Hold on escrita por Brru


Capítulo 14
Vulneráveis




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As paredes úmidas pareciam deixar o lugar ainda mais assustador. Ouvia-se vozes mas nenhuma conhecida, era um lugar triste, frio e rodeado de incertezas. A injustiça doía como ser esfaqueada em seu peito, no entanto, a exclusão de qualquer notícia que fosse de lá fora a matava as poucos. Já não conseguia mais chorar porque lhe doía a cabeça, e os olhos. A boca estava em uma sequidão infernal, se sentia suja e não fisicamente mas como alguém que deixou as más decisões levá-la.

Há pouco tempo tinha uma vida tranquila apesar das dificuldades, no entanto, se bastava. Não imaginava que o mundo lhe guardava tanto, e tanto que a levou a ser aprisionada como um ser perigoso e mentiroso.

A noite tudo piorou, não havia nenhum sinal em sua direção. A comida servida lhe embrulhava o estômago, assim deixando-a ainda mais vulnerável aos seus devaneios e suposições. De fato, tinha certeza que o perdão de Aurélio lhe custaria muito, ou talvez, nem mesmo o teria.

Sentou-se na cama dura, e encostou-se a parede gélida.. E só quando o cansaço lhe fez refém, conseguiu finalmente adormecer.

...

Horas depois barulhos de chaves a invadiram a cabeça, pensara em ser um sonho daqueles que parecem reais, no entanto, quando abrira os olhos sentiu que a liberdade já não lhe era necessária. Afonso a esperava próximo as grades, a olhava tristonho, e Julieta sabia bem porque.

— Você está livre. - ele disse.

Ela ignorou as dores que sentia por todo o corpo levantando-se, e enfim saindo de dentro da cena.

— Onde ele está? - perguntou, ao velho homem.

— Em casa, pediu-me para pagar sua fiança, e cá estou. - suspirou. - Creio que vocês tem muito o que conversar.

— Sim, temos. - ela respondeu engolindo em seco. - Ao menos pode dizer-me qual fora sua reação? - Afonso lhe direcionou o olhar mais frio que alguém poderia receber em sua vida.

— Soubemos por sua irmã, e viemos o mais rápido possível.. Diante disso, a senhorita já pode imaginar, não?

Ela assentiu, o seguido até o carro que os esperava. Durante toda o caminho até a mansão Ouro Verde, Julieta sentia que estava indo em direção à forca. As mãos lhe transpiravam tanto a ponto de enxuga-las em seu próprio vestido. Olhara por diversas vezes para Afonso mas o mesmo a ignorava, certamente por ordens de Aurélio.

Mariana, Guadalupe e Rosa correram em sua direção logo que ela saltara do carro. Os abraços e beijos que recebia pareciam reviver sua alma, já adormecida. Mas não era bom esta de volta, não quando estava prestes a ter a conversa mais difícil de sua vida.

— Como você está? Fizeram algo com você? - a mãe perguntava aflita.

— Eu- eu.. Estou bem, mamãe. Inteira. - sussurrou. Mariana a segurou as mãos.

— Eu sei que não era o que você queria, Julieta, mas ninguém poderia nos ajudar, senão ele. - a irmã mais nova disse com lágrimas nos olhos. - Ao menos ele expulsou a megera.

Julieta apenas assentia, tinha plena certeza que a próxima a ser expulsa não só da casa, mas da vida de Aurélio, seria ela.

— Ele está no seu quarto, Julieta. - Mariana a informou. - Esta mudo, apenas nos cumprimentou e sumira, nem mesmo comeu algo..

— Ele está magoado, Mariana. Antes de ir embora, é lógico que Noêmia lhe disse tudo o que houve. Foi pra isso que ela implantou o dinheiro em minhas coisas.. - fechou os olhos esperando toda a tensão de seu corpo amenizar. - E agora Aurélio pensa que a roubei para pagar a dívida.

— Aurélio, jamais acreditaria nisso, minha filha.

— Mas tem o conhecimento sobre meu plano com Vitório, mamãe. Esta se sentindo traído, isto é certo.

— Então, o prove o contrário. - Mariana lhe ofereceu meio sorriso. - Diga-o que tudo mudou, que você está feliz ao seu lado..

Julieta soltara as mãos de sua irmã e rumou para a casa. Seus passos pareciam pesados, a fome que sentia minutos atrás, já não era presente. Respirou fundo, e enfrentou as escadas, logo, o corredor que parecia tão assombroso que quase lhe faltou coragem para seguir adiante. Mas precisava. Seu quarto estava em ordem, o seu cheiro doce era presente mesmo que pouco. Havia um caixa em cima de sua cama, certamente com seu vestido de noiva, e fora inevitável não chorar, apertou os punhos com força sentindo as unhas quase a ferindo a pele de suas mãos. Então, finalmente olhou para frente encontrando-se com Aurélio.

Ela quase correra para seus braços, mas seus pés prenderam-se ao chão, não suportaria que ele a negasse um abraço, era certo que o faria. Também não era ingênua a ponto de não entender que seu rosto estava em total recusa a sua presença. Ele segurava um envelope em mãos, e permanência imóvel.

