Uma carta, Ravena. escrita por Carenzinha


Capítulo 1
Talvez você nem leia.




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/769025/chapter/1

Infelizmente os Jovens Titãs acabaram. Motivos? Vários, e que você já sabe quais foram. Mas a única coisa realmente importante nisso tudo é que todos os cinco membros tinham uma certa culpa, principalmente eu, já que por algum motivo eu sempre levarei a maior parte da culpa.

Principalmente para você.

                “Como você me faz lembrar”

Eu nunca te entendi direto. Você sempre foi uma caixa de mistério, sarcasmo e grosseria. Sempre parecia estar em um dia ruim e não fazia o mínimo de esforço para demonstrar o menor sorriso possível quando tentamos te ajudar.

Mas, não se culpe por isso, eu sei que a culpa é minha.

Era como se apenas você tivesse problemas, como se nada mais importasse sem ser você e as dificuldades que você mesma enfrentava. Muitas vezes chegava a parecer que seu ato de ficar isolada de todos fosse só mais uma desculpa para chamar a atenção do grupo. Mas eu não te culpava, nunca  culpe você, eu também sabia o que é implorar por uma atenção.

Você nunca me contou sobre seu passado, e, posso dizer com quase certeza que eu sempre fui a pessoa que você menos confiava em todo o grupo. Mas está tudo bem, eu sei que a culpa disso também é minha.

Eu nunca fiz o “seu tipo”, nunca consegui te conquistar. Você sempre foi tão quieta, sempre foi tão vidrada na sua leitura... e eu? Eu sempre gostei de videogames, correr por aí, bagunçar meu próprio quarto. Não me lembro nem de quando foi a ultima vez que peguei um livro nas mãos, e, se caso eu tiver pegado um livro, pode ter certeza que era um livro de piadas, aquelas piadas que você nunca gostou.

“Nunca tive sucesso como um sábio”

Mas por outro lado nós tínhamos uma amizade, do nosso jeito, mas tínhamos.

Você nunca me disse que eu podia contar com você, mas quero que você saiba que você podia contar comigo. Mesmo eu sabendo que minha pessoa seria a última que você procuraria para desabafar. Sei que você não tem culpa disso, afinal eu meio que te “forcei” a me evitar. Todas as vezes que me aproximava de você era para alguma piada, irritação ou para te forçar a comer um dos tofus que eu sempre amei. E você sempre detestou.

Eu consigo me lembrar de quando entrei em seu quarto sem permissão e te espionei algumas vezes. Sei que estava claro, mas eu gostaria de reforçar: eu não confiava em você, mas ao mesmo tempo você era a pessoa que eu confiaria um grande segredo. Um grande paradoxo talvez. Porém, por eu ser tão imaturo e você tão focada, acabei colocando em seus ombros o peso de me suportar. Por você parecer impenetrável resolvi tentar te penetrar, ir a fundo em seus sentimentos, descobrir o que essa garota ranzinza tanto escondia.

Mas, eu não pensei nisso direito, assim como eu nunca pensei em nada com clareza na vida. Fui tão impulsivo que não notei que estava invadindo seu espaço. Não notei que estava te atrapalhando.

“Pois viver comigo deve

ter quase te feito morrer”

Porém, gostaria de esclarecer: você também teve culpa.

Por mais que eu sempre gostei de me aparentar o extrovertido, eu nem sempre fui feliz. Eu nem sempre sou feliz. Tenho meus problemas e, se não fosse essas minhas piadas eu provavelmente me afundaria na depressão e desespero.

Mas, minhas piadas não surtiam o efeito desejado em você. Você surtava e eu ficava sem saber o que fazer perante à isso. Será que era complicado entender que eu estava dando meu máximo para tentar te ajudar? Era complicado (ainda é) para eu compreender que você queria ficar sozinha com seus problemas remoendo a sua mente.

Porém, era tão complicado você esboçar um sorriso, você reparar que eu estava me esforçando.

“Você não costuma dizer que sente muito”

Claro que era, e quem sou eu para te julgar?

Queria te fazer feliz, pois eu sabia que você era como eu nesse quesito. Era triste, preocupada.

A única diferença era que eu te invejava. Caramba, como eu te invejava.

Você era quieta, na sua, não precisava se apoiar em muletas de falsas risadas para fingir ser feliz. Diferente de mim que tentava provar para todos que a minha máscara era na verdade real.

E que por baixo da minha pele verde tinha sempre um sorriso estampado.       

