A Máscara e a Rosa escrita por Sakura Kinomoto 20


Capítulo 3
Capitulo 2 – Passado (1ºParte)




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John Fredickson tinha 20 anos e uma vida pela frente. Médico reconhecido que largara tudo para se dedicar às paixões efémeras da vida. Viagens, escrita e mulheres. Em cada sítio onde passava, partia uns quantos corações. Um rapaz alto, corpulento, de olhos castanhos brilhantes e um vasto cabelo castanho.

Filho de um maiores empresários ingleses do ramo da cosmética, tinha tudo para um futuro brilhante qualquer que ele fosse. Mas optou pela vida boémia. Começou por escrever para jornais, alguns poemas que depois se transformaram em artigos de opinião a favor de uma república que nunca chegou a existir.

Rapidamente ganhou popularidade entre os seus pares e viajou por todo o mundo para recontar as suas aventuras.

Porém, certa vez em África, durante uma expedição ao Quénia, decorria, então o ano de 1893, a carruagem onde seguia foi abalroada por um bando de rinocerontes furiosos e foi cair numa ribanceira. Houve muitos mortos e feridos. Ele fora um deles. Ficou com a perna presa por baixo da carruagem. «Foi sorte não ter partido, mas vai ter sequelas» disse-lhe o médico.

O acidente encheu de desgosto a mãe que viria a falecer algum tempo depois. O pai ainda aguentou mais algum tempo, depois finou-se levando com ele todo o dinheiro da família.

Deprimido e manco para sempre, o jovem Fredickson entregou-se à bebida, ao desespero e ao crime. Roubava carteiras e alguma comida dos restaurantes.

Até que ela apareceu na sua vida.

Ela chamava-se Viviane Longbotton. Uma rapariga rica mas simples. Sempre alegre e descontraída. Naquela altura, adorava duas coisas: dar longos passeios à beira-mar e estar com a sua melhor amiga Nadeshiko Himoto a quem carinhosamente chamava Naddie. Eram amigas desde pequenas. Partilhavam todos os segredos até os mais íntimos.

Naddie namorava um jovem comerciante chamado Fujitaka Kinomoto. Já Viviane estava noiva de um homem viúvo e mais velho que ela chamado Jonathan Li.

A primeira mulher de Jonathan morrera de tuberculose há alguns anos e, como não tinha herdeiros porque a mulher era estéril por causa da doença, não tinha a quem deixar a sua enorme fortuna. Fora a única mulher que amara na vida. Conheceram-se tinha ele acabado de chegar de mais uma negociação bem-sucedida nos Estados Unidos. Elisabeth era o seu nome. Tinha cabelo comprido preto apanhado numa trança, olhos da mesma cor, vivos e brilhantes. Fora amor á primeira vista. Ambos eram de famílias ricas, por isso não foi difícil que aprovassem o namoro. Soube da sua saúde frágil pouco depois de oficializarem a relação. Todos os dias ia visitá-la, e todos os dias ela recebia-o com um sorriso aberto, apesar do seu ar debilitado. «Amar-te-ei para sempre, Jonathan» dizia, mesmo no meio de uma crise que a deixava cada vez mais sem forças. Conseguiu arranja-las no dia do casamento. Vestida com um delicado vestido branco, parecia quase um anjo. E foi-o. Ao fim de apenas 3 anos de casamento, ela não resistiu e sucumbiu á doença. Jonathan ficou destroçado, desesperado. Desde então, fechara o seu coração para o mundo. Passou a agir de forma rígida com toda a gente, até com a família. Tinha 23 anos quando tudo aconteceu, mas parecia que tinha mais. A cara e o corpo envelheceram depressa demais. Agora, com 40 anos, precisava de alguém que lhe pudesse satisfazer as necessidades.

A família Longbotton estava aflita de finanças. As plantações de cacau que tinham em África já não rendiam como antes e precisavam de sustentar o seu nível de vida por isso arranjaram este casamento. «Ao menos uma filha vai servir para alguma coisa» dizia Elisa, a mãe de Viviane.

