Dia 1

Cabelo: 9/10

Querido diário,

Hoje foi o dia! Não acredito que meu plano resultou!

Estou tão feliz por finalmente te ter! Sempre quis — na verdade acho que preciso — um diário. Penso que ler o que escrevo é a única maneira de entender que estou sendo ridículo. Também acho que nós vamos nos dar bem.  Sempre me dou bem com pessoas que não têm medo de chamar-me de ridículo, embora, bem, você não seja uma.

Deve estar se perguntando o porquê de eu não ter arranjado um diário ainda, certo?

Bem, é que eu morro de medo que te encontrem. Especialmente a minha mãe… Não que ache que ela leria você sem autorização, só que não posso arriscar. Seria o fim da minha vida como a conheço se você fosse encontrado. Ela já me conhece o suficiente para zoar de mim até doer.

Tive que pensar muito bem sobre como poderia ter um diário sem que o encontrassem. Podia ser no computador, já que os conhecimentos dos meus pais acerca da tecnologia são bem rudimentares. Só que... É tão chique poder segurar um em minhas mãos!... Além disso, a minha letra sempre me irritou, vai ser uma boa maneira de treiná-la. Deus me livre ter letra de garoto feia que nem a do Boruto.

Desculpa, Boruto.

Não sei bem a etiqueta para me apresentar a um diário. Visto que vai ouvir de mim o suficiente, vou falar um pouco sobre como você chegou aqui.

“Tenji, não sou um diário!”. É, eu sei, desculpa.

Tudo começou com um livro que eu mesmo comprei, e serviu perfeitamente por um tempo! Aquela máscara de cabelo caseira com mel? Tem feito maravilhas!

Acontece que percebi que ninguém suspeitou de eu ter um livro de tratamentos para cabelo.

Então fez-se luz:

Iria te transformar no meu diário, disfarçado como um ninja secreto, exceto que, ao invés de segredos de guerra, seu dever seria guardar os devaneios de um genin de 13 anos, o que é muito mais legal! Só havia um último obstáculo: suas páginas já estavam completas.

“Sem medos,” pensei, “conheço um especialista — tá, o filho de um — em tinta e todos os jutsus relacionados a ela: Inojin!” Vou ter muito tempo para te apresentar todos os meus amigos; por agora, precisa saber que ele é um colega do tempo da academia. É filho de Sai, o ninja que sabe um monte de jutsus relacionados a desenho e pintura. Eles usam técnicas do mesmo tipo.

Perfeito! Pedi que removesse a tinta.

Adoro como as coisas sempre correm bem quando preciso pedir alguma coisa! Na verdade, quando conversamos, frisei que deveríamos estar sozinhos. Não queria que ninguém suspeitasse. Claro, não contei sobre o seu propósito, diário, apenas que precisava de remover a tinta das suas páginas.

O Inojin nem pestanejou: fomos para o quarto dele, e eu abri o livro.

Ele sabe que dá pra notar direitinho quando suas bochechas ficam coradas, ainda mais por ser tão pálido, certo?

Foi bem estranho… Ele não é de ficar envergonhado. Aliás, nunca o vi envergonhado. Mas quando ficamos sozinhos ali, e especialmente quando lhe agradeci, ele ficou todo constrangido.

Bem, deixa pra lá!

Cá está você, novinho em folha, e parece apenas um livro normal, que estaria na minha estante normal porque é um livro normal. Espero que a tinta fresca não esteja incomodando.

Sobre as anotações acima da página: sim, estou me referindo ao meu próprio cabelo.

Tem quem faça uma escala de quão bom o dia foi, mas para mim, seria melhor usar a medida “quão bom meu cabelo está hoje?”. Agora, por exemplo, está ótimo; não perfeito, mas pode melhorar já que vai ser lavado daqui a pouco com o novo champô de Romã que fiz papai comprar para mim.

Na verdade, duvido que alguma vez coloque um 10, visto  que ele deve ser deixado para ocasiões muito especiais e, para ser sincero, nunca sinto que meu cabelo está 100%.  Sempre tem um fio desviado, ou o caimento da minha franja me desagrada, ou o coque não está firme o suficiente ou…

Enfim!

Também prefiro contar quantos dias te tenho ao invés de usar a data. Talvez mude para semanas, anos ou meses — pretendo escrever por muito tempo. Contar me faz pensar e fica mais fácil organizar os meus pensamentos, garante que não saia escrevendo desalmadamente num dia ruim.

