Estava ansioso para aquela tarde, depois de alguns dias, finalmente poderia receber visitas e ver algo que não fosse o rosto preocupado e evasivo do Dr. Solace. Passava todo o meu tempo pensamento nos amigos e em Annabeth. Will não me dava qualquer pista sobre seu estado ou detalhes do acidente.

Eu tive a sorte de sofrer apenas uma batida forte na cabeça, pelo o que entendi, as ferragens do carro foram empurradas entre mim e Annabeth após a colisão no poste em alta velocidade, não afetando tanto nós dois.

E com não afetar tanto, quero dizer que com o ferro quente do motor, sofri queimaduras no braço direito, que ainda estavam sendo tratadas. Fora isso, eu me sentia completamente sortudo por não fazer parte da porcentagem de mortes e incapacitações que martelava na minha cabeça. Eu escapei de ser um dos sessenta e seis por cento, e isso me deixava horas sorridente encarando o céu de verão pela janela do quarto.

Ouvi uma batida na porta e logo vi os cabelos negro petróleo de Thalia adentrando a sala, ela estava com uma aparência péssima, mas logo vi que se tornava o padrão após Luke e Sally a seguirem para dentro do quarto. Sally sorriu abertamente, ato que suas bochechas e boca não estavam acostumadas, deixando seu sorriso sem o aspecto caloroso de sempre. Mas eu não liguei. Eu estou vivo, e minha mãe está feliz por isso.

— Percy, querido... — Ela se aproximou e me abraçou forte, quase tão forte que pedi que se afastasse do meu braço queimado, mas resisti a dor daquele abraço. Ela precisava dele mais do que eu.

— Iai cara. — Luke cumprimentou, se aproximando. Ele também não escapava dos sinais de noites em claro. Seus olhos carregavam pesadas olheiras e seu semblante cansado me fez querer levantar para que ele se deitasse. — Vou te atualizar sobre a empresa, mas agora não... Temos outras coisas sobre o que falar.

— Annabeth. — Eu e Thalia dissemos juntos e nos encaramos nos olhos pela primeira vez.

— Os médicos não me deixaram vê-la. — Eu comentei.

— Não deixam ninguém entrar. — Thalia disse e sentou-se na poltrona próximo a cama. — Contataram os meios-irmãos e madrasta, mas nenhum deles veio visitar.

Fiquei com medo pela minha loira, que seu problema fosse maior do que eu pudesse imaginar. 

— Será que ela vai perdoar? — Perguntei para eles.

— Annabeth nunca ficaria com raiva de você, Percy. — Sally disse. — O casal na moto que você salvou veio nos agradecer pessoalmente, eles tinham um bebê.

— Se não tivesse desviado, você e Annabeth sairiam intactos pela proteção do carro, mas eles na moto com certeza não escapariam. — Luke falou. — O bebê estaria órfão.

Saber disso aliviou minha tensão. Não me sentia um herói por isso, machuquei eu e a mulher que amo, mas fiquei feliz de não ter separado aquela família.

— Ótimo, estão todos aqui. — Will entrou na sala. — Percy vai poder receber alta, mas com algumas condições.

Todos na sala vibraram, principalmente Sally.

— Quais condições, Doutor? — Perguntei.

— Sem trabalho até seu braço se recuperar das queimaduras, até lá apenas repouso. Passei uma lista de analgésicos para dores de cabeça que possa vim a sentir e pomadas para seu braço, está tudo com minha secretária na recepção.

Sorri.

— Obrigada Solace. — Agradeci e ele sorriu também.

— De nada Percy, agora vou deixar vocês a sós. — Ele se retirou e eu olhei para Luke.

— Quais as novas na empresa?

— Muito, muito trabalho. — Ele sentou no braço da poltrona em que Thalia estava e ela apoiou a cabeça em seu braço. — Jason insistiu que eu lhe substituísse, mas recusei e ele contratou um novo funcionário para isso. Uma mulher.

— Ela é boa? — Perguntei.

— Ela é um dragão. — Luke disse e soltamos uma gargalhada. — O nome dela é Liz, faz um trabalho ótimo, mas costuma pisar nas pessoas com cargo inferior ao dela. Jason a adora.

— Bom... Talvez ela não goste de saber que vou voltar.

— Nem um pouco. 

ღ

Após receber alta, Thalia insistiu em me receber no seu apartamento. A primeiro momento, não me pareceu boa ideia, pois a lembrança que tinha de seu apartamento era um ovo apertado e de apenas um quarto, mas ao chegar lá eu me impressionei.

— Você se mudou? — Perguntei enquanto ela deixava as chaves do carro no balcão de mármore da cozinha americana.

— Assumi o novo setor na empresa, Relações Internacionais. — Lhe parabenizei pelo emprego e observei o apartamento, era realmente um luxo e me lembrava um pouco o meu, se não fosse os itens para cachorro e estantes de livros em idiomas que eu nem sonharia em aprender.

— Onde está o Tofu? — Procurei aquela bola de pelos, mas não o encontrei.

— O mandei para o pet shop, talvez chegue apenas de tarde. Vamos, vou ajudar a levar suas coisas para o quarto. — Ela pegou minha mala e me mostrou a suíte que eu ficaria, com cama de casal, televisão e mesa para computador.

— Thalia... Isso realmente é mais do que eu esperava, muito obrigado mesmo. — Disse e ela sorriu.

— Somos família, eu não ia deixar você ficar sozinho. Além de que Sally precisa ter na memória um Percy saudável que ela viu no hospital. — A Grace sentou-se. — Foram bem difíceis para ela os meses em que ficou internado.

Imaginei Thalia e Luke cuidando de Sally todos esses meses em que fiquei fora, enquanto Luke aguentava Liz no escritório e Thalia trabalhava em tempo integral. Foi um esforço dos meus amigos que nunca serei capaz de compensar.

— Luke vem dormir aqui hoje depois do trabalho e vamos pedir comida árabe. — Sorrimos e ela se levantou. — Preciso terminar de resolver outras coisas da empresa. Espero que goste daqui.

— Tudo bem Lia. — Ela saiu e eu arrumei minhas roupas no pequeno closet, pus meu notebook na mesinha e o liguei, observando o plano de fundo, uma foto minha e de Annabeth durante o natal.

Ela sorria, aquele sorriso caloroso emoldurado por um batom vermelho, enquanto eu beijava sua bochecha e agora me perguntava quanto tempo mais demoraríamos para ficar assim próximos de novo.