Expulso escrita por Nanquim


Capítulo 1
Expulso (Going Home)




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A primeira ofensa havia sido cair na Gryffindor.

A segunda, ter amigos por lá.

Sirius se perguntava quantas ofensas mais Walburga Black toleraria. Quão distante estava de ser expulso de casa, quando cruzaria aquele limite. Fitou a fumaça espiralada, perguntando-se se seriam os cigarros, ou talvez a bebida...

— Six!

Regulus estava à porta, sua voz em um sibilo nervoso. Com um aceno displicente de varinha, o animago deixou que o irmão entrasse. O slytherin andou até ele com passos rápidos, sem tecer nenhum dos usuais comentários a respeito dos cigarros ou da magia ilegal, fazendo o mais velho erguer uma sobrancelha.

— Você precisa ir embora. – informou, muito rápido. Seus olhos escuros como os da mãe arregalados de susto. – Bella...

Mas o que a insuportável Bellatrix havia feito desta vez, Regulus não chegou a lhe dizer; o grito enfurecido de Walburga ecoou por todas as paredes da casa, cortando a conversa:

— Sirius Orion Black!

Ela não o mandou descer, mas ele sabia que aquilo estava implícito em seu nome completo, então apenas revirou os olhos e jogou a bituca pela janela, antes de se levantar da cama e seguir pelo corredor, Regulus em seus calcanhares.

Entrou na cozinha logo depois de Narcisa. Aparentemente, a loira havia farejado o cheiro de sangue iminente, como o perfeito membro daquela família de tubarões que era. Parou no meio do cômodo, diante da mãe, que o encarava de cima com uma expressão enfurecida, as mãos na cintura em uma pose autoritária. Poucos passos às suas costas, Orion sustentava uma expressão de puro desprezo. Sentada na cadeira elegante, Bellatrix parecia não caber em si de exultação. Regulus ficou um pouco para trás, como se tivesse vergonha de assistir à cena, provando que era a única pessoa decente naquela família além de Andrômeda. Druella e Cygnus estavam fora, decerto caçando muggles.

A ceia estava posta sobre a mesa, o que na verdade não fazia muito sentido, já que os Black não eram exatamente cristãos, mas era uma tradição britânica e antiga, e eles eram uma família britânica e respeitável, então, como poderiam não ter uma ceia de natal?

Hipócritas. Sempre, o tempo todo. Hipócritas.

— Sirius, para o seu bem, é melhor que Bella tenha se enganado com o que viu. – Walbuga disse em um tom grave.

O gryffindor lançou um olhar de puro ódio à prima, que apenas alargou o próprio sorriso. O cheiro de tabaco que exalava de suas roupas sem dúvidas se espalhava pela cozinha e era sentido por todos, e o fato de que ninguém o havia indagado sobre isso lhe dava uma boa ideia do que “Bella” havia visto.

— Depende. O que a puta viu?

O tapa muito bem dado estalou contra seu rosto. Sirius sentiu uma única linha em sua bochecha arder ainda mais do que o resto; o anel com o brasão dos Black havia aberto um corte na maçã direita. Não ligou, voltando a encarar a mãe com a mesma postura insolente de antes.

— Olha a boca! – Walburga alertou

Ele não sabia quando os palavrões haviam se tornado parte de seu vocabulário – talvez eles estivessem certos e James fosse uma má influência em sua vida. Por outro lado, seu linguajar os incomodava muito mais do que os tapas o incomodavam, então na verdade ele ainda saía ganhando.

— Eu vi você e aquele sangue-ruim no trem. – sua prima mais velha informou. Sirius demorou um momento para entender de quem ela estava falando.

— Remus? – questionou, uma sobrancelha levantada. Bellatrix assentiu, e Sirius engoliu o impulso de corrigi-a e informar que, na verdade, Moony era mestiço; pensar que ele era um nascido muggle só faria irritá-los ainda mais e, bem, ele não ligava nem um pouco. Em vez disso, continuou com a sobrancelha levantada. – E daí? Vocês já sabiam que ele é meu ami-...

