30 Dias escrita por CCris


Capítulo 1
30 Dias


Notas iniciais do capítulo

Li quinhentas vezes e ainda acho que poderia ter melhorado alguma coisa rsrs
Como faz muito tempo que não posto nada, queria postar algo BEM Romanogers, espero que gostem da ideia e que comentem, ou critiquem, ou sugiram alguma coisa.
Bjooo
=^_^=



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Dia 01

Querido tormento diário!

Então? Essa provavelmente foi à idéia mais idiota que alguém poderia me dar, mas já que não vou começar a me consultar com um psicólogo o jeito vai ser esse, escrever num diário.

Há alguns dias atrás Steve presenciou um dos constantes momentos em que minha cabeça sai de sintonia do hoje e volta para décadas atrás. Geralmente quando isso acontece involuntariamente eu faço expressões e até movimentos que demonstra o quanto essas lembranças me perturbam. Ele insistiu me perguntando o que estava me incomodando e eu tentei a todo custo ser passiva ao alegar que não era nada, mas acabei mandando ele se fuder, pois é! Essa sou eu! Aquela que recusa a ajuda sincera de uma das pessoas mais honestas da face da terra.

Ele se magoou profundamente e eu quis morrer de arrependimento, mas o leite já estava derramado. Ele tentou me evitar por uma semana inteira e eu não tentei nada contrário a isso. Mesmo assim fomos a uma missão onde tínhamos que resgatar reféns de um grupo terrorista e bem… um dos terroristas que tinha um cinto de dinamites do tronco usou uma refém como escudo humano pondo uma arma na cabeça dela, tentei o meu melhor para negociar a liberação da moça e por fim, em um ato de impulso atirei na cabeça do homem que por conseqüência disparou um tiro na refém a matando no processo.

— Agora chega! Ou você fala comigo ou vou pedir a Fury que seja obrigada a fazer terapia! Você tem 24 horas para decidir! - Foi o que Steve disse ao chegarmos à torre, ele realmente pensa que pode me obrigar a fazer uma dessas duas coisas? Escolhi a terceira opção, mentir dizendo que estou em terapia e escrever nesse diário estúpido por sugestão da Wanda.

Dia 02

Oi droga de Diário?

Pensei eu que iria ser fácil me livrar da terapia, mas Steve acabou descobrindo minha farsa e fui intimada a fazer um tratamento psicológico, Steve aparentemente conversou com Fury e eles passaram a me vigiar.

Os episódios que mencionei nunca foram um problema pra mim, até mesmo porque geralmente ocorrem quando estou sozinha e geralmente durante o sono, mas agora eles vinham ocorrendo em plena luz do dia, durante missões, na hora das refeições. Eu sinto que estou perdendo o controle da viúva negra novamente e isso me preocupa um pouco.

Dia 07

Isso é idiota de mais!

Sei que deveria ter escrito antes, mas não sei o que escrever, acho isso estúpido de mais. Há dois dias eu poupei um homem durante uma missão e hoje ele entrou em um shopping com um quilo de dinamites atados à cintura e se explodiu dentro de uma sala de cinema, portanto Fury e Steve julgaram que eu perdi meu senso de julgamento e por isso quiseram me impor férias obrigatórias. Tony vai me disponibilizar sua casa de praia em Malibu e terei de ficar sob vigia, de quem ainda não sei, mas não gosto da idéia de passar um mês enfurnada em uma casa de praia, sozinha e fazendo terapia.

Dia 08

E ai Diário?

Obviamente eu recusei que Steve fosse minha babá, briguei e esperneei pedindo que até Tony fosse em seu lugar, mas Fury junto à doutora Cho alegaram que do time Steve é o mais equilibrado e que seria uma boa influência para se ter por perto. Quando vão entender que eu não quero Steve por perto? Sei que ele é uma ótima pessoa e desejo a ele tudo de bom, porém ele quer sempre me controlar e me trata como se eu fosse feita de vidro…

Dia 09

Porque mesmo que continuo escrevendo aqui eu não sei!

Segundo dia na casa de praia e Fury quis me demitir! Por quê? Tentei fugir da casa e Steve não permitiu, no processo da tentativa de fuga o eletrocutei com minhas picadas da viúva e travei uma luta corpo a corpo bem mais real que a que simulamos na sala de treinamento. O que me deu mais raiva foi que ele não revidou apenas se defendeu tentando bloquear meus golpes.

Mesmo com um olho roxo, um lábio partido e uma costela quebrada o idiota do Steve disse que não seria necessário a minha demissão, que ele ficaria responsável por qualquer coisa que acontecesse dentro desse um mês.

Ele alegou a Fury que o ocorrido foi fruto de um dos meus lapsos, mesmo ele sabendo que isso era mentira. Fury não se deu por satisfeito e disse que dentro desse um mês eu devo me “consertar” e que ao fim Steve diria se eu poderia voltar a fazer meu trabalho como antes ou não.

Dia 11 (4° dia na praia)

Estou começando a achar esse diário realmente um pouco terapêutico, pelo menos posso rasgar algumas paginas arremessar na parede e se necessário até molhá-lo um pouco! Hoje eu fiquei um pouco preocupada, mas acho que é só coisa da minha cabeça! É que faz três dias que dei uma surra em Steve, ele tem o soro para ajudar a curar seus ferimentos, não devo me preocupar com isso certo? Claro que sim!

Dia 13 (6° dia na praia)

Isso nunca aconteceu antes, Steve não está se curando da costela quebrada, seu olho ainda está roxo e seu lábio ainda inchado. O que implica que agora estou começando a ficar um pouco preocupada do porque ele não se cura logo, eu já o vi levar vários tiros e no mesmo dia estar andando pela torre como se não tivesse sofrido cirurgia para a remoção das balas.

Eu ainda tenho muitos dias pela frente dentro dessa casa, espero não enlouquecer até lá…

Dia 14 (07° dia na praia)

Passei praticamente vinte e quatro horas brigando com Steve porque que queria examinar seus ferimentos, mas ele não me deixa. Diz que eu deveria ter me preocupado com isso antes de tentar contra a vida dele, que agora não adianta eu fingir que me preocupo com seu bem-estar.

Dia 15 (08° dia na praia)

Steve está me obrigando a acompanhá-lo em suas corridas matinais, estou ganhando dele todos os dias, suas costelas ainda doem, eu sei disso. Ele não me diz, mas vejo suas caretas quando fica ofegante e sua caixa torácica é levada a movimentar-se mais.

Estou oficialmente preocupada com isso, mas quando fomos chegando de volta a casa encontrei Wanda na porta nos esperando, ela nunca foi de muita conversa, pelo menos não comigo então imaginei que sua vinda tinha relação com Steve.

— Oi! - Steve diz e mesmo ele suado, ela o cumprimenta com um beijo no rosto, o que por algum motivo desconhecido me irritou.

— Oi! - Ela responde a ele e me ignora.

— Certeza que ela não vai com a minha cara. - Digo a Steve que se limita a sorrir.

