O dia estava clareando e era possível ver o sol “atrás” das colinas; o céu daquela manhã era colorido e exibia extrema beleza. Sophie e Matt estavam ansiosos por aquele importante dia: iriam para a faculdade. Ambos estavam, como sempre, disputando o uso do banheiro, mas desta vez Matt ganhara, e ainda pediu à irmã que lhe fizesse panquecas de chocolate. “Ele não muda mesmo! Folgado aqui, lá e onde for...” pensou Sophie, rindo. Os dois comiam tranquilos, havia tempo suficiente para que fizessem qualquer coisa, haviam acordado bem cedo exatamente para isso. Mesmo com tempo, Sophie acreditava que por alguma razão, se atrasaria, e assim que acabou o café dirigiu-se ao banheiro.

A governanta descia as escadas para se juntar ao jovem Matt, que já estava pronto e só esperava a irmã para que pudessem finalmente partir, porém Sophie ainda demoraria: sua ansiedade era grande o suficiente para que tivesse dúvida do que vestir, algo muito incomum na rotina da garota. Mas era possível entende-la, afinal, este momento que se aproximava havia sido adiado inúmeras vezes. No momento em que Matt viu sua irmã descer as escadas, teve de admitir para si mesmo que ela estava deslumbrante. O garoto quis então fazer um elogio a ela, outra coisa que era por completo incomum.

          -Você não se veste assim quando vamos sair com nossos amigos. – Ele a observava fingindo um olhar de reprovação, o que a deixou envergonhada.

          - Eu estou pior do que imagino? – Ela abaixa a cabeça para ver suas roupas e concordar ou não com o irmão.

          -É brincadeira Sophie! Pare de levar tudo tão a sério, você está muito bonita!

Matt sorri e vai até a irmã, passando o braço atrás de sua cabeça e abraçando-a, como se lhe dissesse “vai dar tudo certo...” amigavelmente. Ambos andaram até a estação, que era relativamente perto de sua casa. Lá ficaram a espera do ônibus que os levaria ao seu mais desejado destino, a universidade Saint Charles. Sophie andava de um lado paro o outro e olhava para o portão por onde saiam e chegavam os ônibus, deixando clara a sua impaciência. A agonia da garota aumentava cada vez mais à medida que via pessoas entrando e saindo tanto da estação quanto dos ônibus.

- Você deveria ficar mais tranquila, está tão afobada que veio de chinelos e esqueceu-se do tênis... – disse Matt à irmã de forma tão calma que chegou a irritá-la.

Sophie olhou rapidamente seus pés, mesmo sabendo que não calçava chinelos.

Fez-se acreditar que era um reflexo, mas ela sabia que tinha caído na brincadeira do irmão, fazendo com que ele a olhasse com uma expressão de felicidade no rosto. Um dos passatempos preferidos de Matt era pregar peças na irmã, e ela sempre se deixava enganar, o que o divertia e o fazia pensar em como sua irmã sempre seria sua irmãzinha.

A “longa” espera finalmente acabara, o tão esperado ônibus se aproximava. Sophie e Matt abriram grandes sorrisos em suas faces. Para eles, uma nova fase começava e, por mais que a almejassem, no fundo não sabiam se estavam realmente preparados para tal. Os sentimentos de ambos confundiam-se entre felicidade, desespero e nervosismo. A cabeça de Sophie mal distinguia razão de emoção naquele momento, seu coração estava batendo a uma velocidade para ela desconhecida. Já Matt aparentava estar completamente calmo, porém, remoia dentro de si toda a pressão dessa nova vida.

Os irmãos observavam a paisagem, um pouco mais tranquilos. Toda agonia e nervosismo pareciam diminuir, conforme avançavam. Os belos campos floridos marcaram a paisagem. Via-se ao longe vacas pastando e cavalos correndo. Homens trabalhando em suas plantações, com os rostos molhados pelo suor e iluminados pelo “sol matutino”. As flores pareciam ganhar vida e dançar no ritmo do dia, como se quisessem andar por todas as colinas ali visíveis. As grandes mansões que se encontravam no caminho eram possuidoras de jardins invejáveis, sendo possível apelidá-los de morada das borboletas. Sophie ouvia uma música agradável, porém triste; Logo seus olhos estavam derramando lágrimas de felicidade, dor e saudade. Ao ver tal cena, Matthew abraça a irmã, acomodando-a próxima a ele. “Vai ficar tudo bem, não precisa se lembrar de nada agora. Passou. Estamos começando de novo, não?”, cochichou o rapaz, na esperança de reconfortá-la, mas tais palavras o fizeram chorar silenciosamente.