Parou, seu olhar deslizando pela careta de nojo de Orion. Lembrou-se subitamente de que, naquela viagem em particular, Prongs metera-se em um de seus planos mirabolantes para conquistar Evans e puxara Wormtail junto, deixando ele e Moony sozinhos na cabine, e a cortina... A cortina permanecera aberta.

O susto da constatação devia ser claro em seu rosto, pois o sorriso de Bellatrix aumentou ainda mais. Os lábios de Walburga crisparam-se em uma expressão ainda maior de ódio, e Orion tornou-se impassível atrás da esposa. Os lábios de Sirius tremeram e, de repente, ele estava gargalhando.

Curvou-se, uma mão sobre a barriga, algumas lágrimas escorrendo por seu rosto. A risada rouca como um latido saiu rascante por sua garganta, ecoando pelas paredes antigas e decadentes, assustando o resto da família. Assustou-o também, mas Sirius não conseguia não rir. Dentre todas as ofensas que costumava praticar – tabaco, álcool, sexo desde os catorze anos –, aquela que o faria ser expulso era o fato de ter um namorado.

— Esse é o problema? – latiu, recompondo-se, os lábios ainda tremendo em uma risada fraca – De tudo... Tudo... O problema é que eu bato uma para um cara?

A linguagem lhe rendeu mais um tapa e consequentemente mais um corte na bochecha. Recompôs a postura, cruzando os braços e mirando-os com desprezo.

— Você vai se afastar dele, Sirius. – Walburga instruiu em voz baixa, um aviso implícito em seu tom – Você vai ficar longe dele pelo resto do ano, e em setembro você vai para Durmstrang, para aprender a agir como um Black!

Aquilo o irritou. Mais do que os tapas, mais do que o modo com que falavam de seus amigos, mais do que os olhares de desprezo lançados por cima dos pratos no jantar. Essas coisas não o afetavam de verdade. Sair de Hogwarts, por outro lado, significaria nunca mais ver Prongs, Wormtail, Lily, McKinnon... Moony. Por mais que tentasse acreditar que sua amizade poderia sobreviver a isso, uma vozinha em sua cabeça lhe dizia que não. E essa vozinha o assustava.

— Mas nem fodendo! – rugiu em resposta – Eu não vou para aquela porra de escola! Nunca! E não vou me afastar de Moony, nem que vocês me matem! Eu...

Interrompeu-se, quase hesitante em completar a ideia. Então, seu olhar abaixou-se para Orion, para os olhos azuis que espelhavam os seus, a barba cheia que parecia prever o futuro da sua, a expressão de desprezo que parecia uma cópia da sua. Um lampejo sádico, decerto advindo de seu sangue Black, tomou sua mente, ávido por ver a expressão descrente naquele rosto quando disse, em alto e bom tom:

— Eu o amo.

Por um momento, nada aconteceu.

Então, Sirius caiu, indo de cara em uma das cadeiras. Ignorou a dor da batida, entretanto, tomado pela sensação de dezenas de chutes e socos em todo o seu corpo. Contorceu-se, mas não gritou; tanto sua Casa quanto seu sangue o faziam orgulhoso demais para tal. O crucio durou pouco mais de um minuto, e o animago quase riu; eles podiam dar a desculpa que quisessem, mas ele sabia que o pai só parara ali porque era fraco demais pata continuar a torturá-lo.

— Não ouse dizer isso. – Orion sibilou, perigoso como uma serpente – Não ouse sujar esta família deste jeito.

O garoto pôs-se de pé, orgulhoso como um leão.

Mirou o pai nos olhos por apenas alguns segundos; frio, cruel, insensível. Deu-lhe as costas e saiu da cozinha com passos duros. Ninguém tentou pará-lo, decerto pensando que aquela era apenas mais uma de suas birras. Regulus o seguiu com passos rápidos.

— Diga a eles, Six. – o mais novo pediu, parado à porta de seu quarto, observando enquanto o irmão vasculhava uma das gavetas de sua cômoda, bagunçando todo o aposento – Diga a eles que Lupin é um mestiço, não um s-... Nascido muggle.