Perguntei o que ela queria e ela apenas estendeu um papel em minha direção, no todo dizia “Nova composição da picada da viúva”. Basicamente aquilo me dizia que as picadas que usei contra Steve foram alteradas por Tony com o objetivo de serem mais eficientes contra seres não humanos, ou seja, elas continham uma espécie de veneno que retarda a cura, eis o porquê ele não estar curando como deveria.

— Fez toda essa viagem para jogar na minha cara que o estado de Steve é culpa minha? - Falo de forma hostil. – Isso eu descobri sozinha!

— Não! Vim tentar ajudar vocês, se me der licença eu preciso me acomodar.

Ao terminar de falar simplesmente saiu em direção a porta do quarto que fica de frente ao de Steve no fim do corredor, ele me observava sério sem dizer nada, mas eu poderia ver que ele me repreendia pela grosseria. Segui na mesma direção que Wanda e entrei no meu quarto, joguei o papel que ela me entregou no canto da escrivaninha rindo da idéia infantil que foi ela vir aqui. O que ela iria fazer? Ele precisava ver Ellen ou mesmo Tony para ver se eles produzem um antídoto. Ela vai fazer o que? Sugar a doença dele?

Dia 16 (09° dia na praia)

Não sai mais do quarto ontem à noite, daí no meio da madrugada eu sonhei com a noite de graduação das viúvas, onde eu recebi as últimas injeções do soro e depois fiz a cirurgia de esterilização que acompanhava, acordei banhada de suor e gritando feito uma garotinha.

Cinco segundos depois de abrir os olhos tomo outro susto ao ver a porta do meu quarto ser arrombada por um Steve muito assustado, me levantei pegando embaixo do travesseiro minha pistola e mirando pra ele, eu estava tão atordoada com o pesadelo que por um momento achei que a pessoa na penumbra do quarto fosse um dos enfermeiros que ministrava as injeções e acabei por atirar em Steve. Graças a Wanda que o cobriu em seu escudo escarlate, à bala não o feriu. Se antes todos achavam que eu estava louca, agora teriam certeza disso.

Steve viu meu estado e pediu que eu abaixasse a arma, só ao ouvir sua voz pude acordar de fato e perceber o que eu tinha feito. Soltei a arma na cama e Wanda a levitou para si, Steve falou algo com ela e em seguida a vi sair e fechar a porta. Eu estava delirando.

Ao mesmo tempo em que via essa interação, ouvia as vozes das pessoas da red room, vozes que eu posso nomear uma a uma, isso porque eu as matei uma a uma. Steve sentou a meu lado e falou algo, mas eu estava atordoada demais para entender exatamente.

— Nat? Nat? Natasha, você me ouve? - Balanço a cabeça positivamente, eu estava encolhida feito uma criança que tem medo do bicho papão, ele tentou pegar minha mão e ao sentir seu toque estremeci e puxei minha mão de perto dele. Eu me sentia vulnerável, acuada, com medo, insegura.

— Vá embora, eu vou ficar bem! - É o que consigo dizer.

— Não vou a lugar nem um! - Ele responde e tenta novamente me tocar. - Eu não vou te machucar!

— Eu sei disso, mas eu vou te machucar, eu já fiz isso uma vez, hoje quase faço de novo e sei que tentarei outras vezes, você e Wanda tem que ir embora antes que eu faça algo pior do que quebrar suas costelas.

— Eu não vou te deixar aqui sozinha Nat, agora vem aqui! - O observei estender a mão na minha direção, não entendi o que ele esperava que eu fizesse, mas coloquei minha mão na dele e aos poucos ele se aproximou de mim até me dar um abraço, na verdade mais pareceu que me tomou no colo já que como disse eu estava encolhida quase em posição fetal. Eu tenho consciência que ainda estava tensa e suava frio, mas aos pouco fui me acalmando. Há muito tempo não me sentia tão sem controle e há muito tempo uma pessoa não me passava tanta segurança. Ouço vagamente Wanda entrando novamente no quarto e perguntando.

— Ela está bem? - Wanda pergunta, eu tremia um pouco e nem mesmo seu por que, sei que ouvi ela comentando com ele mais cedo que achava que em Utron o que quer que ela tenha feito comigo ocasionou meu atual problema.

— Ela vai ficar! - O ouço responder.

— E você?

— Não precisa se preocupar comigo, pode ir dormir, está tudo sob controle agora. - Ela sai em silencio e assim que tenho certeza de sua ausencia.

— Não é culpa dela! Não é culpa minha também, eu sei!

...

Dia 20 (13° dia na praia)

Às vezes me sinto como a pessoa mais egoísta desse mundo, especialmente vendo Steve e Wanda se esforçarem tanto para se aproximar de mim e a única coisa que sei fazer é afastá-los. Todo mundo tem problemas, eu não tenho o direito de fazer o meu problema uma prioridade pra eles, mas parece que minhas tentativas foram em vão, eles continuavam a tentar fazer algo pra me acalmar nas minhas noites conturbadas.

As noites começaram a ficar mais complicadas de dormir, porém eram poucas as que eu não acordava como da primeira vez. Eu me tornei mais reclusa do que o normal e Steve insiste que eu devo falar o que é o sonho.

Dia 21 (14° dia na praia)

Ontem à noite depois de escrever aqui me peguei pensando em algo para falar a Steve e Wanda. Eu tinha todo um discurso onde eu diria tudo que estava me incomodando, resolvi finalmente dizer a eles o que acontecia em meu subconsciente. Como toda vez, ao olhar para Steve e ver em seus olhos toda a inocência e pureza que eu jamais teria dei pra trás, é como se ele tivesse poder sobre mim que não importa o que eu teria a dizer, eu sempre me sentiria a pessoa mais errada desse mundo em sua frente. É como se ele sempre estivesse certo e eu errada, seus atos e argumentos sempre pareciam imaculadamente corretos.

Fui para meu quarto e me peguei enxugando lágrimas de frustração, como posso ser ruim até em contar sobre meu passado? Sinto-me incapaz de fazer as coisas diferentes, ou como se qualquer coisa que eu faça não seja suficiente, para meu problema com o passado, para meus colegas, para meu trabalho, para meus exercícios físicos, para a limpeza da casa, para o que eu cozinho, para Fury. Nada que eu faço parecer ser o suficiente, eu sempre sinto a obrigação de fazer mais e melhor.

Dia 22 (15° dia na praia)

Estou ficando cansada desse diário, não vejo onde ele está me ajudando, mas de qualquer forma vamos lá.

Ontem eu fui para a cama tendo passado o dia sem trocar uma palavra com os outros dois residentes, Wanda finalmente resolveu confessar que sua vinda para cá foi para tentar usar seus poderes psíquicos em mim, o que na verdade eu descobri um dia depois que ela me entregou aquele papel que continha a explicação do porque as feridas de Steve não estavam sarando. Nessas horas penso que todos me acham fraca, mas na verdade estou querendo ser forte.

