Monstro escrita por ColibriMoriarty


Capítulo 2
Capítulo 2




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Quatro horas.

Faziam quatro horas desde o confronto com o E.V.O cefalópode.

Faziam quatro horas que Rex havia desaparecido, voando para longe com seu constructo.

Os agentes não tiveram sorte em rastreá-lo, uma vez que seus nanites destruíam todo e qualquer rastreador que tentassem implantar no garoto. Porém, poderiam rastrear a assinatura deixada pelas nanomáquinas, assim como se rastrearia uma bomba atômica pela sua assinatura radioativa. Todavia, todas as assinaturas nunca levavam a Rex, mas sempre para algum E.V.O nos esgotos ou para a Jarra de Insetos.

— Alguma evolução? – Questionou o homem de terno para um agente próximo, que analisava dados computados em uma tela.

— Não, senhor. – Respondeu a moça. – Nenhuma assinatura que seja compatível com a de Rex. – Reportou, enquanto digitava rapidamente. Seus dedos morenos deslizando pelo teclado a uma velocidade vertiginosa. As unhas pintadas com esmalte transparente faziam barulho de encontro as teclas feitas de plástico. Um mapa surgiu na tela, onde vários pontos com diferentes escalas de cores quentes mostravam a atividade nanite na região. Um círculo vermelho representava o espaço onde o QG se encontrava. A cor denunciava uma alta taxa de manifestação no prédio, talvez devido ao zoológico ou à quantidade de seres contaminados com as nanomáquinas em tão mínima extensão.

— Continue trabalhando. – Instigou de forma branda, dando as costas para ir embora.

— Porém... – Iniciou a moça fazendo o homem parar. – Há uma leitura conhecida do sistema. – Seis se virou e se aproximou da agente.

— Que tipo de leitura? – Questionou, erguendo uma das sobrancelhas por detrás dos óculos escuros enquanto analisava o monitor.

~X~

— Isso que é vida! – Exclamou após dar uma longa tragada pelo canudinho de sua bebida gelada. Seus olhos, ocultos por um óculos de sol, espiavam de forma descarada os corpos esculturais e seminus de várias mulheres que passavam à sua frente. Um enorme sorriso satisfeito surgiu em seu rosto enquanto se reclinava na cadeira de praia e cruzava os pés peludos, sentindo-se confortável.

Um garçom se aproximou dele com um andar silencioso, em seguida, tomando os copos vazios que o freguês havia largado sobre a areia de forma desleixada, afastou-se quase que despercebido. Mas não para seu cliente.

— Ei, amigo! – Chamou antes que o homem fosse embora completamente. – Me traz mais uma... Como se chama? Caipira?

— É “caipirinha”... Ãhn, senhor. – Respondeu de forma educada, avaliando aquele anômalo turista.

— Então me vê mais uma caipirinha. – Disse, sentindo a palavra estrangeira escorregar de maneira deliciosa por sua língua. O homem assentiu e deu às costas para concluir seu objetivo. Entretanto, seu freguês tornou a chamá-lo. – Com bastante gelo também! – Pediu enquanto sacudia sua bebida parcialmente consumida. Com um aceno de cabeça, o garçom se afastou.

De repente uma bola de vôlei, que parecia ter se materializado em pleno ar, acertou um banco de areia ao lado de sua cadeira. Uma avalanche de dióxido de silício desabou sobre si, sujando seus braços peludos e inutilizando seu refresco. Cego por alguns segundos, sentiu a irritação subir-lhe a garganta, tão rançosa quanto bile. Virou-se na direção de onde, supunha, a bola viera com esse desgosto ácido tornando-se um grito alto de pura resignação, que explodiu contra as pessoas que seriam donas do item responsável por catalisar sua, até então, entorpecida neurastenia.

— Ei! – Reclamou, mas logo se calou ao ver um grupo de belas moças, próximas de uma rede, acenando e pedindo a bola de volta. Um grande sorriso se formou em sua face. – Ei, bonecas! – Disse agarrando o objeto com ambas as mãos e esquecendo totalmente o motivo de sua raiva. – Vamos jogar um pouquinho?

