Heartche escrita por MNunesPe


Capítulo 1
Prólogo


Notas iniciais do capítulo

Boa madrugada, pessoal, sou a MC! Muito prazer e obrigada por escolher a minha história para se aventurar. Recebam minhas calorosas boas vindas neste dia chuvoso (aqui na minha chove como se não houvesse amanhã). Espero que apreciem minha história! Caso não apreciem, sempre podem me mandar críticas! Estou evoluindo como escritora, então todo conselho sempre é bem vindo :)
Sem mais delongas, Boa leitura!
??”MC



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O incessante bater na porta me desperta de um sono profundo. Desorientado, demorei para me ambientar e entender exatamente onde eu estava. Sentia meu pescoço dolorido, indicando que a posição e o local que eu estava não eram ideais para dormir, mas o cansaço me ajudou a ignorar tais fatores. Percebi que cochilei sentado em minha poltrona. Muitos diriam que é um lugar extremamente confortável para se tirar um cochilo, mas creio que essas pessoas não pensariam assim de minha poltrona se a conhecessem. Definitivamente antiga, com vários buracos no estofamento, faltando algumas partes aqui e ali… Não que eu pudesse me desfazer da mesma, já que fora um presente de minha bisavó.

As batidas na porta estavam mais fortes. Nesse ritmo, marcas permanentes seriam deixadas e a proprietária do apartamento nunca me deixaria viver em paz até trocar a porta inteira. Tentei me levantar da poltrona o mais rápido possível para impedir tal atrocidade, ignorando o peso que estava sob minhas pernas. Quando me dei conta, um álbum de fotografias despencou no chão, por pouco não acertando meu pé. Meu antigo álbum de ensino médio, para ser mais específico. É provável que, antes de adormecer, eu estivesse revendo algumas fotos de épocas mais felizes, algo que acontece com certa frequência. Como tinha uma emergência à porta, não pude guardar o álbum em seu devido lugar, então apenas o deixei sobre a mesa de centro de minha pequena sala e corri para atender quem quer que estivesse esmurrando a entrada de meu apartamento.

Mal terminei de virar a chave e a porta foi escancarada com uma força descomunal.

— Quando você vai consertar essa porra de campainha?!

Uma confusão de cabelos vermelhos invadiu meu apartamento, largou um engradado de cerveja e uma sacola em cima do balcão que dividia a sala da cozinha, se desmanchando em meu sofá quase imediatamente (que ficava em frente ao meu aquecedor portátil). Com os braços cruzados sem realmente olhar em minha direção, meu melhor amigo resmungava sem parar. Não era exatamente baixo, mas não conseguia distinguir as palavras que deixavam sua boca, já que o mesmo batia os dentes de frio. Por algum motivo ele me parecia irritado, e algo me dizia que isso tinha a ver comigo.

— Boa noite, Kagami-kun. — Me concentrei em fechar a porta ao invés de prestar atenção na birra de meu amigo. Eu ainda estava um pouco tonto já que acabara de despertar, então não engajaria em algum tipo de discussão.

— Boa noite só se for para você. — Ele respondeu, ríspido — Tem ideia de quanto tempo eu fiquei lá fora, no frio, esperando você resolver abrir a porta?! Meia hora!

Hm, eu realmente deveria pensar em consertar minha campainha. Há um mês atrás, ela apareceu simplesmente em pedaços. Até hoje não sei bem como aconteceu, mas sei que algumas crianças costumam brincar nos corredores do complexo de apartamentos que vivo, então imagino que possa ter sido alguma delas sem querer. Crianças de hoje participam de brincadeiras tão violentas que não seria surpresa para mim se isso fosse obra de alguma delas.

— Ah, sinto muito. Eu dormi.