Casada há mais de 20 anos com Roger Longbotton, Elisa era uma mulher amargurada. O seu casamento era por conveniência, não nutria qualquer sentimento pelo marido a não ser desprezo.

Tinha o cabelo louro e olhos azuis. Quase poderia dizer-se que saíra de um conto de fadas. Já o marido, um homem franzino, de olhos claros e cabelo preto. Vestia-se sempre com roupas caras para aparentar ter dinheiro que já era pouco.

Elisa desprezava a filha. Nunca lhe dera afeto. O seu grande sonho sempre fora ter um rapaz, mas depois de tantos abortos, acabou por se conformar. Quando arranjou o casamento para a filha, viu uma oportunidade não só de enriquecer mas também de se livrar de uma vez por todas daquele ‘empecilho’ como muitas vezes lhe chamava.

A sua proximidade com a família Himoto devia-se tão-somente à amizade das filhas. A mãe de Viviane e o pai de Naddie não se suportavam.

A única pessoa que realmente gostava dela naquela grande casa era o seu pai. Viviane tinha uma relação de muita cumplicidade com Roger. Era o seu segundo melhor amigo. O pai era amável e compreensivo e conseguia aguentar as constantes humilhações da mulher por causa da filha. «Tudo pela minha menina» dizia.

A família Himoto era mais simples. Apesar de terem acumulado uma grande fortuna, gostavam de viver a vida de uma forma nada faustosa. E era isso que atraía Viviane a Naddie. A sua simplicidade e generosidade.

O pai de Naddie, Toya Kinomoto, era viúvo. Um homem alto de cabelo castanho - escuro e olhos da mesma cor. Vestia-se de preto, mas houve uma altura em que usava fatos com cor. Era proprietário de uma galeria de arte, que adquiria pouco depois da morte da mulher, onde expunha e comercializava as obras. Muitas vezes, era ele que organizava as exposições da filha que muito o orgulhavam. Era uma pessoa amável tal como o pai de Viviane, mas havia sempre uma tristeza no olhar quando olhava para a sua menina de cabelo cinzento e olhos verdes. «Fazes-me tanto lembrar a tua mãe» dizia.

A mãe morrera de doença quando Naddie era ainda muito pequena. Chamava-se Suiko e era uma mulher encantadora. Tinha o cabelo comprido cinzento e olhos verdes. Quando se conheceram, numa festa de caridade, tinham 20 anos. Apesar de ainda não saberem o que era o amor, criaram empatia logo um pelo outro. Ela, com um vestido rosa-claro, um colar de pérolas e uma flor branca no cabelo. Ele, com um fato cinzento. Convidou-a para dançar e nunca mais a largou. Era a mulher da sua vida. Aquela por quem tinha esperado. Durante todos aqueles anos de viagens e negócios, conhecera muitas mulheres mas nenhuma conseguiu arrebatar-lhe o coração como aquela. Ambos de boas famílias e de origem japonesa. Vieram para a Europa em busca de melhores condições de vida, mas também, «para conhecer outros países fora da Asia» disse-lhe quando se conheceram. Depois, estiveram um tempo separados por causa dos negócios das famílias. Negociar obras de arte noutros países não era fácil. Requeria astúcia e Toya tinha- a. Mas, apesar de separados fisicamente, nunca deixaram de escrever cartas um ao outro, cada vez mais apaixonadas.