Ele fez um saque, para logo correr na direção delas. Entretanto, trombou com alguém, caindo sentado no chão. As moças desandaram em gargalhadas devido à cena cômica que se discorrera.

— Ei! Olha por onde... – Vociferou, irritado. Mas a frase morreu em sua garganta ao reconhecer o dono das pernas nas quais havia esbarrado. Ele ergueu o olhar para o homem de terno que tinha uma expressão dura, acentuada por sua sobrancelha levantada em inquisição. O engomadinho cruzou os braços, assumindo uma carranca irritada. – Hum... Olá... – Disse o símio abrindo um grande sorriso sem graça.

. . .

— É bom você ter um ótimo motivo para ter vindo aqui arruinar minhas férias no Brasil! – Resmungou o macaco, irritado. Seis havia o escoltado até a aeronave da Providência a passos largos, enquanto que o símio o seguira, irritadíssimo pelo fato do agente ter acabado com sua diversão.

— Você não estava de férias. – Retrucou com sua habitual frieza.

— Estava, até você chegar. – Retorquiu mal-humorado. – Afinal, o que vocês querem? Eu tinha acabado de pedir uma caipirinha!

— Rex desapareceu. – Informou o homem enquanto subiam a bordo. – Achávamos que ele estivesse com você.

— E eu lá tenho cara de babá? – Retrucou Haha de forma mal-educada.

— Você sabe aonde ele está, não é? – Insistiu Seis.

— Eu sei lá. Já falou com aquele amigo loirinho dele? – Sugeriu.

— Noah está em um passeio escolar. O rastreador confirmou a localização. – Respondeu o homem, impassível. – Os únicos amigos com quem Rex tem contato próximo é você e ele.

— Ok, já entendi. Sempre colocam a culpa no macaco, por que seria diferente desta vez? – Reclamou o símio cruzando os braços após se jogar de qualquer jeito no banco duro da aeronave.

— Você tem uma certa reputação. – Respondeu o agente, também acomodando-se em um assento e colocando o cinto de segurança. Haha ficou ainda mais emburrado.

— Eu não irei falar nada para você. Ele não quer ser incomodado. – Seis travou uma guerra de olhares com o símio, mas logo soltou um suspiro irritado.

— O que você quer? – Questionou.

— Você sabe muito bem o que eu quero. – Respondeu o macaco abrindo um sorriso malicioso.

— De jeito nenhum. – Disparou.

— Então você ficará correndo em círculos atrás de seu próprio rabo a noite toda. – Retrucou Haha dando de ombros.

— Está bem. Você terá o que quer. Agora, diga-me onde o Rex está. – Disse o agente se inclinando no assento. O sorriso malicioso do símio se alargou.

— Eu te conto no caminho.

~X~

A aeronave pousou no heliporto do QG da Providência de maneira barulhenta devido a seus motores.

— Chega de brincadeira. Onde o Rex está? – Insistiu o agente, já sem paciência. – Sem mais joguinhos! Você nos fez dar voltas a noite inteira! – O macaco começou a rir.

— Essa foi muito boa! Você tinha que ter visto a cara de vocês! – Haha gargalhava, como se houvesse ouvido a piada mais engraçada do mundo. – Sabe o que é melhor? – Questionou, deleitando-se com a expressão ranzinza de Seis enquanto saiam da aeronave. – É que vocês procuraram em todos os lugares atrás dele, menos em um!

— E qual lugar seria esse? – Inquiriu o agente.

— Ora, não está na cara? Ele nem sequer saiu daqui e vocês perderam tempo procurando por ele, enquanto que ele estava bem debaixo de seus narizes! – O símio teria limpado uma lágrima de riso de seus olhos se macacos pudessem chorar. – Faz quase cinco anos que Rex está aqui, e vocês nem ao menos se deram o trabalho de conhecê-lo! – Ele fez uma pausa. – De qualquer forma. – Ele se virou para Seis. – Acho que você já sabe onde ele está. Quero minha recompensa.

