Setenta e três por cento escrita por Corelli


Capítulo 2
Quebre o sistema


Notas iniciais do capítulo

Olá, pessoas!

Para vocês, o segundo e último capítulo.
Espero que gostem!



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Você sente que um calor no seu peito vem aumentando a cada encontro. Brasas ao redor do seu coração parecem ser atiçadas toda vez seus olhos azuis atingem os verdes de Lena.Você acha que ainda é cedo para chamar de desejo e não o faz por um tempo. As brasas ficam guardadas no fundo de sua mente.

 

É no seu quinto encontro que o calor no peito se parece mais como uma chama acesa do que brasa. Você está perto, muito perto de Lena e isso atrapalha até a sua memória de como chegou ali. Em pé, na porta de seu prédio, frente a frente e há milimetros de distância da mais jovem Luthor. Diferente das outras vezes, ela não parece tão implacável. Você arriscaria dizer até um pouco tímida.     

 

“Isso é um ‘até breve’?” Ela quebra o silêncio e, então, você se lembra de que estavam se despedindo.

 

“Com certeza.” Você não quer soar entusiasmada demais, mas as palavras deslizam de sua língua mais rápido do que a sua mente forma pensamentos.

 

Lena se aproxima um pouco mais do seu rosto e beija o canto de sua boca, levando mais do que apenas alguns segundos. Você acha que pode ouvir o crepitar das chamas no seu peito tomando uma proporção ainda maior. Ela se afasta muito pouco deixando o fantasma de  seus lábios ainda queimando na sua pele, a respiração misturada com a sua. Você não pensa em mais nada senão beijá-la. E é tudo o que você faz. Você a beija. Não há mais palavras para descrever o que sente. Fogos de artifício. Incêndio. Nada disso não chega nem perto.

 

Seus lábios se movem lentamente junto com os dela, não indo muito além e dura menos do você espera ou que você quer que dure. Mesmo assim, é um beijo diferente de todos os outros que você já experimentou, o melhor de todos.  Seus olhos se abrem quando Lena se afasta, apenas para registrar o sorriso doce que toma sua face.

 

“Boa noite, Kara.” Ela sussurra e se distancia.

 

Você só sai do seu estado inerte quando tudo o que vê, ainda que rapidamente, é a porta do carro luxuoso batendo e os pneus se movendo na estrada.

 

Seu coração ainda bate fortemente nos seus ouvidos e o toque de Lena Luthor ainda está presente na sua pele quando sua cabeça já está confortável em seu travesseiro e seu corpo pesa cansado sobre o colchão. Você não dorme, porém. No fundo de sua mente há uma voz que a mantém acordada, dizendo que o seu coração vai acabar quebrado.

 

—x-

 

    Passam-se dias que se tornam semanas e, então, um mês inteiro, e o presságio dessa voz continua lá, agora quase como um sussurro. Você o nota quando o silêncio é a sua única companhia e os seus pensamentos borrados e mais obscuros se tornam sufocantes. Esses momentos são poucos e acabam, contudo, então cada vez você enterra mais e mais profundo, esperando que desapareça. É mais fácil quando você passa mais tempo com Lena. Quando, em algumas manhãs, você acorda com o rosto dela ainda pacífico, bem próximo do seu. É assim que você o esquece por tempo.



—x-




Depois de mais algum tempo, a voz, então, retorna.



É uma manhã comum de domingo, uma manhã do seu novo comum. Você acorda com a luz do sol infiltrando-se pela sua janela. Esperando encontrar um outro corpo, você estende os braços na extensão do colchão. Mas não há nada além do vazio. Aquela mesma voz surge, um pouco mais alta do que o som do seu coração batendo nos seus ouvidos e você se desespera, quando abre os olhos e não avista Lena no quarto. O medo de ter estado certa é grande demais para que se escute o outro lado dizendo que pode ser apenas uma tolice sua.

 

Você se levanta, veste as primeiras roupas que vê no chão o mais rápido que consegue e avança até a cozinha. Um suspiro de alívio escapa de seus lábios quando encontra Lena na lá. Você se sente tola por um instante e sorri por pensar que o seu presságio esteve errado.

 

Lena está sentada em um dos bancos, os braços apoiados no balcão, de costas para você. Ela não parece ter percebido a sua presença. Você se aproxima e enlaça sua cintura colocando um beijo quente no pescoço pálido.

 

“Bom dia.” Você diz, mas ela não responde.

 

Lena quase nem se move. Seu corpo endurece com o contato, então você se afasta um pouco, restringindo o toque a uma mão no ombro coberto pela alça branca da camisola.