Steve não liga para isso, ele bateu na porta do quarto de Wanda e a convidou para assistir a um filme, sei disso porque eu não consegui dormir e fiquei acordada olhando pela janela do quarto.

Dia 23 (16° dia na praia)

Como sempre, hoje acordei às cinco da manhã, a casa estava em silêncio indicando que Steve ainda não retornou de sua corrida e Wanda ainda dormia, ou era o que eu achava. Menos de cinco minutos depois que entrei na cozinha Steve aparece.

— Bom dia! - Ele diz e toca na minha cintura ao se esticar por cima de mim no intuito de pegar seu cereal que fica acima da cafeteira que travava uma briga comigo nesse momento.

— Bom dia soldado!

— Está melhor?

— Do que?

— De tudo!

— Não espere uma resposta honesta para sua pergunta. - Cento com o café na mão e ele começa a preparar o próprio lanche.

— Sua psicóloga vem à noite não é mesmo?

— Gostaria de poder dizer que sim, mas terei que ir até ela, não espere por mim acordado, só sairei de lá ao fim da tarde, não sei que horas estarei de volta.

— Eu posso ir te buscar?

— Ok! - Ele olha pra mim surpreso, acho que não esperava que eu aceitasse a proposta.

— Agora um sorriso, por favor?

— Não força! - Ele ri e vai para a mesa fazer seu desjejum.

Dia 24 (17° dia na praia)

Eu não sei o que eu quero, ou o que espero de Steve, algumas vezes sinto como se ele fosse o mais próximo que tenho de família depois de Clint, mas também sinto que ele não me vê dessa forma. Penso que em algum momento ele não vai mais me suportar, como se nossa amizade tivesse uma data de vencimento, como se em algum momento ele simplesmente fosse confessar que é melhor que estejamos distantes. Ao mesmo tempo ele me irrita mais que qualquer outra pessoa que eu um dia já tenho conhecido, até mesmo mais que Tony.

A cada dia me sinto mais insegura, mas eu tento fazer o que é melhor e me isolo em minha confusão mental, ontem quando ele foi me buscar na psicóloga, a mulher o disse que se eu não colaborasse ela não iria mais trabalhar comigo, que seu serviço poderia ser melhor aproveitado.

— O que fez? - Ele me pergunta assim que entramos no carro.

— Porque tenho que ter feito alguma coisa?

— Uma psicóloga da SHIELD está te rejeitando como paciente Natasha, ela lidou com gente bem pior e não rejeitou ninguém.

— Há você acha?

— Ela entrevistou gente da Hidra…

— E ela já trabalhou com algum agente da KGB? - Ele permanece em silencio dando atenção a estrada. - Fui cobaia de controles mentais, sou uma assassina em série e poderia continuar listando inúmeras coisas que me fazem pior do que qualquer pessoa que já tenha entrado naquela sala.

— Algo você fez para que ela ficasse assim tão alterada! - Ele acusa.

— A única coisa que fiz foi contar a verdade.

— Você a leu, é isso que quer dizer! - Ele estava extremamente irritado, mas tinha razão, eu a li. Basicamente observei seu consultório e ela em si, disse sua idade, seus principais medos, quantos filhos têm, que é casada pela terceira vez, que tem um filho que a processa por dinheiro, em fim, ela não ficou feliz em ser o espécime em estudo.

— Ela não vai me ajudar!

— E quem vai Natasha? Você não aceita ajuda de ninguém, de todas as pessoas que te cercam eu fui o único que agüentei tudo calado e mesmo assim você não confia em mim o suficiente pra que eu te ajude.

— Eu não preciso de você! - Ele ficou calado até chegarmos a casa, estacionou o carro e antes de sair se virou pra mim e disse com o tom mais sério que já usou.

— Eu desisto disso! Eu vou continuar aqui, mas se você quiser ajuda terá que pedir, eu não consigo mais… - Sai do carro batendo a porta.

Dia 25 (18° dia na praia)

Tudo o que Steve disse ontem me fez sentir mais insegura ainda, tento pensar que assim é melhor, que ele vai poder enxergar que deve seguir sua vida. Tenho que a creditar que é melhor assim, porque pior do que já está é impossível ficar certo?

Dia 26 (19° dia na praia)

Ontem eu tive um sonho… Não me orgulho disso, mas tive um sonho erótico com Steve, desde nossa discussão ele vem me evitando e vem malhando mais que o normal, por algum motivo me peguei lhe admirando enquanto levantava pesos. Para ser bem honesta acho que não é assim tão fora do comum, estou a alguns meses sem sexo e trancafiada com ele dentro dessa casa... Juntando isso com seu corpo que convenhamos é de fazer qualquer um babar!

Dia 27 (20° dia na praia)

Pensei que se continuasse sem fazer nada, Steve e Wanda iriam me deixar em paz, mas eu me sinto completamente inútil, então resolvi ajudar Wanda na limpeza da casa. Enquanto ela tirava o pó eu passava o aspirador no carpete. Em um momento eu brigava com um sofá que era bem pesado e ela usou seus poderes para levitar o móvel.

— Obrigada! - Digo e ela da um mínimo sorriso em resposta.

— Eu terminei aqui, vou cuidar do almoço, quer me ajudar?

— Geralmente é Steve o chefe de cozinha, porque hoje é tarefa sua?

— Ele foi fazer o ultimo check up das costelas quebradas. Saiu cedo o suficiente que nem mesmo eu o vi. -

— Deduzi que ele estava apenas me evitando, não imaginei que ele fosse sair para passar o dia fora. Sabe que horas ele volta?

— Amanhã!

— Amanhã? Por quê? - Digo soando mais alarmada do que eu gostaria.

— Ele fará um exame para saber se o veneno ainda está no sangue, Cho diz ser longo e cansativo, que não é seguro que ele dirija uma distancia tão grande à noite.

— Entendo! - Digo involuntariamente encarando as mãos.

— Se importa em me ajudar com o almoço?

— Não! - Desligo o aspirador e seguimos as duas para a cozinha. Depois de nos lavarmos comecei a cortar alguns temperos e legumes enquanto ela fazia o resto.

— O que gosta de comer? Geralmente Steve sempre acerta não é?

— Pior que é! - Digo sorrindo. - Não tenho problema com comida, como o que você fizer.

— Meu gosto é um pouco estranho…

— Somos ambas russas, não creio que seu gosto por comida seja tão diferente do meu.

— Às vezes me esqueço disso! - Ela brinca. - Mesmo assim, sempre vejo Steve fazer comida italiana e você só falta devorar o prato.

— A bem da verdade não sei se é a comida italiana ou simplesmente qualquer coisa que ele faça, porque até hoje não provei um prato feito por ele que não fosse divino. - Wanda ri, mas me vi novamente pensado que tenho estragado minhas amizades como esmagaria formigas.

— Gosta dele?

— Do porco que está cozinhando? Adoro carne suína!

— Sabe que não é mais da comida que estou falando.