— Você não vai ganhar nada.

— O quê?! – Exclamou Haha, ultrajado. – Havíamos feito um trato! – Gritou, porém o agente já havia dado as costas, deixando o heliporto e o símio para trás. Ele assistiu Seis desaparecer quando as portas automáticas se fecharam. – Está olhando o quê?! – Resmungou ao notar que os agentes haviam parado para prestar atenção no que se discorria. – Nunca viram um macaco sendo injustiçado antes?!

~X~

O homem encarava a porta automática do quarto de Rex fazia alguns minutos. Haviam grandes chances de o símio tê-lo enganado, mas ele havia procurado pelo garoto em todos os lugares, menos naquele. Mas por que Rex ficaria no QG? De todos os lugares para onde ele poderia ter ido, o Centro de Operações da Providência era a última opção do rapaz. Mas lá estava, possivelmente, ele atrás de uma parede de metal.

O agente deu um passo à frente e o sensor notou sua presença, abrindo a porta automática após alguns milissegundos, ele adentrou o quarto, que estava totalmente escuro. Sua sombra se agigantava, disforme, no chão devido à luz que se infiltrava pela porta aberta. Seis estendeu a mão até o interruptor e acionou as luzes. O ambiente iluminou-se, denunciando o rapaz que estava deitado na cama ouvindo música.

A mudança súbita de luz fez com que abrisse os olhos e encontrasse a figura do agente à porta. O garoto emitiu um ruído de desaprovação enquanto que desviava o olhar. Um breve hiato se formou, visto que nenhuma das partes iria iniciar um diálogo.

— Como me achou? – Inquiriu Rex após algum tempo.

— Haha nos contou. – Disse, vendo a expressão do rapaz tornar-se ainda mais ranzinza. Outro silêncio momentâneo. – Rex... – Iniciou Seis, mas sua fala foi cortada pelo garoto.

— Eu não quero ouvir essa ladainha sobre meus poderes de novo. – Resmungou, irritado. Ele tirou os headphones com raiva. – Eu sei que pisei na bola. – O agente permaneceu em silêncio. – Foi minha culpa ter colocado a vida daquele menino em risco. Mas... – O rapaz pareceu confuso por um segundo, perdido em meio a pensamentos. – Eu não sei o que aconteceu. Eu simplesmente não podia deixar que aquele garotinho perdesse a mãe.

— Você enxergou a si mesmo naquele menino. – Respondeu Seis, de forma afiada. – Foi isso que aconteceu.

O rapaz ficou mudo, o agente havia lhe estapeado com uma verdade que havia lutado para negar assim que escapara covardemente da zona de confronto.

— Você não pode curar a todos, Rex. – Repetiu o homem.

— Eu sei, Seis! – Gritou, colocando-se de pé em um rápido movimento. – Acredite, eu sei muito bem disso! O zoológico está cheio de E.V.O's que não pude curar, assim como a mãe daquele menino! A Holly vive dizendo que meus poderes são afetados pelas minhas emoções e você sempre está irritado comigo por pisar na bola. Estou cansado de ter tanto potencial desperdiçado por minha própria inutilidade. – Confessou, desolado, encarando suas mãos cobertas pelas habituais luvas negras.

— Rex. – Disse o agente colocando a mão em seu ombro para acalmá-lo. – Você não é inútil. Existem coisas que sempre estarão além de nosso alcance. Se não fosse por você, aquela criança poderia ter morrido. Você é útil. – O rapaz ergueu o olhar para Seis, para logo desviar assumindo uma expressão tristonha. De súbito, o homem crispou as sobrancelhas e retirou a mão do ombro do garoto. Ele analisou sua palma agora úmida. – Você está ferido? – Questionou voltando a fitá-lo, mas, mais intensamente.

— Não é nada. – Respondeu Rex tocando o braço machucado. – Foi apenas um tiro de raspão. Meus nanites já estão cuidando disso.

