Voz Letal escrita por Ruby


Capítulo 1
Capítulo único




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[...]

No dia seguinte, decidimos ver alguns filmes, como havíamos prometido a Padma, mas, ela não parecia conseguir prestar muita atenção neles.
Concentradas, ou não, elas estavam estranhas. Não conseguiam olhar nos meus olhos. Sempre desviavam o olhar para falar comigo. Até que não aguentei mais, pausei o filme e comecei a falar:
— Ok. O que está acontecendo aqui? - Elas ficaram caladas. - Vocês não vão me responder? - 
— Acho que é hora de contar pra ela - Miaka disse - Ela precisa saber a história toda.
— Que história? - Perguntei imaginando o que elas estariam escondendo de mim
— Eu não contei nada - Miaka jurou, sentando num pufe do outro lado da sala. - Elas descobriram sozinha.
Franzi a testa.
— Descobriram o quê?
Elizabeth enfiou a mão no bolso da calça e sacou uma folha de papel.
— Ele.
Gelei ao ver o desenho dos olhos de Akinli.
Eu estava tão nevosa que me esqueci de perguntar com ela tinha conseguido aquilo. Na verdade, eu estava tão nervosa que não conseguia dizer nada.
— Você fez esse desenho. Disse que esteve numa cidade pequena, Port Clyde. Tudo o que sempre quis foi se apaixonar, e voltou numa depressão tão profunda que logo saquei tudo. Miaka só teve que confirmar.
Eu estava pasma. Completamente sem reação.
— Quando estávamos em Nova York, você chorava enquanto dormia e repetia a mesma palavra o tempo todo: "Akinli" - Elizabeth disse, observando o desenho. - Primeiro pensei que fosse uma palavra inventada. Então pensei que fosse o nome de uma cidade ou de um prédio... Não percebi que se tratava de uma pessoa até você fazer isto. - Ela apontou para o papel gasto de tanto ser dobrado e desdobrado.
— Quando Elizabeth veio me perguntar, tive que contar a verdade, e decidimos encontrar o garoto. Você tinha dito o nome da cidade. Fomos para lá procurando um garoto chamado Akinli parecido com esse desenho - Miaka explicou com um sorriso triste. - A cidade era pequena. Não foi difícil.
— Vocês o viram de verdade?
Ambas confirmaram. Pensei em todas aquelas viagens, nas histórias que inventaram para saírem sem que eu soubesse.
— Como ele está? - perguntei, incapaz de conter a curiosidade. - Está bem? Voltou para a faculdade? Ainda mora com Ben e Julie? Está feliz? 
Não consegui conter as perguntas. Eu precisava muito saber.
Elizabeth engoliu em seco.
— Esse é o problema, Kahlen. A gente acha que ele está morrendo.
Comecei a me sentir tonta. Lágrimas começaram a surgir nos meus olhos e eu sabia que não conseguira contê-las.
— Como vocês sabem que ele está morrendo?  Perguntei aos prantos. — Não faz sentido. Ele era saudável. É câncer?
Miaka fez que não com a cabeça.
— Fizeram exames. Consideraram um monte de coisas.
— Mas como vocês sabem disso?
— Seguimos Akinli até o médico e ficamos na sala de espera: ouvimos o primo dar as notícias a Julie... Aliás acho que ela sente sua falta.
— Sério?
— Fingi ser surda, claro, e não esperava que ela fosse falar nada. Mas falou sozinha como eu parecia com uma garota linda que ela conhecia e não falava. Comentou como foi bom ter outra garota em casa e como tinha medo de você ter se afogado.
Soltei um suspiro.
— Então é isso que eles acham que aconteceu comigo. Faz sentido.
— Mas a questão é a seguinte, Kahlen: Os sintomas dele são graves. Ele está fraco e pálido. está de cadeira de rodas.
Levei a mão à boca e comecei a chorar novamente.
— Está cheio de hematomas, porque qualquer coisa o machuca: dormir, sentar, qualquer movimento. Os médicos não sabem o que fazer.
Eu estava chocada. Comecei a me encolher no sofé e chorar, muito. Minhas irmãs me abraçaram, mas, num impulso, me soltei desse abraço e saí correndo até a Água.
— KAHLEN! - Ouvi alguma de minhas irmãs gritando, mas ignorei.
Precisava visitá-lo. Nem que fosse a última vez. Mesmo que fosse olhando apenas pelo vidro da porta ou da janela, precisava ver seu rosto.
Assim que entrei no mar senti a preocupação dEla comigo.
 Aconteceu algo? Por que você está chorando?
— Me leve lá — eu disse entre soluços - Me leve até ele. Por favor, me leve até Akinli.
A Água me puxou levemente até o fundo. 
— Fique calma— Ela disse serenamente 
— Me leve até ele por favor! - Eu supliquei - Ele está doente. Preciso vê-lo— 
A Água parecia esconder algo
— O que você está escondendo? Tem haver com a doença de Akinli não é?
Ela finalmente cedeu e a verdade apareceu.
— Você o envenenou Kahlen. A única coisa capaz de curá-lo é a sua voz. Mas não a sua voz de sereia. Sua voz de humana! 
Eu comecei a chorar e minhas lágrimas se misturavam com o mar.
 É impossível! Não sou humana.
— Se ele não tivesse ouvido sua voz, estaria bem.
A culpa tomou conta de mim. EU estava matando Akinli, EU o envenenei.
Não conseguia me mexer só chorar encolhida até a Água me levar até minhas irmãs.
" Você o matou Kahlen. Você é a assassina do amor da sua vida. E não há nada que você possa fazer." Esse pensamento me atormentava a cada segundo.
— E agora? - Ouvi Padma dizendo as outras na praia - Não há nada que possamos fazer?
— Não - Miaka respondeu com uma voz melancólica - A única maneira de salvar Akinli é a Kahlen virar humana. Coisa que não vai acontecer.
— Por que não?
— Porque somos da Água, Padma. Todas nós. Ela não deixaria Kahlen voltar a ser humana.
Todas olhamos para porta quando Elizabeth chegou. Ela estava com uma cara triste e engoliu em seco antes de falar.
— Não irei enrolar por pior que seja a notícia. - Ela disse. Nesse momento comecei a entrar em desespero. - Akinli. Ele... morreu -
Aquelas palavras ecoaram na minha cabeça inúmeras vezes. Eu não queria acreditar, mas tinha. Não queria que fosse real, mas era. Não havia mais o que fazer.