— Não do jeito que está insinuando! Steve é um amigo, só isso.

— Continuar contando uma mentira até que ela pareça verdade não funciona muito bem com uma telepata.

— Você não lê pensamentos! - Acuso me assustando com a possibilidade de ela na verdade poder. Ela ri.

— É verdade, mas sabe que ele não está mais com raiva né?

— Ele não fala comigo há dois dias!

— Vem fazendo um esforço descomunal, isso eu te garanto!

— Como assim?

— Ele quer que você busque ajuda, mas fica a todo minuto me perguntando se você comeu, se tomou banho, se fez seus exercícios, em fim…

— Você é a baba eletrônica!

— Pode-se dizer que sim.

— Eu vou ser honesta com você, eu não sei como pedir ajuda. Nunca soube! Eu fui feita para ser independente, forte, inteligente, eu fui a maquina perfeita por décadas…

— Mas até maquinas falham e você não é uma.

— Eles tentaram me fazer uma e na verdade é isso que vem acontecendo.

— Como assim? - Me viro pra ela que está mexendo algo em uma panela grande.

— Quando eu era a viúva negra, eu funcionava de forma bem semelhante ao soldado invernal…

— Quer dizer que existe um protocolo pra você também?

— Mais ou menos! Existe um modo de me fazer obedecer a comandos, eu não fico completamente inconsciente como Bucky e não são todos que pronunciando as palavras corretas conseguiram acessar a viúva…

— Mas é possível?

— Sim! E hoje o que vem acontecendo é que a viúva está desativada há muito tempo, parece que agora criou vida própria. Em meus lapsos, é como se alguém me controlasse, mas eu sei que não é ninguém além de mim mesma, consegue entender? - Ela sorri solidária.

— Na verdade sim! Quando eu fui para a Shield, quando examinaram meus poderes, eu conheci uma mutante que tem um problema semelhante ao seu…

— Jean Grey?

— Você a conhece?

— Conheço Logan, ele falou dela.

— Nunca pensou em experimentar o mesmo que o professor Charles fez com ela?

— Sabe que há alguns anos as barreiras psíquicas que ele montou vieram a baixo e ela praticamente trouxe o apocalipse junto com a fênix?

— Isso porque o professor queria conter a fênix e não permitir a Jean o controle…

— É possível? Controlar ao invés de conter? – Pergunto meio que debochando da ideia, porque pra mim soava impossível.

— Eu consigo conter meus poderes hoje, mas quando me conheceram eu não conseguia, pelo menos não por completo.

— É diferente!

— Não é! O problema é que você e Jean encaram isso como algo independente, quando na verdade a fênix e a Jean são uma só.

— E eu e a viúva negra também?

— Basicamente!

— Isso me faz entender que tem estudado a questão, quero dizer, a minha questão!

— Eu posso tentar te ajudar!

— Como?

— Entrando na sua mente!

Dia 28 (21° dia na praia)

Ontem almoçamos e um pouco depois me deitei no sofá e permiti que Wanda entrasse na minha mente, até o presente momento não sei exatamente o que foi real ou não.

Vi cada faze da minha infância e adolescência dentro da red room, vi minha carreira como viúva negra e várias das mortes pelas quais sou responsável, mas o que me fez de fato ficar na duvida se era real ou não, era a voz de Steve, como se ele estivesse no meu subconsciente. Sua voz foi à única coisa que me deu segurança suficiente pra passar por aquilo.

Quando acordei estava em minha própria cama e Steve sentado em uma poltrona no fundo do quarto, ele dormia desajeitado e tinha no colo um dos meus livros. Levantei sorrateiramente e fui até a cozinha, sentia minha garganta extremamente seca. Levei o copo d’água até a piscina que até aquele dia nunca havia sido usada por nem um de nós três e sentei na beirada da mesma deixando os pés penderem pra dentro da água gelada. Fiquei relembrando novamente cada coisa que Wanda me fez rever e me perguntando se aquilo algum dia iria acabar, a menos que apagassem minha memória!

— Você está bem? - Me sobressalto com a voz a meu lado. - Isso me responde!

Sorri fracamente antes de responder a Steve.

— Eu estou bem, só cansada!

— Então porque não dorme um pouco mais?

— Minha mente não me deixa descansar… - Ele fica esperando uma explicação. - Quando tenho algum episódio dos que você presenciou, fico relembrando interminavelmente coisas do meu passado, é como se minha cabeça estivesse presa em um loop de memórias desagradáveis. Hoje estou me sentindo bem pior.

— O que faz quando isso acontece?

— Nunca encontrei nem um remédio, já tentei exercícios, leitura, bebida, até sexo, nada parece me fazer relaxar o suficiente.

— Já tentou nadar?

— Todo tipo de exercício físico que possa imaginar!

— Já treinou na água? - Ele diz com um sorriso maroto.

— Como assim?

— Era uma brincadeira que eu e Bucky fazíamos quando crianças… - Ele começa a remover a roupa.

— O que está fazendo Rogers? - Digo colocando a mão na frente dos olhos já que ele fica só em cuecas boxes que davam perfeita visão a quase tudo.

— Agora pode olhar! - Ele diz depois que eu ouço o SPLASH quando ele atinge a água gelada da piscina.

— Você pode se sentir a vontade em não me deixar congelar sozinho aqui! - Ele brinca espalhando água em mim.

— Essa água ta congelando Steve! - Ralho com ele e ele joga mais água em mim fazendo minha blusa encharcar.

— Te dou duas opções, vir por bem ou por mal! - O encaro incrédula, mas acabei rindo.

Levantei e comecei a remover a roupa ficando apenas com o lingerie, quando terminei percebi que ele estava de costas pra mim.

— Já pode se virar agora! - Digo ao entrar na água com um mergulho bem mais delicado e sem tanta bagunça.

— Melhor? - Ele pergunta.

— Mais frio talvez! - Digo abraçando-me ao tremer.

— Não se preocupe, logo vai sentir calor! - Ele brinca e começa a me explicar o que exatamente ele sugeria o que basicamente era uma luta corpo a corpo em baixo d’água.

— Sabe que você é grande mais não é dois não é? Não pense que vai me vencer só porque estou debilitada!

A primeira coisa que fiz foi lhe afogar, ou pelo menos tentar, empurrei sua cabeça embaixo d’água, mas como previsto ele se saiu facilmente. Não passava de uma brincadeira infantil onde um tenta afogar o outro, mas me vi tendo a mente ocupada por algo leve. Em um determinado momento ele conseguiu me segurar em um abraço de urso, obviamente ambos sob água, ou seja, era agora uma disputa de melhor apneia. Ele me observou por demorados oito minutos e começou a ficar com o rosto vermelho, alguns segundos e o vi impulsionando para a superfície.

Enquanto ele sugou uma grande lufada de ar eu comecei a gargalhar a plenos pulmões.

— Você perdeu pelo motivo mais bobo! - Zombo dele que está extremamente ofegante.

— Quanto tempo consegue ficar sem respirar? - Ele pergunta rindo.