-Matt... Você acha que devemos esquecer tudo? Digo... Simplesmente passar uma borracha em tudo e deixar de lado as coisas boas? – Os olhos da garota ainda estavam carregados de lágrimas e direcionados para baixo, sua cabeça estava acomodada no peito do irmão.

-Ah Sophie, eu não sei o que responder. Mesmo tendo nascido junto com você, sinto uma estranha necessidade de cuidar de ti, como se fosse minha irmã mais nova. Eu não quero que se esqueça dos bons momentos Phie, eles trouxeram boas memórias, para nós dois. Mas tem de apagar essa dor do seu coração, ela não lhe faz nada bem e eu odeio ver você triste por coisas que já se passaram. Eu não posso mentir pra você dizendo que já não tenho mais saudades, mas sei que posso ficar do seu lado e te oferecer apoio.

Matt abraçou-a forte. Era um bom rapaz e estava sempre ao lado da irmã, ela precisando ou não. Era alto e fazia muito sucesso com as garotas. As esmeraldas em seu rosto eram marcantes e contrastavam com sua cabeleira ruiva, que estava sempre desarrumada de uma maneira encantadora. Um rosto muito bem desenhado, combinado com uma pele clara e um resto de barba sempre por fazer faziam do rapaz dono de uma beleza inigualável.

A viagem seguira tranqüila. Tentando se manter calmo e afastado das lembranças, Matt ficou calado o restante da viagem. Sophie sabia que o irmão estava chateado; todas aquelas lembranças vindo à tona, em um momento tão crítico. Porém a garota jamais poderia afirmar algo em relação aos sentimentos do irmão, já que o rapaz sempre fora muito misterioso.

Para a alegria de ambos, estavam (finalmente) a poucos metros da Universidade de Saint Charles. Sua nova casa. No centro do campus, havia um enorme prédio rodeado de outras construções. Mais ao sul encontrava-se o prédio dos alojamentos, carinhosamente apelidado de “Descansotório”. Este por sua vez, apresentava-se tão grandioso quanto o prédio central e era rodeado por um extenso gramado. O campus era um ótimo lugar para se viver: além de apresentar uma ótima infra-estrutura, a atmosfera do local era acolhedora. Próximo aos alojamentos, havia quadras e campos para a prática de esportes e uma piscina coberta (esta era propriedade exclusiva do clube de natação). A biblioteca era uma das construções que rodeava o prédio central. Para a felicidade de Matt, a variedade de livros era imensa: desde livros para estudo até literatura estrangeira. O acervo da biblioteca de Saint Charles deixava qualquer colecionador com inveja. Outra construção invejável era a “Morada da Ciência” (assim apelidada pelos fundadores da Universidade). Este era o local onde estavam todos os laboratórios da Universidade. No prédio central havia apenas salas de aula e um enorme salão.

            “Saint Charles... É assim que você é então. Melhor do que eu pude imaginar.”, pensou Sophie depois de passear pelo campus com os outros calouros, guiados por um pequeno grupo de veteranos. Entre os veteranos, um em especial despertara a curiosidade de Sophie, pela tatuagem que possuía no braço direito. Era Heidan Stew, estudante do 2º ano de medicina. Era um rapaz de altura mediana e aparência desleixada, entretanto era bonito: tinha cabelos negros e olhos cor de mel. A timidez de Sophie falou mais alto que sua curiosidade, e ela não teve coragem de falar com ele. Ao fim do “tour”, ela e Matt se dirigiram aos alojamentos. Desajeitada como sempre foi, Sophie esbarrou em duas pessoas, derrubando-as.

            - Desculpe, eu sou um pouco desastrada. – Disse a garota, levantando-se, desculpando-se e tentando ajudar as pessoas que derrubara. Matt disfarçava o riso próximo ao “acidente”.

            - Ah, não se preocupe, essas coisas acontecem. Você deve ser caloura também, não? Bem, eu sou Emily. Emily Copperman. – Respondeu uma moça com cabelos negros e curtos e uma pele extremamente clara.

