Burnout escrita por InsaneBoo


Capítulo 1
Capítulo único


Notas iniciais do capítulo

Oi bebêzinhos.
Titia se meteu em mais desafio e daí surgiu essa fic. É spinoff, então pra quem não leu "A força da juventude", o link estará nas notas finais, ok?
Mas não se preocupem, não é estritamente necessário ter lido a história original antes de ler essa aqui, dá pra entender perfeitamente. Porém, não ler as tags antes da fic é crime em 50 países, 'cês sabem né? rsrs
Dito isso, boa leitura amores ♥



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Lee no fundo sabia, que não podia apressar o tempo a sua vontade, mas isso não era suficiente para fazê-lo deixar de encarar – quase sem piscar – o objeto a sua frente, como se sua concentração e ansiedade pudessem de fato influenciar na equação temporal.

Sua tensão suprimia com louvor, sua racionalidade.

E quando finalmente o alarme do celular soou que já haviam passado os minutos pedidos pelo teste, a resposta que queria estava estampada sob a palma de sua mão, na forma de duas notáveis e fortes linhas azuis.

Já havia passado por momentos como aquele duas vezes antes e jamais vira linhas tão fortes como aquelas.

Fortes a ponto de tornarem os quinze testes anteriores desnecessários, porém há algo no exagero, que Lee simplesmente nunca foi capaz de evitar.

Finalmente se viu firmando a informação em sua mente. Aquilo era real. Definitivo.

Estava esperando um bebê pela terceira vez.

Viu seu próprio reflexo no espelho do banheiro no qual trancara-se, já sem saber dizer exatamente há quanto tempo. Viu-se chorando, mas também viu-se brilhando de tão feliz.

E depois de permanecer mais alguns longos minutos – aproximadamente uma meia hora – contemplando a própria alegria, sentado no chão, num cantinho perto da porta, abraçado a si mesmo, começou calcular que talvez fosse ser um pouco difícil dar a notícia a seu marido.

Talvez o processo todo, fosse ser difícil afinal.

Já não era mais tão jovem, apesar de não se achar velho de maneira alguma.

E Gaara, bem...

Gaara estava passando um momento difícil.

Não vinha se dando bem com seu chefe, vivia preocupantemente mergulhado em trabalho, quase não podia estar em casa...

Lee quase já não o reconhecia mais.

O entristecia muito assistir ao que parecia ser uma perda de sanidade explícita, porém todas as vezes em que tentava interceder a respeito, estimulá-lo a procurar ajuda profissional ou iniciar qualquer assunto do tipo, Gaara reagia muito mal e quase sempre acabava numa briga sussurrada entre as paredes do quarto do casal, porque mesmo perdendo a calma, não podiam acordar as crianças.

Lee suspeitava que o marido sofria da síndrome de burnout. Um distúrbio psíquico depressivo, de esgotamento físico e mental intenso, relacionado a vida profissional.

Perdera as contas de quantas noites passou com as crianças em sua cama e o notebook no colo, pesquisando sobre a questão e se apavorando, porque achava que Gaara se enquadrava em sintomas demais.

Dedicação intensificada, necessidade de fazer tudo sozinho e imediatismo? Confere.

Descaso com as necessidades pessoais, comer, dormir, sair com os amigos? Confere.

Percebe que algo não vai bem, mas não enfrenta o problema? Confere.

Recusa à socialização; evitar o diálogo e dar prioridade aos e-mails, mensagens, recados etc? Confere com ênfase.

Mudanças evidentes de comportamento, dificuldade de aceitar certas brincadeiras com bom senso e bom humor? Sim, com certeza sim!

Marcas de indiferença, desesperança, exaustão e sensação de que tudo é complicado, difícil e desgastante? Tudo bem, essa podia simplesmente descrever o comportamento normal de Gaara, mas ainda assim, era motivo para se preocupar.

Lee ainda leu, que o último estágio seria um profundo colapso físico e mental.

Desde que pôs os olhos nessa informação, redobrara suas atenções sobre o esposo, mas realmente não vinha sendo fácil, com o tanto que Gaara se punha resistente, até mesmo ao que mais gostava de receber, desde sempre.

Carinho.

No entanto, mesmo possivelmente doente, Gaara ainda era o homem a quem amava e que merecia esse sentimento. Certo?

Juntos, ainda eram a quem todos os amigos chamavam de “maníacos da família”, certo? Isso ainda o fazia feliz... Não fazia?

E por um instante, se sentiu um pouco mal por estar duvidando que Gaara fosse reagir bem a novidade que tinha. Tiveram Metal e Shinki, Gaara se alegrou junto com ele em ambos os casos. Não seria diferente agora.

Seu marido podia estar numa má fase, porém não deixaria de se felicitar sobre aumentar a família. Isso nunca foi o caso, esse não seria Gaara, que pecado pensar assim sobre ele!

Lee então levantou decidido a se preparar para falar com o parceiro de tantos anos. Já haviam passado por tantas coisas juntos, aquilo não os abalaria. Talvez o novo bebê, ajudasse Gaara a entender que precisava cuidar melhor de si mesmo.    

Contudo, surpreendeu-se quando alguém bateu na porta, antes mesmo de conseguir pôr a mão na maçaneta.

Ué, a madrugada já tinha passado? Ficara por ali mais tempo do que imaginou afinal.

Guardou no bolso o último teste de farmácia que fizera e ainda estava em sua mão, os demais, guardou apressado na parte de baixo do armário do banheiro e abriu a porta, que já estava sendo batida novamente com impaciência.

Surpreendeu-se mais uma vez, quando ao fazer isso, deparou-se com seu cunhado.

Quando Kankuro chegara a sua casa? Ele simplesmente não estava ali antes…

— Cara, você ‘tá bem? – O homem interrompeu o que parecia querer dizer realmente para perguntar.

Lee fez uma expressão confusa. A que se devia a pergunta, se estava tão feliz? Notando a dificuldade do outro, Kankuro completou.

— Por que estava chorando?

Nossa, era tão nítido assim?

— Ah, nada de ruim, relaxa... Mas eu devia conversar com o seu irmão primeiro.

