Dress escrita por CarolFonseca


Capítulo 1
Capítulo Único


Notas iniciais do capítulo

Tive essa ideia num surto de inspiração, então espero que gostem!



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     Clarke respirou fundo, contando mentalmente até dez, enquanto estralava suas mãos em um tique nervoso que tinha desde pequena. O pequeno toc toc que seus saltos faziam no chão não eram ouvidos pela garota devido sua própria ansiedade, e suas unhas, outrora lindas e arrumadas, agora já se encontravam roídas e com um esmalte preto já descascado.


     Para todos que olhassem, era bem mais que óbvio que aquela jovem mulher não estava se sentindo confortável em suas vestes. O vestido a apertava, principalmente no busto, o cabelo alisado parecia estar mais rebelde que o normal e os sapatos de salto — botas, para ser mais exata — começavam a formar pequenos calos em seus pés.


     Se fosse por qualquer outra pessoa, Clarke já teria desistido de fazer aquilo antes mesmo de sua mãe marcar um horário de salão, mas infelizmente, não era. Aquilo era um pedido de Lexa, uma de suas melhores amigas e seu — não tão — recente interesse amoroso. Era seu último pedido, como Lexa sempre gostava de falar, por mais que Clarke nunca achasse graça ou risse da brincadeira da amiga.


     Pra falar a verdade, Clarke e Lexa se conheciam desde sempre, tanto que nunca se lembravam exatamente como tinham se conhecido. Fora na escolinha do bairro que as duas frequentavam? Ou então naquele dia em que Lexa acabou escorregando do parquinho e teve que receber cuidados médicos da Sra. Griffin? Era impressionante como as memórias se embaralhavam na mente das duas quando as mesmas tentavam fazer uma linha cronológica de suas vidas. O importante era que elas se conheciam, se amavam e apoiavam-se desde sempre, não importando os bons ou maus momentos. Principalmente os maus momentos.


     Lexa descobriu que tinha câncer aos treze. Aos quatorze, Clarke finalmente descobriu seu "pequeno segredo" depois de ver sua amiga vomitar todo seu almoço no vaso da escola, logo após escutar uma conversa muito suspeita entre sua mãe a Sra. Debnam-Carey. Não é preciso dizer que a garota ficou devastada. Tudo que veio em sua mente foi a imagem do seu próprio pai na cama de um hospital enquanto respirava com a ajuda de aparelhos, falando que Clarke seria sempre sua princesinha, dias antes de falecer. Então a garota fugiu. Não queria viver aquela realidade de novo, não queria perder novamente alguém que amava. Porque Clarke sabia, mesmo aos 14 anos, que amava Lexa, é que coisa nenhuma mudaria aquele sentimento. Então, quando uma semana depois Clarke bateu na porta da Sra. Debnam-Carey pronta para fazer as pazes, encontrou uma Lexa radiante de felicidade que lhe contou que com pulinhos de alegria que tinha ganhado seu primeiro beijo.


     Clarke ficou triste, isso era óbvio. Mas mais que seu primeiro amor, Lexa era sua melhor amiga, e se ela estava feliz mesmo com tudo o que estava acontecendo em sua vida, Clarke estaria feliz por ela também. E então a vida seguiu.


     Um ano se passou, e sua escola recebeu um intercambista australiano. Pele clara, olhos azuis e cabelo na altura do pescoço, Finn era a personificação do próprio deus Apolo, arrancando suspiros por onde passava. O garoto também parecia conhecer a sua fama, não medindo esforços pra conquistar Clarke, mesmo que ela ainda só tivesse olhares para uma garota. Ela sempre iria ter olhos para uma só garota. Mas Lexa estava feliz, seu primeiro beijo havia se tornado também seu primeiro namorado, e o primeiro aniversário de namoro dos dois estava cada vez mais próximo. Então Clarke aceitou as investidas do garoto, tendo seu primeiro beijo com ele. Ela não sentiu os fogos de artifício ou as borboletas no estômago que os seus livros de romance descreviam, porém só deu de ombros e aceitou que, talvez, só talvez, ela não prestasse para aquele negócio de amar.