            - Sim, como Emily disse, essas coisas acontecem. Eu sou Kevin Walker, estudante de medicina do 2º ano. – Disse simultaneamente o outro jovem que fora derrubado.

            - Ah... Oi... Hm... Desculpe novamente. Eu sou Sophie Dickson, e esse – Sophie puxou o irmão para perto de si – é meu irmão, Matthew Dickson. Muito prazer em conhecê-los. Somos calouros sim, e estamos adorando o campus.

            - Bom saber. Eu sou monitor de corredor aqui na Saint Charles, garanto que nos veremos mais vezes, mas preciso ir agora. Vejo vocês por aí. – Disse Kevin despedindo-se e afastando-se lentamente.

            - Vocês estão indo para os alojamentos?

            - Sim, e eu não deixarei minha irmã derrubar mais alguém pelo caminho.

            Emily e Matt riram o suficiente para que Sophie pensasse “Meu irmão não vai mudar mesmo...” e risse junto. Os três caminharam até os alojamentos lentamente e conversaram muito durante o “percurso”. Emily Copperman era uma garota interiorana, muito bem informada e com um gosto muito refinado para tudo. Sua aparência era peculiar, com destaque para seus olhos azuis. Logo de cara, era possível perceber sua personalidade marcante.

Checando as listas dos alojamentos, tanto Sophie quanto Matt alegraram-se. Sophie iria dividir o quarto com Emily e Matt ficaria sozinho em um quarto, pois havia um número ímpar de garotos, e os quarto acomodavam no máximo dois estudantes. “Meu irmão deve estar feliz, sempre odiou dividir quarto mesmo”, pensou Sophie. “A Phie vai ficar contente, está dividindo quarto com uma garota que não é mais completamente desconhecida pra ela”, pensou Matthew simultaneamente.

            -Phie, eu vou para o meu quarto, aproveitar a “falta de alunos”. Até amanhã.

            -Até, boa noite adiantado. – Respondeu Sophie sorrindo.

            Matthew abraçou a irmã, cumprimentou Emily e subiu as escadas rumo ao segundo andar. Logo que entrou em seu quarto, sentiu-se um rei. O alojamento não era muito grande, mas era perfeito: era bem arejado com janelas estrategicamente localizadas, um dos poucos quartos do campus que tinha camas de solteiro um pouco maiores do que as convencionais, as quais estavam posicionadas nos cantos esquerdo e direito do quarto. Havia também uma grande escrivaninha de madeira maciça, com algumas prateleiras adaptadas na extremidade esquerda e sobre as mesmas, folhetos da universidade que mostravam regras de conduta e uma luminária de tamanho médio que iluminava bem o ambiente durante a noite. Localizado na extremidade esquerda do quarto, de frente para uma das camas, havia um grande guarda-roupas. Espalhadas pelas paredes, pequenas prateleiras de madeira davam um toque rústico ao ambiente.

            Era possível ver a animação de Emily e Sophie no momento que adentraram o quarto. Todas as acomodações estudantis eram idênticas, mas ambas as garotas deram um toque pessoal no cômodo para que o mesmo se tornasse ainda mais confortável. Terminado o “trabalho”, cada uma se jogou em sua cama, com aparente cansaço.

            - Quantos anos você disse que tem mesmo? – Perguntou Emily ofegante.

            - Dezenove. – Sophie parecia não quere falar sobre o assunto.

            - Hey, hoje à noite os veteranos vão dar a famosa festa de boas vindas aos calouros, você vai?

- Claro, porque não? Ouvi dizer que essa é a universidade mais festeira dos EUA!

- Ouviu certo! Meu irmão mais velho estudou aqui e sempre me contou ótimas histórias das festas aqui. Mas eu fiquei animada em vir estudar aqui quando ele me falou da biblioteca. – Os olhos de Emily estavam com um brilho diferente. Ela realmente amava ler e a biblioteca de Saint Charles a deixava extasiada.

As meninas conversaram por muito tempo, tempo suficiente para que se conhecessem melhor, para que se considerassem amigas. Em termos de personalidade, eram bem parecidas. Sophie acreditava que seria demasiado agradável passar os próximos anos ao lado de Emily.