— Você deveria ir ver a Doutora Holly. Ela ficaria louca caso você pegasse uma infecção. – De repente um som veio através de seu comunicador auricular. – Entendido. – Disse após apertar o pequenino botão do aparelho. – O Cavaleiro Branco quer um relatório sobre o ataque de hoje. – Ele deu as costas para ir embora, entretanto, deteve-se à porta. – E Rex? – Chamou, atraindo a atenção do rapaz. – Você fez um ótimo trabalho hoje. – E desapareceu quando a porta automática se fechou.

O fantasma de um sorriso iluminou a face do rapaz.

~X~

Sua expressão assumiu um ar desconfortável enquanto que estava ali de pé, ao lado de Seis, encarando em silêncio a tela pela qual o Cavaleiro Branco usava para se comunicar.

— Explique-me melhor o que acabou de dizer, Seis. – Resmungou, irritado, o homem albino.

— Houve um ataque E.V.O de nível 1 no centro de Manhattan esta tarde, por volta das 17:10. Rex e eu, junto de um esquadrão de apoio, chegamos ao local as 17:30, encontrando um E.V.O semelhante a um cefalópode destruindo tudo. Imobilizamos, sedamos e transportamos o mutante para o zoológico, onde se encontra sob efeito de sedativos pesados. – Repetiu o agente, mantendo seu olhar impassível.

— Então, diga-me, agente Seis, por que uma de nossas aeronaves recebeu a permissão, sua permissão, para ir até a América do Sul? – Indagou, seu semblante era duro como mármore. Rex olhou para o homem de terno de forma inquisitiva, ele também não sabia de nada daquilo que o Cavaleiro havia dito.

— Nada com relação ao ataque desta tarde, senhor. – Respondeu Seis, neutro. O Cavaleiro ficou em silêncio por um momento.

— Soube que fugiu do local do ataque após neutralizar a ameaça, posso saber o porquê? – Questionou, voltando-se para Rex.

— Branco, nosso relatório já está--

— Calado, Seis! – Cortou o homem albino. – Responda minha pergunta: Por que você saiu da zona de confronto sem pedir permissão? – Repetiu o Cavaleiro, fitando incessantemente o rapaz. Rex mudou o peso de um pé a outro, incomodado.

— Já estava tudo resolvido. – Respondeu. – Meu trabalho já estava feito.

— Isso não teria relação com suas recentes falhas durante as últimas missões, teria? – Indagou o albino, pegando o rapaz de surpresa.

— Cavaleiro, nosso relatório já está entregue. – Insistiu Seis, dando um passo à frente. – Creio que já estamos dispensados. – O homem de terno encarou o Cavaleiro Branco, sem trégua.

— Vocês estão dispensados por hora. – Informou o albino, reclinando-se em sua cadeira, após alguns segundos de silêncio desconfortável. O agente e o rapaz assentiram e deram meia volta para saírem da sala. – É melhor resolver isso, Rex. – Disse, detendo por um momento, o garoto com sua frase. – Uma arma defeituosa não tem utilidade para mim, muito menos para a Providência. Fique ciente disso.

— Pode deixar, Branco. – Retrucou o garoto com raiva transparecendo em sua voz enquanto cerrava seus punhos.

Eles deixaram a sala em silêncio, com a porta se fechando com um alto estalido atrás deles.

— Não dê ouvidos a ele, Rex. – Instruiu o agente quando já não podiam ser ouvidos, com uma quase amabilidade em seu timbre de voz, colocando a mão sobre seu ombro.

— Não enche, Seis. – Resmungou o rapaz, ranzinza, se livrando da mão do parceiro. Ele enfiou as suas próprias nos bolsos, e se afastou do agente, com um ar irritadiço envolvendo-o como uma aura quase tátil.

O homem de terno assistiu, contemplativo, o casaco rubro que o garoto usava desaparecer pelo corredor quando Rex dobrou uma esquina.


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