Eu o olhava. Ele estava tão de perto, mas tão longe. Quase não sinto a sua presença, não posso tocá-lo. O sentimento que nós sentíamos não estava mais ali, não como antes. Cada um preso em seu próprio universo, em sua bolha particular onde podíamos ignorar o silencio esmagador. 

A luz do sol entrava pela janela ampla e iluminava o ambiente com suas cores alaranjadas. Essa era a nossa hora favorita do dia, quando o sol se punha e a lua se erguia tímida, mas maravilhosa como sempre. Harry mantinha sua concentração no celular e eu mantinha a minha atenção nele. Meu corpo que antes tinha o seu para se aconchegar agora se mantinha aquecido pelo raro sol que fazia em Londres. Suspirando, me obriguei a voltar a minha atenção para o livro que estava aberto em meu colo. 

"Estar apaixonado é muito estranho, os pensamento acabam sempre se voltando para essa outra pessoa, independente do que se está fazendo. Ao pegar um copo no armário, ao escovar os dentes ou ouvir alguém contar uma história, sua mente começa a vagar pela lembrança do rosto, do cabelo e do cheiro da pessoa amada, a imaginar a roupa que ela vestindo e o que dirá na próxima vez que a vir. E, junto a esse constante estado de sonho, o estomago parece estar preso a uma corda elástica, descendo e subindo por horas até enfim se acomodar perto do coração.". 

Esse trecho de "O Poder do Seis" despertou questões em minha cabeça. Há quanto tempo eu não penso no que eu sinto por Styles? Quando eu me tornei tão fria e fechada? O que eu estava pensando que não reparei que o sentimento que eu sentia por ele esfriou ou sequer existiu? Será que essa distancia que nos separou nos últimos meses foi refletido nos meus verdadeiros sentimentos? Eu não o amo mais? Eu já cheguei a amá-lo? Tudo isso que a gente viveu foi real ou apenas um breve momento de fantasia? 

"Harry" o chamei, mas ele não me deu atenção. "Eu amo você". 

Ele continuou com sua atenção voltada para o celular. Levantei-me suspirando, fechando o livro e o deixando na mesinha de centro. Atravessei a sala em sua direção e me ajoelhei em sua frente, coloquei as mãos em seus joelhos, me apoiando. Harry erguei a cabeça, os cabelos compridos fazendo sombra em seu rosto. Afastei os fios de seu rosto com um sorriso doce nos lábios. 

"Harry" disse baixinho, o meu sorriso se tornando menor. Styles abaixou a cabeça e engoliu em seco. "Hey, olha para mim, por favor." pedi suavemente, minhas mãos migrando de seus ombros até os dois lados de seu rosto, puxando-os para cima. Os olhos verdes me fitavam brilhantes, quase marejados. "Harry" disse mais uma vez. "Precisamos acabar com isso antes que machuque mais ainda." 

Ele ficou em silencio, piscou rapidamente e trouxe suas mãos para minha bochecha. A mão grande e quente tomou conta de meu pedaço de pele sensível.  Olhei para minhas mãos, onde eu não precisava encarar suas orbes verdes. O anel de prata delicado parecia pesar em meu dedo anelar, as pedras azuis pareciam mais brilhantes que o normal. Como em um filme, a lembrança do dia em que eu ganhei o anel tomou conta de minha mente. Estávamos em um parque ao anoitecer, o céu ainda estava em um maravilhoso degrade de roxo e rosa. Era começo de outono e as árvores tinham começado a ter o tom mais alaranjado, deixando o lugar lindo e completamente mágico. Harry tinha preparado um piquenique maravilho embaixo de uma cerejeira. Naquele dia eu tinha certeza que eu o amava, que ele seria meu para sempre assim como eu seria dele. Não tinha mais volta. 

Mas aqui estamos nós. Terminando algo que até três meses atrás parecia algo de uma vida inteira. 

O movimento circular que sua mão fazia em minha bochecha me trouxe de volta a realidade. A ponte do meu nariz começou a pinicar, minha boca ficou seca e meu peito apertado. As lágrimas se acumularam em meus olhos e me obriguei a manter a calma. Harry é uma pessoa especial demais para me ver chorar, para se sentir culpado por qualquer coisa que deu errado nesse relacionamento. Precisávamos terminar isso como adultos, maduros o suficiente para perceber que ficarmos juntos não teria futuro. Ignorando o bolo que se formava em minha garganta, levantei meu rosto e encarei os olhos de Harry. Foi um erro. 

Styles tinha os olhos marejados, a ponto de quase chorar. Fitei seus olhos por alguns segundo, tentando transmitir por olhares tudo o que eu não conseguia falar, tudo que eu sentia. Não sustentei muito tempo o seu olhar confuso e torturado. Nunca fui muito boa em desvendar olhares, mas sabia que Harry não estava bem e saber que eu sou a causadora disso me deixava em pedaços. Fiz força para eu me levantar, e dei um beijo doce na testa cheia de cachos de Harry. 

