Daikyô escrita por PizzaYola


Capítulo 1
Feliz Ano Novo e Daikyô!


Notas iniciais do capítulo

Boa leitura!



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Já faz mais de dez anos que eu moro no Japão.

Ainda acordo todos os dias com uma felicidade sem igual quando penso onde estou. Meu sonho sempre foi vir ao Japão e terminar meus estudos em uma escola que realmente se importa em dar um ensino de qualidade para seus alunos, além de fazê-los ajudar até mesmo na limpeza e manutenção do local. Achei que iria apenas conseguir terminar o ensino médio aqui, mas consegui passar em uma boa faculdade. Minha família fez uma festa na Espanha, não acreditando que eu conseguira uma bolsa em uma faculdade que pede tantos pontos. Não foi fácil conseguir isso, foram anos de estudo, noites acordado, passando fome e com o estresse no limite até conseguir aprender a técnica para me lembrar de tudo o que cairia na prova.

Agora, finalmente posso descansar. Está quase chegando o ano novo no Japão, que eu acabei nunca festejando por estar sempre muito ocupado. Minha melhor amiga, Sayuri, vem me chamando para ir com ela até o centro da cidade ouvir os sinos faz muito tempo. E será nesse dia que pretendo me declarar para ela.

Eu amo a Sayuri desde que a conheci. E o maior erro que eu cometi foi não ter me declarado para ela mais cedo, mas para a minha defesa, nenhum de nós colaborávamos para que esse dia chegasse. Primeiro que eu tenho um medo absurdo de ela não aceitar meu amor, afinal, sou um brasileiro, com costumes bem diferentes dos dela e com a aparência bem distinta da que ela geralmente procura nos namorados. Não que isso atrapalhe em algo e sei que ela e nossos outros amigos não são racistas, mas o tratamento que me dão é bem diferente. No começo, eles até chegaram a me perguntar se eu me ofendo por rirem do meu sotaque espanhol. Parecia até que nunca tinham visto alguém da minha cor pessoalmente e eu não duvido que isso seja verdade, mesmo que eu não chegue a ser negro.

Atualmente as coisas têm estado mais tranquilas, mas eu ainda me sinto um alienígena que todo mundo tenta fazer se enturmar, mas que sente que seu lugar não é ali.

Mas a Sayuri faz com que nada disso importe. Eu nunca estive tão apaixonado por uma mulher antes e eu com certeza não quero perder isso. Eu prefiro continuar na friendzone dela para sempre, se isso significar não levar um fora, ou fizer com que nossa relação fique estranha.

Eu vou na casa dela, ela vem na minha. Mesmo que as pessoas no Japão sejam mais acatadas, ela ainda anda de braços dados comigo na rua e me beija na frente de todo mundo. Ela me deixa fazer tranças no cabelo dela, que se desfazem assim que eu solto por causa do tanto que seus fios são finos e lisos, coisa que nunca aconteceu quando eu as fazia nas minhas irmãs.

Ela tem olhos pretos e grandes, mesmo que puxados. Tem uma boca rosa linda, e um corpo magrinho e pequeno comparado ao das espanholas com quem eu já fiquei. Mas a gentileza dela, a beleza, o jeito com o qual ela me trata, como se eu fosse especial, como se comigo ela não ligasse para os olhares, apenas ligasse para me fazer sentir bem. E, caramba, como ela faz eu me sentir bem. Eu sou tão feliz por saber que ela está ali por mim, sempre. E eu fico tão maluco quando penso nela. Sou tão louco, mas tão louco por ela que eu me comprometo a aguentar seu “não”. Se ela me odiar, se ela negar ser minha, eu vou compreender. Eu não garanto que não vá chorar até meus olhos secarem, nem garanto que não vou sentir vontade de largar tudo e voltar para a Espanha, mas eu garanto que se eu perder a chance de fazer isso, se eu perder ela para outro cara... Eu nunca serei verdadeiramente feliz. Minha viagem para o Japão, acordar todos os dias de manhã com um sorriso no rosto, o emprego dos sonhos... Nada disso valerá a pena se eu tiver que lembrar que ela casou com outro cara e eu nunca terei outra chance.

Então, só me resta arriscar e torcer para tudo dar certo.

—-

Chegou o grande dia.

Mal começo a me arrumar quando ouço meu celular tocando com mensagens da Sayuri.

“Já está se arrumando?”

“Já está pronto?”

“Cadeeeeeeê voceeeeeeeeê”

“Argh se você se atrasar nunca mais vamos nos falar >☹”

Reviro os olhos enquanto escrevo uma resposta.