Eu percebi que Kagami-kun estava se preparando para gritar obscenidades por causa de minha resposta, mas aparentemente estava com tanto frio que não conseguia formar uma frase. Não consigo compreender como uma pessoa com aquele corpo massivo poderia ser tão vulnerável à baixas temperaturas. Deixei meu amigo encolhido no sofá tentando se aquecer enquanto guardava as bebidas que ele trouxe e o conteúdo da sacola na geladeira. Não creio que as cervejas necessitassem qualquer tipo de refrigeração, mas na sacola havia algumas coisas que provavelmente não poderiam ficar sem, como tomates, abacates, coentro e limões. A carne moída e o molho que estavam na sacola ficaram em cima da bancada.

— Gostaria de beber algo agora? — Ainda com a geladeira aberta, levantei a cabeça e tentei ver sua reação na sala, mas agora ele estava tão encolhido no sofá que eu não entendi exatamente se ele me respondeu de alguma forma — Vou preparar um chá, então.

Ouvi um grunhido vindo dele e não consegui controlar um riso baixo que acabou escapando. Kagami-kun desgosta de poucas coisas quando o assunto é comida e/ou bebida. Ele sempre experimenta um pouco de tudo e é extremamente fácil de agradá-lo. Mas quando o assunto é chá… Digamos que desgostar não consegue abarcar os sentimentos dele por essa bebida e não há ninguém nesse mundo que o faria beber tal "atrocidade". Satisfeito com a reação que obtive dele, apenas peguei o resto do leite que tinha dentro da geladeira e decidi fazer um chocolate quente. Seria um bom acordo de paz já que ele ainda parecia estar irritado comigo.

Com o achocolatado, leite e amido nas mãos, acendi o fogo abaixo da panela e comecei a preparar a bebida. Ao longo dos anos, Kagami-kun me ensinou a cozinhar minimamente, — principalmente as coisas que ele gosta de comer — então já não considero mais o fogão meu pior inimigo. Hoje em dia até me pego ansioso para testar algumas receitas, ter novas experiências culinárias, mas hoje meu cansaço me dizia para fazer o mínimo. Um chocolate quente simples, talvez colocar um pau de canela junto à mistura para dar a sensação que é algo mais refinado. Até coloquei alguns marshmallows que Kagami-kun me deu no Natal passado (por algum motivo, nunca abri o saco). Quando senti que estava no ponto ideal, desliguei o fogo e tentei experimentar. Hm… está um pouco mais amargo… Acho que queimou um pouco. Olhando pelo lado positivo, está melhor do que da última vez. O amargor será mascarado pela doçura do marshmallow, então está perfeito. Servi a bebida em sua caneca preferida e me dirigi à sala, carregando a oferta de paz.

— Eu não quero o seu chá. — Murmurou.

— Eu não fiz chá. Sinta o cheiro. — Calmamente coloquei a caneca na mesa de centro e me sentei no sofá, ao lado de meu amigo, observando quais seriam suas reações.

Inicialmente ele não pareceu querer se mover, provavelmente não querendo perder o calor que vinha em sua direção. Mas assim que sentiu o cheiro de chocolate e canela (modéstia a parte, o cheiro estava maravilhoso), ele vagarosamente foi saindo de seu estado análogo a um burrito, encolhido no sofá. Ainda deitado, esticou os braços tentando alcançar a caneca. Antes que ele acabasse esbarrando em alguma coisa, quebrando-a no processo, preferi ser o intermediário naquela ação, entregando-lhe seu chocolate quente.

— Hm. Obrigado.

— Kagami-kun às vezes parece um cachorro.

Em dias normais, esse comentário teria o irritado e o deixado envergonhado, — Kagami-kun é conhecido por ser tsundere — mas acho que sua intolerância ao frio estava ocupando toda suas funções mentais, então não houve qualquer objeção. Ele estava apenas bebendo sua bebida, ocasionalmente soprando para não queimar a língua. Por sua expressão, parecia estar agradável.  

— Eu estava precisando disso. — Ele estava claramente mais tranquilo, me fazendo crer que minha oferta de paz foi bem sucedida — Você não faz a menor ideia do frio que está lá fora. Me admira que ainda não esteja nevando.