Falemos sobre mim:

Sou Tenji Hyūga, tenho 13 anos e me formei na academia ninja há cerca de um ano. Meu desempenho sempre foi bom, o que orgulha muito o meu pai, Neji Hyūga, e minha mãe, Tenten.

Me considero alguém muito… atento em detalhes.

Mas meus amigos preferem o termo “dramático”.

Ah, tem também o fato de eu ser mimado demais. E não vejo razão para mudar: seria cruel estragar o prazer dos meus pais em mimar seu único filho.

Devo falar bastante da minha família por aqui, me desculpe se for apressado por agora.

Sinto que só escrever o nome da minha mãe aqui pode estar invocando-a. Deve ser instinto mesmo, mas ela sempre me apanha quando estou fazendo algo embaraçoso, o que é quase sempre!

Meu pai é um pouco mais reservado, mas nos damos muito bem. Sempre que sinto que estou fazendo um drama gigante na minha cabeça, é ele quem procuro para me trazer de volta à realidade.

Embora eu seja muito parecido fisicamente com meu pai, minha personalidade é mais como a de mamãe. Ela é mais alegre e faladora, gosta muito de pregar peças e, assim como eu, zoar de quem mais ama.

Vivemos apenas nós aqui em casa, o que é ótimo, pois me sinto um príncipe o tempo inteiro.

Quanto aos amigos, tenho vários.

Os mais próximos são com certeza Chocho e Metal, colegas do time genin. Somos treinados por Rock Lee, o pai do Metal, ex colega de equipe do meu pai, e é por isso que já o conheço há um bom tempo, antes até de entrarmos na academia. Eu e Metal sempre nos demos bem…

Sinceramente não há ninguém com quem eu não me dê bem.

Ah! Metal é divertido demais! Me faz rir a toda a hora, zomba de mim e é ótimo parceiro para treinar. Praticamos bastante juntos, ele é muito talentoso, com um estilo de combate invejável que é interessante estudar.

A Chocho e eu nos conhecemos na academia. Ela é muito carismática — qualidade que também tenho — e confiante — qualidade que não tenho. É estranho porque me considero muito vaidoso, mas nunca iria conseguir falar metade das coisas que a ChoCho diz sem pestanejar. Ela não se importa com as opiniões das pessoas e gosta de comer e se divertir com a galera. Nos entendemos muito bem fora e dentro da equipe.

O preço é que zomba de mim a toda hora, especialmente unida com o Metal, mas isso me faz gostar mais deles. É estranho?

Se eu continuar falando de todos os meus amigos, não termino. A verdade é que quase todo mundo da minha idade me considera como um. Para alguns é só dar “oi” que pronto: tá feita a parceria. Vou discordar? Claro que não, isso seria rude.

Continuando com a minha família: sim, sou sobrinho postiço do Hokage; não, isso não muda minha vida em nada.

Para falar verdade, lembro-me melhor do tio Naruto antes dele virar Hokage. Agora mal nos vemos, mas isso não quer dizer que não veja meus primos com frequência. O Boruto em especial, por ter a minha idade e estar nos mesmos grupos, é das pessoas com quem mais me cruzo.

Não me leve a mal, nós nos damos bem — novidade —, mas é que, nossa… Fico constrangido quando me chamam de gênio, só que sempre que estou com o Boruto eu realmente me sinto um.

Isso foi rude demais. Desculpe.

Ele é muito infantil. Às vezes sinto pena e acabo por levá-lo comigo quando saio com o meu pai. Acho que se não fôssemos família, não nos daríamos tão bem.

Continuando...

Tem outra coisa que eu não falei, é uma história simples, um pouco trágica, embora hilariante para os de fora: tenho uma queda enorme pelo meu “melhor amigo”.

Odeio chamá-lo de melhor amigo, então vou chamá-lo de “melhor amigo” ou Shinki. Não é como se fosse segredo, todo o mundo já notou a não ser que seja cego… ou o Shinki.

Na verdade, apenas gosto de acreditar que ele ainda não percebeu porque se já notou quer dizer que não está fazendo nada quanto a isso — e que não gosta de mim — e isso ia ser o fim da minha vida.

Mas será que ele sabe?

Foco, Tenji.

Sei lá… Nós nos conhecemos desde infância, desde que ele foi adotado.