Outro fato é que eu nem sempre quis ser o Mutano.

Eu nem sempre quis ter essa pele verde e esse poder todo. Sei que deveria ser grato por eles, já que eu estou vivo graças aos poderes. E, pensar que eu não gostaria de tê-los faz eu me sentir um baita ingrato.

Eu realmente não sei me expressar quanto a isso.

Às vezes eu apenas queria ser um garoto comum, com meus pais biológicos aqui. Você me entende, certo?

Ah, claro que não. Quero dizer, nem sei por que eu estou te contando essa parte da minha vidinha, a sua é bem pior do que a minha. Afinal, eu não tenho constantes brigas com meu pai demônio. Sinto muito por achar que você poderia me ajudar.

Gostaria de deixar aqui claro meus sentimentos. Eu nunca soube o que sentia por você. Paixão, admiração, raiva, ódio. Era tudo tão misterioso quanto você. Não era algo tão direto quanto foi com a Terra ou algo do ripo, era diferente.

A única certeza que eu tenho é que você sempre me trouxe desconforto. Muitas vezes você me colocou para baixo, e mesmo eu dando risada depois do ocorrido eu não fiquei bem. Várias vezes seus comentários cortantes perante aos meus hábitos me causaram tristeza e inquietação. Mas, eu não demonstrei. Eu nunca demonstrei.

Nós dois nunca fomos de demonstrar o que realmente sentíamos.

Por você nunca ter me achado hilário, eu fui me despedaçando. Na verdade, eu nunca soube realmente o motivo da sua opinião ser tão importante para mim. Talvez porque eu te considerava um espelho, tão igual e tão diferente ao mesmo tempo da minha personalidade, e você me negando seria como se eu negasse a mim mesmo.

“E eu estive errado, eu estive mal

fui até o fundo do poço.”

Muitas vezes desabafei com você. Não por meio de palavras, mas por gestos e brincadeiras. Nunca soube dialogar sobre meus problemas sem ser com pegadinhas. Mas, seu sarcasmo me feria por dentro.

Você sempre foi o motivo para eu desistir e continuar.

Eu me entreguei para você, mesmo você não percebendo.

E a culpa é minha.

 

“Dessa vez, eu errei por te entregar um

coração que valesse a pena quebrar”

Nessa altura da carta você já deve ter jogado o papel na lareira, picotado ou lançado um de seus feitiços nele. Eu te entendo, pois aqui disse coisas que nunca tive coragem de te falar cara a cara. Tive medo da sua reprovação, ou da minha.

Porém, se você ainda está lendo gostaria de confessar: estou triste pelo fim da equipe, mas aliviado pelo fim da pressão. Conviver com você era uma auto-pressão enorme. Conviver com o grupo era uma pressão enorme, um desespero enorme.

A Patrulha do Destino era algo semelhante, eu nunca tive tantas expectativas. E, as poucas e baixas que colocaram em mim eu desapontei. Porque esse sou eu. Depois que flerto com alguém ou lanço uma piada me pergunto se não fiz papel de bobo, se meu impulso não me prejudicou. E automaticamente quebro as expectativas de cada pessoa nova que eu conheço. Ou pelo menos, é o que eu acho. Eu quebrei a sua, não é mesmo?

Os Jovens Titãs era para ser divertido, mas acabou sendo um grande problema para mim.

E minha esperança foi embora.

“Cansado de ver e não ter sentimento”

Então, se você ainda estiver lendo isso saiba que eu vou estar por aqui, pelo mundo, tentando não acabar comigo mesmo. Não tenho perspectiva de vida e não vejo nada em que eu possa ser bom. Porém, eu gostaria que você me procurasse, e vou confessar que vou te esperar.

Sei que você deve estar se perguntando por que escrevi isso logo para você...

Pois, ao mesmo tempo que você é meu desespero, você é minha paz. E, por você ser a pessoa que eu menos me dei bem no grupo, queria que você estivesse aqui comigo agora, para impedir de eu desistir de mim mesmo.

“Essas ‘cinco’ palavras na minha cabeça

Gritam "ainda estamos nos divertindo? "

Não.

Nós nunca nos divertimos, e eu sei disso.

Assim como eu sei que eu não passo de meras piadas baratas e de alguém que nunca vai deixar de ser quem é.

Pois, infelizmente esse sou eu.

Atenciosamente, Mutano.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!




Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Uma carta, Ravena." morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.