Sobre cores e horas escrita por Julia


Capítulo 2
Capítulo 2




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Carl:

Acordei com a luz da lua. Era noite de lua cheia e a cortina mal fechada deixava entrar uma claridade incomoda. Iluminava a parede de quadros das crianças, frente ao meu lado da cama. Fiquei observando as obras deles, os desenhos da Alex e as fotografias de Joan. Lembrei do desenho inacabado na mesa dela, estava desorganizada e exposta. Ela nunca deixaria a mostra uma obra inacabada. Ela pretendia voltar.

—Por que não voltou? -Lamentei sozinho.

Um cara buzinando passou acelerando. Me dei conta de estar no trânsito. Uma fila havia se formado atrás de mim. Todos me ultrapassaram irritados. Eu deveria seguir reto, mas escolhi dobrar a esquerda em direção a um café. A atendente não parecia estar mais atenta do que eu, levou vários minutos até que viesse até mim. Era muito cedo para um café escocês, então pedi um café expresso, porém ela me trouxe um cappuccino. Normalmente eu reclamaria, mas eu sentia muito sono para isso. Passei a mão sobre o rosto demoradamente e quando abro os olhos me deparo com a tela da TV ligada no canal de esportes, transmitindo uma maratona. Chamei a atendente.

—Pode trocar?

Havia sonhado com Alex essa noite. Me perguntava se eu iria correr com ela. Então ela sumia pela porta e tudo e por mais que eu quisesse puxa-la pelo braço mais distante ela ficava de mim. Ela havia me feito a pergunta naquele dia.

—Claro que sim.

—Você sempre diz isso. – Ela riu.

—É por que eu quero, mas já sei que não vou conseguir te acompanhar, aí desisto.

—Liam tem me acompanhado. Se ele pode, você também pode.

—Correr até a loja de sorvete e ficar lá ate você voltar não me parece muito participativo.

—Foi uma vez só. – Ela riu. Estava feliz, ao menos parecia.

—Tenho que ir. – Passei tão rápido por ela que seu beijo mal encostou meu rosto.

—Hei!

Me virei rapidamente dando um sorriso enquanto ia em direção a saída. Toda vez que penso nessa cena me sinto um idiota. Cinco segundos não me deixariam mais atrasado. Cinco segundos e poderia ter abraçado uma última vez., algo que me consolasse. Empurrei a xicara para longe o cheiro me enjoava. Mandei outra mensagem para ela e fiquei admirando minha coleção de mensagens sem resposta. As primeiras eram exigindo que ela voltasse para casa, agora só quero peço que ela me responda. Quando ficava entediado abria a conta bancaria dela e via se estava faltando algo, buscava nos extratos alguma pista, mas não havia nada diferente, mesmo que alguns centavos.

Cada dia, cada hora que passavam e as coisas estavam exatamente iguais, exceto que estavam completamente diferentes.

Joan:

No começo eu fiquei furiosa. Tinha certeza que ela estava fazendo algum tipo de melodrama, não que ela tivesse o habito desse tipo de coisa, mas não seria a primeira vez. A primeira vez que ela “sumiu” deveria ter uns 8 anos, passou duas horas escondida na garagem por que Liam havia “carimbado” seu desenho com uma mãozinha suja de tinta. Levei 5 minutos para encontrá-la, mas só avisei a Ellen duas horas depois. A verdade é que ela sequer havia notado a ausência dela. Alex só saiu depois que Ellen obrigou Liam a balbuciar um pedido de desculpas e prometer ajuda-la a consertar o desenho.

Anos mais tarde, aos 12, ela repetiu a cena, dessa vez com um esconderijo melhor. Depois de não ganhar permissão para algum passeio ela sumiu. Reviramos a casa, conversamos com vizinhos, gritamos seu nome e ela estava o tempo todo dentro do guarda roupa. Carl a fez pedir desculpas, então ela começou a chorar e como Ellen estava tão feliz e aliviada de vê-la bem lhe deu permissão para o passeio e não se falou mais disso. Na noite daquele dia chamei ela a meu quarto e fechei a porta.

—Você tem noção do que fez?

—Eu estava chateada.

—Eu perdi a tarde inteira desse sábado para procurar uma idiota igual você. Eu tinha mais o que fazer sabia?

—Não precisa falar assim! – Alex abaixou a cabeça e começou a choramingar.

—Não, não, não. Nem comece a chorar, você não me engana. – Ela se recompôs no mesmo instante.

—No mínimo você deveria ter me avisado. Eu não precisava perder meu tempo com isso.

—Desculpa.

—Não é esse tipo de acordo que nos tínhamos. Se você quer enganar eles tudo bem, mas não admito que me deixe de fora! Eu não posso mais confiar em você. – Ameacei.

—Nããoooo.! Me desculpa por favor!

—Não. Você não é confiável. – Virei o rosto tentando segurar o riso.

—Eu juro que nunca mais vou fazer isso sem te avisar. Por favor me perdoe, eu sei que fui errada, prometo que não vai acontecer de novo. – Ela estava ajoelhada com as mãos unidas. Eu poderia prolongar mais um pouco aquilo, mas estava bom por hora.

—Tudo bem, mas que isso não se repita.

—Não vai. – Ela sorriu aliviada. Podia ver no brilho dos olhos dela que era verdade. Por isso fiquei tão furiosa vendo essa promessa se quebrar. Mas eu não conseguia lembrar de nada que justificasse o sumiço dessa vez.

Comecei a achar que as coisas não iam bem quando sua caixa de mensagens lotou rapidamente. Tinha algo REALMENTE errado. Eu a conhecia bem o suficiente para saber que ela odiava qualquer tipo de notificação não lida e que dificilmente sairia para uma corrida sem carga de bateria suficiente para no mínimo seis horas. Comecei a pensar milhares, milhões de acontecimentos onde esse evento poderia se encaixar. Na maioria, eles não eram consoladores.

Alex:

Acordei desorientada e com dor de cabeça. Eu não conseguia ver nada por mais que me esforçasse. Ao tentar me levantar percebi que estava presa. Meus braços estavam distantes e presos com algo muito duro, metálico, possivelmente uma corrente. Sem dúvidas era uma. Meu corpo inteiro se arrepiou ao perceber a situação. Queria tocar a cabeça, mas a corda, ou corrente, me impediam, era isso que me machucava, tinha algo muito apertado, puxando meus cabelos e pressionando minhas têmporas. Eu conseguia no máximo encostar ligeiramente as duas mãos, esse era meu limite. Não conseguia ficar em pé. Tentei sentar. Ótimo, isso eu conseguia, e nessa posição conseguia tocar meu rosto, porém não muito além da ponta dos dedos. Sentia algo como um capacete, fui tateando tentando imaginar o formato daquela coisa. Uma fita isolante impedia que eu gritasse. Havia algo nos meus ouvidos também. Por fora era como se fosse fones de ouvido grandes, mas sentia que havia algo dentro deles também. Eu já estava aos prantos. Seja lá quem fosse, poderia fazer o que quisesse comigo. Me inclinava de frente para trás buscando me acalmar, tudo em vão.


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