     O tempo passou, a situação de Lexa começou a piorar e Finn — o único apoio que ainda lhe mantinha firme  — foi embora. E mesmo nunca tendo criado sentimentos românticos por ele, Clarke acabou o considerando um fiel amigo. Por isso não teve vergonha de chorar no colo de Lexa ao descobrir que o ex tinha deixado uma namorada em seu país natal e que Clarke fora somente uma diversão estrangeira para ele. Então ela chorou. E chorou. E chorou mais um pouco, por tudo que estava sentindo. Por Finn, por Lexa e principalmente por si mesma. E Lexa a consolou com o coração nas mãos, não entendendo o porquê de o aperto em seu peito crescer cada vez mais com a situação. Horas depois, com uma Clarke já adormecida em seu colo, a garota já um pouco mais pálida pela doença escreveu um breve e explicativo texto explicando quem era e sobre a situação em que sua amiga tinha vivido, mandando a mensagem diretamente para a caixa do correio eletrônico de Raven Rayes. Clarke nunca soube disso.

     Aos 16, com a doença se agravando lentamente pelo corpo de sua melhor amiga, foi a vez de Clarke devolver o favor prestado um ano antes, quando o namorado de Lexa simplesmente falou que não poderia aguentar a pressão e pulou fora do barco, se mudando de cidade dois dias depois. Aproveitando o final das férias e a recente fossa, as garotas maratonaram sem parar filmes tristes e melosos sendo sempre acompanhadas com um grande balde de pipoca e refrigerantes, revezando a festa do pijama entre a casa das duas, já que as mesmas moravam a poucos metros de distância e não queriam dar tanto trabalho aos pais. Em um desses revezamentos, Lexa resolveu fazer uma surpresa para Clarke, mas o que encontrou foi sua amiga nua da cintura pra cima enquanto trocava de roupa depois de um relaxante banho. Mesmo tendo sentido uma sensação estranha Clarke nunca soube que estava sendo observada, assim como Lexa nunca admitiu em voz alta que sua atração pela amiga vinha ganhando cada vez mais força.

     Porém, foi aos 17 anos que tudo desmoronou. Era o aniversário de Lexa, e tudo estava devidamente programado. Clarke havia organizado uma festa surpresa para a amiga, e ficou encarregada de distrair a mesma a levando ao cinema enquanto as duas famílias se uniam para organizarem a festa. Porém a festa nunca aconteceu. Naquele mesmo dia Lexa teve que ser internada no hospital com uma melhor amiga em prantos, e Clarke recebeu a pior notícia de sua vida: Lexa tinha somente um ano de vida. Talvez dois, se elas tivessem sorte.

     E sendo assim, Clarke fugiu. De novo. E continuou fugindo, até pouco tempo atrás. Não de sua amiga, óbvio, ela não seria estúpida nem burra o suficiente de abandonar Lexa depois de tudo que elas passaram juntas. Não. Clarke fugiu de seus sentimentos. Por quase um ano, Clarke tentou se enganar falando para si mesma que Lexa não estava flertando pra valer com ela, que a mesma só estava entediada ou brincando para deixar a tensão das quimioterapias passarem. Mas Lexa via aquilo como uma última chance. Uma última chance de realmente seguir o seu coração, de descobrir que aquele aperto em seu peito era realmente uma paixão que vinha nutrindo e escondendo a anos de sua amiga. Por isso, com o final do ano e a formatura cada vez mais perto Lexa não poupou esforços em pedir a companhia de sua amiga e recente paixão no baile que teriam, usando como desculpa aquele ser o seu "último desejo".

     Ela só não pensou que Clarke fosse aceitar. E lhe entregar um corsage. E a elogiar. E abrir a porta do carro para ela entrar, sair, e ser a perfeita acompanhante que fazia de tudo para agradar seu par. E também não pensou que Clarke fosse querer tentar.

     Pois bem, ali, na pista de dança, Lexa nunca imaginou que iria receber a melhor proposta de sua vida.

