A Última Magia escrita por Vlad Petrova


Capítulo 1
Until the very end...


Notas iniciais do capítulo

ç.ç
Não sei de onde saiu isso, mas espero que gostem...
Com certeza veio de dentro. *põe a mão no peito*



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James Potter e Severus Snape haviam percorrido um longuíssimo trajeto para chegar até ali.

Se alguém tivesse dito a eles na adolescência o que um dia significariam um para o outro, eles teriam sugerido que a pessoa se internasse num manicômio, sem nem mesmo considerar.

E que significavam um para o outro, então?

James suspirou, batendo os pés impacientemente enquanto corria os olhos amendoados pelos corredores frios do hospital.

Tudo.

Severus era seu mundo, era seu alicerce...

Sem ele, James sabia que acabaria por desmoronar.

Mas já não possuíam mais quinze anos.

Já não eram mais garotos imprudentes, não estudavam em Hogwarts e certamente não levavam a mesma vida inocente e pacata de antes.

Antes...

Antes, James era um babaca.

Não sabia como fazer para chamar a atenção de Severus, então ele o azarava.

Não no bom sentido, não da maneira que deveria ter feito desde o princípio.

O azarava, literalmente.

Puxava-lhe as cuecas, fazia-o escorregar na frente de todos, não perdia uma oportunidade de humilhá-lo e de acabar com os seus dias.

Severus raramente lhe correspondia com raiva.

Ele era indiferente, era frio... Sem emoção.

Era quase deprimido.

Na verdade, sempre houvera algo a mais, algo sombrio por detrás daquelas órbitas negras enigmáticas que James conhecera tão bem ao longo do tempo.

Mesmo quando Snape abria sozinho raríssimos sorrisos, seus olhos eram de uma tristeza da profundidade do oceano.

Não haviam lágrimas suficientes para expressar a enorme tristeza que era para ele viver morto.

Seu coração batia, o corpo respirava... Mas ele nunca se sentira vivo, realmente.

Talvez quando era criança.

Quando ele e Lily brincavam juntos na Rua da Fiação, praticando mágicas bobas que fugiam de seus controles tão pequenos quanto eram, encenando uma vida adulta que um dia gostariam de levar – essa era uma das brincadeiras que Evans particularmente mais gostava – e fazendo o que quer que fosse para matar o tempo.

Mas a inocência, véu que nos cobre com sua vasta proteção desde o momento que abandonamos o conforto e o calor de um útero materno, dissipara-se como fumaça quando ele começou a entender certas coisas.

O pai era um bêbado.

Batia na mãe, batia nele, quebrava a casa toda...

Chegara a por fogo nos móveis, uma vez – Snape ainda tinha as queimaduras em suas costas.

Ele achava que isso o tornava uma aberração.

Não gostava do próprio corpo, das cicatrizes provocadas por correia que carregava, das dores que suas marcas acumulavam – as dores das lembranças, das surras, das lágrimas de uma mãe que, como fênix, possuíam poderes curativos sob suas feridas.

Ah, e curavam.

Como curava rápido as feridas de Severus, o choro de partir o coração da também sofrida Eileen Prince!

Não era mágica, na verdade.

Ou talvez fosse.

Pensando melhor, era, era sim.

O amor é sempre mágico.

E ver a mãe chorar, para um filho, é uma dor que aflora um instinto primitivo, algo que atravessa a sensatez e ludibria mesmo os dados sensoriais mais teimosos da anatomia humana.

Mais poderoso que morfina, mais poderoso que qualquer sedativo.

Ver uma mãe chorar, ver uma mãe sofrer... Ver Eileen Prince acabar-se, para Severus, era o que bastava para que sua dor física se dissipasse, e para que a emocional, embora ainda existisse – em escala muito maior, mas contida, refreada – diminuísse de maneira drástica, e que o sentimento de cuidado tomasse seu lugar ante a todas essas dores, que no mesmo minuto lhe pareciam os menores de seus problemas.

Guardava as próprias tristezas, os próprios medos e anseios no bolso, para correr em amparo da mãe assustada.

Era uma vítima, como ele.

E ele vivenciara tudo aquilo, mas ainda estava de pé.

Por quanto tempo?, aquela voz atordoante soprava sádica nos ouvidos de James Potter.

Enquanto seu esposo detestava as cicatrizes que ele carregava consigo, James as amava.

Enquanto Severus via as marcas de seu próprio corpo como lembranças dolorosas, expressões ardidas dos terrores mais macabros que vivenciara na Rua da Fiação em sua infância conturbada, traumática, James constantemente o tentava ajudar a enxergar as coisas por uma outra perspectiva.

