O Intruso escrita por thierryol1


Capítulo 3
O Escultor de Pesadelos




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"Eu tentei explicar o porque de eu ser tão triste... Mas nenhuma palavra saiu da minha boca. Foi então que eu percebi que também não sabia."

 

Lucie corria muito, estava desesperada. O que estava perseguindo-a era rápido, e familiar. A garota correu o quanto pôde em meio às ruas vazias, gritava por ajuda, mas só podia ver a criatura correndo em sua direção.

O corpo magro e alto, as mãos extremamente longas e pontudas, um cabelo grisalho em cima da face, totalmente lisa. Era como se o monstro não tivesse um traço de humanidade em seu rosto. Não possuía nariz, ou boca, ou sequer olhos. Mas ainda assim, usava um terno com uma gravata vermelha.

A criatura corria atrás de Lucie, e mesmo com a ausência de uma boca, era possível ouvir uma risada macabra, bem de leve. Era como se ele sentisse prazer em ver o sofrimento da garota, que tentava de todas as formas escapar. Mas não era possível. Quanto mais Lucie corria, mas parecia que estava parada. O monstro continuava a vir em sua direção, e ela corria, fisicamente, mas não saía do lugar, como se a rua fosse uma esteira.

Aquela rua que ela tanto conhecia. E odiava. A criatura ia chegando cada vez mais perto, abrindo seus longos braços como se desejasse abraçar a garota, que estava extremamente ofegante. De repente o ser raquítico encostou suas frias mãos no ombro de Lucie, que ficou em estado de choque. Queria sumir dali, sair correndo das mãos daquele monstro vil e nojento, mas já era tarde. Aquela aberração a segurou forte. Abriu uma de suas mãos enormes e tapou todo o rosto de Lucie, de forma que ela não conseguia enxergar nada.

Então a garota começou a sentir sua vida acabar.

Lucie então abriu os olhos. Viu o teto de madeira e sentiu o chão duro embaixo do cobertor. Ao perceber todo o suor em seu rosto, viu que tudo não passara de um pesadelo.

*****

— Lucie? Você está me ouvindo?

— Hm? Sim... Eu estava só... Lembrando um pesadelo que tive essa noite...

Abel levantou da pequena cadeira onde estava e sentou-se mais próximo da garota. Ficou olhando para ela com seus pequenos olhos azuis por alguns instantes, antes de pronunciar:

— Por que eu sinto que você está tensa?

— Talvez eu esteja... – Respondeu a garota, olhando a sua xícara de chá.

— E por que necessariamente?

Happy corria e pulava nos pés de Lucie e Abel embaixo da mesa.

— Não sei... Acho que eu somente... Queria esquecer certas coisas.

— Todos nós temos algo que queríamos esquecer, Lucie. Seja algo errado que fizemos, ou que sofremos... Mas não podemos deixar isso nos por pra baixo, afinal, sem esses erros, não seríamos o que somos hoje... – Abel disse aquilo num tom tão frio que incomodou um pouco a garota, mas logo ele deu um sorriso e se levantou.

— Já vai? – Perguntou Lucie. Não que ela queria que ele ficasse, mas foi bom tomar um chá e conversar um pouco.

— Sim... Tenho trabalho a fazer. Obrigado pelo chá, eu adoro camomila! E obrigado pelo autografo também! Foi um prazer enorme te conhecer.

— Eu que agradeço... Sem você eu acho que nunca ia terminar de arrumar os móveis...

O garoto sorriu, acenou a cabeça e saiu, deixando Lucie sozinha. Ela voltou a fitar sua xícara, que ainda estava cheia de chá.

*****

Após tomar um banho frio, a jovem resolveu passear um pouco para conhecer melhor a vila.

Ao atravessar a porta principal, ouviu um barulho estranho atrás da casa, que se repetiram várias vezes. Lucie ficou parada alguns segundos, pensando se deveria perder tempo com isso.

— Deve ser apenas um gambá... – Pensou.

Mas ela sabia que gambás não faziam barulho de corte. Ela se dirigiu até o pequeno portão do lado da casa, que levava até a parte traseira da mesma, que daria em um quintal provavelmente. O portão estava aberto, então Lucie apenas continuou andando. Ao chegar ao pequeno quintal, encontrou um homem cortando umas rosas com uma tesoura gigante.

