Cada dia da minha vida escrita por Dani Tsubasa


Capítulo 13
Capítulo 13 - Perto da verdade




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Capítulo 13 – Perto da verdade

Amália estava colhendo ervas com a mandingueira. A mulher não estava à vista no momento, mas a plebeia sabia que ela estava por perto. Andou para outro lugar e parou ao ouvir o som de passos. Convivia com a mulher mais velha há pouco tempo, mas sabia que aqueles passos não eram dela, deviam ser de alguém bem maior e mais pesado. A presença de viajantes na floresta era constante, podia ser apenas isso. Mas a ruiva correu para trás de uma árvore e puxou o capuz sobre a cabeça quando identificou Virgílio de longe.

Tinham se afastado da casa essa manhã. Caminhar vinha lhe fazendo bem, ainda mais agora que os enjoos e tonturas eram raros. Se ele a encontrasse... Se descobrisse que estava grávida... Amália não tinha realmente ideia do que Virgílio podia ser capaz, mas tinha medo. O comerciante já lhe dera muitas provas de que não tinha caráter, querendo colocar até ela mesma na rua quando tentou lhes tomar a casa para se vingar de Afonso. Descobrir que ela estava esperando um bebê de Afonso poderia deixá-lo louco. Se tinha algumas razões para temer enquanto estava sem memória, agora lembrava de muitas mais. O que Virgílio estaria fazendo aqui? Atrás dela talvez? Estava longe do lugar de onde tinha fugido dos guardas, não tinha ideia do que acontecera a eles ou porque não tinham reagido quando ela fugiu, mas teria Virgílio encontrado o local e seguido algum rastro que ela deixou sem perceber?

Seus ouvidos ficaram atentos quando ouviu um cavalo correr em algum lugar por perto. Viu Virgílio andar para longe da direção da casa, ficou aliviada, mesmo assim permaneceu escondida até achar seguro seguir.

******

Cássio adentrou mais profundamente a floresta. Tinha acabado de passar pela estrada que vinha de Artena. Encontrou marcas de rodas no chão, possivelmente de uma carruagem, se de Artena ou Montemor, se fugindo ou não, ele não sabia. Havia cinzas de uma fogueira há muito tempo apagada espalhadas pelo chão. Alguém do castelo de um dos dois reinos devia ter montado acampamento ali, talvez enquanto fugia da guerra ou voltava para Montemor.

Sabia que uma mulher vivia na floresta. Ela descendia de povos antigos e era uma boa pessoa, embora alguns a temessem. Ela nunca aparecia em reino algum, apenas caminhava pela floresta, e apesar de provavelmente ela saber sobre a guerra, Cássio não acreditava que pudesse conseguir qualquer informação com ela. O conselheiro parou o cavalo por um momento, pensando se valeria a pena tentar. Estava perto de onde diziam ser a casa dela. Mas outra coisa chamou sua atenção, passos. Passos correndo, e distantes.

Cavalgou por mais alguns segundos até o som ficar mais alto e viu duas pessoas se movendo ao longe quando as árvores se tornaram mais distantes. Se seus olhos não o estavam enganando, o que estava mais longe podia ser Virgílio, o homem de quem Afonso e Amália tinham decidido esconder o bebê quando ela perdeu a memória. A outra pessoa estava encapuzada e aparentemente tentando se esconder atrás das árvores, parecia ser uma mulher.

Cássio se aproximou um pouco mais. Virgílio desapareceu na direção oposta a que levaria à casa da mandingueira. Sendo de Artena talvez ele sequer soubesse da existência dela, que era mais conhecida pelas pessoas de Montemor. A mulher olhou em volta, sua postura relaxou um pouco ao notar a ausência de Virgílio, mas não saiu de onde estava. Talvez soubesse de algo relevante. E ele queria saber quem mais estava vivendo ali além da mandingueira. O corpo todo coberto pela capa dificultava identificar quem quer que fosse. Rodolfo, Orlando e Petrônio juravam por suas vidas que uma bruxa vivia na floresta, mas pelo que Cássio tinha ouvido dos três, ela tentaria atrair Virgílio para ela e não fugir dele.

— Ei! – Chamou ao se aproximar com o cavalo, mas a pessoa o ignorou e caminhou depressa entre as árvores – Ei!!

A pessoa correu e Cássio tentou segui-la, mas logo se viu sozinho.

******

— Você tem certeza disso, Cássio?!