Snape era um sobrevivente.

Aquelas marcas comprovavam aquilo.

Não eram sinal de fraqueza, não deveriam ser recordações de dor, mas sim sinais de força.

Cicatrizes de alguém que havia sofrido tanto, e que mesmo assim não desistira.

Havia perdido Lily, também.

Os dois haviam.

Morrera muito cedo em decorrência de varíola de dragão.

Lene McKinnon também havia sofrido com esse mal.

Morta, como Evans.

As duas estavam mortas, eram cadáveres. Pó sobre a terra.

Do pó viestes, e ao pó há de retornar.

Em seu âmago, James Potter podia sentir os pedaços remendados de seu coração ameaçando partir-se novamente.

Tudo estava dando errado, tão errado...

Ele batia os pés frenéticos, retendo lágrimas em seus olhos e esperando desesperadamente que tudo aquilo acabasse.

Queria ir pra casa, queria deitar-se no aconchego de sua cama, junto de seu Sev. Queria tê-lo em seus braços, esquecer aquele pesadelo...

Mas ele sempre fora um bruxo intuitivo.

E algo nos ruídos agourentos, macabros, das máquinas de hospital que preenchiam o silêncio do corredor, pressagiavam aquilo que ele não queria admitir.

Que não iria admitir.

Não sem lutar, não sem tentar se entorpecer...

Perdera Dorea, Charlus, Lily...

Não se permitiria perder Severus.

Em pouco tempo, ele dizia, firme, forte como seu amado em sua cabeça, aquilo estaria acabado.

Não precisaria enterrar mais um corpo, não veria o amor de sua vida ser arrancado de seus braços novamente.

Aquela não era uma opção...

“Você está enganado”, algo lhe dizia, vindo de dentro, e seu estômago revirava.

Novamente, os dutos lacrimais tremelicavam, ameaçando transbordar, e o coração pesava, pressagiando aquilo que ele já sabia.

Moony e Padfoot aproximaram-se, cabisbaixos, com o segundo parecendo bem mais abalado que o primeiro.

Nenhum deles desejava aquilo para James.

Ele não merecia.

Havia sido uma pessoa incrível, um ser humano exemplar a vida toda, apesar dos apesares... E certamente, aquilo não lhe apetecia.

A vida não poderia ser tão injusta ao ponto de tirar-lhe Severus. O seu mundo, tudo o que lhe restara.

E tudo o que ele precisava.

Notando a presença dos amigos, que se aproximavam sombriamente em passos contidos, quase vacilantes, ele levantou-se de um salto, temendo pelo pior pelas feições agourentas que perscrutavam os rostos de seus amigos.

Não, não... Não podia ser.

Não havia chegado a hora.

Não podia ter chegado.

— James, eu sinto muito — Lupin disse, os olhos marejados e o nariz vermelho. — Os médicos dizem que as chances não são boas e que é melhor você começar a se preparar para o pior.

Sirius mantinha a cabeça baixa, o olhar alucinado, olhos molhados.

Como aquilo fora acontecer?

Um guerreiro tão bravo, um pocionista exemplar e um bruxo de capacidades inexplicáveis... Vencido por uma doença trouxa.

James olhou de Moony para Padfoot, incrédulo, inconsolável.

— Não... — foi tudo o que saiu, e suas pernas ameaçaram ceder.

Remus correu a segurá-lo.

— Lupin, não, por favor... — pediu ele, com as lágrimas finalmente escorrendo pelo canto dos olhos amendoados que Snape tanto adorava, manchando-lhe as lentes e tornando escorregaria a armação. — Tem que haver um jeito, meninos, por favor. Vamos levá-lo a um hospital bruxo, vamos tentar...

— James... — Interveio Lupin copiosamente, com o coração partido por ter que ser ele a dar ao amigo aquele choque de realidade. As esperanças eram baixas, quase inexistentes... James precisaria ser forte. Como o seu marido fora. — Não há outra opção. Doença trouxa se cura em hospital trouxa, o uso de poções ou feitiços só pioraria o quadro, a Dra. Whitman lhe disse isso.

— Não! — Ele libertou-se, recuando. — Moony, Padfoot, ele é tudo o que eu tenho, eu...

Sirius ergueu os olhos, o cenho enrugado e os lábios contraídos, unidos numa fina linha única.

Ele estava quieto, taciturno, fúnebre.

E então, James reconheceu aquele olhar.

O olhar de Sirius quando soubera sobre Marlene. Quando descobrira que sua menina, que sua Lene, havia sido morta.