— Quem é você? – A garota indagou, fingindo não estar com um pouco de medo.

O homem se virou lentamente, revelando ser um pouco mais velho que a jovem.

— Olá... Eu sou Josh.

— Hm... E o que você está fazendo Josh?

— Josh está fazendo o seu trabalho moça... Sabe, Josh é o jardineiro. – O homem falou, sorrindo.

— Eu não contratei nenhum jardineiro. Deve ter algum engano aqui.

— Ah, você é a nova proprietária? Bem, Josh era o jardineiro do senhor David, o antigo dono. Josh pensou que o novo dono iria precisar de um jardineiro, então continuou a cuidar do roseiral. – Josh disse, virando-se e continuando a cortar uns ramos.

Ele aparentava estar nos seus quarenta anos, com seus cabelos negros com alguns fios grisalhos e uma barba pequena muito bem feita. Seus olhos eram negros e ele era magro e um pouco moreno, por causa do sol.

Lucie franziu a testa até, então, perceber as diversas rosas plantadas, com uma grande variedade de cores.

— Bem... Você tem histórico ou algo que comprove que você é realmente um jardineiro? – Perguntou a jovem, desconfiada.

— Ah... Josh tem um contrato, se quiser contrata-lo, pode ler e assinar. – Ele respondeu sem interromper suas tarefas.

— Onde está esse contrato?

— No carro... Josh estacionou na frente da casa.

Lucie se virou e foi em direção à rua. Foi quando então ela viu um sedan preto estacionado na frente da casa de Abel. Ela estava achando tudo aquilo muito estranho, afinal o antigo proprietário não havia dito nada sobre um jardineiro.

Lucie aproximou-se e abriu a porta, vasculhando o porta-luvas. Foi quando uma mão gelada tocou seu ombro. Lucie se contraiu, assustada, e olhou em direção à pessoa.

— Calma, parece que viu um fantasma! – Abel riu um pouco, mas logo ficou serio ao ver que Lucie não expressava uma reação.

— Você me assustou...

— Não foi minha intenção... Só queria saber o que você está procurando no carro do Josh. – Perguntou Abel, curioso.

— Ah, você conhece ele? É jardineiro de verdade? Trabalhava mesmo para o antigo dono?

— Calma! – O garoto levantou um pouco a voz. – Pra que tantas perguntas? Não me diga que tem medo do Josh? Hahaha!

— Não tem graça...

— Desculpe, mas é que você poderia ter medo de qualquer pessoa, mas justo o Josh? Ele é um amor! – O garoto sorria. – Sim, Lucie, ele é um jardineiro. Tem aquele jeito estranho mais logo você se acostuma. David adorava ver como ele cuidava das flores, ele vivia me dizendo que Josh era um artista...

— Ah... Bem... Fui criada em cidade grande né? Isso me fez desconfiada.

— Bem, aqui pode ter pessoas que você deve temer. Mas Josh com certeza não é uma delas. Toma! Você deve estar procurando isso! - Abel entregou um conjunto de folhas para Lucie. Era o contrato de Josh.

— Obrigada... Onde você achou?

— Josh esqueceu na minha casa mais cedo. – O garoto respondeu, com um sorriso. – Eu tenho que ir agora, eu estou trabalhando num novo projeto e tenho que adiantar... A gente se vê! – Abel sorriu e entrou em sua casa.

Lucie leu o contrato ali mesmo, hesitou um pouco, mas acabou contratando o tal Josh. Andou de volta até o canteiro de rosas e entregou o contato para o homem.

— Aqui, está contratado.

— Josh agradece, senhora.

— Lucie... Pode me chamar de Lucie!

*****

Lucie caminhava lentamente pelas estreitas ruas da cidade. O clima fresco deixava o passeio mais gostoso. A garota andou por algumas lojas, deu uma passada na pequena praça com uma lagoa cristalina, e por fim dirigia-se a uma padaria.

Pouco antes de entrar, notou um movimento anormal na porta da padaria: Um homem alto, forte e com uma cicatriz em seu rosto estava discutindo com a dona da padaria. Lucie aproximou-se um pouco mais, porém a discussão parecia ter chegado ao fim.