Kankuro jogou a cabeça pra trás e fechou os olhos teatralmente murmurando: “Não, você não disse isso...”, porém se explicando antes que desse tempo de Lee estranhar a reação.

— Eu não sou idiota sabia? Eu te conheço há anos, tecnicamente, acabou de me contar... Olha aqui é sério, você tem menos de um dia pra contar pra sua mãe, porque se eu olhar pra ela, ela vai saber que eu ‘tô escondendo alguma coisa e eu não quero ser o alvo da fúria rancorosa daquela mulher!

E Lee riu do temor real na fala dele, pois sempre achou muito engraçada a relação do cunhado com sua mãe.

— Tudo bem, tudo bem, mas primeiro se conta pro pai, não é? – Rebateu ainda com riso na voz. – E não está esquecendo nada?

Kankuro deu um passo atrás e olhou de um lado pro outro no corredor, discretamente, como se estivesse receando ser pego. Quando se viu seguro, puxou o cunhado para um abraço forte enquanto dizia:

— Parabéns pela loucura e pela coragem. Pode contar comigo pra comprar coisas estranhas e te ouvir chorando nesses nove meses, mas nem pense em me pedir pra trocar as fraldas, vou estar ocupado ensinando o Metal e o Shinki a chegar nas meninas. Ou meninos, vai saber né...

Lee se soltou rindo, porém repreendendo:

— Pelo amor de Deus, eles têm dez e nove anos!

— É de cedo que se aprende oras...

Lee revirava os olhos pra aquilo, quando ouviu a voz irritada de Gaara no andar de baixo:

— Kankuro é pra hoje!

E Kankuro sacudiu a cabeça, subitamente se lembrando de algo.

— Ah! Quase esqueci de perguntar. Gaara acha que perdeu uma pasta azul, você sabe onde está?

Lee não ligava a mínima pra pasta, aquela era a primeira vez em alguns dias naquela semana que ouvia a voz do marido em casa, Gaara tinha pernoitado no trabalho as últimas três noites.

Aquele era seu momento.

Julgou que do jeito que as coisas iam, se não falasse naquele instante, do jeito que fosse, teria que contar pelo telefone, deixar recado com uma secretária ou avisar no dia do parto.  

Afastou o cunhado da frente e saiu correndo corredor a diante e escada a baixo.

Kankuro sentiu um arrepio ruim lhe percorrer.

Aquilo não ia dar certo.

***

E a alguns metros de onde os adultos estavam, Metal e Shinki descobriam que seu tio estava correto em seus temores, ainda que não fossem capaz de entender exatamente o que acontecia.

Não vinham entendendo o que ocorria entre seus pais havia um tempo e isso muito os assustava.

Sempre foram uma família alicerçada sobre valores de clareza, mesmo em momentos difíceis, mesmo sobre assuntos complicados, Lee e Gaara sempre procuraram ser honestos com os dois. Até se não queriam por qualquer motivo abordar o assunto, nunca mentiram ou foram evasivos, simplesmente explicavam “não estamos prontos para conversar isso agora, esperem um pouco”.

Sempre houve muito respeito na família Lee-Sabaku.

Mas o que escutavam agora, espremendo seus ouvidos contra a parede – Metal chegando ao cúmulo de usar um copo para tentar escutar melhor – não parecia o habitual de seus pais.

Ambos pareciam tão cansados, tão estressados...

Lee parecia tão preocupado e magoado.

Gaara parecia tão teimoso, tão pouco flexível.

O que Lee tanto queria contar, que parecia estar falando em código? Por que Gaara queria a todo custo evitar a conversa?

Por que ultimamente pareciam tão distantes um do outro, quando antes eram tão unidos, tão calorosos?

A situação lhes parecia tão séria e alarmante, que os irmãos até vinham fazendo um esforço para dar uma trégua na costumeira rivalidade, entendendo que deviam unir esforços para manter sua família como conheciam e gostavam.

Motivo que os mantinham acordados às seis da manhã, espiando a conversa dos adultos que infelizmente não parecia amigável ou positiva como preferiam que fosse.

Por fim, o tio jogou um chaveiro sobre o próprio irmão e o sugeriu irritado que “saísse antes de piorar tudo”.

Como assim?

Gaara saiu e Lee... Estava chorando?

Não souberam dizer exatamente, se estava, foi muito discreto. Só o que os indicava isso, foi o comentário de Kankuro, que dizia mais ou menos: “Não fica assim, eu vou conversar com ele...”.

Mas isso não pareceu suficiente para acalmá-lo, pois este rebateu um “não precisa”, cujo complemento, por algum motivo, Lee não foi capaz de terminar e as crianças apenas ouviram seus passos escada a cima.

E então silêncio.

Metal e Shinki se afastaram da parede e se entreolharam, havia tanto sono e pavor misturado naqueles rostinhos, que não precisaram de muitas palavras para entenderem os sentimentos um do outro.

Calados, sentaram-se os dois na cama do Metal, que pegou o próprio celular – conseguido depois de muita insistência e promessas de que não se esqueceria do é que ser criança por causa dele – e fez uma chamada de vídeo para seu irmão informalmente adotivo.

Digamos apenas que nada no mundo podia impedir Gaara e Lee de tratarem Iwabe dessa forma.

Iwabe era mais velho, Shinki e Metal recorriam muito a ele por isso, em busca de respostas que suas mentes ainda sentiam dificuldades em atingir sem embolar tudo em fantasia no meio do caminho.

E como todo bom adolescente, Iwabe achava péssimo ser despertado tão cedo.

— É bom que o mundo esteja acabando! – Sentenciou em tom de ameaça ao atender a chamada, ainda embolado nos lençóis.

— O mundo ainda não, mas o casamento dos nossos pais acho que sim. – Metal explicou.

— Como é que é!? – Iwabe estava totalmente acordado agora e eles tinham toda sua atenção.

***

Pouquíssimo tempo depois, Iwabe chegou a casa Lee-Sabaku, acompanhado de um sonolento e desentendido Denki.

Lee ficou muito surpreso em ver os dois na soleira de sua porta tão cedo, parecendo tão desarrumados e aflitos,

— Não tem aula hoje? Eu já estava indo chamar o Metal e o Shinki e...

