Assombros escrita por Tina Santos


Capítulo 1
Capítulo 1


Notas iniciais do capítulo

Embora a sinopse a narração fica por conta de Pacifica que está passando por um drama familiar.
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Postada também no Amino na comunidade Gravity Falls Amino PT|BR
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Espero que gostem. Eu a escrevi ano passado.



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Assombros

Dois meses. Dois infernais meses! Eu já não aguentava mais móveis levitando, arranhões nas portas, sussurros inaudíveis pela madrugada e o som do maldito machado cortando algo. Não conseguia dormir e não conseguia sair daquela casa. Meus pais sem qualquer noção do perigo continuavam com seus jantares foras, indo aos clubes ricos e não dando a mínima para nada. A maquiagem escondia grande parte do cansaço que eu sentia, emocional e mental. Eu estava farta dos horários para sair, as festas superficiais e chatas, as exigências sem qualquer reconhecimento.

A estranha alegria e alívio que sentia era quando os irmãos Pines estavam na cidade. Mabel tinha estranhamente virado uma amiga incomum e improvável. Embora não usássemos esse termo para definir nosso embate. Fazíamos um torneio de minigolfe sempre que ela estava na cidade, como era o caso de hoje. O novo motorista da família me esperava na entrada da mansão.

— Não demore a chegar Pacífica, temos um encontro com...

— Já sei. _ interrompi meu pai que lia o jornal com interesse. Ele apenas olhou para mim e não disse mais nada.

Assim que passei pelos portões da mansão um peso pareceu ficar para trás assim como a casa e meus pais. Deitei a cabeça fechando os olhos por uns intantes, ao menos foi o que me pareceu quando William me sacudiu para avisar que havíamos chegado.

Com os olhos pesados do sono acumulado retoquei a maquiagem e ajeitei a roupa pegando a sacola de tacos e eu mesma carregando ao invés de entregar a William. Mabel já estava no campo, a blusa pólo rosa e o short branco com tênis e um boné conversando animadamente com um estranho de sobretudo preto num dia quente de verão. Dei de ombros, não era do meu interesse saber. Mas ao me notar ela se despediu da figura que caminhou em direção às árvores.

—Estava achando que havia desistido! _ provocou se apoiando no taco.

—Estava dando tempo para você correr para casa._ dei um sorriso que para muitos aspectos era convencido e esnobe. Mas naquele momento mascarava o cansaço, o choro preso na garganta e o medo.

—Vamos começar?

O jogo seguiu com um irritante empate até os novos buracos construídos. Antes de prosseguir tiramos uma pausa para comer alguma coisa. William estava a postos na lanchonete do clube quando chegamos. Animada, Mabel começou a tagarelar sobre várias coisas que eu não saberia listar.

— ...mas Dipper nem ao menos se dignou a fazer esse pequeno favor a irmã favorita dele! _ Falou emburrada pelo o irmão gêmeo ter recusado a acompanhar ela.

Continuei bebendo meu suco. Mason não gostava muito de mim, o sentimento era mútuo. Então raramente eu o via quando saia com Mabel, que não era tantas vezes assim.

— ... prefere ficar caçando fantasmas ao invés de se divertir. Por isso não arranja namorada... _ com um suspiro decepcionada voltou a comer.

— Fantasmas... _ murmurei, uma idéia formando-se.

O jogo terminou tarde, o pôr-do-sol pintava o céu de laranja quando Mason nos encontrou no último buraco. Um elaborado mini campo representando a civilização asteca da América do Sul. O mini templo iluminado por luzes e cercado por tocas de pedra.

— Ainda não acabaram? _ perguntou ao chegar perto. Não nos cumprimentamos. Com seus quinze anos, sua voz tinha finalmente se tornado masculina, embora meia rouca. Os cabelos castanhos rebeldes grandes ocultava sua marca de nascença que renderá seu apelido.

— Estou quase a vencendo! _ Obstinada Mabel se preparou para mandar a bola para a entrada do templo.

Me apoiei no taco a observando e Mason veio para o meu lado para não atrapalhar a irmã. Ele estava mais alto do que no verão passado, e usava um perfume gostoso. Mudei de posição colocando o taco no ombro.