Até que um dia, voltaram a encontrar-se. Foi em Inglaterra, o mesmo país onde se conheceram. Oficializaram o namoro que ainda durou 8 anos. E, ao fim desse tempo, casaram. A saúde frágil revelou-se pouco depois do casamento, pelo que quando souberam da gravidez, os cuidados foram redobrados. «Não pode fazer esforços e tem de estar em repouso absoluto» dissera o médico depois de a examinar. Depois de Naddie nascer, a saúde de Suiko melhorou um pouco e, até, já era capaz de se levantar da cama. Mas, á medida que o tempo passava, ia perdendo as forças e, numa noite fria de Inverno, quando Naddie tinha apenas 4 anos, a sua mãe não resistiu. Toya ficou destroçado e entregou-se a uma depressão profunda. Durante muito tempo, não foi sequer capaz de olhar para a filha, por esta lhe fazer lembrar a mulher que perdera. Grande parte de infância de Naddie fora passada com uma ama chamada Anne. Uma mulher de meia-idade, de cabelo grisalho e olhos escuros, mas bondosos. Cuidou da menina até o pai ter forças para retomar o trabalho e voltar a olhar para ela.  O talento de Naddie para a pintura revelou-se pouco depois de o pai ter recomeçado a trabalhar. Um dia, chegou a casa e encontrou uma das paredes do muro do jardim pintada com flores e outros motivos primaveris. Quando perguntou quem pintara aquilo, Naddie surgiu com um ar de culpa e disse: «Fui eu, papá». Toya ficou impressionado com o talento da filha e, com apenas 16 anos, já expunha nas mais conceituadas galerias do Mundo.

Viviane ia sempre às inaugurações das exposições da amiga, nunca falhava uma. Ia sempre com o pai, pois a mãe estava ocupada com festas, clubes e conversas fúteis. Dizia que a arte era «uma perda de tempo. Mais vale conhecer pessoas bem relacionadas que ir ver um monte de quadros pintados por puro capricho».

Numa dessas vezes, o seu caminho cruzou-se com o de John Fredickson.

Naquele dia, tinham acabado de vir de mais uma exposição de Naddie. Estavam na carruagem, a caminho de casa. O céu estava cinzento e, em breve, começaram a cair as primeiras gotas de chuva.

Um homem sai de um bar a cambalear. A chuva limpa-lhe o rosto mas não a alma atormentada. Balança de um lado para o outro enquanto ia coxeando. De repente, uma carruagem passa á sua frente por cima de uma poça de água, salpicando-o. Todo molhado, continua o seu caminho.

Da carruagem, Viviane não pôde deixar de comentar com Naddie que ia sentada á sua frente:

— Acho que íamos atropelando o homem. É melhor ir ver se está tudo bem.- Naddie faz sinal para que parassem. Saíram as duas da carruagem não se importando com a chuva que lhes tornava as saias pesadas. Aproximaram-se do vulto combalido por causa de bebida, perdera o equilíbrio e deixara-se ficar sentado na berma do passeio. Viviane perguntou:

— O senhor está bem? Quer que o leve ao hospital?-

O homem levantou a cabeça e foi quando os seus olhares se encontraram. Viviane sentiu-se a corar e desviou o olhar. O homem fez o mesmo. Apenas disse:

— Está tudo bem, não se preocupe.-

Depois, levantou-se e afastou-se dali o mais depressa que conseguiu.  

Durante o tempo que se seguiu, Viviane não parava de pensar naquele olhar, tão belo e misterioso. Queria vê-lo de novo, mas não sabia onde procurar. Resolveu pedir ajuda à sua melhor amiga, assim sempre tinha uma desculpa para sair quando não ia visitar noivo, que detestava.

— Mas não sabemos onde começar a procurar.- Retorquiu Naddie. Estavam na casa desta na sala de estar sentadas uma em frente á outra. Era Inverno, pelo que a lareira estava acesa e as duas aqueciam-se.

— Londres é uma cidade enorme, Viv! Como é que o vamos encontrar?- Acrescentou.

— Nem que tenha de verificar rua por rua, eu vou encontra-lo!- Viviane estava determinada.

Naddie então lembrou-se de algo. Levantou-se e foi até uma mesa com gavetas perto do sítio onde estavam sentadas. Abriu uma e tirou de lá três ingressos. Voltou a sentar-se e disse:

— Olha, tenho bilhetes para a ópera esta noite. Ia só com o meu pai, mas acho que me aborreceria. Queres vir connosco? Sempre te distrais um pouco.-

Viviane aceitou encantada:

— Está bem, vamos então.-

Continua…


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