Iwabe não pensou duas vezes antes de mentir:

— Não tem aula hoje, é conselho de classe, eles não te avisaram?

Poucas pessoas arrumariam uma desculpa tão rápido e de forma tão deslavada.

Denki desviou o olhar de Lee na mesma hora, querendo evitar estragar tudo. O seu forte já não era mentir ou atuar.

— Entendo... Acho que eles esqueceram. Ou a escola deve ter avisado ao Gaara e ele simplesmente terceirizou o recado, que nunca chegou aqui...

E a forma quebrada e exausta como o homem que os adotou em seu coração disse aquilo, os fez compreender melhor o que Metal e Shinki haviam dito em vídeo.

Não pensaram duas vezes antes de surpreendê-lo novamente e o envolverem num abraço apertado.

Denki chegou até mesmo a dizer:

— Vai ficar tudo bem pai, a gente promete.

Lee se viu lutando com os olhos que lacrimejavam pelo que já devia ser a décima vez naquele começo de dia, se perguntando como eles adivinharam que precisava ouvir aquilo naquele momento e se não causava ainda mais problemas pra eles em suas casas, terem parado de chamar os pais biológicos assim, para trata-lo dessa forma.

— E-entrem... – Começou puxando aqueles que não eram menos seus bebês dos que os que havia gerado. – Acho que Metal e Shinki ainda não acordaram, mas espero que nada de ruim os tenha trazido aqui a essa hora.

Dizer isso de repente fez sua mente dar uma espécie de estalo.

Se afastou uns dois passos para olhá-los melhor e perguntou já quase cerrando os punhos.

— Vocês estão bem, não estão? Eles não fizeram nada dessa vez, fizeram?

E por “eles”, Lee se referia aos progenitores dos meninos, com os quais já tivera muitos problemas no passado, por descobri-los sendo agressivo com as crianças, que com o tempo, acabaram por tomar costume em fugir pra lá, quando as coisas ficavam muito complicadas em casa.

— Não, não! ‘Tá tudo bem, a gente só quis vir cedo pra passar mais tempo com vocês, desculpa por não termos avisado...

Teria sido mais insistente, averiguado melhor toda a situação, mas naquele dia, precisava tanto se cercar do amor de sua família, que simplesmente aceitou as respostas que tinha e os deixou se encaminharem para o quarto dos irmãos, enquanto foi pra cozinha, animado em preparar uma bela mesa de café da manhã pra eles. Algo que sempre lhe proporcionava muito prazer em fazer.

*** 

— Eu não admito isso! Isso não pode acontecer! Eu não fui finalmente adotado por uma família decente, pra ver ela acabar assim, a gente não pode deixar isso continuar! – Iwabe dizia nervoso, andando de um lado pro outro do quarto, quase a beira do pânico.

— O Iwabe é mais velho, ele não vai se desesperar, ele vai saber o que fazer, você disse... – Shinki comentou sarcástico e desaprovador, encarando Metal.

— Como eu ia adivinhar que ele ia surtar mais que a gente? – O garoto de cabelos iguais aos de seu pai Lee, comentou erguendo as mãos com inocência.

— Vocês vivem aqui, tem que entender porque isso está acontecendo! Se a gente souber porque estão bravos, vai ser mais fácil de consertar!

— Iwabe fala baixo, dá pra ouvir sua voz lá do corredor! – Denki entrou no quarto alertando e colocando sobre a escrivaninha, uma porção do que inicialmente, pareciam palitos esquisitos coloridos entre o rosa e o azul. – Mas respondendo a sua pergunta, talvez seja por isso.

— Que diabos é isso? – Foi Metal quem perguntou, porém facilmente poderia ter sido Shinki.

— Acho que entendi... Talvez o pai Gaara ache que quatro é o limite dele. Onde estava isso Denki? – Iwabe perguntou, já voltando a soar como o mais velho e sábio.

Gostava e frequentemente se aproveitava de ter os menores o vendo como referência. Era bom ser o líder respeitado em algum aspecto de sua vida, para variar.

— Muito mal escondidos no armário do banheiro. Achei quando fui procurar uma toalha de rosto...

— Vão dizer o que é isso ou vão ficar só fazendo essas caras fajutas de inteligência? – Shinki disparou mal humorado, porém sem perder a oportunidade de dizer alguma palavra que a maioria das crianças de sua idade não iria pensar.

— Vocês disseram que parte do que ouviram nossos pais discutindo hoje cedo, foi o pai Lee dizendo que precisava contar alguma coisa, certo? E se não ouviram tudo? E se ele contou, o pai Gaara não ficou contente e esse é o problema? – Iwabe rebateu.

Shinki levantou-se de onde estava sentado, muito sério, a postura de quem não teve certo trabalho para pôr os pés no chão e parou de frente a Iwabe com o rosto esticado para encará-lo o melhor possível.

— Eu juro que deixo seu olho roxo, se não parar de enrolar.

— Como se fosse conseguir... – O mais velho dos quatro debochou.

Kankuro abriu a porta do quarto surpreendendo-os e eles se viraram assustados, como se estivessem fazendo algo muito errado.

O tio teria passado sem olhar muito, se não tivessem se entregado com as expressões. Então ele entrou no quarto e viu o que Denki tinha trazido.

— Ah pronto, mais essa agora... – Lamentou.

Ao invés de se lamentar terem sido descobertos, Shinki aproveitou para perguntar para alguém realmente mais velho e considerável.

— O que isso quer dizer?

Sabendo da regra do irmão de não mentir pros filhos, Kankuro se viu resignado a verdade e achou que rodeios não seriam justos.

— Quer dizer que vão ganhar mais um irmão. Se puderem evitar o assunto até seus pais se acertarem sozinhos, a paz na casa agradece e talvez, frisem bem a palavra talvez, eu fique lhes devendo um favor.

— Mas a gente quer ajudar! – Denki tomou coragem de se pronunciar.

— Ah querem? Se tiverem oportunidade, peçam pro Gaara pegar mais leve e vir pra casa. Agora desfaçam essas caras de preocupação e vão tomar café. Andem!