—Anda logo!_ reclamei pela a demora.

—Calada!

A resposta brusca não me incomodou, fazia parte da nossa rotina. William apareceu, provavelmente porque eu estava atrasada e apenas confirmei com um aceno. Me senti tensa.

—Infelizmente vamos ter que deixar essa tacada para outro dia. _ anunciei colocando o taco na sacola que William carregava.

Mabel reclamou.

— Até mais, Pines

— Tchau! _ Mabel gritou. _ Marcamos outro dia hoje à noite!

Achei ter ouvido Mason se despedir. Mas continuei caminhando ao lado de William, que me observava. Ele tinha sido contratado para isso, me observar.

A noite foi uma completa decepção já que havia um espírito mortal assombrando a casa, nossos convidados mal ficaram para a sobremesa que explodiu em todos os lugares. Para ser sincera, mesmo sendo Gravity Falls, a cidade mais louca do país com relatos não comprovados sobre aparições de criaturas estranhas e eventos mais estranhos ainda, eu me sentia apavorada. Naquela noite mesmo com os móveis sacudindo e tendo que entrar no closet, o cansaço foi maior que apaguei em algum momento durante a madrugada.

┈┄┉┅൦ഠ൦┅┉┄┈

Acordei decidida a acabar com aquela situação. Atravessei a mansão até a cozinha, em alguns corredores vasos caros estavam quebrados e empregados os recolhiam, mas as marcas nas paredes não tinha como encobrir. Achei William conversando com a ajudante da cozinheira que ao me ver voltou a prestar atenção na louça que lavava.

—Bom dia. _anunciei de mau humor. A reação dos empregados era sempre a mesma quando me viam, eu tinha lá minha fama quando criança.

—Bom dia senhorita_ responderam.

—William preciso que me leve à um lugar. E é urgente! _ catei dois pedaços de bolo recém saído do forno e os comi quando uma outra empregada colocou uma xícara de chocolate na bancada onde eu estava sentada.

—Seus pais...

—Esqueça-os. Não notaram minha ausência, até porque eles não estão em casa não é mesmo?

Não era mais segredo que nenhum dos dois dormia em casa. Mesmo assim William e a empregada ficaram tensos, os olhares de pena me deixaram irritada.

—Certo senhorita.

Aproveitei para dormir pelo caminho. Afinal eu teria que atravessar a cidade para falar com ele. Acordei antes de virarmos na rua da Cabana do Mistério. Me ajeitei da melhor forma e preparei meu discurso para convencê-lo a me ajudar.

A Cabana do Mistério continuava acabada, na varanda Stanley Pines em sua cadeira de rodas cochilava e para minha sorte Mason estava ao lado dele lendo um livro. Nerd. Parei na sua frente e limpei a garganta.

—Pacífica? _ ele se levantou e olhou para o tio avô. _O que faz aqui? Mabel saiu e...

—Eu vim falar com você. _ por conta da surpresa e desconfiança ele me encarou. _ Por favor? _ ele desceu da varanda.

—Certo, o que quer?

—Tenho um problema com um fantasma.

—De novo?

—Sim. _ Três anos atrás Mason tinha ajudado minha família a se livrar de um fantasma vingativo.

Expliquei os detalhes e esperei que ele se prontificasse a me ajudar, mesmo eu não merecendo.

— Legal. Boa sorte! _ ele se virou para sair quando terminei e segurei seu braço.

— Dipper estou pedindo ajuda! Só você pode me ajudar!

Um tempo atrás, numa festa no verão retrasado que eles passaram aqui eu acabei o magoando para impressionar algumas pessoas esnobes. Era natural que ele não quisesse me ajudar. Depois daquilo passei a chama-lo pelo nome.

—Sei que ainda está magoado... _ Comecei, soltando o braço dele e juntando as mãos. _E sinto muito. Mas preciso da sua ajuda, por favor!

Ele me encarou e depois olhou para casa. Meu coração estava saltando em meu peito, se ele não me ajudasse eu não saberia o que fazer. Sentia que poderia fazer alguma besteira se a situação continuasse como estava.