E sentiu o peito pesar, fechar...

As esperanças se foram ralo abaixo.

Câncer.

Severus Snape estava sendo vencido por algo tão banal, algo muggle que subestimaram.

Era apenas câncer.

E ele estava prestes a descansar.

James respirou fundo, tentando encontrar algum ar para suster a consciência.

Lupin esperou, esperou e por fim, disse:

— James, acho que vai querer estar com ele quando a hora chegar. — Falou, sério, olhando para o melhor amigo com misericórdia.

Seu marido Sirius tornou a abaixar a cabeça, deixando que Moony cumprisse o seu trabalho.

— Ele não consegue falar, mas precisa de você ao lado dele. Vá. Esperaremos você aqui até que retorne.

“Até que retorne”...

Então, James teve a certeza, o tempo que possuíam era escasso.

Horas, minutos? Quanto?

Ele não sabia.

Cada milésimo que perdia ali, não voltava.

Ele se encaminhou pesadamente para o quarto de hospital, despedindo-se do casal de amigos com um olhar copioso.

E por fim, quando ele abriu a porta, a enfermeira o olhou como quem lamenta, e os deu privacidade.

Deixou-os a sós.

Kettering – The Antlers

— Querido? — James sorriu, enxugando com a mão o nariz.

Severus, incapaz de se mover com os tubos lhes enfiado goela abaixo e nariz a dentro, com muitas agulhas ligadas às suas veias, correu os olhos pelo local, procurando pelos do marido.

Ele se aproximou, hesitante, e tentou não parecer tão abalado, já sabendo que fracassaria.

Seus olhos lhe entregavam, antes que as lágrimas recomeçassem a cair.

Repousou a cabeça pesadamente sobre o peito do amásio, e Severus, com muita dificuldade, deslizou os dedos finos pela cabeça do esposo, tocando pela última vez aquele cabelo espetado rebelde que ele tanto tentara ajustar e que James jamais permitira durante todo o tempo de casados.

As lágrimas escorreram pelos seus olhos sem que ele se contivesse, e ele deu-se ao luxo de chorar, enquanto acariciava pelo que ele sabia ser a última vez o seu amado.

James chorava, sem acreditar que estava ali, sem acreditar que o estava perdendo...

Sem acreditar que já o havia perdido.

Mas havia

E ele sabia disso.

the fox - o+s

E gozando-se dos seus quase extintos talentos de magia, muito debilitados pela ação da doença, ele fez como um mestre da mente a sua última mágica.

A mais bela, a mais dolorosa, a mais nostálgica.

A mágica mais bela que James já havia visto.

Conforme seus dedos deslizavam-se pelo rosto, pela cabeça do amado, visões foram-se sendo projetadas.

Lembranças, memórias felizes. E algumas... Nem tanto.

Mas que naquele momento, valiam a pena serem mostradas, simplesmente porque eles estavam juntos.

E nos minutos que se seguiriam, eles dariam tudo para poder voltar a se atracarem nos corredores – porque odiar o amor da sua vida, vivo, é muito melhor do que amar incondicionalmente alguém que você sabe que está morto.

Os olhos de James se fecharam, e o elo mental estabeleceu-se.

Eles viajaram nas memórias mais alegres, de outros tempos...

Primeiro, Hogwarts.

O ódio à primeira vista no expresso, os ressentimentos que perduraram por anos depois...

O primeiro beijo após uma briga no pátio de transfiguração. Sétimo ano.

Eram tão jovens, tão bobos...

Dois garotos apaixonados.

Depois, Severus conhecendo Dorea e Charlus.

Severus consolando James pela perda dos pais.

E James consolando Severus pela perda de Lily.

Em tantos momentos de agonia, encontraram forças um no outro...

E na hora da morte, Severus encontrava forças em James.

Mas e quando ele se fosse, em quem James encontraria forças para seguir em frente após a perda do grande amor de sua vida?

Não haveria Severus ali para confortá-lo.

Eles vivenciaram em menos de um minuto, o casamento, a lua de mel na Escócia, a adoção do pequeno Harry, a construção de uma casa incrível, que tivera tudo para ser o palco de um lar feliz para os três.

Ah, e como fora.

Com um último suspiro, um último sorriso, um último toque...

A mágica se desfez e os ruídos descompassados, oscilantes, da máquina que monitorava os batimentos cardíacos do já nem tão jovem Severus pararam, estatizaram. Tornaram-se estáveis, anunciando o óbito.

E James permaneceu ali, segurando a sua mão.

Até o final.

“— You'll stay with me?

— Until the very end”


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Notas finais do capítulo

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