Mas como? - Padma perguntou - Como ele ficou tão mal de repente?
— Os médicos não sabem nem que doença o atingiu - Elizabeth respondeu olhando para baixo.
— Eu - Disse começando um choro desesperado
— Você o quê, Kahlen? - Miaka perguntou nervosa
— Eu... Eu o atingi - Respondi entre lágrimas e soluços. - Eu o ma...matei. Eu matei o Akinli.
Minhas irmãs me olharam com caras extremamente confusas
— O que você está falando Kahlen? - Miaka me perguntou mais nervosa ainda. - Impossível! Você estava obcecada nele.
— Foi um aci... Um aciden... - Não conseguia falar. Só chorar e soluçar.
— Se acalme, Kahlen - Miaka disse com uma voz tranquila - Respira. - Suspirei antes de começar a falar.
— Eu o beijei - Eu disse olhando para os lados. Evitando olhar nos olhos de minhas irmãs - E aí e...e...eu - Mais lágrimas saiam de meu rosto.
"Respira, Kahlen" - Pensei
— Eu suspirei. Ele ouviu minha voz e a canção subiu a sua cabeça. - Parei para respirar um pouco e secar meu rosto com a manga da minha camisa. - Ele estava entrando no mar, então supliquei a Ela que o deixasse viver.
— Kahlen?! - Minha irmã disse reprovando minha atitude com o olhar.
— Eu sei, Miaka, eu sei. Mas não ia deixá-lo morrer. Eu não podia. Mas acabou que ele morreu de um jeito ou de outro. - Eu disse ainda chorando muito. - A minha voz. Ela o envene... - Comecei a sentir tontura. - Envene... - Minha visão ficou turva e me senti tombando para o lado.
— Kahlen? - Padma disse - Kahlen! -
Eu ouvi bem baixo minhas irmãs falando: " Kahlen, Kahlen. Segura ela. Vamos levá-la."
Logo a voz de minhas irmãs foi substituída pela voz dEla
— Kahlen. Acorde. Kahlen.
Acordei dentro d' Água. E, surpreendentemente, ela me abraçava carinhosamente, como uma mãe.
No calor do momento assombrada por tristeza eu tomei provavelmente a decisão mais importante da minha vida.
— Sou sua.
— Não compreendo.
— Não quero voltar a ser humana. Quero ser sua para sempre. Só amarei a você e minhas irmãs, e te juro fidelidade eterna.
— Kahlen, não posso fazer isso
— Claro que pode. Me castigue por mais tempo. Para sempre.
— É isso que quer? Abdicar da vida humana por conta de um garoto?
— Não mereço e não quero mais ser humana. Sou um monstro.
— Você não é um monstro.
— NÃO SOU? - Perguntei gritando com Ela - EU O MATEI! MATEI O AMOR DA MINHA VIDA!
— Kahlen...
— Faça por favor! Eu lhe imploro. Eu lhe suplico.
Ela soltou algo parecido com um suspiro, mas não ousei falar mais nada.
Estava me virando para ir embora e vi que minhas irmãs haviam me seguido e ouvido tudo.
— Kahlen, Nã...
— Não fale nada, Elizabeth. Por favor! Eu preciso ficar um tempo sozinha.
Saí correndo em rumo à lugar nenhum e só parei quando eu tropecei e caí no chão. Acabei ficando um tempo ali. Imóvel. Apenas chorando e sussurrando coisas que nem eu mesma entendia. Naquele instante eu queria morrer. Não apenas porque Akinli não estava mais entre nós. Queria morrer porque me sentia uma assassina. Mas não poderia morrer. Nunca mais na verdade. Deve ter se passado muitas horas, pois quando finalmente tive algum resquício de força para me levantar, já era noite.


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