    — Lexa... — Clarke estava tremendo. — Nós... nós nos conhecemos desde sempre. E eu gosto muito, muito mesmo de você. Você é a minha melhor amiga, e sempre esteve lá por mim, mesmo que as vezes você ache que não. Você conseguiu me ver através da fachada de garota perfeita que as pessoas pintam de mim. Você me entende, mesmo quando eu não quero que você entenda-

— Clarke-

— E eu sei que isso tá horrível, mas toda vez que você fala meu nome... tudo para, e eu me arrepio por inteira. Lex. Lexa. Eu não quero ser só sua melhor amiga. Eu quero mais. Eu quero você. Pra mim. Por inteiro.

— Clarke, o meu tempo—

— É tudo que eu preciso Lex. Acredite em mim. Por favor. — Clarke estava praticamente implorando.

— Eu... Eu não quero que você se machuque Clarke. Isso já é difícil o suficiente pra mim, acredite.

— Eu já estou machucada Lex. Nós duas estamos. Eu só preciso saber se você vai ser o meu band-aid, porque eu te garanto que eu posso ser o seu.

— Clarke—

Com um passo, Clarke colou seus lábios aos de Lexa. E aquela sensação foi indescritível. Seus lábios pareciam ser feitos um para o outro. O beijo era lento, doce, suave e molhado - devido as pequenas lágrimas que escapavam dos olhos de ambas. E enquanto as garotas se beijavam Lexa decidiu que queria que o seu pra sempre fosse com Clarke, mesmo que o seu pra sempre não durasse muito tempo.

***

Naquela mesma noite Clarke e Lexa tiveram sua primeira vez. Entre risadas, beijos roubados e pequenas lágrimas, Clarke percebeu que o vestido de Lexa parecia ter sido feito para que ela pudesse retira-lo sem nenhuma dificuldade. E Lexa notou que Clarke era sua dose de morfina diária, conseguindo tirar sua dor com um simples toque e entorpece-la com o mais suave encostar de lábios.

***

Não muitos dias depois Lexa foi internada em estado terminal. Seu cabelo já escasso caiu de vez, seus lábios antes rosados empalideceram juntamente com o resto de seu corpo, e mesmo com Clarke sussurrando em seu ouvido que as duas iriam superar aquilo juntas, Lexa já sabia a verdade. E Clarke também.

Então quando o monitor cardíaco parou de emitir os batimentos de Lexa na madrugada seguinte, Clarke apenas chorou em silêncio enquanto era abraçada pela mãe.

 

 

Clarke,

     Se você está lendo essa carta, isso significa que eu parti. Mas só porque eu não estou aí não significa que você precisa ficar do jeito que você está agora. Eu te conheço Clarke, e acredite e mim, por mais que me doa dizer isso, você não pode continuar se afundando na sua dor cada vez que a vida te der um golpe amor. Isso é tóxico, e eu tenho certeza que como uma futura médica você mais do que ninguém sabe disso. Também não estou pedindo para você sair dançando e cantando por aí, só quero que você viva o luto que sente agora, e somente agora Clarke, porque tem um mundo maravilhoso te esperando do lado de fora da sua janela querida. Então quero que você me faça uma coisa. Um último pedido.

     Viva sua vida Clarke. Viva a sua vida o mais intensamente possível. Pegue a sua bolsa de estudos que eu sei que você ganhou e vá para a faculdade de Boston perseguir o seu sonho. Conheça novas pessoas, faça novos amigos, vá pra festas, fique bêbada por mim e por você mesma e conheça uma pessoa garoto ou garota, não importa que perceba o quão maravilhosa você é. E então fiquei com ela. E siga sua vida.

     Quando eu era pequena sonhava com um lindo príncipe sentado em um cavalo branco vindo me buscar. Agora eu percebo que a princesa ideal pra mim estava do meu lado o tempo todo. Você foi o melhor final que eu pude pensar em ter Clarke.

Com amor,

Da sempre sua,

Lexa.

 

P.S.: Se sentir minha falta, é só colocar a mão no seu coração. Eu nunca vou sair daí. Se mesmo assim a saudade persistir, olhe para o céu e procure a estrela mais brilhante. Vou estar te observando sempre amor.


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Notas finais do capítulo

Confesso que chorei com esse final, mais fazer o quê não é? Pode ser até ~ muito ~ triste, mas quis retratar algo mais real e sinto que esse final era exatamente um recomeço que a Clarke precisava.

Quem sabe não vem uma continuação por ai?



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