—Esta bem! _ um alívio tomou conta de mim, o ar que eu prendia saiu junto com uma risada um pouco histérica,  eu poderia tê-lo abraçado ali se eu soubesse que não choraria. _Mas só por causa da Mabel! Ela me mataria se soubesse que recusei.

Agradeci Mabel silenciosamente, mal contendo o sorriso. Mason me observava então tentei me conter.

— Caso queira algo...

—Não quero que me pague. Não estou fazendo pelo dinheiro. _ o tom dele foi mais gentil que no início da conversa.

—Certo.

—Vou pegar minhas coisas, volto logo.

Esperei ele tentar acordar Stanley para avisar que estava saindo, após olhar para mim resmungou algo e voltou para seu cochilo. Mason entrou no carro comigo e partimos para a nova mansão NorthWest. Não conversamos no caminho e o clima ficou pesado, William olhava constantemente para trás. Encostei a cabeça na janela e fechei os olhos por uns segundos pensando em como acabar com o silêncio. Novamente adormeci. Acordei com Mason me chamando, seu olhar era de preocupação. Olhei em volta e já havíamos chegado a mansão.

—Você está bem? _ ele perguntou.

—Sim. Bem._ respondi meio sem jeito e um tanto sonolenta. Não imaginava que o cansaço era tanto ao ponto de cair no sono com Mason do meu lado.

Entramos pela a porta da frente quando William me comunicou que meus pais ainda não haviam chegado. Como a perfeita dona do solar que meus pais me criaram, no automático ofereci comida, água e outras coisas que faziam parte de ser uma NorthWest.

—Bem, eu ainda não almocei então seria bom comer alguma coisa.

—Excelente! Bel?!_ a empregada mais antiga da casa e que para todos os efeitos me criou, apareceu. Seu rosto sempre fora gentil e seus olhos sempre atentos. _Pode servir o jantar na varanda, por favor?

Levei Mason até a sala da varanda. Era o cômodo daquela casa que eu mais gostava. Dava vista para a floresta e um jardim colorido com uma fonte. Na sala havia um piano, e prateleiras de livros assim como duas poltronas e uma lareira. As portas da varanda estavam abertas onde uma mesa redonda com quatro cadeiras ficava. Como o bom nerd que era, Mason começou a olhar as prateleiras de livros. William estava na porta e com um aceno o pedi para que saísse.

—Pode jogar sua mochila por aí. _ anunciei ao sentar na poltrona e me recostar.

Ele colocou a mochila na outra ainda observando os livros. Lutei contra a vontade de me aconchegar mais na poltrona e dormir.

—Você parece bem cansada Pacífica. _ Pisquei e o olhei. Mason me encarava e fiquei na dúvida se havia novamente adormecido.

—Considerando que novamente há um fantasma pertubando a noite, deve ser normal.

—Mabel havia comentado, mas não achei que estava tão mal. _Ele continuou ignorando minha explicação óbvia. Senti vontade de me olhar no espelho.

Acabei não o respondendo. Mas não parei de encará-lo, e ele sustentou meu olhar. Meu rosto esquentou quando um pensamento estourou e desviei o olhar. Para minha felicidade Bel chegou com o almoço o que impediu Mason de continuar me sondando. Ouvi o suspiro resignado, mas fingir que não. Para que o silêncio não reinasse e ele fizesse mais perguntas, perguntei sobre qual o tipo de fantasma ele achava que poderia estar assombrando novamente minha família. Isso rendeu horas com ele falando sobre categorias etc.

Após o almoço mostrei a ele os corredores e cômodos que haviam sido atacados, inclusive meu quarto que tinha sido destruído e minhas roupas e calçados completamente estragados. A porta do quarto dos meus pais fora trocada quinze vezes com marcas de machados. Os empregados nos observavam mas nada diziam. Quando chegamos a sala principal Mason estava estranhamente calado.

—E então, alguma idéia de como exorcizar esse fantasma?

—Bem, não até pegá-lo. _ ele passou a mão na nuca meio constrangido._Já faz um tempo desde a última vez.

Suspirei tirando a franja que tampava sua marca de nascença. Os cabelos castanhos macios deslizaram facilmente entre meus dedos. Surpreso Mason me encarou, talvez esperando que eu dissesse algo sobre a marca. Eu também estava surpresa com esse gesto da minha parte.

