O destino do tigre - POV diversos escrita por Anaruaa


Capítulo 16
Fênix - Ren




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Depois de tomarmos o café da manhã, entramos no barco a motor e seguimos para a Ilha Barren. Kelsey estava nervosa, com medo do vulcão, que estava em atividade. Ela contou histórias sobre a erupção de um vulcão que devastou uma cidade inteira e reclamou que não estava conseguindo respirar direito, por causa das cinzas. Eu tentei acalmá-la e lhe ofereci uma máscara feita pelo lenço, para ajudá-la a se sentir melhor.

Kelsey teve um pouco de dificuldades para escalar até o topo do vulcão e eu tive que segurá-la algumas vezes em que ela escorregou. A vista do topo era incrível. Paramos ali para discutirmos a melhor maneira de descermos para o centro do vulcão. 

— Faremos uma corda com o Lenço Divino e desceremos de rapel até lá embaixo.

— Vocês tem certeza de que a entrada para a Cidade de Luz está lá em baixo?

— Não é uma ilha grande, Kells. Se não está lá embaixo, então vamos procurar por toda a ilha até encontrar — Kishan respondeu.

Todos nós colocamos luvas e depois Kishan prendeu as cordas ao redor do corpo de Kelsey e em uma árvore grossa. Estávamos prestes a caminhar na face da rocha, utilizando uma roldana e um sistema de cordas para nos impedir de ir muito rápido.

— Não salte. Não se empurre para trás. Somente caminhe lentamente. Ren estará abaixo de você e eu estarei ao seu lado. Não vamos deixá-la cair. Está pronta? — Kishan perguntou calmamente.

Ela assentiu e eu comecei a descer, jogando meu corpo para baixo. Parei alguns metros abaixo e olhei para cima. Kelsey me espiava da borda do vulcão.

— Vamos Kells. Estou bem aqui. —Falei gentilmente.

Ela começou a descer devagar, mas ficou nervosa e começou a balançar. Kishan a pegou e ajudou a se ajeitar. Ele sorriu e disse:

— Você está bem, bilauta. Solte e deslize para baixo até onde Ren está.

Chegamos lá em baixo e começamos a caminhar. A caminhada pela superfície árida foi lenta e complicada devido as pedras de rocha maciça, que muitas vezes barraram o nosso caminho. Ocasionalmente, pisávamos em algumas bolhas carbonizadas que estouravam em grânulos de pó. Vapores sulfurosos subiam de rachaduras finas. Quando a bota de Kishan rompeu a crosta negra em um local, vapor escaldante explodiu para fora do buraco e queimou a pele de seu braço. Ele olhou para Kelsey, que estava nervosa e tocou o Kamandal.

— Vamos nos curar, Kelsey, e se algo acontecer com você, usaremos o elixir da sereia.

Não demorou muito para chegarmos a um grande buraco que brilhava com uma ligeira luz. Eu me abaixei para olhar lá dentro.

— É um canal de lava, provavelmente ativo.

— Então lava virá jorrando de lá?

— Eu não sei.

— Bem, o que devemos fazer? Ir em frente ou entrar?

Kishan se inclinou sobre a abertura.

— É muito quente. Ela não vai sobreviver.

— E vocês dois? Suponho que não queiram sua pele queimada também.

— Então seguimos em frente.

Recomeçamos a caminhada, seguindo em frente, até que Kelsey parou, perguntando se tínhamos ouvido algo.

— Ouvir o quê? — Kishan perguntou.

— É uma… canção.

— Não ouvi nada — respondi.

— Nem eu — Kishan acrescentou.

Ela fechou os olhos.

— Novamente. Vocês não podem escutar com a audição de tigre?

Balançamos a cabeça.

— Odeio dizer isso, mas sinto que… este é o lugar.

— Mas está muito quente, Kells.

— Então precisamos esfriar. Esfriar-me no processo não seria uma má ideia — ela enxugou o suor com a mão e tocou o colar de pérolas— Eu tenho uma ideia — falou a Kishan. — Siga-me. 

Subimos a lateral superior do túnel e Kelsey murmurou para o colar. Um estrondo sacudiu a ilha e ouvimos o barulho de água. Kelsey tropeçou mas eu a segurei. 

— Espero que possa controlar isso — murmurou nervosamente com os braços levantados.

Árvores sacudiram descontroladamente e, em seguida, um jato de água do oceano correu por cima da parede e mergulhou na bacia. Vapor subiu em vários lugares e sibilou. Kelsey controlava o fluxo da água com as mãos, fazendo com que elas se tornassem um caminho pelo tubo de lava. Ela mantinha os olhos fechados e movimentava a a água à sua vontade. Com um movimentar de dedos, ela enviou água do fundo do mar sobre a lava, que assobiou, esfriou e enegreceu quando os dois elementos se encontraram. Quando ela abriu os olhos, Kishan perguntou intrigado:

— Como você soube fazer isso?

— Eu não sei. Acho que foi a música. Tem certeza de que não consegue ouvir?