Sirius perguntou-se se Regulus só estava inventando ou se de fato sabia disso – e, nesse caso, como sabia –, mas balançou a cabeça, negando ao mesmo tempo em que afastava o pensamento.

— Esse não é o problema e você sabe, Reg.

Regulus calou-se. Ele sabia.

Sirius enfiou a carta de Prongs no bolso e olhou ao redor, procurando por algo que pudesse se mostrar importante. Sua varinha estava no bolso interno do casaco, a carta no externo das calças, sua vassoura e seu bastão sempre ficavam na casa de James. Agarrou uma gravata da Gryffindor e amarrou-a de qualquer jeito ao redor do pescoço. Também tirou do porta-retratos sobrea escrivaninha uma foto em que ele, Remus, James e Peter empurravam-se mutuamente para dentro do Lago Negro, enfiando-a no bolso juntamente à carta. Então, virou-se, saiu do quarto e desceu as escadas com aqueles mesmos passos duros. Regulus mais uma vez o seguiu.

A aproximação dos irmãos sobressaltou a família na cozinha. Cygnus e Druella haviam chego, ele reconheceu suas vozes. Passou reto, entretanto, e foi direto para a porta de entrada. Sentiu os olhares seguindo-o. Quando ergueu a mão para a maçaneta, a voz de Walburga o parou:

— O que você pensa que está fazendo?

Tocou a maçaneta no formato de uma rosa prateada com a ponta dos dedos.

— Indo embora.

Quase pôde ouvir a ira dela estourando às suas costas, mas foi Orion quem respondeu, em seu tom perigosamente controlado.

— Se você passar por esta porta, Sirius, eu juro que será a última vez. 

O gryffindor virou-se, deixando que os braços pendessem dos lados de seu corpo, e encarou a família, seus olhos azuis e brilhantes perfurando-os.

Cygnus estava mais para trás, o rosto naturalmente grave circundado por sombras advindas da barba longa e espessa. Druella estava logo à frente do marido, sob o umbral, com um sorriso presunçoso e afiado – ela sempre dissera que Sirius traria as piores vergonhas para a família. Ao lado da loira, Orion lhe devolvia o olhar penetrante, sua boca retorcida em desprezo e nojo. Diante deles, um passo corredor adentro, Walburga o encarava com uma expressão dura, os olhos negros o desafiando.

Logo ao lado da tia, parecendo uma cópia perfeita da mesma, Bellatrix tinha o queixo erguido, desafiando-o tanto quanto ela. Perto da mãe, como se tentasse se esconder sob suas saias, Narcisa o encarava com um misto de curiosidade e medo que ele sabia haver em seus olhos quando Andrômeda saiu de casa sob circunstâncias bastante similares.

Perguntou-se se ela, algum dia, seguiria também o seu exemplo. Provavelmente não; ela era perfeita demais para isso. A princesinha dos Black.

Por fim, havia Regulus.

Ele ainda estava parado no último degrau da escada, parecendo pequeno demais ao encolher-se contra o corrimão. Sirius percorreu-o com os olhos; seus cabelos pretos e curtos, tão diferentes do seus, o maxilar quadrado e forte, parecido com o de Cygnus, o corpo pequeno e frágil, demasiadamente magro, parecido com o de uma garota. Fixou seus olhos pretos, praticamente cópias dos da mãe, que refletiam apenas receio. De perder ou de agir?

“Venha comigo, Reg.”, pediu mentalmente “Por favor, venha comigo.”.

Regulus não foi, e Sirius não verbalizou seu pedido. Mirou a árvore genealógica na parede, onde o rosto de Andy já estava queimado, e perguntou-se quanto tempo Walburga levaria para queimar o seu.

Deu as costas à família, abriu a porta e saiu na noite fria. Deixou Regulus para trás. Sabia que Orion estava sendo honesto, e seu peito apertou-se com a consciência de que nunca mais veria seu irmãozinho. Mas ele era uma serpente como todos os outros, saberia sobreviver no ninho. Além disso, precisava escolher e, Merlin, como poderia não escolher Moony?