— Você vai conseguir. Não teria te chamado se não estivesse certa disso.

Eu não era de palavras de encorajamento, mas eu gostaria de voltar a dormir e o jeito mais fácil disso acontecer era Mason exorcizar o fantasma. Acabou que ele teve que passar a noite para encontrar o fantasma. Meu plano era ficar acordada com ele e ajudá-lo se fosse necessário.  Mas como ocorria frequentemente nesses dois meses, eu adormeci. Na manhã seguinte fiquei sabendo o que tinha ocorrido.

Aparentemente Mason tinha sido arremessado por uma janela e estava cheio de cortes. Felizmente nada mais grave havia acontecido, ele poderia processar minha família.

—Preciso ir a biblioteca! _ ele disse com urgência,  tentando se levantar enquanto William aplicava os primeiros socorros.

—Você precisa descansar!_O segurei fazendo-o voltar para cama._Depois eu te levo lá, mas antes precisa dormir e...

—Se curar._William completou. Não foi fácil convencê-lo a dormir, mas consegui. Verifiquei a sala que o fantasma e Mason tinham tido um embate e fiquei surpresa ao ver facas cravadas no retrato de família.

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Acompanhei Mason até a biblioteca pública de Gravity Falls e ele entrou na sessão mitológica e pegou um livro de capa vermelha. Ele folheou algumas páginas e parou em uma específica lendo-a. Ele mordia o lápis enquanto lia, a expressão preocupada e os olhos perdidos faziam parte do conjunto Dipper Pines. Sem qualquer interesse nos livros daquela sessão fiquei vagando pelos corredores. Para minha infelicidade dei de cara com um chato.

—Pacífica NorthWest numa biblioteca pública? _O riso infantil soou._E com Dipper Pines, hmmm...

—Não deveria estar perseguindo obssessivamente a Mabel, Gideãozinho?

—É Gideão! Sabe que abandonei esse nome artístico quando...

—Então Gideãozinho. _Provoquei fazendo o garoto de doze anos, de cabelo branco e um topete estranho ficar vermelho de raiva.

—Aaargh! _ Ele bufou, respirou até sua cara redonda voltar a brancura com sardas. _O que exatamente esta fazendo com Dipper Pines?

—E desde quando lhe dou satisfação sobre com quem eu saio?_ Dei um sorriso para ele, que franziu a testa me encarando. Acho que estava tendando usar seus poderes de telepatia,  algo assim.

—Pacífica! _Mason apareceu e seu rosto assumiu uma expressão assustadora ao ver Gideão. _Gideão.

— Dipper.

Ambos se encararam e por mais que eu fosse adorar ver Mason dar um soco no pequeno topete, eu agarrei o braço dele e o puxei em direção a porta. Gideão provocou, perguntando por Mabel. Senti Mason ficar tenso, os músculos se retraindo quando ele cerrou os punhos, meu aperto em seu braço ficou mais forte e quando saímos Mason extravazou a raiva. Me sentei no banco ao lado da biblioteca que dava para um canteiro verde com algumas árvores e esperei. Quando ele se sentou passou as mãos nos cabelos o jogando para trás, deixando visível a marca de nascença.

— Eu detesto ele!

— Tambem não sou fã. O que descobriu?

Mason tirou um papel onde ele havia feito anotações e me mostrou.

—O fantasma que eu encontrei não tinha forma e nem possuía aquele brilho fantasmagórico que normalmente os fantasmas possuem. _ O encarei entendo quase nada. _ Ele parecia mais uma fumaça consistente e ficava zanzando.

—Então... O que é?

— Uma mania.

— Uma o quê?

— Um mania. É a personificação da loucura de uma pessoa, resumidamente.

— E como se livra dele ou dela, que seja!

Para começar teríamos que achar um galho de um velho carvalho, e para isso tive que me enfiar na floresta. Não era um lugar bacana com os gnomos que vomitam arco-íris nos seguindo. Felizmente eu estava com um look propenso a não estragar nesse terreno. Antes de nos enfiarmos na mata, Mason ligou para Mabel que iria nos encontrar perto da toca do Unicórnio, seja lá onde aquilo ficava.

