Capítulo 1

O Estranho

Não gostamos de sermos julgados, porém julgamos os outros.

Mais um dia do ano normal para mim, o som do meu celular começava a tocar, anunciava que eram 6 horas da manhã, hora de levantar e ir para a escola, eu não estava nem um pouco animada esta manhã para agüentar mais um dia de aula – cansativo como sempre. O despertador não parava de tocar, ainda com os olhos fechados, taquei meu celular de cima da escrivaninha para longe, resolveu, ele parou de tocar, voltei a dormir.

Acordei com barulho das batidas na porta que minha mãe dava, queria pedir para que me deixasse dormindo, não consegui achar minha voz aquela mar de inconsciência que me rodeava.

_Lisi, vamos acorda! Você vai perder a hora! Já são seis e meia! – minha mãe falava atrás da porta, com uma esperança vã de me fazer levantar, ainda não conseguia falar. De repente sinto um frio em minhas pernas – minha mãe acabara de puxar minhas cobertas. Dessa vez não teve jeito, ela definitivamente conseguiu me acordar.

Levantei e fui direto tomar banho, não tive pressa de sair do chuveiro, o calor da água queimava sobre a minha pele, eu estava com frio esta manhã. Assim que sai do banho, fui até minha janela, olhei entre os espaços da veneziana, hoje – mesmo com o clima quente de ontem – tinha uma leve camada de neblina com garoa, a brisa leve da manhã fazia com que meu corpo sentisse um leve tremor. A meteorologista havia errado novamente.  Percebi logo que hoje seria um dia DAQUELES!

Agora faltam 5 minutos pra 7 horas, o portão da escola fecha assim que acaba de soar o segundo sinal, sai de casa sem tomar café estava com pressa apesar da escola não ficar tão longe assim de casa, mas era uma boa caminha. Comecei a andar rápido pelas ruas, a cada vez que olhava para trás e não via ninguém ia mais rápido ainda.

Não sei como consegui chegar a tempo de ver a inspetora fechando o portão, sai correndo, quase cai – me perguntei várias vezes se aquele degrau existia não me lembrava de ter passado todas as minhas manhãs por ele.

Se eu caísse não ia ser culpa do degrau, mais sim de uma voz diferente que gritava para a inspetora esperar um pouco. Quando a ouvi, foi como se eu estivesse em um sonho, foi ai que perdi completamente o controle de meus movimentos, e acabei torcendo o tornozelo.

Enquanto me recompunha de minha quase queda, vi passando o dono daquela voz á uns dois metros de mim. Enquanto passava, eu o observava. Ele era lindo, não tinha o corpo tão musculoso como os de alguns garotos da escola, mas era forte, tinha o cabelo castanho não muito claro, mas também não muito escuro, liso e todo bagunçado, seus cabelos fazia uma combinação perfeita ao contraste em sua pele clara. Não conseguia me mexer, mesmo de ter visto ele apenas de costas ele era lindo. Eu o acompanhava pelo olhar, até passar pela inspetora que gritava para eu entrar, foi ai que detectei uma leve pressão em meu tornozelo - ele latejava -, andei mancando ate o refeitório, ele se virou e me olhou pela primeira vez.  A primeira impressão que tive ao olhar seu rosto foi que eu parecia uma estranha, depois ele abriu um sorriso olhando pra minha perna machucada – corei enquanto ele me fitava.

No refeitório digamos que foi a parte mais constrangedora de minha manhã, a inspetora começou a dar sermão pelo meu atraso, pelo menos a minha perna começava a melhorar, quando desviei o olhar dela, vi o meu estranho perfeito rindo da minha situação, um ponto positivo, pelo menos alguém se divertia com a situação. Eu começava a me irritar.

Depois de uns 5 minutos só escutando, finalmente fui para a sala de aula, a porta estava aberta, entrei sem mesmo prestar atenção se tinham pessoas nela, apenas olhei um lugar vago no fundo – o meu lugar – era sempre ali que me sentava. Tinha apenas uma cadeira atrás de mim, lá sentava Ashley, a minha melhor amiga, ela sempre guardava o lugar quando eu chegava atrasada, hoje eu sabia que ela iria perguntar pelo meu atraso, normalmente me atrasava uns 5 minutos, hoje cheguei com 10 minutos a mais que meu horário rotinal. Fui em direção ao meu lugar, apenas prestando atenção nele, a dor que sentia em minha perna passou para a cabeça, ela começava a ficar meio analgésica, enquanto minha cabeça explodia – só me restava saber se era da perna, da discussão com a inspetora ou do estranho que havia visto naquela manhã. Apenas uma coisa me puxou para a realidade, fazendo com que saísse de meus pensamentos...

_Obrigada por se juntar a nós Louise! Espero que da próxima vez compareça no horário certo. – Por essa eu não esperava.

Assenti, corando novamente quando o pessoal começava a rir dessa pequena observação da professora. Sentei no meu lugar, sentindo-me segura por um momento, como se no fundo da sala fosse meu esconderijo. Não apenas meu, mas como de todos que se sentam lá, o pessoal do fundo guarda os pensamentos e observações disfarçando em risos e distrações. Assim que sentei, pude ouvir Ashley empurrando a mesa para se aproximar de minha cadeira. Suspirei calmamente, sabendo que agora vinham as perguntas.

_Lisi! O que aconteceu com você hoje?

_ Minha mente resolveu dormir mais que a cama! – Disse sem querer dar muitas explicações, ela não pareceu satisfeita com isso.

_ Ah, todo dia você fala isso! Hoje deve ter algum motivo diferente! – Ela adorava saber mais e mais, para depois ter os detalhes para uma conversa com as outras meninas.

_Ashley! Só dormi um pouco mais hoje e acabei chegando quando o portão estava fechando. – Não queria contar da parte do estranho garoto lindo.

_ Tudo bem então, mas vê se você consegue chegar um pouco mais cedo, estou começando a ficar cansada de ter que ficar guardando o seu lugar na sala. – detectei um sorriso enquanto ela falava aos sussurros para não termos que ser chamadas a atenção diante da turma novamente.

_ Ta! Vou tentar, mais não prometo! - Disse dando um sorriso a ela.

Eu sei que ela sentia falta do jeito que era no passado – mais ou menos uns 3 anos atrás. Eu era daquelas pessoas que falava com todo mundo, sempre tive vergonha de algumas coisas, e isso era horrível porque sempre acabava corando. Era muito difícil o dia em que eu chegava atrasada na escola, depois do acidente que aconteceu comigo, foi e está sendo muito difícil voltar ao que era. Sempre que me lembro disso, uma mistura de raiva, ódio e culpa me persegue, fazendo com que minha cabeça começasse a explodir mais ainda. Esfreguei os olhos rápidos e disfarçadamente para que ninguém notasse, mas sempre que eu o lembrava, meus olhos marejavam – uma fraqueza que eu tinha e não podia evitar. Ela andava ao meu lado quando estava acordada, nos meus sonhos, não me deixava dormir direito. Esse era um dos motivos de sempre chegar atrasada, só conseguia pegar no sono quando era mais ou menos 3 horas da manhã. Nunca vou me esquecer desse dia, 25 de Julho de 2006.