pretos ou laranjas nas mãos. A música era incrivelmente mais intensa no lado de dentro, mas por incrível que fosse isso conseguia ser um ponto positivo. Melhor ainda era constatarem que, por mais frio que fizesse lá fora, o lado de dentro da casa não estava tão lotado quanto o lado externo. Claro que ainda eram muitas pessoas, mas nada que os impedisse de se movimentar.

 A decoração temática era, sem exagerar, extraordinária. Com teias de aranha gigantes pelos cantos, serpentinas adornando o teto extremamente alto, figuras tradicionais como esqueletos e morcegos, mesas com comida de aparência assustadora até onde os olhos alcançassem e iluminação provida exclusivamente por luz negra, o aspecto visual tinha tudo do bom e do melhor.

 

 Fosse em pequenos ou grandes grupos, os presentes apreciavam a música e conversavam. Poucos de fato dançavam, afinal o evento só havia começado. Muitos rostos conhecidos, alguns nem tanto, outros totalmente novos; um pesadelo para os introvertidos, mas um prato cheio para quem quisesse conhecer pessoas. Os quatro nem mesmo sabiam por onde começar.

 

 — Aquela não é sua namorada? — ao avistar Wendy em seu grupo de amigas, Eric falou para o Marsh ao lado. Fazendo o oposto do que todos esperavam, Wendy estava caracterizada como Xena, a Princesa Guerreira.

 

 — (Ela não ia usar uma fantasia de corvo pra combinar com a sua?) — graças à máscara e agora à música, Kenny perguntou de maneira quase incompreensível.

 

 — É. Parece que ela mudou de ideia. — mesmo em completa decepção, Stan se pôs a caminhar até ela. — ...Outra vez.

 

 Os demais o observavam ir embora. Por uma pequena quantia de tempo viram-no conversar com a Testaburger, receber um beijo no rosto e cumprimentar as outras garotas, não ousando comentar sobre a mudança repentina de fantasia. As coisas passaram a funcionar muito melhor entre eles quando Stan aceitou seu papel de submisso.

 

 — Ei, Kyle — vestindo uma fantasia de bruxa, muito provavelmente feita às pressas, estava Jessie. Uma garota que sempre esteve no grupo das populares, apesar de não se destacar dentre as demais. Loira, de aparência doce e abordagem sutil. Resumidamente, ela e o judeu começaram a passar certo tempo juntos há alguns dias.

 

 — Ei — cumprimentou de volta, corando assim que teve sua mão segura.

 

 — Sua fantasia ficou ótima, quase não te reconheci. Pena que não sou talentosa assim, gostaria de ter tido mais empenho na minha. — a garota sorriu sinceramente. — Pode me acompanhar? Minhas amigas me abandonaram hoje.

 

 — Hã... Claro — antes mesmo de formular a resposta, já estava sendo voluntariamente levado pelo braço.

 

 Bem... Metade do grupo já tinha se dispersado. Divertindo-se com o fato dos dois terem se rendido tão facilmente, Cartman caçoou sorrindo.

 

 — É, Kinny. Parece que somos só eu e você. — se interrompeu ao virar para o lado e perceber que estava sozinho. — Kinny?

 

 Após procurar com os olhos, o encontrou. Ao longe, um Médico da Peste todo de preto, curvando-se feito um cavalheiro diante de um trio de garotas vestidas feito damas da realeza. Uma delas, em particular, era Tammy Warner; antes um romance breve de infância, hoje sua namorada novamente com até então três meses de duração. Como num RPG da idade média, Kenny simulou em sua mão um beijo delicado.

 

 No fim... Sobraram ele e ele mesmo. Eric não esperava diferente, apesar de ter cultivado uma vã esperança de que isso não aconteceria. Desde que esta festa foi marcada, manteve em mente que seus amigos já tinham alguém. Namorar era algo que gente mais velha fazia, certo? Já imitavam este costume precocemente. Não tinham culpa alguma sobre ele ser o único solitário.

 Sem outra escolha senão aceitar sua condição, Cartman bufou. A parte mais desagradável de se estar sozinho há quase quatro anos é justamente se lembrar de que está sozinho, para então se lembrar do porquê de estar sozinho.

 

 Mas não ousaria pensar nisso por hoje. Da mesma forma, não se esforçaria em procurar companhia em outro grupo. Cedo ou tarde, mesmo o mais dependente dos indivíduos se cansa de clamar por atenção. Sendo alguém que carrega quase 14 anos de idade em suas costas, esse momento havia chegado para Eric há muito e muito tempo.

 Esta era uma das muitas vantagens de ser filho único. Curtir a própria companhia jamais lhe foi um problema. Se podia brincar sozinho quando ainda apreciava esse tipo de coisa, poderia aproveitar uma festa sozinho. Pelo menos, por enquanto.