“Eu falei que você poderia passar aqui. Sabe onde eu moro e é caminho, cariño. ”

“Não! Você que tem que estar lá e esperar eu chegar pra suspirar pela minha beleza, assim como nos animes XD”

Gargalho e deixo o celular de lado, terminando de me aprontar. Quando estou pronto, saio correndo do meu apartamento e ando pelas ruas agitadas até o parque no centro. Está tudo iluminado, as barracas de comida exalam um cheiro agradável e caseiro, além da quentura do fogão que usam deixar a noite fria mais suportável. Os japoneses realmente fazem até o mais ranzinza se sentir á vontade no meio de tanta gente.

Estou nervoso, mas não pelos olhares curiosos em mim, nem pelo tanto de garotas lindas de kimono que passam do meu lado, nem pelo fato da ansiedade ter feito eu passar fome de novo e todo esse takoyaki em volta de mim, fazer meu estomago roncar... A expectativa de ver a Sayuri arrumada, me esperando, era o que mais fazia eu suar. Por eu ser bem mais alto que a maioria das pessoas por ali, eu consigo olhar para todos os lados à procura de Sayuri. Como ela havia falado sobre a genérica cena de anime, imaginei que seria ela a me encontrar, me tocar por trás e me fazer virar e dar um suspiro de satisfação por finalmente vê-la. Mas para a minha sorte, minha altura me ajudou. Eu vejo Sayuri encostada em uma parede, nossos antigos amigos da faculdade ao redor dela, todos conversando animadamente enquanto ela toma um suco de cor rosa.

Fico por vários momentos a observando de longe, vidrado no seu rosto. Ela está usando um coque alto, preso perfeitamente alinhado. Pouca maquiagem, mas o suficiente para fazer sua boca e seus olhos parecerem ainda maiores e mais femininos. Ela dá alguns sorrisos de vez em quando durante a conversa, fazendo os cantos dos seus olhos se puxarem ainda mais, os dentes brancos que ela odeia que apareçam quando ela ri, ficando em evidência. Ela usa um kimono rosa, com desenhos de pétalas de sakura e mesmo de longe eu sei que ela deve estar usando o perfume que comprei junto com ela no seu aniversário.

Finalmente volto a andar e me aproximo deles no mesmo momento em que ela pede licença para sair. Quase nos esbarramos, e quando ela vê que sou eu, sorri de boca fechada.

— “Igoru-kun”! — Ela fala meu nome, Igor, com seu sotaque fofo e me dá um soco no peito. — Onde você estava?

— Em casa. — Eu respondo, dando de ombros, tentando disfarçar o quanto a beleza dela havia me abalado. — Você não marcou nove horas? Então...

— Mas... — Ela dá uma olhada rápida no relógio dourado em seu pulso e depois cai na gargalhada, achando graça de não sei o que. — Ah, são nove horas mesmo! Eu jurava que já tinha passado disso!

— Ah, mas então... Você estava de saída?

— Sim, eu ia pegar uma bebida.

Olho para o copo dela, ainda acima da metade.

— Quer essa? — Ela pergunta, me oferecendo. — Eu não gostei muito do sabor.

— Sim, obrigado.

— Eu já volto. — Ela diz animadamente, se afastando.

Eu me aproximo do grupo e cumprimento á todos, que se curvam levemente, alguns mais chegados apertando minha mão.

Começamos a conversar e observar as garotas que passam. Eu nunca achei que diria isso, mas mesmo mostrando pouco do corpo, aquelas mulheres estavam mais do que lindas. Estavam joviais e elegantes ao mesmo tempo e até mais atraentes do que o normal.

Quando Sayuri volta, nossa conversa sobre mulheres para. Começamos a falar sobre as tradições e eles me contam sobre o tal papel da sorte que eu devo pegar no dia seguinte, para saber como vai ser meu ano. Mesmo achando aquilo mais sem noção do que horóscopo, eu digo que vou fazer. Não custa nada e eu realmente estou precisando de boa sorte, pois ano que vem começa meu novo emprego e provavelmente estarei em uma relação com a Sayuri.

Depois de muito conversarmos, comermos e passearmos, finalmente chega a hora do grupo se separar. Alguns vão ficar com suas famílias, outros com suas namoradas, outros, como eu, vão tentar a sorte com a garota que gostam.

Quando ficamos sozinhos, eu e Sayuri começamos a andar na direção da floresta. Ela anda com o braço pendurado no meu, cantarolando algo e olhando para o céu enquanto alguns fogos explodem.

