Daemon escrita por Taty M


Capítulo 1
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Não era de se admirar que uma cidadezinha do interior pudesse ficar tão decorada durante o Halloween, contudo, para Erika, aquilo ao invés de trazer a sensação de alegria e envolvimento, a desmotivava.

Tinha se mudado com Ezarel com intuito de tentarem reestabelecer a relação após uma turbulenta fase. Contudo estava cada vez mais descrente de que um dia as coisas voltariam a ser como antes.

 

“No dia das bruxas do ano anterior, viajaram em um grande grupo de amigos que se conheciam desde o colegial para a cidade de Eldarya, conhecida por suas vastas mitologias e tradições.

Talvez devessem ter escutado Valkyon na época quando os alertou sobre brincar com a lenda dos Daemons... Deviam ter respeitado algumas crenças alheias. Mas movidos a muito álcool e a típica coragem que a juventude emana, acabaram profanando deliberadamente em forma de gozações, o rito oculto mais importante por lá.

Um a um acabou sendo achado à sua maneira...”

 

Tinha sido o pior ano da existência de Erika!

Sua vida estável, seu namoro perfeito, seus amigos verdadeiros, tudo estava definhando, foram acuados, caindo em loucura, inclusive mortes, era o aviso de que com total certeza algo estava vindo para cobrar a dívida que criaram naquela antiga noite de Halloween.

 

Por esse motivo, como última esperança de salvar seu relacionamento agora frio, e livrar-se de vultos e vozes que ela e Ezarel passaram a presenciar durante o dia-a-dia na cidade grande, Erika teve a ideia de mudarem de vida e começar do zero, no interior.

Não conheciam ninguém, os dois ingressaram no único colégio na cidade como professores, respectivamente Erika dando aula de inglês, e Ezarel de química. Desejava muito que finalmente pudessem ter a chance de viver em paz.

 

Apesar disso, o Halloween chegou, e como costume padrão, a cidade sombria ganhou o tom ainda mais cabuloso após as decorações e isso a afligia, pois de certa forma, vinha acompanhado de certa distância entre o casal, lembranças dos amigos perdidos, e pesadelos da mórbida noite terrível.

Aquele dia não tinha sido tão diferente, após o trabalho mais lúdico, esticaram por algumas horas em um bar da forma que poderiam fugir deliberadamente do trabalho de fazer o jantar, e finalmente dirigiram para a casa compacta que os atendia.

 

Ela não estava decorada para a data festiva.

Diferente do apartamento que moraram durante anos na capital, não possuía mobílias modernas e fotos divertidas decorando as paredes. A cozinha era conjugada à sala, após isso vinha um corredor curto que levava para os dois únicos quartos, sendo que o maior ainda possuía uma varandinha que nunca foi aberta pelo casal.

 

Erika tomou banho e avisou que iria ler algo na cama, Ezarel apenas acenou em concordância, falando que jogaria mais algumas partidas de videogame no quarto ao lado, e logo se juntaria a ela.

Os minutos foram se alargando, as páginas foram passando de forma mais frenética e a moça sequer prestava mais atenção. Um frio incomum estava dentro de sua casa, e nem mesmo o fato de se encontrar abaixo de um edredom grosso amenizava aquela situação.

 

Era como se soubesse, como se fosse um aviso...

Os dedos esticaram para pegar o celular que estava ao seu lado na cama e rolaram para a mensagem de meses atrás. Tinha jurado a Ezarel que apagou tudo, prometeram recomeçar a vida, porém mentiu. Como poderia apagar?

Aquela mensagem aflita enviada no meio da noite por Nevra antes de morrer, carregava um teor tão assustador, tão paranoico!

 

# Erika. ERIKA. Ele nos achou, estou com medo. Valk... eu acho que Valkyon... Está tão frio, eu só queria ter paz. #

 

Está tão frio.

Ele nos achou.

 

A moça sentia todos os pelos do seu corpo se arrepiarem horripilantemente. E sobressaltou ao escutar a voz de Ezarel a chamar. Ao mesmo tempo acompanhado de um alivio.

Seu parceiro da vida toda estava ali, tudo ficaria bem, certo? Certo?

 

— ERIKA? — novamente, o mesmo tom que dizia quando estava precisando de algo, ou seja, sempre.

— Ezz... Não vai vir mesmo deitar? Acho que podemos conversar umas coisas quentes sabe, essa noite está bem fria, o que ach...

— Erika pode me ajudar aqui na cozinha?

 

Ela usou uma tentativa de acender o namorado para reverter aos poucos a relação escassa, mas não esperava que Ezarel pudesse ainda estar com fome. Apesar que era ele, e não era de fato surpreendente. E também poderia estar querendo algo mais sexy fora da cama, combinava.

 

— ERIKA, ERIKA. Não vá. Sou eu, estou aqui no quarto do lado, estava jogando ainda... — a voz semelhante à que tinha falado anteriormente murmurou.

— Ezarel... — sussurrou quando o frio se intensificou.

— Erika, sou eu, não vá para o quarto, venha para a cozinha! — o timbre ecoava um pouco mais preocupado. Se desesperando. Mas a voz do cômodo ao lado voltou a falar:

— Erika estou no quarto ao lado, eu também ouvi, não vá para a cozinha... — idênticas, as vozes, ambos. Medonho.

 

Era como a mensagem de Nevra, estava tão frio.

A verdade estava clara enquanto escutava a duplicidade de seu namorado, qual deles era o verdadeiro? Erika só queria paz, mas ao que parece seria impossível, pois...

Ele já os tinha achado.


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