 Se recompondo, Eric andou pelo salão. Seu destino, assim como desejou logo que pôs os pés naquele lugar, era uma atraente mesa de iguarias ao paladar. Ao alcançá-la, pegou um copo de plástico numa pilha com vários outros iguais, típicos de festas adolescentes norte-americanas. Com uma concha, preencheu metade do copo com ponche tirado de uma bacia de vidro. Uma bebida vermelho viva, decorada com olhos falsos flutuando na superfície.

 Estava cedo. Os convidados estavam distraídos, a comida não iria desaparecer. Por ora, apenas algo para beber bastaria. Para manter-se sossegado, encontrou uma parede onde se escorar. Como forma de passar o tempo, começou a observar as pessoas enquanto bebia.

 

 Pôde ver Craig e Tweek, respectivamente vestidos como Hanzo e McCree do Overwatch. Token, o dono da festa, usando um interessante traje de cardeal, acompanhado de Nichole Daniels vestida feito freira. Bebe Stevens, vestida como cheerleader zumbi, acompanhada de seu atual namorado. Palhaços macabros, heróis, mais vampiros e bruxas, personagens de animes e filmes... Mesmo observar tornou-se monótono depois de algum tempo. Sem contar a quantidade incrível de casais por onde olhasse, causando-lhe inveja e embrulhando o estômago.

 Ainda assim, Eric sentia como se estivesse se divertindo. Ele e ele mesmo, e estava tudo bem. Olhando o fundo de seu copo, viu que a bebida já estava quase no fim.

 Quando ia completar o último gole, o garoto gordinho teve um desvio de atenção acidental. Por algum motivo cósmico ou indução do universo, seus olhos pararam nas pessoas sobre o mezanino ao qual levava a escada. Mais necessariamente, num casal muito próximo um do outro, encarando-se frente a frente e mantendo uma conversa aparentemente agradável.

 O garoto em questão estava de costas para ele. Irreconhecível, vestindo roupas negras e eduardianas. A garota estava voltada para sua direção, fantasiada feito uma fada com múltiplas cores, cujo rosto Eric podia ver apenas parcialmente. Uma garota que ele bem conhecia.

 Ou costumava conhecer.

 

 Heidi Turner era inconfundível.

 

 Doce, delicada, com calma nos olhos e em seu jeito de falar... Sua fantasia não poderia ter sido diferente. A mesma franja sobre a testa e os cabelos longos cor de areia, como assim ela dizia. Magra assim como quando a havia conhecido, porém por seu rosto estavam marcas deixadas pelas espinhas. Poderia ser somente uma impressão do menino, mas sua ex-namorada parecia infinitamente mais bonita.

 

 Qualquer um que viesse a conhecer Heidi Turner, fosse no presente ou passado, tiraria a mesma conclusão: era uma garotinha perfeita. A clemência, empatia e generosidade em pessoa.

 Cartman, por obra do acaso, teve a sorte de estar no lugar certo e no momento exato. Quando mais estava conformado de que nenhuma garota iria se interessar por ele nesta vida, passou a ser verdadeiramente amado. Amado por alguém que era exatamente o oposto dele mesmo.

 Mas ele “precisou” estragar tudo. Precisou transformar o relacionamento perfeito, que pensou que jamais conseguiria, num completo caos. Precisou fingir ser o que não era, coagi-la com ameaças, enganá-la com mentiras.

 Precisou tratá-la assim como tratava sua mãe.

 

 No fim de tudo, mesmo a fantasia que Eric usava estava de acordo consigo. Heidi tinha em si a graciosidade e bondade das fadas, como na literatura infantil. Enquanto tudo o que Eric fez foi sugar toda a sua energia vital, para então recompensá-la com quilos a mais e espinhas. E inseguranças, desilusões... Traumas.

 Se Eric passou estes anos sozinho graças a ela, Heidi havia passado pelo mesmo.

 

 Mas Eric Cartman não poderia sentir culpa... Certo? Ele representava tudo o que havia de pior no mundo. Era o que ele demonstrava, era o que pensavam dele.

 Preconceituoso, intolerante, nazista. Um mimado que só pensa em si, que destrói vidas sem qualquer remorso. Não havia por quê se levar em conta que ele costumava ser pacífico, pouco importava se as inúmeras ofensas gratuitas que recebia foram a razão de torná-lo agressivo.

 Para quê alguém levaria em consideração que ele também era um ser humano, afinal? O fato de que Cartman seria diminuído por todos caso não se defendesse, feito um novo Butters ou um novo Pip, não possuía relevância alguma. Ele devia ter se calado mediante as ofensas de seus próprios amigos, devia ter aceitado seu papel de “gordo e burro”, devia ter demonstrado o que sentia e ser humilhado por isso. Todos eram genuinamente bons e apenas ele representava todo o mal, pouco importava o que estivesse em seu passado. Era só um gordo mimado e egoísta, dotado da incapacidade de sentir.