— Depende, mas minha média é doze minutos. - Ele me encarou um pouco indignado.

— Ainda está abaixo do recorde mundial. - Sua resposta despeitada me fez soltar outra gargalhada e ele ri de forma mais comedida.

— Adoro sua risada! - Ele diz assim que me recomponho, ainda estávamos bem perto um do outro e à medida que me acalmei percebi um olhar diferente em Steve sobre mim, podia jurar que se eu não o tivesse impedido ele teria me beijado. 

— É mesmo? - Pergunto tentando quebrar o clima.

— É só que não costumo ouvir com a frequência que gostaria. - Ele tinha um sorriso simpático no rosto, mas não debochado. Fiquei desconcertada com isso e soltei dele caminhando até a borda da piscina para sair.

— Sabe… Eu deveria ter dito isso antes, mas me desculpe pelo dia que foi me buscar na psicóloga. Eu sei que agi no mínimo de forma infantil, é só que não lido bem com a ideia de ser julgada como incapaz ou doente entende? - Falava de costas pra ele buscando minha blusa na borda da piscina, não adiantaria de muito para cobrir algo já que estava molhada também, mas era melhor que eu sair apenas de calcinha e sutiã.

— Tudo bem! Acho que devo pedir desculpas a você também… - Ele começa a dizer.

— Sem mais desculpas Steve! Já estamos Kits. - Sinto o roçar de seu braço no meu quando ele imita meu movimento para pegar a própria roupa.

— Está frio! - Ele diz logo atrás de mim, perto suficiente que se eu me inclinasse alguns centímetros encostaria nele. - Você está com o corpo arrepiado.

— É melhor sairmos. - Digo, mas antes que eu fizesse qualquer esforço para sair da piscina ele me ergue como se eu não pesasse nada, a única coisa que consegui fazer foi pegar em suas mãos que agarravam minha cintura com firmeza, na verdade foi mais um impulso. Levantei-me da piscina e o vi sair junto comigo e pegar uma toalha no canto onde há um armário lotado delas. Ele me entrega uma e pega outra para si.

— Acho que ainda não está com sono certo? Então se troque que vou preparar um chocolate quente para nós. - Ele não esperou minha resposta e saiu em direção a cozinha, me vi obrigada a lhe obedecer.

Minutos depois desci novamente, ele já estava de roupa trocada, sentado no mesmo sofá que há algumas horas Wanda me tinha em transe. Ele escolhia algo na Netflix, sentei a seu lado catando uma caneca na mesa de centro enquanto ele tinha uma nas mãos.

— O que vamos assistir? - Ele pergunta não desgrudando os olhos da TV

— Silent Hill! - Digo e ele olha de rabo de olho pra mim. - O que? Eu gosto de filmes de terror.

— Garotas não costumam gostar de comédia romântica ou coisas assim? - Ele fala em brincadeira.

— Isso porque as garotas que conheceu eram chatas! - Tomo o controle da mão dele e coloco o filme, ele não protesta, apenas se aconchega melhor no sofá. – A quantos encontros foi com a Sharon?

— Vamos assistir o filme! – Diz emburrado me fazendo sorrir por ter pegado em seu calo. Ele ri e quase que no mesmo instante sinto um calafrio que faz tremer involuntariamente, levo as pernas para cima do sofá me encolhendo um pouco.

— O que foi? Eu não sou um super soldado, sinto frio! – Digo quando percebo que ele ria de mim que estava me transformando em uma bola em cima do sofá.

— Tudo bem! – Ele levanta um braço e passa ao meu redor. – Relaxa!

Ele deve ter percebido que eu estava imóvel, então me corrigi mentalmente e pensei que aquilo não era nada de mais e além do mais ele emanava certo calor que até parecia febril. Relaxei o suficiente que acabei pegando no sono.

Dia 29 (22° dia na praia)

Tive novamente minhas cessões com Wanda, só que dessa vez foi diferente, quando ela entrou no meu subconsciente eu estava dormindo com Steve no sofá, como na noite anterior, a tela da Tv ainda estava ligada, eu desliguei a mesma e olhei pro lado vendo Steve deitado de modo desajeitado ainda com o braço ao meu redor, me dei o luxo de acariciar seu rosto tranquilo, era uma memória boa e extremamente recente. Eu não sei se essa foi a intenção dela ou era algo que estava fresco em minha mente.

Infelizmente isso não durou muito, logo estava viajando entre memórias desagradáveis novamente.

Dia 30 (23° dia na praia)

Wanda havia me dado o dia de folga e nós três concordamos que minha noite bem dormida foi resultado do que ela fez, porém era algo cansativo e fazer todos os dias poderia piorar as coisas ao invés de melhorar. No fundo eu tinha duvidas se havia sido a terapia dela ou a de Steve, se é que o nado e o filme poderiam ser considerados terapia. Essa noite não foi sem sonhos como anterior, esse sonho era novo, eu não estava nas mediações da KGB ou mesmo da SHIELD como já havia acontecido, eu estava ali, na casa de praia. Acordei sozinha na minha cama, estava muito calor e resolvi descer as escadas para tomar um pouco de água fresca. Ao descer as escadas percebo que a casa não era a mesma, tinha paredes pintadas de uma cor escura, quase preto. Na parede da sala tinha uma série de porta-retratos com o que parecia uma família. Um casal, uma moça jovem e duas crianças pequenas.

Cheguei mais perto para entender a foto, mas as crianças tinham o rosto borrado, como se eu tivesse adquirido miopia somente para enxergar os dois rostos menores. Os três adultos eram eu, Steve e Wanda. Eu e Steve estávamos abraçados como um casal feliz e sorridente. Wanda estava sentada no chão com uma criança em cada perna, mas também parecia feliz. Aquilo era estranho de mais e foi exatamente o que me indicou que era um sonho. Só em sonho para que eu fizesse parte de uma família feliz! Foi isso que pensei segundos antes de ouvir o choro infantil vindo da sala de estar.

— Sara? - Chamo estranhando, não sabia o porquê chamaria aquele nome. Segui em direção ao choro e encontrei a criança sentada no chão ao lado dos corpos sem vida de Steve, Wanda e da criança maior que era um menino ruivo. Assim como nas fotos eu não tinha visão clara das feições das duas crianças, mas de alguma forma eu sabia que eram as mesmas.

Senti como se estivesse em uma roda gigante ou coisa do tipo, a cena se tornava distante e mais distante a cada momento até que me vi sozinha em um espaço completamente escuro, na verdade não escuro o suficiente para que não enxergasse minhas próprias mãos, mas escuro o suficiente pra que me sentisse no limbo.

Acordei calma, sem gritos e suor frio, só uma vontade enorme de sair daquele quarto fechado, levantei da cama calmamente e sai do quarto com o dia ainda por raiar, tentei não acordar ninguém e desci para a praia, eram alguns poucos quilômetros, nada que deixasse a casa fora de vista, mas era longe o suficiente e por isso levei uma arma junto. Precaução nunca é demais. Caminhei descalça na areia gelada e sentei em frente às ondas na praia deserta. Fitei as ondas por alguns minutos e logo senti a área ao meu lado afundar, mesmo eu sabendo de sua presença ela se manteve em silêncio, apenas me fazendo companhia.