Sendo expulsos do quarto pelo tio com aquelas palavras, os quatro só fizeram ter mais certeza, de que o problema era Gaara não ter ficado feliz sobre a notícia.

Tomaram café o mais rápido possível, porém a cada cinco segundos, um deles se importava em dizer alguma aleatória frase otimista para Lee, que estranhou, mas por fim apenas comentou um “é bom que já estejam tão cheios de juventude logo cedo”.

Voltaram correndo pro quarto logo que acabaram, sob o olhar analítico de supervisão de seu tio, que resolveu por bem cancelar seus compromissos e não deixar Lee sozinho naquele dia.

Uma vez sozinhos novamente, sentaram-se em círculo no chão. Denki em seu notebook, pesquisando casos semelhantes que pudessem lhe servir de referência, na internet e os outros três se lamentando e questionando, o que teria feito Gaara reagir assim.

Será que haviam o traumatizado sendo maus filhos?

Será que o haviam feito se cansar de crianças?

Como iam consertar isso?

Por fim, Denki se cansou da aura pesada que aquilo estava criando e sentenciou.

— Isso não pode ser verdade! Iwabe, por que ele adotaria a gente se já não aguentasse mais crianças? Metal e Shinki, quando foi que ele destratou a gente pra vocês acharem que ele criou trauma, ranço ou seja lá o que for!? Não pode ser isso... Eu acho que o problema é que adultos as vezes ficam com tantos problemas, que ficam cansados e confusos, esquecem do que realmente são ou do que importa. Eu vejo isso muito no meu... Outro pai... – Era um pouco complicado falar sobre isso, mas o menino achou que valia a pena. – Ele, que nem o pai Gaara, também trabalha muito. Às vezes eu penso que isso faz eles pensarem que não vai dar pra fazer mais nada...

Os outros garotos se calaram numa compreensão silenciosa.

— Mas então o que a gente faz agora? A gente não vai deixar eles se cansarem um do outro e se separarem, não é? – Metal questionou sinceramente tenso.

Denki se levantou, como se fizesse alguma diferença em sua estatura, encheu o peito de ar com determinação e proclamou.

— A gente vai fazer ele se lembrar do que importa, a gente vai convencer o pai Gaara de que dar pra gente um outro irmão, vai ser ótimo!

— E como acha que a gente vai fazer isso? Vamos invadir o trabalho dele? – Iwabe tinha certa dificuldade em assimilar as ideias de outras pessoas como boas.

— Não, a gente vai trazer ele pra cá. O seu cérebro maligno vai criar alguma coisa, com certeza.

O pequeno tinha mesmo um plano afinal.

— Mas e daí se a gente fizer ele voltar? Ele não ouviu o pai Lee, vai ouvir a gente? – Dessa vez foi Metal quem levantou uma dificuldade.

— Nós temos o Shinki! – Denki falou como se dissesse “xeque mate”.

— O que tem eu? – O mais novo no cômodo se espantou com a citação.

— Você não vive de analisar o seu pai e tentar imitar? Você não fica se gabando que o entende tão bem? Então é o mais próximo que a gente tem de como funciona a cabeça dele. Vai arrumar uma abordagem que ele entenda.

— E o que eu e você vamos fazer? – Metal agora já parecia mais animado.

— Nós vamos criar os argumentos pra o convencimento.

Pela primeira vez no dia, os quatro compartilharam de um indescritível brilho no olhar.

***

 E quando mal tinha dado meio dia, a campainha da casa soava e Lee imaginou ao se levantar pra atender, que deveria ser alguém tentando vender cosmético ou coisa parecida, porque não esperava ninguém.

Em especial, não esperava um Gaara ofegante como se tivesse corrido dez quadras e tenso como se acabasse de ter escapado de um assalto.

“Ai meu Deus, eu sabia que o cérebro dele ia pegar fogo e derreter!” – Lee não pôde evitar o pensamento.

— Como assim você me avisa por mensagem de texto!? – O ruivo desgrenhado exclamou quase irado.

— Eu o que? – Lee estava realmente confuso, enquanto abria mais a porta para que seu esposo entrasse.

— Vocês já foram pro hospital!?

Lee jurava que havia uma veia saltando perigosamente no canto da testa do marido.

Tudo bem que não tinha mandado mensagem nenhuma, mas ele só podia estar falando sobre o que estava pensando… Certo? Era a única notícia que julgava ter pra avisar...

— Calma! Porque está tão nervoso? Porque eu iria ao médico correndo? Não é uma emergência...

— Como assim não é uma emergência!? – Gaara bradou inconformado.

Antes que Lee pudesse contestar porque ele estava tendo aquela reação tão desmedida, as crianças todas apareceram correndo no meio dos dois.

Metal sacudia os dois braços, quase gritando pra Gaara:

— Pai eu tô bem! Não aconteceu nada, meu braço tá ótimo, olha!

— E eu sou inocente, juro! – Shinki achou por bem pontuar.

— Para todo mundo! O que está acontecendo aqui!? – Foi a vez de Lee impôr sua voz.

Gaara começou a ritmar sua respiração e tentar resumir.

— Pelo que eu entendi, nossos filhos faltaram aula, mentiram pra escola a respeito e mentiram pra mim, pegando o seu celular e dizendo que o Shinki tinha quebrado o braço do Metal. Vocês me queriam em casa só pra botar todo mundo de castigo pessoalmente? É isso?

— Colocando dessa forma, o senhor faz parecer muito pior do que realmente é…

Gaara olhou chocado para Denki. Não esperava essa ousadia vinda dele. E por receber tal olhar, o menino quase desfez no chão.

— Por que fizeram tudo isso? Lee, como eles fizeram tudo isso do seu lado!? – Gaara sentia que precisava de um ótimo motivo para ter jogado toda uma pilha de cálculos pro alto.

— Agora a culpa é minha!? Considerou por um segundo, que se fosse fácil te encontrar, eles não teriam sentido que precisavam tramar tudo isso? – Lee rebateu exasperado.

— PAREM COM ISSO OS DOIS! – Metal berrou decidido, o que alarmou ambos os pais.