— Queria que o papai ainda estivesse vivo. — Ela diz, de repente. — É o terceiro ano novo que passo sem ele, mas ainda me dá saudades.

— Sinto muito. — Eu digo, empurrando um galho para que não a machucasse.

— Desculpe te trazer aqui. Já te obriguei a sair de casa, agora te faço vir para o lugar especial do meu pai...

— Você sabe que eu não ligo, Sayuri. — Eu digo. — Eu gosto que você me inclua nessas coisas. Somos melhores amigos, afinal.

Ela sorri, triste.

Eu também, mas por motivos diferentes.

Finalmente passamos por aquele monte de árvores e chegamos em uma pequena ponte. Uma ponte completamente inútil, pois o rio que tem debaixo dela não molha nem meus tornozelos, além de só parecer caber umas cinco pessoas de pé em cima dela. Sayuri me solta e sobe na ponte, sorrindo enquanto olha para o pequeno rio.

Eu me junto á ela, com meu coração apitando. Que merda de situação romântica. Se não era uma clara menção divina à “vai com tudo, se declara para ela”, eu não sei o que era.

— Meu pai construiu essa ponte pra mim. — Ela disse, passando o dedo na madeira. — Quando eu era muito pequena, eu morria de medo de me afogar. Não entrava em banheiras, nem rios e muito menos em mares. Mas tínhamos que passar por aqui para chegar na casa do meu vovô, e sempre que passávamos eu chorava muito. Até que ele fez essa ponte para mim e de tanto passar por ela, de tanto sentar na beirada e ficar olhando a água... Nós duas nos entendemos. Não tenho mais medo.

Eu sorrio e a observo ficar com um olhar sonhador ao lembrar de tudo aquilo. Engulo em seco, sabendo que essa é a hora, mas antes que eu diga algo ela atravessa a ponte.

Eu a sigo e ela deita na grama baixa ao lado do rio, se esparramando de qualquer jeito, fazendo o cabelo tão arrumado se soltar e com certeza sujando o lindo kimono.

—Você não tem jeito Sayuri, parece uma criança... — Eu rio enquanto me aproximo e sento do lado dela, sem jeito de me deitar.

— Gosto disso. — Ela diz, me olhando. — Gosto que me chame pelo primeiro nome. Quando me chamou assim pela primeira vez, me assustou, mesmo eu sabendo dos costumes ocidentais... Mas eu gostei. Gosto como não preciso de regras com você. Gosto de poder ser íntima de você sem me preocupar se vão achar que somos namorados ou não.

— Gosto que pense assim. — Era a verdade, mas aquilo parecia ter sido uma indireta para “não é porque sou próxima de você que tenho algum interesse a mais”.

Nós ficamos calados por um momento e é o momento perfeito para eu pensar rápido no que fazer.

Que droga, eu não sabia o que fazer. Iria me confessar? Sim, mas não pensei em como fazer isso. Só falar? Preciso olhar para ela e mostrar minha cara de desespero e pedir compaixão? Só sair beijando? E se ela me batesse? E se eu me confessar fosse um tipo de assédio no Japão? Será que posso ser preso por me confessar?

Na ansiedade eu acabo me deitando e virando o corpo para ela, com a cabeça apoiada na mão. Ela me olha estranhando, e claro, aquela posição está super estranha!! Estou muito próximo dela e sei que não posso voltar atrás agora.

Mas as palavras não saem. Ela está me olhando e eu estou olhando ela, nós dois sem sabermos o que dizer ou pensar sobre aquela posição constrangedora. Se eu não tinha o que dizer, só me restava fazer.

Fecho os olhos e abaixo a cabeça hesitantemente, a beijando.


NO ME BATE NO GRITA NO LLAMA LA POLICÍA POR FAVOR

Mas nada disso aconteceu.

Sayuri me deixou beijar ela e eu beijei, mas não ousei abrir os olhos para saber se ela estava me beijando por educação, se estava fazendo uma careta que dizia “não sei o que está acontecendo, não estou gostando, mas como somos amigos sou obrigada á deixar você fazer isso”.

Nossa eu me sinto tão idiota, mas a boca dela é tão incrivelmente macia! Desculpe por ser egoísta, Sayuri, mas me aproveitar dessa boca é o foco no momento.

Nosso beijo está monótono, estamos beijando sem língua, apenas apertando nossos lábios uns nos outros. Eu ouso abrir a boca dela e enfiar minha língua, e nesse momento ouço um gemido. Não sei se de “não acredito, que nojo!” ou de “outro virjão que vai tentar enfiar a língua na minha boca”.