— Prometo consertar a campainha eventualmente. — Tentei manter a expressão mais neutra que consegui para que ele não percebesse que eu estava mentindo.

— Eventualmente… Quantas vezes você já me prometeu isso? — Ele fechou a cara, mas logo voltou a se concentrar no chocolate quente, suavizando a expressão.

Ficamos alguns segundos em silêncio, até eu lembrar porque ele estava ali. Estamos no meio do campeonato nacional de basquete, e hoje tem jogo entre os Alvark Tokyo e os San-en NeoPhoenix. Não perdemos até agora nenhum jogo da liga, então esse não seria diferente. Resolvi começar a preparar alguns petiscos para comermos durante a partida, mesmo que ainda tivesse bastante tempo antes do início. Graças àquele corpo massivo, Kagami-kun sempre comia muito, então era preciso preparar muita coisa com certa antecedência.

— Vou preparar algo para comer, gostaria de alguma coisa específica?

— Não se preocupe, eu posso preparar alguma coisa. — Ele se levantou do sofá, ainda com a caneca, e se dirigiu a cozinha.

Aproveitei esse momento que meu amigo não estava na sala para pegar o álbum de fotografias que estava em cima da mesa de centro. Não quis chamar a atenção para ele, então não fiz nenhuma tentativa de guardá-lo até agora. Não que eu tenha vergonha do meu ensino médio, eu apenas não gosto de admitir que sinto um pouco de saudades. Aquela não foi a época mais feliz da minha vida, mas foi a época que eu conheci meu amor por basquete e, bem… um outro tipo de amor. Não gostaria de prestar sobre isso agora, então apenas peguei o álbum e o guardei na última gaveta da cômoda que fica em meu quarto. Ao voltar para a cozinha, Kagami-kun estava cortando alguns legumes, ocasionalmente tomando um gole ou outro em sua caneca.

— Você convidou mais alguém para ver o jogo? — Perguntei enquanto puxava um dos bancos do balcão para sentar e observá-lo cozinhando.

— Não é um jogo tão importante assim na liga, então não falei com mais ninguém. — O foco dele não estava em mim, mas na faca que rápida e profissionalmente picotava um pouco de coentro — Você tem torradas? Eu esqueci de trazer.

— Acho que tem um pouco que baguete ainda… Posso cortar e colocar no forno para fazer torradas.

Aqui e ali falávamos alguma coisa enquanto trabalhávamos, algum comentário irônico era feito ou era apenas algo relacionado às últimas partidas da liga. De repente, meu telefone de casa começa a tocar. Como minhas mãos não estavam muito sujas e eu estava mais perto, resolvi atender (Kagami-kun vem tanto em minha casa que ele já está mais do que acostumado em atender o telefone para mim).

— Boa noite, Kuroko Tetsuya falando.

— Ele está aí, não está? — Uma voz feminina que já me era bastante familiar parecia extremamente irritada do outro lado da linha.

— Ah, olá Mayu-chan… — Falei um pouco mais alto para que da cozinha meu amigo pudesse ouvir. Escutei de repente um barulho como se algo tivesse caído e grunhido de dor vindo de lá — Ele está sim… Hoje é dia de jogo.

— Eu estou ciente disso, mas nem ontem, nem anteontem foram dias de jogo! — A voz dela ficava cada vez mais aguda, algo que sempre acontecia quando seu nível de irritação aumentava.

— Eu sei, Mayu-chan. Tente se acalmar, por favor.

— Hnf…Peço desculpas, Kuroko-san. Não era minha intenção de gritar com você... Mas você deve entender meu lado: meu marido não aparece em casa há três dias seguidos, sem dar satisfação alguma! Ele anda indo quase direto do trabalho para a sua casa! — Sua voz continuava um pouco aguda, mas agora ela beirava o choro. Eu entendia completamente os motivos dela e não a culpava por isso.