Com a atenção obtida por ele, Iwabe declarou.

— A gente sabe que tudo isso foi errado e sentimos muito, mas não achamos outro jeito. Podem nos dar o castigo que quiserem, só que depois que ouvirem o que fizemos.

Gaara abriu a boca para dizer algo, enquanto Lee olhava com a expressão franzida em curiosidade cautelosa para a situação.

Shinki estendeu a mão para o pai e pediu, tentando soar formal como era de seu costume:

— Acompanha a gente por favor. Só uns minutinhos…

Então Gaara e Lee se entreolharam por um segundo. Lee chegou até a se emocionar, fazia certo tempo que não invocavam tal sintonia, a que os fazia poder dispensar a troca de palavras antes de decidir algo.

Mas dissipou isso rápido, os meninos pareciam ansiosos. Acenou positivamente para o esposo e o viu relaxar um mínimo quase imperceptível, porém que para si, representava muito.

Gaara largou a bolsa no chão, como se não importasse com ela – ao menos naquele instante – e seguiu com as crianças.

Lee estava pronto para sacudir a cabeça, saindo do torpor mágico que a cena lhe causou, quando Kankuro o impediu segurando um de seus ombros e sussurrando em seu ouvido.

— Vem comigo, deixa eles acharem que estão sozinhos. Deixa as crianças trabalharem…

Lee ainda tinha alguns receios, porém resolveu confiar no sorriso faceiro e cheio de esperança do cunhado.

Enquanto o acompanhava, caminhando às escondidas pela própria casa, até um ponto em que se podia ver bem a sala de TV sem serem notados, questionou sem saber se acusava ou agradecia.

— Está metido nisso?

— Não. Eles fizeram tudo sozinhos, eu descobri só cinco minutos antes de vocês. Temos que dar crédito aos pestinhas, são bons no que fazem…

Kankuro tinha um jeito muito peculiar de ver as coisas…

***

As crianças posicionaram o pai no meio do sofá, bem de frente pra televisão que Denki já havia dado um jeito de conectar ao notebook.

Antes que Gaara perguntasse pela terceira vez do que se tratava, Metal parou na frente da TV com um papel nas mãos, pretendendo dizer algo.

Não tivera tempo de decorar a primeira parte, mas estava tudo bem, isso era o de menos.

Não julgava estar indo mal, até Iwabe gritar “lê logo” e Metal levantar os olhos, realizando que todos, especialmente seu pai, estavam prestando atenção.

O garoto imediatamente começou a suar frio, quase tremendo e sair da primeira linha, parecia impossível com o tanto que gaguejava.

Shinki revirou os olhos e puxou o papel da mão do irmão.

Mesmo sem saber ainda sobre o que se tratava tudo aquilo, Gaara se compadeceu do filho. Levantou o abraçou e levou pra sentar-se ao seu lado, sem soltá-lo.

— Ei, porque está tão nervoso? Vocês estão me assustando com esse suspense todo.

— É… É que… É muito importante! – O menino deixou escorrer uma lágrima.

Ele parecia tanto com Lee...

Gaara o aconchegou mais forte junto a si. Mal começaram e já estava profundamente comovido.

Um pouco mais distante, Kankuro susurrava pra Lee, explicando como as crianças haviam descoberto, divertindo-se com as expressões exageradas que ele fazia a respeito.

— Nós queremos te convencer da nossa opinião sobre uns assuntos muito sérios e como conseguir a sua atenção estava muito difícil, recorremos a isso. Desculpa pela parte em que te assustamos, mas não tinha outro jeito de te trazer pra casa. Pra facilitar, achamos que o senhor ia entender melhor, se imaginasse que está no trabalho, então…

Estava tão difícil pra Gaara, não demonstrar o quanto estava atingido com aquilo, quanto pra Kankuro, tentar impedir que Lee chorasse alto demais e revelasse seu esconderijo, os impedindo de continuar espiando.

— Espera… – O ruivo interrompeu a leitura de Shinki. – Porque você acha que eu só vou entender o querem dizer desse jeito?

Nesse instante, Kankuro pensou sinceramente, quase alto: “Aonde nossos pais erraram com você, pra ser tão lerdo?”.

Já Rock Lee, só faltou se iluminar inteiro de tamanha esperança.

“Finalmente ele perguntou, agora vai dar certo…” .

— É… É que parece que trabalhar é o que o senhor mais gosta de fazer então… – Denki se encorajou a tentar explicar.

Vendo a dificuldade do menino em comentar o assunto, Gaara não o deixou terminar.

— Entendo… – Sua voz saiu quase como um lamento, enquanto se lembrava de todas as vezes que Lee tentou chamar sua atenção sobre isso.

Não devia ter subestimado o alerta de seu esposo.

Mas agora não havia muito o que fazer. As crianças tinham claramente se esforçado, no mínimo, devia lhes deixar fazerem sua apresentação sobre o que quer que fosse.

Contudo, o clima um tanto quanto triste e tenso se dissipou quase numa gargalhada, que felizmente Gaara conteve, as custas de um pequeno engasgo, quando se deparou olhando para um slide do PowerPoint, cujo título garrafal dizia: “Porque devemos ter mais um irmão e porque vocês não devem se separar”.

Gaara mal tinha parado de tossir e Iwabe já estava a sua frente com um copo d’água.

— Sabia que isso ia acontecer… – Comentou o jovem, orgulhoso de si mesmo pela previsão assertiva.

Lee emocionado com o trabalho de suas crianças, viu o marido aceitar a água quase tremendo, enquanto continha o riso.

— Mas de onde vocês tiraram que…

Kankuro desistiu de se manter nas sombras e puxou Rock Lee consigo, aparecendo na sala a tempo de interromper o irmão.

— Olha aqui, tenha a decência de deixar eles terminarem ou eu juro que dou na sua cara na frente dos seus filhos!

Rock Lee se sentou ao lado do esposo, tentando bravamente fingir que não estava um tanto quanto nervoso.

De todas as maneiras inusitadas que poderia ter pensado dar aquela notícia, um slide PowerPoint apresentado por quatro crianças, jamais lhe passaria pela cabeça.