— Dessa vez não foi um pesadelo não é mesmo? - Ela perguntou.

— Não sei dizer, foi um pouco de cada eu acho. Foi diferente.

— Porque não me conta?

— Porque não! Você vai ver de todo jeito mesmo! - Minha intenção não era ofendê-la, mas percebi que ela ficou em silencio encarando as mãos, então calmamente expliquei o sonho.

— Se tem uma coisa que posso interpretar desse sonho, baseado no que pude ver até agora no seu subconsciente, é que esse sonho mostra o seu desejo mais profundo e o seu maior medo. - Eu não ri, não brinquei e nem soube o que dizer, apenas esperei que ela continuasse. - Você sempre teve o desejo de ser ordinária e poder se apaixonar e talvez ter uma família própria, mas seu maior medo é conseguir isso e perder.

Em algum momento me senti a vontade para descansar a cabeça em seu ombro.

— Eu sei que não quer admitir, mas é apaixonada por ele e não se engane, ele também é por você. - Eu sabia que ela falava de mim e Steve, sabia que era um sentimento que eu tentava enterrar o mais profundo possível e sabia que aquilo era verdade, mesmo assim fingi que não ouvi aquilo e ficamos ali até o raiar do sol. Pouco depois que o sol nasceu ouvi o ronco alto do meu estômago e isso a fez rir.

— Acho melhor eu alimentar a besta fera dentro de mim! Está com fome? – Pergunto.

— Comer é uma boa idéia! - Ela levanta e estende a mão para me ajudar a fazer o mesmo.

No momento em que estávamos entrando na casa ela tropeçou e tentou se segurar em mim que desavisada não pude fazer nada além de assistir sua queda estabanada, acho que a minha gargalhada poderia ser ouvida a quilômetros de distância.

— Vai ficar ai só me olhando ou vai me ajudar? – Diz ela rindo também.

— Não! Você é pesada demais e eu sou muito frágil pra isso.

A ajudo a levantar rindo ainda mais porque percebi que ela estava toda suja da areia que tinha na entrada, nesse momento a porta da frente é aberta e abruptamente e um Steve assustado e confuso nos encara...

— O que vocês fazem aqui fora a essa hora? Hoje é domingo! - Ele estava levemente descabelado por ter acabado de acordar e mais parecia uma criança esfregando os olhos para espantar o sono. Passei por ele não resistindo à tamanha fofura e lhe beijei o rosto ao passar com Wanda.

Talvez eu de fato esteja me curando...

Dia 31 (24° dia na praia)

— Então, porque não começar relaxando? - Diz Wanda durante o inicio da nossa cessão, Steve como sempre ficou junto a nós. Alguns minutos depois Wanda já estava na minha cabeça.

— Eu vou conversar com você e tente me responder da forma mais sincera possível ok? – A ouço perguntar.

— O que quer que eu diga?

— Qualquer coisa que te lembro do passado pra começar.

— Tudo bem! – Involuntariamente me remexi nervosa com a ideia. - Alguns dias eu tinha vontade de não fazer absolutamente nada para assim saber se alguém me notaria pelo menos pra me dizer o quanto inútil eu sou.

Eu falava, mas minha língua pesava mostrando a sonolência se instalando em mim, mesmo assim ouço Steve perguntar...

— O que está acontecendo? – Se eu tivesse controle das minhas feições agora, provavelmente estaria sorrindo pelo tom alarmado que ele usou nessa pergunta.

— É como se ela estivesse dormindo, então eu estimulo ela a falar algumas coisas porque sonhos são sempre muito enevoados, nem tudo faz sentido ou contextualiza entendeu?

— E o com o que essa frase contextualiza? - Ele pergunta confuso pelo que falei.

— Ela está em um quarto com várias garotas, uma espécie de ateliê de balé que na verdade balé é a última coisa que praticam. Em outras ocasiões ela era quem se destacava pelas habilidades, mas era como se nunca fosse suficiente, dessa vez ela resolveu errar propositalmente os movimentos. – Mais uma vez, se eu fosse capaz de mover meu corpo naquele momento provavelmente estaria com a feição de surpresa, era exatamente disso que eu lembrei, era como se ela estivesse relatando minha lembrança borrada com uma riqueza maior de detalhes que nem eu mesma seria capaz.

— Querendo se misturar com as outras garotas… - Ele conclui.

— É! – Eu respondo, mas era um eu de no máximo 12 anos de idade na minha cabeça. - Eu gosto de ser amigável com qualquer pessoa, mesmo que tenhamos opiniões diferentes, o problema com isso é que as pessoas querem que eu seja um tipo específico de pessoa e não que eu seja eu mesma. Eu falava numa formalidade maior que uma garotinha daquela idade normalmente teria.

— Ela tentava fazer amizade com as outras meninas logo no começo, mas as garotas sempre eram muito malvadas ou tinham medo dela, acabou se isolando e por isso quando disseram a elas que teriam de matar umas as outras, ela não teve tanta dificuldade. - Steve ouvia o que Wanda e eu falávamos em completo silencio o que me dava vontade de espiar sua expressão, seria de aversão? Asco? Desprezo?

— Matar umas as outras? – O ouço dizer calmamente.

— Ela é A viúva negra, não uma viúva negra! – Ela esclarece o que aparentava bem obvio colocado dessa forma.

— Quer dizer que ela matou todas?

— Sim! – Respondo firmemente, essa era eu, não poderia voltar atrás, minha única opção ali era aprender a conviver com meu passado.

— Boa parte, algumas morreram durante os procedimentos de administração do soro da viúva e uma foi separa delas porque deveria seguir outra carreira. – Explica Wanda, apesar de que eu sempre me considerei responsável pela morte de todas elas.

— Quantas? - O ouço perguntar.

— Ela não sabe! Ou pelo menos não quis manter a matemática em dias.

— Nós começamos em 10 garotas. – Eu os respondo.

A “terapia” ainda durou por uma meia hora e Steve se ausentou, ou pelo menos eu não sentia mais seu toque sobre a minha mão. As imagens que eu comecei a ver eram bem mais reais e vividas, eu comecei a reviver as primeiras mortes que executei.

— Tem que fazer isso, caso contrário não passará de uma perda de tempo! - Dizia minha mentora.

— Eu não quero fazer! – Eu dizia, mas lembrava bem o suficiente para saber que na ocasião real eu não pisquei em obedecer à ordem de minha mentora.

— Quer me desafiar menina? – Ela pergunta agarrando meu queixo com certa força.

— Natasha? – De uma hora pra outra a mulher que segurava meu rosto tem a voz de Wanda e eu começo a ficar com a visão embaçada, como se não pudesse mais distinguir as feições que estavam a poucos minutos vividas em minha memória.