O vento gélido fez seu olho esquerdo latejar, e ele subitamente notou o gosto de sangue. Desceu os degraus de pedra até a calçada, erguendo a varinha. Dentro de instantes, o Nôitibus estava parado à sua frente. Subiu, cumprimentando o cobrador, e lhe entregou uns nuques que tinha no bolso por pura sorte. Pescou a carta de James e passou rapidamente os olhos por ela, procurando pelo endereço.

— Sussex. Rua do Cervo. – informou, quase rindo da ironia. Acomodou-se em um dos assentos precários e passou a observar a paisagem que transcorria como um borrão pela janela. Pararam duas vezes antes de chegar a Sussex, uma para deixar um velho que parecia prestes a vomitar e a outra por causa de uma garota pouco mais velha que Sirius cujo bebê de colo começava a chorar copiosamente.

Meia hora depois de sair daquele ninho, o animago saltava na Rua do Cervo. Andou pela calçada escura com uma mão no bolso da calça e a outra segurando a varinha. Olhou, meio desesperado, de um casarão para o outro, rezando para que a casa de Prongs não fosse muito difícil de achar; ao contrário de Remus e Peter, que estavam acostumados a passar as duas últimas semanas de verão com os Potter, Sirius nunca fora lá, a despeito de todas as vezes em que o amigo insistira para ele sair da casa dos pais e ir morar com ele.

“Espero que estivesse falando sério, Prongs.”, riu secamente, antes de deparar-se com um casarão alto, mas não ostensivo, de paredes vinho e uma porta vermelha com uma guirlanda natalina cujas gavinhas formavam um P elegantíssimo.

Toda a casa parecia gritar “Prongs”.

Sirius caminhou até a porta com passos decididos e tocou a campainha antes que o receio o dominasse. Passou, então, a encarar os próprios pés, tentando ignorar todos os “e se...” que rodavam em sua cabeça.

E se James só tivesse dito aquilo da boca para fora? E se ele não pudesse aceitar seu relacionamento com Remus? E se seus pais não o quisessem ali? E se... Merlin, ele mal conhecia Fleamont e Euphemia! E se James fosse a ovelha negra e eles fossem tão terríveis quanto Orion e Walburga? E se...

O som da porta se abrindo interrompeu seu fluxo de pensamentos, juntamente com o feixe de luz que se derramou sobre seus pés e o som de músicas natalinas. Apenas quando James o chamou, entretanto, foi que ergueu a cabeça.

— Pads? Mas o que...

O apanhador se interrompeu, as palavras mortas em sua boca, quando viu o rosto do amigo. Sirius então se deu contas de sua aparência: seus cabelos deviam estar uma bagunça, os cortes em sua bochecha já deviam ter estancado, mas ainda haviam deixado uma placa de sangue seco em sua cara, seu olho esquerdo provavelmente estava roxo e inchado, e seus dentes ainda ostentavam uma coloração avermelhada.

— Eu fugi de casa. – o garoto informou, como se não fosse nada. A boca de Prongs moldou-se em um perfeito “o”, e ele pareceu que ia dizer alguma coisa, mas o outro foi mais rápido ao complementar: – Porque estou completamente apaixonado por Moony.

Potter o encarou por mais um segundo, como se tentasse entender se aquilo era sério ou apenas uma pegadinha. Por fim, sua expressão desfez-se em um sorriso e ele deu um passo para trás, abrindo mais a porta e dando-lhe passagem.

— Bem-vindo ao lar, Pads. Já íamos mesmo começar a comer.

O estômago de Sirius roncou. Deu um passo à frente e finalmente entrou em casa.


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Notas finais do capítulo

Sirius ♥
Amo muito o Six e sempre quis saber exatamente como foi essa fuga dele de casa. E como eu ando bem viciado em Wolfstar, acabei escrevendo isso na aula vaga... Hahaha XD
Pode comentar me xingando ou me elogiando nos comentários, eu deixo :3



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