Por um segundo trocou um olhar com o cunhado, claramente querendo dizer: “Será que ele já entendeu?”.

E o que Kankuro devolveu no silêncio, poderia facilmente ser traduzido por: “É claro que não, é o Gaara!”.

De fato, dava praticamente pra ver engrenagens trabalhando a todo vapor em sua mente, enquanto o pequeno grupo infantil dava seu melhor.

Era nítido o quanto eles haviam se esforçado, para que Gaara não tivesse argumentos para contrariá-los. Fizeram até alguns gráficos, ainda que não cem por cento corretos, o que o lado fascinado por matemática do ruivo ignorou com certa dificuldade.

Ambos os pais não conseguiram se impedir de comentar vez ou outra, que se tivessem tido esse mesmo empenho na escola, alguns problemas teriam sido evitados.

Iwabe prontamente fingiu que essa parte não lhe dizia respeito em especial.

Quando por fim terminaram, tendo conseguido dissertar sobre motivos que iam do financeiro ao emocional, passando por argumentos cômicos no meio do caminho, como quando Iwabe e Denki disseram que um bebê novo, seria um ótimo motivo para mandarem Shinki e Metal ficarem em silêncio por algumas horas, Gaara sentia que seu espírito havia sido mastigado e cuspido.

Permitira que sua família chegasse ao ponto em que suas crianças achavam que ele precisava de uma intervenção.

Pela primeira vez em muito tempo, Gaara desacelerou, olhou ao seu redor e percebeu o quanto estava assustando as pessoas que amava com seu comportamento obcecado.

Quando se curvou pra frente buscando algum apoio nos próprios joelhos, Lee entendeu que enfim, seu marido havia enfim sentido o cansaço que acumulou todo aquele tempo.

E percebera que não valia a pena.

Achou que poderia sentir o mesmo aperto no peito que sabia estar sendo sentido pelo homem tão quebrado e exausto a sua frente, quando o ouviu perguntar em sua epifania.

— Isso foi só ideia deles ou você também achou que eu não queria mais continuar casado?

Uma vez que ele já estava se sentindo mal, talvez pudesse considerar dar uma resposta amena.

Mas não foi assim que sua mãe lhe ensinara a responder perguntas diretas.

— Gaara eu... Eu vinha honestamente me perguntando se você ainda se lembrava de quem eu era...

E isso o doeu mais do que um soco direto no rosto.

Lee sabia, porém não se arrependia de ter dito. Se era pra terem uma intervenção que fosse decente e de uma vez só.

No entanto, isso não o impedia de ter a doçura habitual para com o esposo e se pôs a secar o rosto dele com as costas da mão, enquanto lhe sorria, verdadeiramente contente por vê-lo começar a admitir que estava com problemas.

Metal que ainda estava aconchegado abraçado ao pai, comentou insatisfeito.

— Nós não fizemos isso tudo pra deixar vocês mais tristes...

— Não, não é exatamente tristeza é que... Dói perceber que eu errei tanto com vocês. Eu sinto muito, de verdade. Eu não sei explicar eu só... Eu me perdi nos meus objetivos. Estou orgulhoso do que me fizeram hoje, obrigado meninos. – Gaara chegou a fechar os olhos pra falar, pois parecia difícil encarar as pessoas no momento.

Mas acabou os reabrindo tomado pela surpresa de ter sido subitamente abraçado por Denki.

— Sabia que o senhor ia entender! – O pequeno desabafou contente.

Shinki e sua mania de analisar seu ídolo tão profundamente, encarando que o olhar do pai parecia menos vago do que andava sendo, comentou também aliviado, porém não menos sério e simplista do que sua armadura permitia.

— É bom te ter de volta papai.

— Ei vocês dois, não se façam de durões, vocês querem abraçar também que a gente sabe, vão logo! – Kankuro estimulou Shinki e Iwabe, que acabaram cedendo.

A família perdeu tanto tempo amontoada no silêncio desafogado de quem não precisava dizer mais nada, de quem já havia entendido sua conquista, que não repararam em Kankuro gravando tudo.

Aquilo com certeza, só seria assunto pra mais tarde.

Por hora, Gaara finalmente se atentou no que quase estava deixando passar.

— Mas… Eu não sabia que queriam tanto assim ter outro um irmão, vocês nunca disseram nada a respeito. De onde veio isso?

As crianças se olharam confusas por um segundo e antes que a situação piorasse, Lee esclareceu seus filhos.

— A apresentação foi linda, mesmo. Mas o que vocês não sabiam, é que eu ainda não tinha contado pro seu pai. Nós não nos desentendemos mais cedo por isso, foi... Outra coisa. Eu queria contar, mas ele não tinha tempo...

Shinki bateu a mão na testa e resmungou:

— Eu sabia que a gente ia errar em algum lugar... O plano não foi meu se isso ajuda.

— Seu traíra, já está tirando o seu da reta, você planejou sim! – Metal tentou se soltar e ir pra cima do irmão, porém Gaara o manteve seguro em seu lugar e Lee puxou Shinki pra perto de si e afastado o suficiente de Metal pra não causar atrito.

— Espera aí todo mundo! – Gaara precisou falar um pouco alto pra cessar o burburinho que as quatro crianças ergueram repentinamente. – Eu acho que eu não entendi direito...

— Ah não... – Kankuro já ia levantar e sacudir o irmão caçula, porém também foi contido por Lee, que o empurrou de volta ao sofá, se sentindo a própria “Mulher Elástico”, personagem de uma animação que assistira com os filhos outro dia.

Era o seu momento de fala enfim e no meio de tudo o que já haviam enfrentado, a lentidão de seu marido tinha até lá seu charme.

As crianças sabiamente se afastaram um pouco e deixaram Lee chegar mais perto e segurar a mão do esposo, enquanto o encarava tentando passar seriedade para que este não pudesse achar dúvida no que dizia, apesar de seu sorriso incontido.

— Entendeu sim, é exatamente isso, nós vamos ser pais mais uma vez. E antes que você fique assustado ou levante alguma dificuldade, eu quero deixar bem claro que estou muito disposto a fazer isso dar certo.