 

“Tem alguma coisa errada?” Você pergunta, assim que ela encara seus olhos. A expressão no seu rosto muito parecida com a que você viu uma vez que esteve no seu escritório.

 

“Eu suponho que não”, ela desvia para um ponto qualquer na parede, você não entende.

 

“Você supõe?”

 

“Se é suposto que não deveria ter algo de errado.” Você ainda não entende, não há pista nenhuma no que o seu rosto deixa transparecer.

 

“Lena, o que-”

 

Você encontra, então, no celular em cima do balcão. No número aceso na tela. Oitenta e sete.

 

“Eu… Eu sinto muito, Kara.”

 

Você acha que pode ouvir o seu coração se quebrando. Você sabia que isso poderia acontecer. Essa era uma consequência do sistema, afinal.

 

“Não sinta”, você diz e não se reconhece. “É pelo melhor, não é?”

 

“É pelo melhor.” O olhar que ela te lança parece concordar em nada com as suas próprias palavras. Mas Lena não volta atrás, embora pareça esperar que você faça alguma coisa.

 

Você a deixa ir, no final das contas.

 

Ainda pela manhã, você a observa, em silêncio, sair pela sua porta, mesmo que seu interior grite para impedí-la. Mesmo quando tudo o que você quer fazer é dizer o quanto o sistema é estúpido e que você não acredita nele.

 

É pelo melhor.

 

Na noite do mesmo dia, você esvazia sozinha a garrafa de vinho que tinha comprado para o jantar em comemoração dos quatro meses que se conhecem e acaba adormecendo abraçada no travesseiro de Lena.



—x-



Você se sente entorpecida na maior parte do tempo. Cinco semanas depois de ter seguido em frente, seu nome continua no sistema, nada acontece e você não se importa. Você apenas continua com a sua vida. Faz o seu trabalho, sai com sua irmã e seus amigos. Age como no antigo normal de sua vida.

 

Embora você tente com todas as suas forças se convencer de está tudo bem, ou que pelo menos, ficará, não parece suficiente. As coisas estão fora do lugar. Alex também percebe. Ela faz um esforço ainda maior, embora esteja com Maggie agora, para trazer um sorriso para o seu rosto, faz as noites das irmãs serem mais frequentes e até arrasta você para bares. Você aprecia isso e a acompanha na maioria das vezes. É um modo fácil de esquecer o vazio que você sente.



—x-



É no caminho de um bar, a convite de Alex, que você sente a inércia se esvair de seu corpo.

 

Congelada no meio da calçada, uma esquina antes do seu destino, você vê Lena do outro lado da rua. A batida do seu coração é forte nos seus ouvidos e você sente o seu rosto quente. Ela não parece ter o conhecimento da sua presença. Há uma mulher ao seu lado, ela tem um dos braços envolto nos seus ombros e parece estar dizendo algo engraçado para Lena que ri. Você imagina se essa mulher é o oitenta e sete e se pergunta se Lena está mais feliz do que esteve como você. Você acha que ela parece feliz.

 

Então, o olhar dela atinge o seu e há um lampejo de alguma coisa que você não reconhece no seu rosto antes que o seu sorriso se desfaça. Você dá meia volta antes que as linhas borradas de seu pensamento surjam e afetem as suas ações.

 

Sua mente parece estar num loop infinito da última vez que Lena esteve com você. É pelo melhor. É pelo melhor, você repete, mas, como naquele dia, não acredita nem um pouco. Como naquele dia também, o álcool é sua companhia, quando você finalmente chega ao seu apartamento. Dessa vez você adormece no sofá.

 

Você vê que há muitas chamadas perdidas de Alex, e que já passou das duas da manhã, quando batidas na porta fazem você despertar. O tempo de sono não foi suficiente para que você se livrasse de todo o álcool presente no seu sangue, então seus passos são cambaleantes até a porta e você hesita um pouco antes de abrir, prevendo que seja sua irmã do outro lado.

 

Para a sua completa surpresa, é Lena quem está lá.

 

Você encontra o verde dos seus olhos perdido. Ela parece nervosa, muito diferente de como você está acostumada a ver na mídia.

 

“Desculpe-me, é tão tarde”, ela sustenta seu olhar por um momento e desvia deixando transparecer nos seu rosto os indícios de uma batalha interna. “Eu não deveria ter vindo aqui.” Lena diz se afastando, mas você segura seu braço e a impede.

 

“Não… Não vá.”

 

O seu próximo movimento é puxar o corpo dela para si e tomar seus lábios.

 

Que se foda o sistema.

 


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Notas finais do capítulo

Comentários são sempre apreciados!



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