— Sabe... _ Mason começou me ajudando a subir uma raiz alta. _ Você pode me chamar de Dipper.

— Hein? _ Ele olhava para o mapa que o Stanford havia desenhado para ele.

— É estranho quando me chama de Mason. Chamam. As pessoas. _ Por algum motivo ele ficara nervoso.

— É um nome bonito.

— Sério? Er, bem, mas você pode me chamar assim.

— De Dipper?

— Sim. _ Ele colocou as mãos nos bolsos, caminhando na minha frente. _ Dos dois. _ A última parte ele falou baixinho. E por algum motivo fiquei feliz. _ Eu não estou mais zangado. Você é desse jeito. _ Essa parte ele falou alto.

— Que jeito? _ A felicidade passou.

— Sabe, o jeito Pacífica.

— Insisto na pergunta, que jeito? _ Parei na frente dele o obrigando a parar e me olhar.

— Esnobe. Metida. Chata. _ Isso foi bastante direto. E nenhuma novidade.

— Ser chato é algo em comum Pines. _ Bufei avançando sem esperar por ele.

Não entendam mal. Dipper era legal,  eu sentia que às vezes nos dávamos bem. Mas havia uma gravidade entre nós que se muito perto nos repelia. Um bom exemplo era o que acabara de acontecer. Bom, eu não estava atrás de amiguinhos, apenas queria me livrar de um fantasma e voltar a dormir em paz. Era por isso que eu estava andando na floresta atrás de um galho e chifre de unicórnio...

Encontramos Mabel no caminho junto das amigas estranhas que não lembro o nome. Aparentemente ela tinha socado (novamente) um unicórnio e pegado seu chifre. Dipper explicou o que faríamos.  Que consistia em alguns passos.

1) Escolher um cômodo; 2) usar o chifre de unicórnio para desenhar um círculo no chão onde ele impediria - em teoria - o mania de nos atacar; 3) do galho de carvalho seria feito um chá para atrair o mania; 4) usaríamos um espelho de prata para prendê-lo. O que segundo Stanford funcionava com todo o tipo de fantasma.

Enquanto eu esperava que o chá ficasse pronto Dipper e Mabel preparavam as outras coisas. E as amigas de Mabel devoravam os biscoitos recém saído do forno. A maior e mais bruta com uma voz grossa era Gendra, sabia disso por ela namorar Marius von Fundahauser . Eu só não sabia o nome da outra.

Quando Dipper e Mabel chegaram, se juntaram as meninas para comer o restante dos biscoitos. Eu particularmente estava sentada no balcão, longe deles. O cheiro do carvalho fervendo era extranhamente calmante e atrativo. Mabel se aproximou dando-me um leve empurrão.

—Então? Depois de dois meses é que seus pais decidiram pedir ajuda? Estranho.

—Verdade. Principalmente se lembrarmos da festa super mega sei lá o quê de três anos atrás.

—Não era do interesse deles talvez. _ Respondi aos irmãos.

—Talvez... _ Começou a amiga asiática de Mabel que usava óculos. _ Se é um mania, será que eles sabem quem é? Já que um mania surge de uma pessoa ainda viva, certo? _ Ela olhou para Dipper que afirmou com um aceno.

—Quer dizer que um dos meus pais é um fantasma?

— Ainda não. _ Dipper tocou meu ombro e apertou de leve de modo a me confortar.

— Não vamos exorcizar eles!_ Mabel passou o braço por meus ombros me puxando para perto dela.

Armamos a armadilha num cômodo vazio da casa que nem eu sabia que existia. Mandei que todos os empregados não fossem para aquele lado até que Dipper tivesse terminado. Colocamos o chá no meio da sala e desenhamos um círculo com o chifre do Unicórnio, isso pareceu intensificar o cheiro inebriante do chá de carvalho. Gendra, Candy (a amiga asiática de óculos) e Mabel usavam tacos de beisebol, sendo o taco da Mabel todo desenhado. Dipper estava com o espelho de prata para prender o mania e eu estava com um taco de golfe, tinha sido o melhor que eu conseguirá achar de ultima hora.