Kankuro com certeza iria separar um tempo na madrugada para desenhar a expressão sutil de seu irmão naquele segundo.

Sutilmente boquiaberta, ele arregalou os olhos por um segundo e então os piscou algumas vezes até sacudir a cabeça, como se isso fosse fazer tudo se ajeitar dentro dela.

Definitivamente, agora ele havia juntado as peças e entendido o pensamento que levou aos atos de cada um ali naquele dia.

Gaara olhou mais uma vez para os filhos, rapidamente para o irmão que murmurava um “aleluia” e então novamente para Lee.

— Então hoje de manhã o que estava tentando dizer era... E eu fui tão...

Lee não o deixou continuar.

— E você vai fazer de novo ou vai aproveitar a segunda chance pra ter uma reação decente?

Não era nada comum que fizessem isso na frente do resto da família, mas o momento definitivamente valia a pena ter puxado seu marido para um beijo. Mesmo que breve, mesmo que casto, ainda que entre um sorriso.

Ainda que no meio disso, tenham misturado suas lágrimas.

No entanto, chorar valia a pena quando por felicidade.

O segurou num abraço firme por um minuto inteiro, sentindo a apreensão de estar segurando todo o seu mundo com o ato, porém incrivelmente isso o fez se sentir mais forte.

Como uma verdadeira injeção de adrenalina.

E quando Gaara o soltou Lee pode ver seu olhar se transformar para algo que chegava a lembrar raiva.

Lee tinha muitas ressalvas sobre esse tipo de olhar e naquele instante em específico, precisou que Gaara o elucidasse a respeito.

— Também estou disposto a fazer isso dar certo Lee e a compensar vocês por ter faltado esse tempo.

Disse e se levantou, ao que Lee foi atrás, ainda preocupado com a intensidade estranha que viu nos olhos do marido, seguido por uma corda de crianças na contenção.

Mas Gaara apenas caminhou até a porta aonde havia deixado caída a bolsa que levava e se abaixou ali até achar seu celular, retornando a sala, ignorando estar achando engraçado o som de tantos passos seguindo sua sombra.

Se sentou e pediu silêncio depois de alguns cliques no aparelho.

E eis que segundos depois, uma voz vinda dali preencheu a sala.

— Acho bom ter lembrado que têm emprego, porque eu preciso de você aqui em cinco minutos.

— Meus filhos estão bem, obrigado por perguntar. – Gaara rebateu, enquanto as crianças sussurravam nos ouvidos uma das outras, até concluírem que ele estava falando com seu chefe.

— Crianças quebram alguma coisa o tempo todo, o que tem demais? Vai vir ou não? – O homem amargo do outro lado da linha devolveu.

Lee cerrou os punhos, contente por aquilo ser só uma ligação, pois do contrário já teria socado o rosto daquele indivíduo nojento.

Como ele falava daquele jeito sobre seus filhos? Como ele falava daquele jeito com seu marido?

Agora entendia porque Gaara nunca o deixava ter contato com ele.

Era praticamente a primeira vez que o ouvia.

Era com aquele tipo de abuso que seu esposo lidava todos os dias há tantos anos, porque achava que devia, porque aquilo o ajudava a manter sua família.

O jeito imperativo daquele homem lembrava seu sogro, Lee compreendeu então que no fundo, talvez Gaara tenha se perdido porque em algum canto de sua mente, ser excelente em seu trabalho, soava como provar ao pai que conseguia tudo o que ouviu que nunca seria capaz.

“Você não precisa disso”, fez questão de murmurar pra ele, que apenas sorriu pequeno e quebrado de volta, numa espécie de “agora eu sei”, para em seguida responder seu patrão.

— Não. Na verdade, eu liguei para pedir demissão.

— Como é? Não pode fazer isso agora! Estávamos no meio de... Gaara, você está comigo há anos, como eu vou arrumar outra pessoa que faça o que você faz no mesmo ritmo? Está me dizendo que eu desperdicei todo esse tempo que gastei fazendo de você o profissional que é hoje? E de qualquer forma, você é obrigado a me dar pelo menos um aviso prévio!

Definitivamente, aquele homem se parecia muito com Rasa.

— Nós sempre estamos no meio de alguma coisa, eu sou seu funcionário não seu escravo. Nada que desrespeita a mim te interessa, então isso também não é da minha conta. Se quer uma dica, se tratar o próximo contador melhor do que tratou a mim, ele vai se encaixar bem rápido. E você não me fez como profissional, eu te ajudei a montar sua empresa do zero e não fico me gabando. Sobre o aviso prévio, a verdade é que ninguém é obrigado. Desconta da minha rescisão e é isso, eu passo no RH amanhã cedo. – A voz furiosa e inconformada do outro lado resmungava, quando Gaara finalizou. – Ah, e não precisa se incomodar com a carta de recomendação, realmente não faço questão. Queria dizer que foi um prazer, mas não... Então, espero que até nem tão cedo.

E encerrou a ligação se surpreendendo com o quanto se sentiu liberto ao fazê-lo.

Jamais havia parado pra reparar o quanto aquilo o causava peso.

Podia ser um tanto quanto mórbido, mas dessa vez, Lee adorou ver o fogo de maldade genuína que tomava as orbes de marido.

Gaara sentia que tinha acabado de esmagar alguma coisa. Ou alguém.

Podia não entender muito de administração e contabilidade, mas pelo desespero do homem, Lee concluiu que Gaara o tinha deixado numa péssima situação. E sabia disso.

— Vou colocar na minha lista de metas, me demitir assim algum dia… – Iwabe comentou e Shinki concordou de imediato.

— Eu realmente espero que vocês não precisem disso. – Gaara fez questão de pontuar.

Mal teve tempo de acabar a frase e Lee já o tinha envolvido num abraço, que lhe tirou o ar por quase meio minuto.

— Estou tão orgulhoso… Prometo que vamos dar um jeito, vai ficar tudo bem. Você é bom no que faz, pode trabalhar onde quiser.

— Aqui parece ótimo.

E quando Gaara disse isso, Lee sentiu que podia soltar fogos de artifício pelos olhos.