— Eu que lhe peço desculpas. Você não está errada em ficar chateada. — Mantive um tom de voz baixo e tranquilo — Prometo que, assim que o jogo acabar, eu o envio de volta para casa, certo?

Ela concordou, ainda choramingando de leve. Nos despedimos e assim desliguei, suspirando. Eu já deveria saber que algo não estava certo quando Kagami-kun começou a frequentar minha casa mais do que o normal — e digamos que o normal já é uma alta frequência de estadias. Ainda com o telefone na mão, fiquei imaginando como falar com ele sobre isso ou até onde eu poderia me intrometer em assuntos de casal. Eu também não queria ter que me colocar nessa posição de qualquer forma.

Devolvi o telefone à sua base e andei o mais devagar possível em direção a cozinha. De onde eu estava, era possível ver meu amigo extremamente concentrado em cortar coentro em pedaços mínimos. Conhecendo-o, ele estava provavelmente estava fingindo um foco que não existia para disfarçar seu extremo desconforto com aquela situação. Ele sabia que eu ia perguntar, e ele sabia que teria que me responder. Não o culpo por seu desconforto. Fiquei encostado no balcão com os braços cruzados encarando meu amigo, sem realmente saber como dar início a esse assunto.

— Vai ficar me encarando ou vem aqui ajudar? — Ele perguntou com a voz levemente mais aguda que o normal.

— Achei que você tinha dito que conseguia preparar algo sozinho. — Tentei manter um tom neutro, não mostrar meu desconforto era importante nesse momento.

— Eu só disse que poderia preparar algo, nunca vou reclamar por receber uma mãozinha extra! — Uma típica reação de quando ele se sente encurralado.

Dei os ombros e voltei a cortar os pedaços de baguete que jaziam em cima da bancada. Percebi que ele se surpreendeu com a minha reação, mas também não fez mais nenhum comentário. Senti que aquele não seria o melhor momento para trazer o assunto à tona, então me foquei em não falar sobre isso por agora.

Terminamos de cozinhar, agora em completo silêncio, e levamos tudo para a sala. Kagami-kun pode morar no Japão há mais de dez anos, mas seus maneirismos e gostos americanizados nunca o deixaram. Isso inclui sua culinária: hoje ele preparou guacamole e chili sem feijões vermelhos (não é algo fácil de se achar, mesmo aqui em Tóquio). E sim, eu entendo que esses não são pratos americanos, mas mexicanos. Segundo Kagami-kun, ninguém conseguiu comercializar tão bem essas receitas quanto o povo americano. Eu penso que isso é roubar a cultura de seus vizinhos descaradamente, mas Kagami-kun ainda se sente um pouco americano, então a visão dele é de livre mercado — quem melhor faz, melhor comercializa um produto.

Ligando a televisão, percebemos que o jogo estava para começar em dez minutos, então apenas nos acomodamos, acompanhando enquanto as câmeras focavam ora nos jogadores, ora nas arquibancadas. A partida seria aqui na região, então a maioria das pessoas no estádio brandiam as cores vermelho e preto. Se os Alvark conseguirem chegar nas finais, eu e Kagami-kun prometemos um ao outro que iríamos nesse jogo, onde quer que fosse. Neste momento ele prestava muito atenção nos comentaristas, às vezes rindo, às vezes respondendo algo que foi falado com estatísticas estranhas que eu não sei de onde ele tirava sobre os jogadores. Fico me perguntando como ele quase reprovou matemática algumas vezes quando estávamos no ensino médio.

Acho que aquele pequeno de calmaria era a oportunidade perfeita para falar sobre o elefante branco na sala.

— Então… — Comecei num tom baixo, tentando não alterar meu tom de voz, me inclinando levemente em direção a ele  — Você quer… Não sei, comentar… Sobre o que está acontecendo com você e a sua esposa?

Ele fingiu continuar muito concentrado na televisão, mas eu sabia que ele estava entrando em seu modo de defesa. Quando ele se sentia encurralado, sua postura mudava, ficava mais rígida. Era sutil, mas conhecendo ele há anos era perceptível.