— Eu tenho certeza do que vi. Não sei lhe dizer quem poderia ser, mas não acho que aquele comportamento seria de uma bruxa, se ela realmente existir. Tem alguma outra pessoa vivendo na floresta além da mandingueira. Pode ser alguém que fugiu da guerra e sequer sabe que ela acabou. Ou alguém de algum dos reinos que sofreram conflitos antes da guerra entre Artena e Montemor. Eu precisei voltar antes que percebessem minha falta prolongada no castelo, e eu perdi a pessoa de vista de qualquer forma, mas acho que vale a pena investigar.

— De que cor era a capa?

— Eu não tenho certeza, estava longe... Parecia um tom escuro de vermelho, mas podia ser bordô, roxo, marrom.

Mesmo com a incerteza do amigo, Afonso sentiu o coração acelerar um pouco com a esperança que sentiu.

— Você viu alguma outra evidência?

— Marcas de rodas no chão, fogueiras apagadas há semanas... Vi marcas de carruagens, pessoas dos castelos também passaram por lá durante a guerra, tanto indo quanto voltando. Não vejo como ligar isso diretamente ao desaparecimento de uma pessoa específica. Você vai contar aos pais dela?

— Ainda não. Não quero lhes dar esperanças que não sei se poderão manter.

Cássio assentiu.

— Eu tive um sonho, Cássio. Ela estava perdida na floresta, sozinha, aterrorizada. Havia lobos. E ela estava fugindo de alguma coisa, ou de alguém. Eu consegui chegar até ela depois de muito esforço, mas acordei antes dela falar comigo. Eu sei que foi só um sonho, mas não sai da minha cabeça.

Os dois olharam para o campo que levava à floresta. Cássio pôs a mão no ombro do amigo em apoio.

— Eu não garanto poder ir com você, mas espero que descubra mais do que eu, e que sejam boas descobertas.

******

— Ele não virá. Quase chegou aqui, mas já está longe. Você deve se acalmar. O bebê ainda é muito pequeno, e é uma criança muito forte, mas sente tudo que você sente.

Amália respirou fundo. A mandingueira não se permitia ter grande aproximação com ninguém, mas cuidava bem dela.

— A senhora tem razão – a ruiva falou para si mesma, dando um gole no chá que a mandingueira havia feito – Por quanto tempo mais isso vai durar? Meu filho devia estar crescendo ao lado do pai e do restante de nossa família. Precisam saber que estamos vivos.

— A menina deve ter um pouco mais de paciência e se alegrar. Em breve alguém virá até você.

— A senhora disse que alguém estava me procurando e que isso não era bom.

— O futuro não é uma linha reta, Amália, e tempos difíceis ainda poderão vir, mas será mais seguro lá fora em breve do que quando você chegou.

— Quem virá até mim?

— Isso só o tempo poderá dizer.

******

— Todo esse tempo vasculhando a floresta e nada? – Dona Matilda perguntou baixinho a Afonso.

Era muito cedo e só ele e Tiago estavam na taverna. Às vezes faziam isso para conversar sobre as buscas de Amália sem ninguém por perto. Dona Matilda era de confiança, Afonso a conhecia desde criança e sabia disso.

— Também procuramos em outros reinos. Cássio sempre traz notícias quando Rodolfo o manda para fora de Montemor, mas até agora não conseguimos nada – Afonso explicou.

— De qualquer forma, a floresta é muito grande. Procuramos perto das trilhas que os viajantes usam de Artena até aqui. Se minha irmã estiver se escondendo não vai ficar nesses lugares.

— Vocês sabem sobre a velha mulher que vive lá, a mandingueira. É uma boa mulher ainda que alguns ignorantes dessa cidade a temam. Dizem que ela sabe sobre coisas que ninguém mais sabe. Já pensaram em procurá-la?

— Cássio disse que adentrou mais a floresta recentemente, perto do caminho que supostamente leva à casa dela. Nenhum de nós foi lá alguma vez, é só uma suposição. Ele viu duas pessoas, acha que uma delas era uma mulher, mas não conseguiu identificar quem possa ser.

— Bem... O seu irmão insiste pela vida dele que há uma bruxa vivendo na floresta.

— Cássio disse que ela não se comportou como essa suposta bruxa faria, segundo Rodolfo.

— Como assim?

— Uma das pessoas que Cássio viu foi Virgílio – Tiago lhe disse.

— Virgílio... O comerciante de Artena, que tem a loja de tecidos...

