Sussurros da alma escrita por Yui Kaori


Capítulo 1
Capítulo 1 O casamento mortal




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Bonnie Green – Inglaterra, 1892

Nelly Pheal dormia tranquilamente até perceber que alguém levantara as cobertas e a abraçara. A garota, porém, já sabendo que se tratava de sua irmã mais velha, Holly, não esboçou reação ou protestou contra o ato. Simplesmente fechou os olhos e tentou voltar a dormir.

No entanto a cama parecia estar se encharcando cada vez mais e sua irmã ficara tão fria como uma boneca de porcelana.

— Holly?- chamou Nelly com a voz rouca- Que há com você? Está tão gelada... E porque parece que molhou a cama?

Sem obter nenhuma resposta da irmã, Nelly resolveu acender uma vela para saber o que estava acontecendo.

Ao levar a pequena chama até a altura da cama onde repousava, a garota deixou escapar um grito agudo e agonizante que ecoou por quase toda a mansão dos Grant.

                                                           .  .  .

Cloud, o herdeiro e filho mais velho da nobre família Grant, parecia desesperado ao ouvir a alguns minutos atrás o que parecia ser um grito de mulher.

Desesperado ele andava de um lado para o outro do escritório, passando os finos e longos dedos por entre os cabelos lisos e de tom castanho claro, muitas vezes arrancando-lhes alguns fios.

Já ia então abrindo a porta quando esta se escancarou revelando um homem alto e muito ossudo. Era Bill Flick, o mordomo.

— Mil perdões, Sr Grant. – disse o homem – Procurei o senhor em seus aposentos, mas...

— Diga logo o que faz aqui- respondeu Cloud fria e severamente- Não tenho tempo para rodeios.

— Bem... Os criados, meu senhor. – começou Bill- Eles ficaram agitados por...

Antes que pudesse terminar Cloud se jogou contra Bill como uma fera selvagem que havia sido atiçada.

— Ao diabo você e os malditos criados!- gritou o rapaz agarrando o mordomo pelas vestes de dormir que este usava- O que eu tenho a ver com isso?

—É H-Holly, meu senhor. - gaguejou o mordomo assustado – Ela está morta.

A face branca de Cloud se tornou tão pálida quanto o mármore. Suas pupilas se contraíram horrorizadas com o choque das palavras de Bill, que dançavam em seus ouvidos como moscas no mel.

Aos poucos o rapaz foi soltando as vestes do mordomo e tateou a cadeira mais próxima para se sentar, pois suas pernas pareciam não querer deixá-lo em pé.

Demorou alguns segundos até Cloud notar que Bill o sacolejava e chamava por seu nome.

— Me largue homem! - protestou o jovem se desvencilhando das mãos do mordomo.

O rapaz direcionou-se ao corredor, saltando e muitas vezes tropeçando nos degraus da escadaria.  Cloud parecia ser invulnerável a qualquer tipo de dor causada pelos objetos que esbarravam nele.

Sua pressa demonstrava uma desesperadora necessidade de confirmar com os olhos o que os ouvidos se recusavam a acreditar.

Atravessando a cozinha entrou por um estreito corredor cheio de portas, das quais somente uma estava rodeada por empregados.

— O que fazem aqui ainda? – gritou Bill com ar de superioridade- Deem passagem ao patrão, suas lesmas!

Cloud saiu atropelando os empregados até chegar no interior do quarto e ver, horrorizado, o que parecia uma linda manequim em trajes de noiva muito luxuosos.

Ajoelhada ao pé da cama se encontrava uma garota aos soluços com o rosto enterrado entre as mãos. E ao seu lado estava um rapaz de dezesseis anos, usando um hobby azul turquesa. Era Phillip Grant, o irmão mais novo de Cloud.

Cloud, num ato de desespero, se atirou contra o corpo de Holly que o fitava com seus olhos de grandes e negras pupilas sem brilho, sem alma.

Ele parecia querer tocá-la e ao mesmo tempo a temia, ora estendendo a mão em direção ao rosto da garota, ora retraindo o corpo com medo dos olhos que o encaravam.

— POR QUE, HOLLY?! – gritou Nelly chorando e fitando o chão como quem procura por pistas- COMO ISSO FOI ACONTECER? PORQUE JUSTO COM ELA, DEUS?! EU JURO QUE NÃO VOU SUPORTAR... EU JURO QUE NÃO – uma onda gélida percorreu o corpo da garota fazendo com que ela se calasse. Seus ouvidos já não distinguiam mais som algum e antes de tombar desacordada sentiu seu corpo ser sustentado por alguém.

— Vocês ai – disse Phillip abruptamente aos empregados mais próximos- Preparem um chá para Nelly. Vou levá-la a um dos quartos de hóspedes.

— Mas senhor- protestou Bill- Uma serva, nos aposentos da casa?

— Não fale besteiras, Bill- retrucou o jovem mestre- A mãe de Nelly foi como uma mãe para mim. Se eu estou diante de você hoje foi porque Isabella me alimentou e cuidou de mim desde o meu nascimento.

“E além do mais- continuou Plhillip olhando para o irmão que se encontrava inerte a toda situação a sua volta- Cloud não está em condições de protestar contra o que digo ou faço.”

Bill deu passagem ao garoto que saiu apressado, seguido dos empregados que esvaziavam o quarto em silêncio total.

O mordomo esfregava as mãos nervosamente como alguém que procurava as melhores palavras para dar uma notícia ruim.

— Sr Grant- começou ele cautelosamente- O senhor deve ter reparado que o vestido dessa moça pertencia a sua finada mãe, Srª Alice.

“Isto, é claro, confirma o que eu já suspeitava a algum tempo; que esta garota vem roubando pertences de sua família.

— Deixe-me, Bill- disse Cloud acordando de seu transe.

— Mas senhor! A polícia logo estará aqui.

— Apenas... Apenas obedeça- a voz do rapaz parecia pastosa como a de quem está prestes a cair em um choro profundo – Deixe-me com meus pensamentos.

— C-Claro, mestre. – concordou Bill meio desconfiado – Como desejar.

Assim que a porta atrás de Cloud se fechou, a expressão pálida em seu rosto deu lugar a uma torrente de lágrimas que queimavam sua pele como gotas de lava escaldante.

Ele sentou-se sobre a cama, colocou o corpo frio de Holly em seu colo, e acariciou o rosto da garota afastando algumas mechas de cabelo que lhe cobriam as bochechas.

Cloud vislumbrou uma grande mancha de tom vermelho escuro em volta do rasgo no peito de Holly, de onde toda a sua vida se esvaíra. Olhar para aquela ferida deixava o rapaz cada vez mais confuso. Ele não sabia se procurava em suas memórias algum tipo de resposta ou simplesmente se conformava com o fato de que quem foi não volta mais.

Então, como numa última tentativa de se despedir, ele aproximou sua face à de Holly, repousou os lábios entreabertos sobre os da garota e recebeu desta seu beijo póstumo.


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