— Me solta! – Eu ordeno e ela aperta mais meu maxilar.

— Precisa obedecer e ser uma boa garota! – A mulher fala com suas feições ainda enevoadas, como uma tentativa de defesa agarro a primeira coisa sólida que encontro e bato na cabeça da mulher.

— O que aconteceu? – Ouço a voz de Steve e a mulher que antes apertava meu rosto, some.

Desperto e começo a enxergar a sala da casa de praia, Wanda tinha seu escudo erguido, o rosto na minha direção e sua expressão era de medo, pavor. Só então percebi que eu estava suando frio e segurava um peso de papel em uma das mãos.

 Não se aproximem de mim! — Disse entendendo que eu havia feito algo com ela e honestamente não havia ideia do que.

— Natasha? – Ouço me chamar, mas a voz que ouço era estranha, abafada, como se eu estivesse imersa em água, arremessei o peso de papel naquela direção antes mesmo de enxergar quem me chamou, por sorte Wanda foi rápida em colocar na frente de Steve seu escudo avermelhado.

— Sou eu, Ssafhehur! – Ele diz, mas eu não conseguia entender o nome pelo qual ele se identificou e o escudo de Wanda tornou a figura irreconhecível para mim.

— Eu não conheço você! – O vejo fazer menção de passar pelo escudo de Wanda.

— Não se aproxime! – Digo e ele gesticula alguma coisa na direção de Wanda e ela ainda com o olhar assustado, mas sob controle de tudo para conseguir defender aos dois sem precisarem me machucar, baixa o escudo permitindo que eu visse que era Steve que ela protege.

— O que estavam fazendo? – Ele pergunta a Wanda, mas seus olhos estavam sobre mim.

— Eu entrei em uma das memórias mais escondidas, consegui quebrar uma das barreiras que impede ela de seguir em frente. Não tem outro jeito! Ela tem que enfrentar, se não essas memórias vão continuar a assombrando.

— Consegue deixá-la inconsciente?

— Não! Já tentei! Eu não consigo mais entrar na cabeça dela.

— Como assim?

— Ela desenvolveu um mecanismo de defesa, ou talvez tenha sido colocado nela e de alguma forma estava desativado, eu acabei de habilitá-lo novamente.

— Ok! Suba e ligue para o professor Xavier, eu cuido dela.

— O que precisa? – Pergunto tentando passar um pouco de controle próprio.

— Eu não sei! – Wanda fala.

— Pode fazer o que estava fazendo antes? Steve poderia me segurar ou talvez se vocês me algemarem... – Eu digo confiante que se não pudesse passar por isso agora, nunca conseguiria.

— Não! Não vamos te amarrar ou te prender! – Protesta Steve.

— Mas pode funcionar! A única razão pela qual não forcei a conexão foi porque ela tentou me atingir com o peso de papel, se ela não puder se mover ou pelo menos estiver com os movimentos restritos, talvez eu consiga.

— É agora ou nunca Steve! Se realmente quer me ajudar a curar isso, então faça isso!

— Eu não vou poder manter o escudo ao seu redor. – Diz Wanda a Steve.

— Tudo bem, eu sei! – Ele diz caminhando até onde eu estava.

— Eu posso te machucar.

— Você não vai! - Steve estava tão firme em suas palavras que cheguei acreditar ser possível. Ele tocou meu braço de forma leve, mesmo assim me fez encolher um pouco, como se ao invés de seus dedos, agulhas pontiagudas me tocassem.

— Está tudo bem! – Ele diz e sinto Wanda tentar entrar na minha mente novamente, com as mãos nos ouvidos, os olhos fechados com toda força murmuro vários palavrões em Russo, eu sentia minha cabeça a ponto de explodir.

Sinto Steve me abraçar apertado impedindo meus movimentos, mas ao mesmo tempo me confortando. Wanda apareceu no meu subconsciente ainda amedrontada de deixar Steve com tal tarefa, mas ela sabia que esse provavelmente era o único plano.

— Natasha? – Ela chama e vejo minha versão mais nova a encarar e responder.

— Porque fica me chamando assim? Eu não sou Natasha! - Steve e Clint provavelmente eram os únicos que sabiam que meu nome era originalmente Nathalia.

— Então qual é o seu nome? - Ela pergunta.            

— Natalia.

— Então eu cheguei bem próximo não é mesmo? – Diz Wanda sorrindo simpaticamente.

— Acho que sim! – A pequena Natalia responde.

— Eu não vou te fazer mal Natalia. – Ela continua.

— É o que todos vocês dizem. - Novamente minha mentora se materializa ao meu lado.

— O que ela quer que você faça? – Wanda me pergunta apontado para a mulher que me encarava friamente.

— Mais um deles!

— Como assim? – Ela diz confusa.

— Hoje é minha cerimônia de formatura, preciso passar no ultimo teste que é uma luta mortal contra a outra garota.

— O que farão com você se não matar ela?

— É hoje a cerimônia… - Digo sem querer explicar o que aconteceria comigo.

— Quantos anos você tem? - Ela muda de assunto não tentando forçar mais.

— 12.

— A cerimônia não é só aos 16?

— Para as garotas normais! Eu já tive a primeira doze do soro da viúva e não tive problemas, eles querem logo dar a dose definitiva…

— Que só acontece depois da graduação?

— Eu pensei que soubessem disso!

— Eu sou nova aqui não sei direito como funcionam as coisas por aqui, mas me diz uma coisa... Você tem que matar essa outra garotinha?

— Sim!

— E você quer fazer isso?

— Querer?

— É! Alguém já pediu a sua opinião sobre isso?

— Já? Não sei, não lembro!

— Então você está recebendo essa pergunta agora. Você quer matar essa garota? Se pudesse, a deixaria viva? Sairia daqui?

Como que parecendo mentira, a garotinha se esvaiu e eu conseguia me controlar novamente, abri os olhos e Steve ainda me abraçava prendendo meu tronco e braços, por algum motivo ele não percebeu que Wanda não fazia mais nada comigo e apesar de não poder enxergar ela, sabia que ela estava logo atrás dele.

— Steve? – Chamo sua atenção e então ele me solta envergonhado, o que me faz rir.

— Oi! - Ele sorri feliz de me ver “normal”, se é que algum dia essa palavra poderia ser aplicada a mim. Ouço os passos de Wanda ao sair da sala e enlaço o pescoço de Steve em um abraço aproveitando a privacidade que ela nos deu. - Esta tudo bem agora.

 Dia 1 (30° dia, na praia)

Apos o evento anterior, passamos os dias seguintes em uma especie de uma nova terapia onde Wanda buscava algo que pudesse acusar que eu poderia voltar a perder o controle, ela não conseguiu mais encontrar nada assim. As memórias ainda estavam lá e ainda me entristecia a lembrança, mas era algo mais suportável e não me abalava mais como antes. É diário idiota, esse é o primeiro dia em que estou oficialmente livre dos tormentos e dos pesadelos, não sei por quanto tempo vai durar, só sei que me sinto finalmente bem o suficiente para começar a contar os dias sem lamento.