 Subi as escadas e passei pelo corredor, parando na frente de uma das portas. Ela era diferente de todas as outras, era vermelha enquanto resto eram brancas. Mais uma vez uma lembrança apareceu brilhante em minha mente. O dia em que pintamos a porta e em como o corredor ficou sujo de tinta vermelha, de como nós nos beijávamos entre pinceladas e guerras de tinta. O coração que desenhamos ainda estava ali, ao lado da porta. Harry tinha descoberto um antigo sonho meu quando presenciou uma chamada de Skype com uma amiga. Era algo bobo, relacionado à Brooke Davis, uma personagem da serie One Tree Hill. Era primavera, uma semana antes do meu aniversário. 

Sacudi a cabeça e entrei no quarto, evitando olhar para os lados pois sabia que as lembranças me assaltariam sem dó. Com o peito doendo caminhei em direção ao closet onde peguei uma mala pequena e algumas mudas de roupas. Clara iria me receber em sua casa, eu sabia que sim. Voltei para o quarto e por um milésimo de segundo eu olhei para uma foto nossa encima do criado mudo. 

Levantei-me do chão e peguei o porta retrato, outra lembrança me pegou de surpresa. Sorrindo com lembrança visualizei o dia em que eu, Harry e seus colegas de banda inventamos de fazer uma pizza gigante. Nossos rostos sujos de farinha e molho de tomate, os sorrisos estavam tão grandes e felizes. Eu estava nas costas de Harry beijando seu rosto e com um ovo nas mãos, me preparando para tacar em sua cabeça. Liam segurava a camisa suja de Louis com uma mão e na outra um pote de ervilhas. Niall e Zayn estavam sorrindo um para outro, cada um com um saco de farinha em mãos. Anne, a mãe de Harry, que flagrou a nossa guerra de comida e tirou a foto. Esse foi um dos momentos mais inesquecíveis que alguém pode ter. Aquele momento que você não precisa de muito para ser plenamente feliz. 

"Esse foi um dos dias mais felizes da minha vida" a voz de Harry veio da porta. Lá estava ele, escorado no arco da porta, o rosto vermelho e os olhos inchados. "Lembro-me de como minha mãe nos deu um sermão e de como nós nos divertimos arrumando a cozinha." 

Ri fraco, assentindo com a cabeça. Desviei o meu olhar do seu e fixei meus olhos na mala azul ao lado da cama. Harry seguei meu olhar, pois eu ouvi ele prender a respiração. 

"Olive, por favor." engoliu em seco. "Não quero que isso aconteça" confessou baixinho, olhando para baixo. Engoli em seco. "Eu não quero perder você. Não você" 

Um som estranho saiu de meu peito. O choro que estava engasgado na minha garganta finalmente saiu. As lágrimas escorriam pela minha bochecha, mas eu não tentava secá-las. Eu sabia que não tinha necessidade, logo outras as substituiriam. Olhei para baixo, tentando esconder meu choro, tentando controlar meus sentimentos. Fui em sua direção e ergui seu rosto e sequei suas lágrimas com as pontas dos dedos. Forcei um sorriso triste. 

"É necessário." disse acariciando sua bochecha. "É o melhor para nós dois, Harry. E você não vai me perder, vou continuar aqui, enchendo o seu saco todo dia, lhe contando as minhas paixões por personagens de livros e series. Você nunca vai me perder, Styles." 

"Mas não vai me amar, me beijar ou abraçar como antes." disse. Seu tom se tornando tão amargo. A emoção foi mais forte que a razão e quando vi eu estava em seu braços. Joguei meus braços ao redor do pescoço de Harry, agarrando seus cachos. Styles enlaçou minha cintura com força, enterrando o rosto em meu cabeço. Seu cheiro invadiu minhas narinas e as lágrimas vieram com mais força. "Não vai, por favor." implorou. 

Meu coração se despedaçou. Eu me sentia um monstro por estar fazendo isso com Harry, mas precisávamos de um espaço para nos dois. Repensar em tudo o que sentíamos, em tudo que iriamos fazer daqui para frente. Era doloroso, mas era preciso.  

"Esse é o problema da dor, ela precisa ser sentida." sussurrei. Harry riu baixinho em meu pescoço, me apertando ainda mais em seus braços. 

Nós nos beijamos em seguida. Nunca consegui explicar como é beijar Harry, nunca achei uma definição certa ou uma palavra que abrangia tudo o que eu sentia com apenas o tocar de seus lábios nos meus. Era algo indescritível e único. Cada beijo era único, cada toque despertava uma coisa única em meu corpo. Ele era único, raro e especial demais.  

"Eu te amo, Styles, mas precisamos nós afastar." sussurrei contra seus lábios. Me afastei de seu corpo e me obriguei a olhar em seus olhos. "Não dá mais para nós continuarmos assim." 

Harry me olhou amargo. 

"Bem que dizem que a gente só percebe que não poderia viver sem uma pessoa quando nós perdemos ela." riu seco. 

"Você não me perdeu." beijei seus lábios novamente, aproveitando cada segundo. Eu sabia, de algum modo, que aquele seria nosso último beijo. 

"Me espere." pediu entre o beijo. Eu sabia o que ele queria dizer com aquilo. Ele não iria desistir de mim tão fácil assim, eu não iria escapar de sua vida. O beijo se tornou algo mais profundo e intenso, algo molhado e cheio de sentimento de despedida. Talvez não tivesse mais volta ou talvez era apenas uma questão de tempo até voltássemos um para o outro. 

"Eu vou" disse. 

"Não estou indo embora. Apenas me distanciando."