Os minutos se arrastaram. O cheiro do chá estava me deixando sonolenta e quando Mabel fez um arremesso imaginário passos soaram no corredor. Nos arrumamos e ficamos em posição quando a porta se abriu Gendra gritou, e não um gritinho estridente, mas alto e grosso. O que Marcus havia visto nela eu não sei, mas se eu fosse o fantasma tinha saído correndo. Aquilo era assustador!

Mas quem abriu a porta foram meus pais e como previsto, Gendra os assustou. Após o susto meu pai franziu a testa.

—O que significa isso, Pacífica? _A tensão tomou conta do meu corpo. O cheiro do chá de carvalho, o olhar reprovador do meu pai. _Chega dessa bobagem. Vocês, saiam daqui!

—Não! _Consegui falar,  me colocando na frente de Mabel, o nervorsismo me fez começar a suar._Pai eles estão me... nos ajudando com esse fantasma!

—Não precisamos de ajuda Pacífica! _O tom severo e urgente dele me fez recuar. Mas um calafrio nos meus ossos me fez olhar para a porta aberta. Uma ira cresceu em mim...

O som de algo sendo arrastado fez todo mundo se voltar para a porta. Meu pai puxou minha mãe para trás de si e Dipper me puxou para trás com ele enquanto Mabel e as amigas se posicionavam. E então finalmente vi o que tirava o meu sono durante dois meses. O sol nem tinha se posto ainda, mas o fantasma estava ali, envolto em fumaça carregando um machado que marcava o chão.  Minha mãe soltou um lamento.

—Esta funcionando..._Dipper murmurou no meu ouvido e só então notei que ele ainda me segurava e que estava muito perto.

O mania passou pela a porta e eu senti toda a fúria, raiva e ódio dele. Eu estremeci e Dipper deu um aperto em meu braço, não sabia se só eu estava sentindo aquilo, mas não ousei tirar meus olhos da figura. Dipper havia dito que ele era rápido para se mover. Torci mentalmente para que o mania entrasse logo no círculo, mas ele parou alguns passos e ficou parado. Ficamos num silêncio aguardando, mas ele não se moveu.

—Fala sério! _Mabel exclamou, girou o taco nas mãos e acertou a cabeça do mania...

—Au! _ Eu senti o golpe. Minha vista ficou turva por uns momentos até eu notar que todos me encaravam. O mania estava agachado na. Mesma. Posição.  Que. Eu. _O que...

Numa velocidade absurda o mania girou o machado na direção de Mabel, que por milagre se esquivou. Dipper me soltou ao ver a irmã em perigo mas Candy e Gendra foram ao socorro. O taco de Gendra foi partido ao meio e Candy arremessada para o outro lado da sala. Dipper correu para ajudá-la quando Mabel acertou entre as costelas mania. Eu sei. Porque eu novamente senti o golpe.

— O mania é a Pacífica!  _ acho que Dipper gritou, eu estava no chão tentando respirar. Senti mãos fortes me erguer e pensei que fosse Dipper,  mas o rosto do meu pai entrou em foco.

O mania tentou atacar novamente Mabel, mas ela era rápida e ágil.  Gendra deu um berro de guerra e partiu para cima segurando o mania em seus braços... ok, gordos. Não tem como ser simpática com dor. E eu também me senti sendo apertada até a morte por ela.

—Parem! Estão a machucando!! _ ouvi a voz do meu pai, e uma ira tomou conta de mim, gemi. Voltei a mim a tempo de ver Gendra também no chão e o mania avançando na minha direção.

Por sorte ele entrou direto no círculo e uma barreira luminosa surgiu por alguns segundos, indicando que estava funcionando. Dipper correu para minha frente e estendeu o espelho pro mania, que o olhou sem entender.

—Não funciona! Porque não funciona?!_ Ele se desesperou. Mabel veio para o seu lado tomando o espelho da sua mão.

—Foi mal Pacífica! _ eu senti o choque do espelho na minha cabeça.

—Aaaaa!

—Não custava tentar!