— Sim – Afonso confirmou – Ele é obcecado por Amália, especialmente desde que nos conhecemos e ela o deixou. Descobrimos que ele não era só ciumento, mas violento, e até tentou nos tomar a casa em Artena por vingança.

— Que mau caráter!

— Ele também ficou desesperado quando Amália sumiu em Artena. Achamos que ele podia ser o responsável, mas ficou tão chocado quanto nós quando ela foi dada como morta. Deve estar procurando em todos os cantos da floresta também.

— E se minha irmã estiver viva, temos que achar antes dele, não sabemos do que Virgílio pode ser capaz.

— Mas eu ouvi histórias de que Amália perdeu a memória e estava outra vez com esse Virgílio, Afonso... Achei não passasse de boatos maldosos das pessoas.

— Não. Ela sofreu um acidente e perdeu a memória pouco antes do torneio entre Artena e Montemor. De alguma forma só as memórias mais recentes dela se apagaram. Ela esqueceu de mim, do nosso casamento, e...

— E o que?

— Afonso...

— Tudo bem, Tiago. Conheço dona Matilda desde criança, podemos confiar nossas vidas a ela.

— O que de mais grave pode ter acontecido? Ela se feriu no acidente?

— Não – Afonso continuou – Por muita sorte, Diana, a melhor amiga de Amália, estava lá e a segurou quando ela caiu do telhado. Acabou se machucando um pouco, mas as duas ficaram bem. Amália desmaiou, delirou durante a noite e acordou sem memória no dia seguinte. Esqueceu de nossa vida juntos, e também de nosso filho.

— Levi.

— Não. Eu adotei Levi quando ele perdeu a mãe durante a guerra. Eu e Amália já estávamos de acordo com isso antes. Samara temia que algo lhe acontecesse e nos pediu que cuidássemos dele como se fosse nosso. Mesmo sem memória, Amália concordou. Ela sumiu antes de saber que perdemos Samara. Ela e Diana estavam na feira quando a guerra começou e foram separadas no tumulto da fuga. Desde então não a vimos mais. Só encontrei o colar dela, quebrado e manchado de sangue.

— Afonso, eu sinto muito... Mas se não é Levi...

— É isso o que mais tem me consumido, além dela ter sumido ainda com a amnésia. Ela estava grávida de três meses.

Dona Matilda ficou em tamanho choque que não conseguiu proferir qualquer palavra.

— Quando ela acordou ficou um tanto transtornada ao saber que estava esperando um filho de alguém de quem nem se lembrava – Tiago explicou – Mas depois aceitou isso. Ela ama o bebê.

— Nós decidimos manter a gravidez em segredo até onde fosse possível por medo do que Virgílio pudesse fazer. Foi a própria Amália que nos pediu isso. Ela disse que teve um mau pressentimento quando Virgílio a contestou, e mentiu.

— Mas grávida e sozinha por aí... Afonso...

— Dona Matilda, eu sei. Eu sei que parece absurdo termos alguma esperança. Mas Amália é muito mais forte do que pode parecer à primeira vista.

******

— Brice! Eu sei que você tem algo a ver com o que aconteceu a Amália. Ninguém perde a memória só de duas pessoas assim do nada.

— E se eu tivesse? De que isso ajudaria agora?

— Eu não sei. Mas Amália perder a memória dessa maneira estranha e justamente ela ser a única da família a sumir? Que ameaça ela representa pra você?

— Se você fosse mais observadora, Selena, saberia que nenhuma. Eu não tenho qualquer coisa a ver com o sumiço de Amália. Além do mais, é só uma mulher comum, só mais um deles, não podemos, e nem devemos nos importar com ela.

— E os guardas achados mortos? A descrição dada no castelo foi igualzinha ao que você faz.

— Eu posso ter encontrado alguns guardas montando acampamento e me aproveitado disso sim. Eles tinham uma carruagem, mas estava vazia quando cheguei. Não consigo saber se as pessoas estão vivas ou mortas, Selena. Esse não é meu poder. Se ela foi mesmo raptada como você supõe, eu posso ter salvado a vida dela se os raptores eram aqueles homens. Mas como eu disse, não havia mais ninguém lá.

— Esses guardas... Eram de Artena ou Montemor?

— Não prestei atenção nisso.

Selena foi embora perturbada. Os corpos e a carruagem haviam desaparecido, quem quer que fosse que tinha algo a ver com aquilo devia ter limpado o local do crime. E de certa forma Brice podia estar falando a verdade, coisa que dificilmente se podia ter certeza, mas nada garantia que Amália estivesse com aqueles guardas.


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