— Você está... bem? - ele perguntou.

— Sim..

— Não me parece. - afirmou deixando o envelope em cima da cama. - Tem algo para me contar? - indagou aproximando-se dela.

— Já não sabes?

— Sei, mas vamos.. Me dê certeza de tudo que já sei. - ele estava sendo duro, e ela sentia em cada pedacinho seu.

— Sabe que não roubei sua tia. - ele assentiu.

— Não se preocupe com isso, essa hora ela deve estava bem longe.. Mas antes de ir..

— Ela disse que eu e Vitório tínhamos um plano contra você.. - ela o interrompeu.

— Certo.. - ele suspirou. - E quando você me contaria? Ah, de certo quando eu estivesse no altar a esperando feito um idiota.. Queria se vingar na frente de todos, é isto?

— Não, eu não faria isso, quer dizer, a princípio pensava em pagá-lo a dívida, e livrar-me do casamento. - confessou. - Mas você sabe, sabe que tudo mudou..

— Você teve tantas chances, Julieta.. - ela o viu ofegar. - Quando a pediu que fosse fiel a mim fora exatamente porque toda a minha vida até conhecê-la foi uma infernal mentira!

— Aurélio, eu não o trai, se menti fora por receio.. Voce é um homem difícil, e não pode negar isto! - tentou tocá-lo mas ele recuou. - Me entenda, por favor.. Tudo aconteceu antes de sermos um só naquela noite, só eu e você, lembra?

— Você me parecia sincera aquela noite, parecia alguém em que poderia confiar..

— E pode, você sabe! - enfim conseguiu lhe segurar as mãos. - Ontem mesmo fui a casa de Vitório, e desfiz todo o acordo, porque logo, quando você chegasse de São Paulo eu o contaria tudo! Acredite, por favor... - os olhos se perderam na costumeira conexão que tinham. Julieta piscou algumas vezes seguidas fazendo-o, vê-la vulnerável a ponto de derramar lágrimas de quase desespero em sua frente.

— Eu acreditava.-murmurou, e a soltou as mãos. - Acreditei quando disse que queria-me. Acreditei em seus beijos, em nós dois trocando o que de mais íntimo um homem e uma mulher podem trocar.. - respirou fundo sentindo o nó na garganta. O desespero dela parecia não comove-lo e aquilo estava o matando. - O que mais você me esconde, Julieta? Há outra coisa? Diga-me, esta é a hora..

— O que mais eu poderia esconder de você? Está tudo estampado em meu rosto.. Não vê minha dor? Não enxerga que apenas o escondi tudo por receio? Eu estava entregando a minha vida, e a de minha família a um homem que não me era capaz nem ao menos de sorrir! - ofegou. - Mas, ontem você me deu isso.. E eu tive certeza que aos poucos poderíamos ter um bom futuro juntos! Me mostrou ser um homem bom.. E eu me deixei entender que amo você!

Sem sequer deixá-lo pensar, ela o segurou o rosto prendendo o mesmo entre suas mãos.

— Eu amo a tua voz, Aurélio.. A tua cor.. A forma que fazemos amor.. O jeito que me beija, fazendo-me sentir a mulher mais linda e realizada.. - declarou sussurrando quase entre seus lábios. - Não é possível que você não sinta.. Não é possível que meu desespero por perdê-lo não o comova.

— Deve ser comovente esta com alguém por pena, não é Julieta? - os dois de repente viraram-se para a porta. - Disse a ele? Disse que sabe de seu passado sórdido? - Aurélio a olhou com desespero.

— Vitório? O que você está fazendo?

— Dizendo por fim a verdade, que você se confabulou a mim para derrubar do cavalo o grande Barão de Ouro Verde.. Ah, e que no decorrer de tudo, você descobriu o sofrido passado dele e sentiu pena de deixá-lo.. - sorriu. - Ela está com você por pena.. - disse olhando diretamente para Aurélio.

Aurélio a segurou pelos ombros afastando-a de seu corpo. Os olhos dele se puseram tão tristes que faltara ar nos pulmões de Julieta. Sorrateiramente ele fora dando passos para trás, seu rosto estava estático, surpreso por estava tão vulnerável e exposto a tanto. Aquela era sua maior ferida, o passado assombroso, a dor que o seu pai lhe casou, e como o velho lhe tirou a mãe tão precocemente.

"Inútil..." 

"Você será um nada, assim como a imprestável de sua mãe..." 

"Eu o odeio..." 

De repente a voz de seu pai pairou sobre sua mente atordoada. Julieta viu o mar se forma em seus olhos, e ele não permitiria que ninguém o visse chorando. Começara a andar saindo do quarto, e instante parecia quase correr..

— Não, Aurélio... Não... - ela lhe seguia pelas escadas.. - Meu amor, por favor..

Passaram rapidamente pela sala ignorando a todos. Ele andava tão rápido, que era necessário Julieta correr para alcançá-lo.

— Você não pode acreditar no que ele disse!

Ele abriu a porta do estábulo procurando por seu cavalo.

— Aurélio.. - ela disse, por última vez vendo-o montar o cavalo desesperadamente deixando-a sozinha..

 


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