Algumas coisas passaram pela minha mente. Os prêmios ganhos e o descaso de meus pais, o sininho tocando, as festas de aniversário sem qualquer diversão ou amigos de verdade. Era como se o mania estivesse me mostrando tudo aquilo. E quanto mais ele me mostrava mais eu sentia meus ossos gelados e raiva.

—Dipper! _ a voz de meu pai soou distante.

Vozes chamaram meu nome. Dipper. Mabel. Minha mãe e meu pai. Mas estavam abafadas. Os toques ficaram distantes também, eu já não sabia se meu pai ainda me segurava. Provavelmente não, ele raramente me tocava quem dirá um abraço. Eu então me vi. Meu pai, um homem alto de ombroa largos, cabelo e bigode pretos segurando uma garota, linda, de cabelos loiros e olhos brilhantes num tom dourado aninhada ao seu peito. Vi Dipper agachado ao lado de meu pai, todo preocupado. Ele ficava bonito assim. E então eu vi Mabel, não se parecia mais tanto com o irmão, mas a semelhança ainda estava lá. Os cabelos longos castanhos presos num rabo de cavalo alto, um jeans, tênis de caminhada e uma regata rosa. Ela parecia furiosa ou indignada. Ela disse algo que fez Dipper olhar para ela. E então girou o taco na mão e me acertou. O golpe foi forte. Eu apaguei.

Quando abri os olhos Mabel estava do meu lado, os cabelos soltos. Quando me notou acordada sorriu.

—Me diz que não estou com um olho roxo..._ Implorei, o que a fez rir.

—Não. Mas foi mal. _Ela respirou fundo. _Foi necessário, você estava se transformando no mania.

—O que aconteceu?

Ela narrou os acontecimentos. De como acertou o mania para que eu não me transformasse e de como Dipper teve a brilhante idéia de fazer meu pai capturar o mania com o espelho. O que deu certo. Porque minha mãe tinha avisado que o espelho que Dipper estava não era de prata e pegou o espelho certo.

—Candy deve ter pegado um espelho de ferro. _ completou.

—Que tipo de pessoa confufnde ferro com prata? _ questionei sentindo uma enorme dor de cabeça.

—Ainda precisamos fazer o exorcismo. Mas queríamos ter certeza que você era você.

—Como que se responde isso? _ Perguntei me levantando da cama.

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A parte do exorcismo foi fácil.  Era só quebrar o espelho, e isso quando o primeiro raio de sol da manhã brilhasse. Puft. Fácil assim. Stanford veio buscar os gêmeos e as garotas. Mabel ainda ficou um pouco enquanto Candy e Gendra tiravam foto totalmente mal vestidas em frente a fonte.

—Você deveria falar com seus pais. Talvez terapia familiar. _Eu consegui dar uma boa gargalhada que chamou a atenção de todos ali perto.

—Ok. Certo. Como se isso fosse acontecer! _ Mabel deu de ombros, mais séria que o normal.

—Você está ressentida com elas. Com raiva. Foi o que quase tranaformou você num mania. _ Ela parou e olhou para o chão. _Seus olhos brilhavam como os do Bill. _ Ela sussurrou. Falar sobre o demônio dimensional que quase destruiu a cidade e tentou matar os tios-avôs e o irmão era difícil. _Não pensei que eu ainda sentisse medo dele depois de tanto tempo. Às vezes ainda tenho pesadelos de quando ele... possuiu o Dipper, como quase deixou meu tivô Stan sem memórias.

Eu estiquei o braço passando pelos os ombros dela e a puxando para perto, num abraço tão desajeitado.

—Ele se foi. _ foi o máximo que consegui dizer. Eu não estava acostumada a levantar a moral das pessoas.

Mabel passou um braço pela minha cintura e foi quando eu desfiz o meio abraço. Ela sorriu os olhos marejados e os meus ardiam.

—Mabel, vamos! _Dipper gritou já dentro do carro.

—Tchau! Precisamos marcar a revanche! _ voltando ao normal Mabel saiu correndo até o irmão. Fiquei um pouco chateada por Dipper não se despedir, mas tinha uma cois para resolver.

Segui para a entrada da  casa onde meus pais me esperavam.