Sayuri coloca a mão no meu peito e já sei que vai me empurrar. Eu me afasto antes, virando automaticamente o rosto para não ver seu olhar de desprezo.

Tenho vontade de correr, mas não posso. Sou um homem e tenho que encarar a raiva dela.

Me viro com vergonha, sentindo que a mão dela continua no meu peito, segurando minha blusa. Para a minha surpresa, Sayuri está com a respiração ofegante, as bochechas coradas e me olha como se pedisse por mais.

Dios mio

Ela puxa minha blusa e me faz beija-la novamente, passando as mãos pelo meu cabelo, que bate nos ombros assim como os dela.

— “Igoru-kun”... — Ela fala nas pausas que damos, antes de voltarmos a beijar como se nossa vida dependesse disso. — Não para, por favor...

Ela abaixa desabotoa os botões da minha blusa, um por um, de cima para baixo. Não posso estar mais confuso, mas o calor do momento só me faz ajuda-la a me despir mais rápido. Aquilo com certeza era um sonho e eu deveria acordar antes de passar vergonha na frente de todo mundo. Eu com certeza devo estar bêbado e jogado no sofá da casa de um dos meus amigos, sonhando com tudo isso enquanto eles zombam da minha cara. Mas se for um sonho, eu não quero acordar, quero ficar dormindo para sempre.

Nós não paramos de nos beijar, nem abrimos os olhos enquanto as roupas se vão. A vergonha e grande, o medo daquilo não ser real é pior. E não entender aquilo, mesmo que seja bom, mesmo que eu não queira que acabe, está me incomodando demais.

Quando termino de tirar a calça, Sayuri vem para cima de mim, já só de calcinha.

Ela está vermelha como um pimentão e pela primeira vez, hesita quando me sente excitado debaixo de si. Eu seguro as mãos dela e a faço deitar o corpo sobre o meu.

— Sayuri...

— Não! — Ela se levanta novamente, tentando se afastar. — Não fala nada!

— Eu preciso falar...

— Não, por favor. — Ela me empurra bruscamente e fica sentada de novo. — Por hoje, não vamos falar. Vamos apenas fazer isso e amanhã nós nos explicamos, ok?

— Mas... Eu te...

— NÃO. — Ela grita.

Eu finalmente me calo, sem entender o porquê daquilo.

Com raiva, ela abaixa minha box e coloca a calcinha de lado. Quando senta em mim, já não parece que se importa se eu estou ou não participando daquilo, apenas me usa para o seu prazer.

Eu não entendo, realmente não entendo.

Minha vontade era fazê-la parar e me explicar o porquê de estar agindo assim, mas acontece que não sou nenhum idiota de quebrar o clima. Eu seguro em suas coxas e me deixo relaxar com ela.

—-

Amanhece no dia seguinte.

Saio apressado de casa, sabendo que chegaria atrasado no primeiro dia da empresa, onde me mostrariam o local e me explicariam minha função. Era um dia que eu não poderia faltar, eu iria demonstrar minha profissionalidade! Mas eu prometi que tiraria minha sorte na árvore, então corro para o local onde estão todos.

Meus amigos me encontram e me cumprimentam animados, me encorajando a tirar o papel.

Me aproximo, dou um dinheiro, faço uma oração e tiro o papel. Estou atrasado, faço tudo na correria e assim que o arranco da arvore eu corro para a rua, fazendo as pessoas atrás de mim olharem com desaprovação.

Enquanto espero meu ônibus no ponto, finalmente sozinho, penso na noite anterior.

Assim que terminamos, Sayuri não disse nada. Apenas se vestiu e foi embora. Pelo rosto dela, ela estava satisfeita estava tímida, mas não vi nada que expressasse que ela poderia estar mal ou que eu a ofendi de alguma forma.

Suspiro, pensando que quando eu terminasse o trabalho me encontraria com ela e tudo seria resolvido.

Olho sem muita atenção para o papel que eu peguei, vendo nele a palavra Daikyô.

Que bes...

 --

Não sei o que aconteceu.

Está tudo preto.

Eu consigo abrir os olhos... Mas as luzes me cegam. Que luzes são essas?

Luzes vermelhas, piscando.

Tento me mexer, mas não consigo. Não sinto minhas pernas.

Não sinto meu pescoço. Não sinto nada.

Olho com dificuldade para o lado, vendo meus amigos atrás de uma faixa amarela. Estão chorando, olhando pra mim, alguns no telefone.

Finalmente alguém se aproxima de mim. Um policial? Um médico? Eu estou morrendo?

Eu estou morrendo...


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