Voltamos para a torre hoje mesmo e Steve pediu a Fury mais alguns dias para que eu fosse avaliada por uma nova psicóloga, ou psiquiatra se fosse necessário. Durante todos esses dias Steve não me deixava em paz um instante, quando não está treinando comigo, está comigo e Wanda durante novas cessões de hipnose ou mesmo fazendo qualquer outra coisa como assistindo a um filme ou jogando conversa fora e isso não mudou ao chegarmos na torre, nem mesmo Wanda pareceu se distanciar novamente como deduzi que faria.

Uma semana depois...

Hoje eu serei finalmente avaliada pela psiquiatra da SHIELD, Steve já assinou a documentação afirmando que eu estou apta para exercer minhas obrigações tanto como vingadora quanto como agente da SHIELD, mas era necessária a avaliação do especialista. Durante essa semana Steve esteve mais próximo que o normal, Wanda me deu folga das cessões e me vi passando esses dias com Steve a todo instante e de alguma forma gostei daquilo.

— Boa sorte! - Steve diz quando meu nome é chamado pela auxiliar da médica em questão, ele e Wanda fizeram questão de me acompanhar, dei um abraço desajeitado em Wanda que sorria carinhosamente me fazendo achar que eu talvez tenha adquirido uma amiga, então olhei para Steve e seus olhos de bebê e lhe dei um beijo nos lábios, ele ficou um pouco estarrecido no começo, mas pude sentir que retribuía o beijo.

— Obrigada! – Digo ao me separar dele que me encara abobalhado, dou as costas e entro na salinha, mas não antes de ouvir perguntar a Wanda.

— Isso foi aleatório certo?

— Claro! Natasha beija a boca de todos os amigos dela! – Definitivamente Wanda era alguém que eu pudesse chamar de amiga.

— Poderia pelo menos ler a mente dele e me dizer o que isso significa! – Digo pra mim mesma ao entrar na sala da psiquiatra.

— Não seria algo justo com você! – Me surpreendi um pouco ao saber que quem me avaliaria não seria um médico qualquer, mas sim doutor Xavier o que era assustador e ao mesmo tempo tranqüilizador. A única coisa que ele fez além de conversarmos foi ler minha mente para ter certeza que eu falava a verdade, isso por uma tortuosa hora. Ao fim ele resolve me acompanhar até a recepção e no caminho fala.

— Isso é algo bom, vê se não estraga! – Ri um pouco do comentário e me virei confusa.

— Está falando de mim e Steve? - Não existia ponto em esconder nada.

— Sim, foi o que ele estava pensando na hora que entrou no consultório e desejou saber o que passava na cabela dele.

— Só mesmo...- Eu falava enquanto saia, e parei ao notar Steve aguardando na recepção. - - Steve? O que ainda faz aqui? Pensei que tinha ido embora com Wanda!

— E-Eu… - Ele gagueja e o professor nos salva de maior constrangimento, ou talvez aumenta um pouco o constrangimento.

— Steve? É você o herói? É uma honra conhecê-lo! – Professor Charles estende a mão para cumprimentar Steve que vacila um pouco, mas o cumprimenta.

— Herói? Faço meu trabalho, apenas isso! - Ele responde esbanjando sua modéstia.

— É! Sua garota o culpa pela recuperação dela ter sido um sucesso! Agora eu vou deixar os pombinhos a sós! - Steve revezava olhares entre mim e o professor que já se afastava sorrateiramente.

O que foi isso? – Eu sabia que Charles poderia ouvir meus pensamentos.

Por nada! – Ele responde e me vejo sem opção a não ser ir embora dali.

— Vamos embora? – Pergunto e Steve apenas balança a cabeça positivamente, do lado de fora ele percebe que Wanda havia levado o carro que viemos.

— Eu já tinha decidido pegar um táxi! – O tranqüilizo.

— A torre não é muito longe daqui, o que acha de uma caminhada?

— Por mim tudo bem! – Digo retirando os óculos escuros da bolsa e colocando no rosto, talvez assim ele não trouxesse a história do beijo ou o que Charles disse a tona.

Caminhamos por alguns minutos até que me impaciento com sua inquietação e pergunto.

— Desembucha Steve! – Digo calmamente.

— Está obvio assim? – Sorri envergonhado.

— Sou uma espiã Rogers! - Ele respira fundo tomando folego.

— Hoje posso dizer que somos amigos certo? –Aquela pergunta me fez segurar uma gargalhada, ele estava tentando falar algo muito sério, mas estava tão envergonhado e sem jeito que chegava a ser fofo.

— Precisa confessar algo Rogers? – Brinco tentando distraí-lo.

— Talvez, depende da sua resposta!

— Ok! Então pergunte! – Nesse momento eu mesma já estava nervosa.

— Porque me beijou e porque falou de mim para o professor? - Ele fala surpreendentemente de forma bem tranqüila.

— Primeiro de tudo, ele é telepata e você sabe disso! Eu não precisaria dizer nada a ele.

— Quer dizer que o que ele falou é como se sente? – Fiquei gelada com suas perguntas, mas pro inferno minhas incertezas, eu tinha acabado de superar um dos meus maiores traumas!

— O que ele disse é verdade, de alguma forma eu sei que você me ajudou a estar recuperada, Wanda teve papel importante, sem duvida, mas sinto que ela só conseguiu fazer o que ele fez porque você conseguiu lidar comigo em meus piores momentos e quanto ao beijo… Bem, poderia dizer que foi apenas uma forma de gratidão, mas na verdade eu apenas tive vontade!

— Que quis me beijar? – Ele diz rindo como se eu tivesse dito alguma piada de mau gosto.

— As coisas não precisam ser tão complicadas quanto imaginamos Steve!

— Mas...

— Eu já respondi sua pergunta, agora terá que me confessar algo! – Novamente ele fica nervoso e vermelho.

— E-Eu… - Ambos paramos no meio da calçada e quando Steve olha para mim eu não estava contendo o sorriso.

— Não precisa confessar nada Steve! 

— Porque você sabe de tudo?

— Não! Só sei aquilo que quero saber! - Com ambas as mãos ele segura meu rosto e me estico para poder alcançar seus lábios. O beijo dessa vez não foi tão tímido, foi um beijo de verdade, o primeiro beijo que de fato significava algo para mim em uma longa coleção de anos. Ao nos separar Steve ria bobamente e antes de continuarmos nossa caminhada ele passou um braço ao redor dos meus ombros e assim continuamos o percurso. Em um acordo tácito entendemos o que precisava ser explicado.

— Minha garota em? – Ele fala implicando comigo.

— Gosto de como isso soa? - Em outra ocasião eu explodiria com a ideia de ser propriedade de alguém, mas sabia que Steve não pensava dessa forma e mesmo que pensasse acho que ainda o deixaria se dirigir a mim dessa forma.


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Notas finais do capítulo

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