O homem ruivo saiu aparentemente indignado, dando um esbarrão em Lucie, que nada disse. O homem xingou-a, mas ao virar-se e ver a garota mais nitidamente, disse:

— Sinto muito gatinha! Você não é daqui, né?

— Isso não é da sua conta... – Lucie respondeu, virando-se em direção ao homem.

— Não... Você não é daqui. Mas ao mesmo tempo parece que te conheço de algum lugar.

— Acho que não, não faço amizade com pessoas como você.

— Espera, tá dizendo que não gosta de mim? Olhe bem pra mim! Eu tenho físico, sou forte, atraente... – Disse o homem, se gabando.

— Mas a beleza exterior um dia acaba. E o que sobra após isso? O caráter, coisa que aparentemente você não tem... Não passa de um cara avulso com o ego inflado.

— Escuta aqui, acho melhor você tomar cuidado com a língua gata. Sabe... Coisas ruins sempre acontecem com pessoas que falam muita merda...

— Pois eu digo o mesmo para você.

O homem surpreendeu-se com a atitude de Lucie. Fechou a cara e apontou o dedo indicador em direção à garota, que não se intimidou. Ele então se virou e foi embora. Algumas pessoas continuaram olhando Lucie enquanto ela entrava na padaria. A garota pediu uma dúzia de pães de queijo. Enquanto esperava seu pedido, um jovem que não aparentava ter mais de dezenove anos chegou do seu lado e disse:

— Nossa, você é muito corajosa!

Lucie se virou e viu o garoto. Tinha um cabelo grande, liso porém ondulado nas pontas. Olhos castanhos claros. Tinha um colar muito bonito, parecido com âmbar.

— Corajosa? E diz isso por quê? – A garota forçou um sorriso.

— Nunca vi ninguém enfrentar Walter daquela forma... Foi super. Irado! – O jovem deu um pequeno pulo enquanto falava.

— Então o nome daquele nojento é Walter? – Lucie olhou para o lado de fora da padaria por alguns instantes.

— Foi bem legal, mas... Tome cuidado... – O garoto tinha um tom de preocupação na voz.

— Cuidado?

— Walter é um cara perigoso... Já foi preso diversas vezes e mesmo assim tem coragem de desafiar a lei. Ele mora com o tio, que é um advogado muito bom, então ele sempre consegue sair da cadeia.

— Obrigada pela preocupação, mas eu não costumo ter medo desses vermes que se acham.

Nessa hora os pães de queijo foram entregues à Lucie, que pagou e se despediu do garoto.

— Bem, até logo... Ah, ia me esquecendo, como é mesmo o seu nome?

— Me chamo Roger. E você é Lucie não é mesmo?

— Como sabe? – A garota ficou curiosa.

— Eu adoro ler, já li muitos livros seus. Bem, será que você não poderia ir até minha casa?

— Para que exatamente?

— Autografar uns livros, por favor, por favor, por favor!

O garoto insistiu tanto que Lucie não teve escolha, acabou o acompanhando, enquanto iam falando de livros e autores.

*****

Lucie voltava para casa, sozinha. Já estava anoitecendo, e não tinha ninguém nas ruas.

Depois do que aconteceu na casa do Roger, ela só queria deitar e dormir, já tinha planos de começar a escrever seu novo livro no outro dia. Quando estava chegando, uma mão pegou em seu pescoço e a jogou contra um muro, revelando ser Walter.

— Me solta! Está me machucando! – A garota se mexia, tentando se soltar, mas o homem era mais forte.

— Fica caladinha, Lucie!

— O quê? Como sabe meu nome?

— Ora, eu disse que te conhecia de algum lugar... Você é aquela escritora dramática!

— O que você quer de mim?

— Hahaha! O que eu iria querer com uma gostosa como você? – Walter disse, descendo a mão e apalpando as coxas de Lucie.

— Por favor... Não! – Lucie estava quase aos prantos, seu coração estava acelerado.

— Por favor? Ora, devia ter pensado nisso antes de debochar de mim! – Diz o homem, puxando os cabelos da garota.

— Eu vou gritar! Eu vou gritar!

— Não, você não vai fazer nada! Sabe por quê? – Walter tira uma faca do bolso de sua calça. – Por que se você não ficar quietinha, eu vou ter que encher esse seu corpinho delicioso de buraquinhos. Você quer isso?

— Não... Não! – Lucie começa a chorar.


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