Há tempos vinha propondo que Gaara trabalhasse de forma autônoma, num home office, mas ele sempre recusava.

Eram tantas boas notícias num dia só.

Voltou a sufocar o marido num abraço, sem o menor arrependimento.

Mas pra ficar perfeito, um verdadeiro final feliz, ainda faltava alguma coisa.

Ou todo aquele transtorno corria o risco de se repetir em pouco tempo.

Com isso em mente, soltou o esposo subitamente, agarrou o celular mais próximo e pôs sobre a palma da mão dele.

— Por favor, é só isso que falta pra fechar o momento.

Gaara franziu a expressão confuso por um segundo, até que de soslaio viu seu irmãozinho lhe facilitar e balbuciar a dica.

Para Kankuro ter advinhado tão fácil, Lee realmente devia ter alugado seus ouvidos ao longo da manhã.

— Ah sim… Tudo bem eu prometo que vou marcar um horário com a psicóloga que a sua mãe indicou, mas pode ser amanhã? Agora eu preferia ligar pra algum lugar que entregue comida a domicílio. Pode ser?

Lee tinha sérios receios de que isso fosse só uma tentativa de esquiva, porém admitia que ele tinha um bom ponto.

Preferia gastar aquela tarde com coisas que não incluíam ir pra cozinha pelas horas que requeriam, fazer comida pra tanta gente.

E claramente, Gaara ganhou o voto das crianças com isso.

Estavam tão ansiosos para passar um tempo em família, com os dois pais presentes, que qualquer outra coisa parecia poder esperar.

— A gente pode fazer uma sessão de filmes pra comemorar? – Denki propôs, já quase correndo pro notebook e clicando colocando na Netflix.

— Eu escolho o filme! – Shinki falou apressado, sabendo que se não fizesse, Metal faria e teria que assistir filmes antigos do Bruce Lee, pela enésima vez.

E antes mesmo que os pais dissessem qualquer coisa, Iwabe suspirou resignado e saiu andando em direção a porta, enquanto dizia e era seguido pelos irmãos:

— Eu vou ali na outra rua, chamar o Itama alguém tem que segurar o escândalo do Metal, porque com certeza o Shinki vai escolher o pior filme de terror da face da Terra…

Itama era filho mais novo de uma família de vizinhos, que conseguiu a proeza de ter ainda mais membros que os Sabaku-Lee. Agora na altura de seus dezoito anos, ganhava uma bela renda extra a sua mesada, desde os quinze, com serviços de babá periódicos para as crianças de Lee e Gaara.

Os pais do garoto certa vez brincaram, que naquele ritmo o casal acabaria conseguindo pagar a faculdade do filho. Mas ultimamente, Itama vinha começando a se sentir mal em aceitar o dinheiro, pois as crianças, assim como seus progenitores o tratavam tanto como a um familiar, que parecia errado cobrar pelo que fazia no fim das contas, momentos entre amigos.

E a verdade era que Shinki e Metal não precisavam mais de babá, principalmente depois da chegada de Iwabe. No entanto, as crianças já haviam se acostumado a ter o adolescente as tutelando e até o chamavam frequentemente, por conta própria, quando seus pais sequer tinham saído.  

Lee ia lhes ralhar alguma coisa, mas Gaara interveio.

— Deixa eles, eu não consigo pensar em nada melhor pra fazer agora, você consegue?

Lee fez que não a cabeça. Estava radiante, a ponto de se beliscar pra conferir se aquilo não era um sonho.

Ia beijar o marido, mas Kankuro pôs a mão no meio sem a menor cerimônia.

— Desculpa interromper o “felizes pra sempre” de fim de novela, mas eu ainda tô aqui, não preciso ver isso e tem algo muito importante que vocês estão esquecendo…

Ele estava tão sério, que o cunhado e o irmão chegaram a sentir um arrepio de apreensão.

— A Nori! As crianças vão contar pro Itama e ele vai contar pro mundo inteiro! Se ela e o Gai forem os últimos a saber, nós três vamos precisar do plano funerário…

— Ai meu Deus, a minha mãe! É verdade! Vai ter que ser pelo telefone mesmo! – Lee saiu correndo em busca do próprio celular, reconhecendo a gravidade do alerta de Kankuro.

— Faz pelo menos uma chamada de vídeo! – Berrou vendo o cunhado se afastar.

Gaara parando de rir e colocando a mão nos bolsos, comentou com espantosa naturalidade:

— Bom, pelo menos a gente não precisa se preocupar em ligar pra mãe nesses momentos…

— Ai cara, essa doeu… – Kankuro repreendeu, porém não conseguiu deixar reconhecer o humor negro bem colocado.

Esse era o jeito do irmão de dizer que sentia falta dela. O entendia e não o culpava por não querer fazer disso um drama naquele momento.

Kankuro se afastou, porque provavelmente queria aparecer na chamada e dizer um “eu que lembrei os ingratos de fazerem a ligação”. Gaara ouviu meio distante o irmão chamá-lo para acompanhá-lo, mas preferiu esperar Lee adiantar o assunto sozinho.

Momento mãe e filho, que tivessem privacidade, pelo menos de sua parte.

Então se viu só por apenas dois segundos. Tempo suficiente para observar sua casa, para se reconhecer naquele espaço.

O cheiro característico de lavanda, devido a mania de limpeza de Lee, as coisas de Metal espalhadas em alguns cantos…

Como pôde fazer justamente o que tanto criticou em seu pai? Se afastar daquilo.

Quando de repente a porta se abriu e Itama entrou seguido das crianças, correndo e esfuziante lhe parabenizando enquanto roubava um abraço e dizia ter sentido falta de vê-lo ali, se pegou deixando escapar quase num sussurro.

— É muito bom estar em casa.

E sob o olhar acolhedor de seus filhos, sentiu que nada superaria o poder daquilo.

Não precisava buscar grandeza e reconhecimento em qualquer outro lugar, quando já a tinha em seu próprio lar. 


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Notas finais do capítulo

https://fanfiction.com.br/historia/766075/A_forca_da_juventude/

Espero que tenham gostado e que queiram me contar a respeito.
Beijos de luz! o/



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