Rebel Mermaid escrita por nekokill3r


Capítulo 30
A metade mãe, metade pai (e p í l o g o)




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Nossa filha nasceu com olhos especiais e cabelo preto. A apelidaram de "metade mãe, metade pai", pois o olho esquerdo é verde como o meu e o direito é azul claro como o de Ethan, e ela ri apertando as pequenas mãos na boca quando a chamam assim. Apesar de já estar com quase oito meses, eu esperei até completar 24 anos e perceber que era isso o que eu queria, que era tal coisa que gostaria de poder apreciar e fui capaz de reunir a coragem dentro de mim para enfrentar todas as dificuldades até que pudesse ver seu belo rostinho.

 Conforme a observo nas tardes que ficamos juntas se virar de bruços sem ajuda e quase se sentar por si só, percebo que entendo o que as pessoas queriam dizer sobre ter um filho; tudo bem que não foi nada fácil nos primeiros dias, que me desesperava por motivos banais como o choro dela, que não sabia fazer muitas coisas e que levou um tempo até que tivesse coragem de pegá-la nos meus braços, mas Ethan estava comigo e juntos aprendemos tudo o que nunca nos foi ensinado.

Me alegro por ver que minha filha realmente irá crescer em um lugar pacífico e calmo, onde não existem mais Jogos ou Pacificadores, onde ela pode correr livre sobre a areia e se aventurar no mar quanto tempo desejar junto com o pai, que posso deixá-la ir para escola sozinha sem me preocupar e que não preciso temer quando estiver perto de fazer doze anos.

Todos os outros já a viram, pois na primeira semana de vida dela liguei para cada um exigindo que me viessem fazer uma visita e eles chegaram tão ansiosos e falantes que quase me fizeram chorar de tanto rir. Me recordo de Johanna dizer que a bebê sofreria por ter herdado o meu nariz feio, de Beetee dizer que ela viveria em uma Panem de paz, de Peeta ficar tão emocionado que por pouco não conseguiu pegá-la direito e depois a passar para os braços de Katniss, de até mesmo o chato de Haymitch ter vindo e dito que ela era "bontinha". E ligo para eles todos os dias para certificar de que estão indo bem, se estão tentando o máximo para seguir em frente e se estão ocupando suas cabeças das lembranças ruins.

Ethan, agora um pouco diferente pela idade, continua a trabalhar como pescador e algumas vezes eu o ajudo deixando minha bebê junto de Annie —– e ela e Finn se dão tão bem que meus olhos brilham com a possibilidade de se tornarem um casal quando forem mais velhos —–, e costumo jogá-lo na água rindo sempre que diz que não consigo pescar um peixe muito grande por não ter tanta força no braço como ele. Ele gosta muito de pegar nossa filha nos braços e ficar perto da porta conversando com ela, apesar de que sei que não pode entender, e sempre explica como vai chegar um dia que vai gostar de alguém como ele gosta de mim, mas que não vai entregá-la para qualquer um apenas por ter um rosto bonito e jura que jamais vai deixar que outra pessoa com mais força erga a mão contra ela, o que sei que está se referindo a mãe, depois a abraça tão forte que ela chega a soltar um pequeno gemido de dor.

O nosso casamento foi tão simples que quase começo a rir ao me lembrar; na praia, perto do mar, somente nós dois olhando um no olho do outro e prometendo enfrentar as desavenças e dificuldades do caminho que estávamos entrando, prometendo nunca abandonar o outro nos momentos de angústia ou de raiva, jurando fazer o outro feliz mesmo nos dias mais sombrios. E assim ele está conseguindo fazer —– e eu me esforço para imitá-lo —–, sendo a razão por levantar todos os dias e viver mais um dia na esperança de que ele vai ser bom, de que vai acabar bom, de que a alegria está do meu lado na cama e revestido de areia quando o encontro na praia para vir embora para casa.

Minha filha ainda não entende por quê acordo gritando de madrugada, por quê tenho tantas cicatrizes e sou surda de um ouvido, por quê há dias em que não consigo sequer vê-la de perto, por quê ainda me sinto vivendo em um arena-relógio, por quê às vezes a cama é como um refúgio para mim onde me enrolo nas cobertas e não levanto mais, por quê tenho uma peruca verde que sempre insiste em querer usar, por quê meu nome está na parede do Edifício da Justiça como uma vitoriosa, por quê ainda me chamam de Sereia Rebelde, por quê somos os únicos que moramos na Aldeia dos Vitorosos, mas um dia eu a explicarei tudo.

Explicarei como consegui cada marca em meu corpo, como sinto o vazio me dominar e ainda continuo me esforçando para permanecer de pé, como ela nunca vai precisar enfrentar nada do que tive de passar e de como sou feliz pelo fato de tê-la todas as manhãs me fazendo ver que a vida ainda vale a pena, que a luta ainda pode progredir apesar de parecer impossível, que um caixão não é nada se comparado com seus olhinhos que brilham quando me vêem e seus braços que procuram por mim nos momentos de desespero.

Um dia vou dizer a ela como todos os distritos foram separados, como vivíamos presos aqui para sempre, como existiam pessoas más e de como houve um tempo em que a Capital já pareceu um enorme inferno. Direi, com as palavras mais doces e gentis que conheço, como houve uma revolução, uma guerra que nos levou a paz eterna.

Acrescentarei que estive lá, que participei de tal coisa tão perigosa, para então ser levada ao paraíso que temos hoje, o mesmo que demorou décadas para acontecer, o mesmo que ardentemente lutei com todo o meu ser, o mesmo que descanso minha cabeça no travesseiro sem paranóias, porque sei que tenho à ela e Ethan.

E concluirei confessando que, se eu tenho tudo isso, então não preciso de mais nada.


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