 Era o que todos pensavam dele. E, honestamente... Ele não se importava. Antes mal visto do que massacrado. O mundo sempre tem espaço para os pacifistas, desde que não sejam gordos, feios, com mal desempenho escolar ou filhos de mãe solteira. Se ele fez mal a muitos, que se fodessem todos eles; este era o segredo para não fazerem mal a ele primeiro. Sua melhor arma era o narcisismo.

 

 Muitos diziam que ele era incapaz de sentir. Mesmo seu melhor amigo pensava assim, como dito em seu testamento num de seus muitos leitos de morte.

 Pois Eric sentia. Sentia até demais.

 Alguém que chorava todas as noites pela falta de um pai, mas que no dia seguinte soava feliz zombando dos outros com comentários racistas. Alguém que era mimado pela mãe diariamente e que não recebeu corretivos para obter um bom comportamento, mas que por várias vezes a viu se queixar de seu temperamento para os outros sem saber onde errou. Alguém que chorou ao descobrir que contribuiu com o assassinato de seu próprio pai, mas que disse estar chorando apenas por descobrir o gene ruivo em suas veias.

 Alguém que, para não se mostrar arrependido ou fraco, enganou a todos e inclusive a si mesmo. E que, obviamente, enganou Heidi também.

 

 No entanto... Apesar de tê-la enganado, manipulado, feito o inferno em sua vida... Eric não mentiu sobre uma coisa. Heidi era tudo para ele. Depois que ela entrou e saiu de sua vida, nada mais foi o mesmo.

 Enquanto esteve com ela, tentou ser o melhor possível. Deixou de incomodar os outros, tentou recomeçar sua conduta, mostrou todo o seu carinho. Mas com o mero pensamento de perdê-la e com um judeu moralista em seu encalce, voltou a sair do controle. Quando o namoro ultrapassou a margem do abusivo, a ponto de tentar matá-la, o inferno na vida da garota terminou por decisão e consciência dela mesma. Às vezes, se perde de qualquer jeito.

 E agora, depois de todos esses anos... Heidi enfim estava nos braços de outra pessoa.

 

 Fazendo-o gelar de forma súbita, o olhar dela parou sobre o seu. Eric deveria ter esperado por isso, visto que a estava olhando diretamente durante vários minutos.

 O sorriso que Heidi tinha ao conversar com seu companheiro desapareceu. O olhar de reprovação, desgosto, até mesmo medo que ela pôs sobre o dele o atingiu como dois tiros no peito.

 Mas ele não conseguia deixar de olhá-la. Não conseguiria nem se quisesse.

 Assim que o cavalheiro eduardiano à frente dela acariciou seu rosto com os dedos, seu foco retornou para onde não deveria ter saído. A garota tentou um sorriso para seu acompanhante, embora claramente incomodada por quem a estava observando. Olharam-se nos olhos, reuniram delicadamente suas mãos, e dele Heidi recebeu um beijo no rosto tranquilizador. Heidi Turner não olhou para Cartman nenhuma outra vez desde então.

 

 A música ambiente parecia ter sumido, de repente. Ainda tocava em alto e bom som para os outros, é claro... Mas para Cartman parecia ter desaparecido. Fazia silêncio num lugar festivo, sentia-se sozinho num lugar lotado. Mesmo sua posição no universo pareceu deixar de fazer sentido.

 Assim que tirou os olhos dela, direcionou sua atenção às lanternas de abóbora sobre uma mesa. Os sorrisos maldosos naqueles rostos esculpidos pareciam um reflexo do mundo, zombando deliberadamente de seu fracasso.

 

 Depois que “Eric e Heidi” terminou, continuaram com suas vidas na medida do possível. Ele, por sinal, continuou aprontando. Não com a mesma engenhosidade ou vontade, mas continuou. Continuou até onde dava. E então, o cansaço: os primeiros e decepcionantes momentos onde uma criança percebe que o mundo realmente não gira ao seu redor. Também se recusaria a confessar isso até onde desse, obviamente; mas esta noção já existia e crescia dentro dele. Passou a se recolher em seu canto, a se mostrar mais quieto e calmo, a fazer comentários e brincadeiras inconvenientes apenas em seu círculo de amigos. Poderia jamais se tornar um exemplo moral, mas o amadurecimento um dia chega para todos.

 E bem... Não seria este o dia para ele. Afinal, sem avisar ninguém, estava indo embora daquela festa. Heidi costumava ser o mundo para ele, mas hoje não havia mais nada a ser feito. Não estava disposto a continuar remoendo aquela situação.

 

 

* * *

 

 


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