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Eu não imaginaria que uma terapia em família seria realmente possível aos NorthWest. Porém,  a cada duas semanas eu e meus pais aguentavam duas horas de sessão. Não era fácil, mas ao menos estávamos nos comunicando. Eu até tinha conseguido ir para uma escola particular em Londres. E vencido Mabel no minigolfe.

Como parte da terapia eu estava ocupando meus dias com exercícios, leituras e alguma atividade que eu ainda não tinha escolhido. Então estava tentando de tudo. Escrever não era meu forte. Comprar não era uma atividade saudável. Então optei por fotografia. Capturar momentos únicos e imortalizar. Para que ninguém me reconhecesse comecei com a floresta.  Foi entediante nas primeiraa horas. Até que comecei a escolher mais os lugares. Eu estava me posicionando para tirar a foto de um cervo quando senti uma mão no ombro.

—Aaaaaaaah!

—Calma! _ Dipper me segurou para que eu não caisse do barranco. _ Sou eu. _ Ele deu um sorriso sem graça.

—Qual o seu problema? Quase tive um infarto! _ Olhei na direção do cervo que havia corrido com meu grito. Ótimo.

—O que faz aqui? _ Ele me observou de cima a baixo e senti meu rosto esquentar. Afinal eu estava de shorts de corrida e uma camiseta.

—Caminhando. _Comecei a andar. E ele me seguiu. Depois de um tempo enervante ele disse algo.

— Quer ver algo legal? Acho que daria uma bela foto.

Sem responder eu o segui. Conforme o calor ia aumentando mesmo com a brisa, fiz um coque frouxe no cabelo. Dipper estava de short e uma blusa xadrez, parecia estar caminhando também. Chegamos a um lugar bonito, um riacho no meio das árvores lotados de folhas que o vento soprava das árvores. Peguei a câmera, e tive que me mover ao longo do riacho até achar a posição perfeita, que foi num terreno mais elevado. Depois das fotos me senteu com Dipper num tronco velho, encantada com as fotos e a vista e chateada por algumas fotos terem ficado tremidas e desfocadas.

—Como estão as coisas? Nenhum fantasma, espero!

—Estão... bem. _ Eu ri.

Ficamos num silêncio agradável.

—Você está bem? _ A voz dele soou baixa e nervosa e o encarei o que ele já estava fazendo. Ele olhou bem fundo nos meus olhos, e o que Mabel havia dito sobre meus olhos brilharem como os do Bill veio a minha mente. Os castanhos refletiam uma luz vermelha do lago. Eu pisquei.

—Sim. Bem. _ Eu pensava muitas coisas sobre Dipper. Não que ele estivesse vinte e quatro horas na minha cabeça. Mas eu pensava bastante nele. Na verdade era meio impossível não pensar nos irmãos Pines em geral. Quando eu estava com Mabel ou com Dipper ou até sem os dois. Eles tinham se tornado, amigos. Sim. Admito. Amigos. E era vergonhoso e estranho admitir que eu pensava mais no Dipper, talvez desde que ele me salvou do primeiro fantasma. Eu era grata a ele. E na minha visão eu ainda não tinha agradecido adequadamente o que ele já fez por mim. E não tinha a menor idéia de como fazer isso. Talvez seja por isso que "aquilo" aconteceu. Mas talvez um obrigada tivesse sido melhor...

—Eu tenho que ir. _ Disse me levantando e ele me seguiu.

— Eu acompanho você.

Eu sei que conversamos. Sei que rimos. Sei que provocamos um ao outro e chegamos no parque onde meu motorista me esperava.

—Tchau metida.

—Tchau nerd.

—Chata.

—Irritante.

Eu não saberia dizer qual dos dois avançou. O importante é que demos um selinho. Uma pressão nos lábios que foi eletrizante. E confesso que o segundo fui eu. E nos olhamos, surpresos. E fui emboda. Sim. Eu me virei e fui embora. Eu deveria ter agradecido? Dado tchau novamente? Enfim. Peguei os óculos de sol na mão de William e entrei no carro sem olhar pra trás. Em casa eu poderia remoer e ficar histérica.

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Notas finais do capítulo

Mania: personificação da loucura, demência, da insanidade e do frenesi sagrado, na mitologia grega.



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