—  Ahn… Eu até comentaria… — Kagami-kun estava conseguindo manter sua voz muito controlada… Ele tinha uma carta na manga — ...Se você quisesse, não sei, talvez comentar o que o seu álbum de fotografias do ensino médio estava fazendo em cima da mesa de centro.

Oh.

Ooh.

Então ele viu.

Droga.

— Bom ponto. — Respondi mantendo ainda o tom controlado. Devo agradecer a minha inabilidade de demonstrar emoções, porque naquele momento eu só queria enterrar minha cabeça em algum lugar e nunca mais tirá-la de lá.

Apenas me afastei um pouco, voltando a minha postura original, tentando entender o que estava passando naquele momento. O silêncio entre nós era palpável, podia ser cortado com uma faca, e a TV não passava de um eco na minha cabeça. Até que…

— Desculpa. Acho que peguei um pouco pesado. — Não que eu realmente estivesse olhando para ele naquele momento, mas tinha certeza que ele estava mexendo no cabelo de maneira inquieta. Era uma mania dele quando estava envergonhado.

— Não, tudo bem. Eu passei da medida, peço desculpas.

— Não! Você não passou da medida… Você é meu melhor amigo, tem o direito e o dever de perguntar essas coisas... — Mesmo falando isso, ele ainda não parecia confortável em comentar sobre a situação.

— Entendo se não quiser conversar sobre isso.

— Hm… — Ele murmurou algumas coisas inteligíveis, o que quase me fez voltar a encará-lo, mas me mantive firme olhando para a televisão. Eu gostava de observar esses pequenos momentos de indecisão dele: sempre eram acompanhados de expressões… fofas — ...Não é como se eu não quisesse conversar. É só que… Não tem o que conversar, sabe?

Nesse momento, eu tive que parecer um pouco confuso ao encará-lo.

— Sua esposa me liga dizendo que você não aparece em casa há dias e nem ao menos avisa. Você tem certeza que não tem nada o que conversar?

— Erm… Eu… — Ele murmurou mais coisas inteligíveis, não falando coisa com coisa por um breve momento — Não é como se a gente tivesse brigado ou algo assim. Mas ela reclamou que eu nunca passo um tempo em casa com ela, o que não é verdade. Então eu estou apenas demonstrando o que é não passar tempo com ela.

"Meu Deus. Que motivo estúpido." não consegui deixar de pensar.

— Não me julgue assim! Não é só por isso! — Ah, acho que deixei transparecer o que estava pensando. Mesmo tendo dificuldade de me expressar, sempre me esqueço que ele me conhece há mais de dez anos, então é claro que ele sabe me ler um pouco — Ela também queria que eu diminuísse as minhas vindas aqui… E isso não é justo. Eu não posso deixar de te ver assim!

Tentei me controlar ao máximo para não enrubescer. Não sei se fui bem sucedido. Em minha cabeça, só me concentrei em pensar que ele provavelmente não queria dizer aquilo e que eu deveria parar imediatamente qualquer fantasia que tentasse invadir a minha imaginação, me fazendo sonhar que aquelas palavras pudessem representar qualquer outra coisa que não a realidade do que elas queriam dizer e...

— Você é meu melhor amigo, e melhores amigos não deixam de se ver assim, certo? — E é assim que a dura realidade retorna.

— Sim, Kagami-kun… — Tentei formular alguma frase depois de receber um fatal golpe de realidade súbita — Eu entendo seu ponto, mas também entendo o da Mayu-chan. Isso não é justo com ela. Você deveria sentar e conversar com sua esposa, não se esconder na minha casa.

Ele parecia não querer ceder assim tão fácil, então decidi usar a carta que sempre uso nesses tipos de situação.

— Você a ama, certo?

Kagami-kun me encarou franzindo o cenho, como se disse "isso foi um golpe baixo". Sorri levemente, tentando esconder que a minha própria fala me machucou um pouco.