Pelo que minha mãe diz, meu pai não era de fazer muita amizade na adolescência, mas por alguma obra do universo e do destino, com certeza trabalhando para que eu e o Shinki pudéssemos ficar juntos para sempre, meu pai ficou amigo da mãe adotiva do meu “melhor amigo”.

Nossa amizade não é nada como a com o Metal e ChoCho porque ele é muito mais quieto e fechado. Funciona para mim pois consigo falar por ele, por mim, pela família inteira e pela vila também. Além de introvertido, é sério demais, ama treinar e quer ser todo fortão. Às vezes acho que deveria se acalmar. Ele gostou de mim — não sei bem como — e visitamos a casa um do outro há vários anos.

Zoo dele por exagerar nos treinos — e por mais coisas porque fico nervoso e é meu instinto —, mas ele não se irrita.

Passamos a maior parte do tempo juntos e sozinhos porque Shinki não curte quando há muita gente o incomodando. Especialmente o Boruto, o que entendo já que ele consegue ser bem cansativo. Se bem que às vezes queria que se dessem melhor, pois quando formos casar (só uma ideia) ele não pode se dar mal com o meu primo…

Ai… Nosso casamento será maravilhoso. Ele será Kazekage antes dos 30 — não que eu queira que Gaara, seu pai e atual Kazekage, morra! Apenas se aposente — e então serei parte da família real da Suna e sairei daqui sem ter todo o trabalho chato de Kage!

Ficaria na sala com ele o dia todo garantindo que não fique aborrecido e sem graça como o sétimo Hokage está virando.

Metal seria o padrinho, claro; ChoCho a dama de honra, e iria ter um monte de flores por todo o lado. Shinki adora jardinagem, uma coisa que acho fofa sobre ele, então não poderia faltar.

Também iria ter que acordar bem cedo para a equipe de cabeleireiros trabalhar.

Não sei do que estou falando.

Nem sei se é permitido que a gente se case, falando a verdade. No entanto, sendo Kazekage, ele faria as regras. Iria mudá-las por mim, seria lindo e romântico e ninguém poderia falar nada!

Okay, chega de Shinki.

Não esclareci bem a minha sexualidade aqui. Me esqueço porque que raramente falo sobre ela cara a cara com alguém.

Apenas a ChoCho e o Metal sabem da minha queda pelo Shinki diretamente de mim. Não que eu tenha problema com isso — se tivesse, estaria condenado —, mas é tão natural que nem precisou de conversa.

Meus pais já devem ter adivinhado. Mamãe tem aquele instinto de sempre saber quando estou fazendo algo embaraçoso, como já falei. E adivinha? Noventa por cento das coisas embaraçosas que faço é devido a essa maldita queda! Papai é mais sério, mas até ele ri de mim às vezes. Nunca tivemos uma conversa sobre isso, mas tenho a certeza que não os incomoda, e nunca senti necessidade de esclarecer que realmente estou interessado no Shinki.

É bom sentir-me confortável com eles desse jeito e sei que se desejasse falar sobre isso, poderia. Os dois sempre foram do tipo “Se quiser, estamos aqui, não vamos forçar, venha até nós, etc.", essa fofura toda.

Metal faz brincadeiras o tempo todo no treinamento. No último, estávamos treinando, e ele falou: “Olha o Shinki!”. Virei para trás e acabei com a sola do Metal na cara.

Mereci.

Não havia Shinki em lado nenhum, apenas a ChoCho chorando de rir.

Shinki foi a primeira e única pessoa por quem me interessei, mas me considero bi porque… Bem, é um pouco difícil de explicar, mas quando ouço a galera falando de garotas, não me sinto alienado da conversa. Hipoteticamente, num mundo alternativo onde essa queda não existisse, me vejo tanto com uma garota quanto com um garoto. Eliminando o Shinki da equação, nem sei dizer qual prefiro.

Entendo quando eles falam de como elas são bonitas, consigo ver o apelo e a atração, apenas não consigo me imaginar com mais ninguém além do Shinki.

Garoto ou garota.

Diário, me perdoa por essa entrada enorme. A verdade é que falo demais e queria continuar falando, aliás. Entretanto, não posso porque acabei de receber a notícia que o Shinki estará me visitando na próxima semana. Ele vem fazer as inscrições para o exame Chunnin e ficará por aqui um dia ou dois.

Exato! Tenho que ir testar o champô de romã imediatamente. Será que ele prefere o florido? Nunca perguntei a flor preferida dele, sou muito estúpido!

Que meu cabelo esteja ainda melhor amanhã.

Amor, Tenji.