— Amo… —Ele finalmente pareceu ceder, suspirando pesadamente — Certo, certo… Você tem razão. Eu vou conversar com ela, prometo.

Depois disso, o jogo finalmente se iniciou e nos focamos nisso. Durante todo o primeiro tempo e por boa parte do segundo tempo, a partida estava acirrada: com alguns pontos de diferença, os NeoPhoenix estavam na frente, sempre roubando a bola de maneiras absurdas e mantendo um ataque forte e eficaz. Vez ou outra, eu observava as reações do meu amigo pelo canto do olho: suas expressões não paravam de mudar, sua perna tremia com a ansiedade, a cada bola roubada durante um passe dos Alvark, ele não conseguia impedir que um grunhido escapasse… Era uma visão interessantíssima. Tentei não deixar que uma risadinha escapasse, aquilo poderia irritá-lo.

Chegando ao final do segundo tempo, um milagre aconteceu: Os Alvark não só conseguiram virar, como se distanciaram pelo menos em 10 pontos de diferença. Isso já era uma ótima vantagem para o próximo round. Acho que se Kagami-kun estivesse em sua casa, ele talvez jogasse uma cadeira pela janela, tamanho era seu entusiasmo.

Com o segundo tempo encerrado, veio o intervalo de vinte minutos antes do retorno da partida. Meu amigo não conseguia conter sua emoção ao narrar lances do jogo que acabamos de ver. Tenho certeza que, assim que ele chegasse em casa, ele reveria cada passe em câmera lenta. Aos poucos, ele foi se acalmando, bebericando um pouco da cerveja e beliscando aqui e ali o que ele preparou.

— Ei, Kuroko.

Percebi que agora ele me encarava, seus olhos turvos. Eu já tinha uma ideia do que ele estava pensando, então só me preparei para o que estava por vir.

— Você estava revendo o álbum de fotografias… por causa daquele cara? — A mera menção o deixava visivelmente perturbado.

— Não se preocupe com isso, Kagami-kun. — Desconversei.

— Você não precisa se preocupar com ele, sabe? Ele não ousaria mais chegar perto de você. — O tom dele era sério e grave. Seus olhos me atravessavam como adegas, mas eram ao mesmo tempo gentis e seguros de si.

— Eu realmente estou bem, Kagami-kun. Eu apenas estava olhando fotos antigas, tendo um momento de nostalgia. — Procurei tranquilizá-lo o máximo possível. Ele não pareceu acreditar muito em mim, mas não voltou a tocar no assunto pelo resto da noite.

Me sinto um pouco mal por mentir para ele. Não que eu realmente estivesse mal, olhando fotos do meu antigo agressor, remoendo meu passado. Não, eu não estou me referindo a isso. Estou me referindo ao "momento de nostalgia". Não era exatamente isso que estava acontecendo. Era mais… Um momento de me recordar de algumas coisas importantes, mas principalmente como o meu maior objeto de desejo, meu melhor amigo, nunca seria meu para amar. Rever aquele álbum era um lembrete que meu período de ignorância em relação aos meus sentimentos por ele foi o último realmente feliz que tive ao lado dele. Agora eu devo ser o melhor amigo, que dá suporte à felicidade dele com outra pessoa, mesmo que me corroa por dentro.

E é assim que sempre vai ser.


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Notas finais do capítulo

Espero que tenham gostado do início dessa história. Assim que terminei esse prólogo, percebi o quão longa ela poderia ser, então me comprometo a (tentar) resumir mais os capítulos, haha. Se quer me mandar críticas (construtivas ou não), comentários, dúvidas, erros de português que eu cometi, mensagens inspiradoras, recadinhos amorosos, dicas de beleza, me mandar pro inferno, falar que está com vontade de chorar, de cantar uma bela canção, ou simplesmente falar que gostou ou detestou a história, a minha caixinha de comentários estará sempre a disposição de você. Aguardo você no próximo capítulo!
Com carinho, -MC



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