Nós dois balançamos a cabeça, sem entender o que estava acontecendo. 

Entramos na pequena abertura. Enquanto descíamos o túnel torcido, ficou muito escuro, e apenas o brilho dos olhos de Fanindra iluminou nosso caminho. O ar estava abafado e úmido. Veios metálicos enfeitavam a lateral do túnel e Kelsey tossiu com os pequenos flóculos que flutuavam no ar. Chegamos à bifurcação e Kelsey virou à esquerda, só hesitando quando Kishan sussurrou:

— Como você sabe aonde ir?

— Eu não sei — respondeu. — Apenas soube.

Nós a seguimos por cerca de um quilômetro e meio até uma seção quebrada que brilhava com uma luz laranja. Aproximamo-nos e uma onda de calor intenso caiu sobre nós. Eu a segurei, mas nós três nos esticamos para frente para ver a abertura. Uma centena de metros abaixo um rio de lava fluía. Suas bordas rochosas eram escuras e lentas, mas o meio era laranja brilhante e se movia com rapidez. Trechos escuros e já endurecidos racharam e flutuaram na superfície em lugares diferentes.

Nos afastamos dali e continuamos descendo pelos canais até que finalmente chegamos a um beco sem saída. Kelsey tocou a parede de pedras, intrigada.

— Não entendo. Este é o lugar.

Também toquei a parede e comecei a limpar o pó. Um cascalho caiu no pé de Kelsey e ela gritou:

— É aqui. A marca da mão!

Kelsey colocou a mão na marca e sua tatuagem brilhou. A caverna sacudiu e a parede de pedra se deslocou. Pó choveu em nós. 

Kishan segurou Kelsey e colocou o rosto dela em seu peito, para protegê-la. A pedra gemeu e balançou para trás e para frente e em seguida, lentamente rolou para o lado e parou. Passamos pela abertura. 

— Árvores? Como pode ter árvores aqui? — Perguntou Kelsey, incrédula.

— Não acho que sejam árvores normais. Devem ser como as de Kishkindha — murmurei. — Um mundo subterrâneo.

— Sim, exceto que esse mundo é mais quente que o inferno.

Encontrei um degrau de pedras e seguimos por ele. Kelsey estava encantada pela beleza da floresta. Grossos troncos com fuligem apoiavam uma vasta cobertura de galhos coberto com folhas que piscavam suavemente como brasas de uma fogueira apagando-se. Gavinhas douradas cresciam a partir dos ramos e moviam-se em nossa direção enquanto caminhávamos. Eu peguei a gada na mochila, por precaução. Kelsey ergueu um dedo e uma gavilha se enrolou nele. O amuleto em seu pescoço começou a brilhar. Eu a chamei preocupado. 

— Está tudo bem. Não está me machucando — sorriu. — É atraído pelo poder do amuleto.

Kishan se aproximou e as folhas começaram a piscar em cores de alerta. Kelsey acariciou o tronco.

— Eles não vão te machucar. Vocês não tem nada a temer vindo de nós.

A árvore pareceu se recuperar e deixou Kishan tocar seu tronco. Tremendo delicadamente, a árvore de fogo estendeu outra videira com botões minúsculos e abriu-se em pétalas laranja com brilhantes folhas douradas.

— É lindo!

Kishan resmungou, dizendo:

— Eles parecem gostar de você.

Aquela floresta peculiar era incrível. Havia animais nela. Vimos um que parecia um coelho, mas com a coloração avermelhada como fogo. O solo era escuro, rico em nutrientes e as flores também tinham esta coloração. Havia ainda samambaias e musgos brilhantes. Ainda era quente ali, mas de uma forma agradável.

As videiras se esticavam para tocar em Kelsey, como se quisessem acariciar sua pele. Quando isto acontecia, o amuleto brilhava. 

Depois de almoçarmos, continuamos subindo até alcançarmos o pico. De lá, visualizei uma cadeia de montanhas, mas Kelsey não conseguiu ver.

— É difícil de ver porque as montanhas são preto no preto.

— A sua visão de tigre deve ajudar. Não consigo ver nada.

Resolvemos montar acampamento no vale abaixo. Estávamos descendo quando uma luz brilhante atravessou o céu e explodiu em uma cascata silenciosa. Em seguida, as luzes de todas as árvores se apagaram e nos encontramos na total escuridão. 

— O que aconteceu? — Kelsey exclamou nervosa.

Eu segurei sua mão e a puxei para o lado.

— Não tenho certeza.

Mantive minhas mãos na de Kelsey durante a descida. Fanindra iluminou o caminho com seus olhos brilhantes de esmeraldas. Kelsey se afastou para as árvores, preocupada, enquanto Kishan e eu arrumávamos o acampamento.

Kishan comentou que estava preocupado com a ligação entre Kelsey e as árvores. Concordamos em redobrar nossa atenção em relação àquilo. Kelsey entrou na tenda e nós dois paramos de falar sobre o assunto.

— Guardando segredos hein? Não quero saber, de qualquer forma. Só gostaria de dizer que as árvores estão dormindo. Acho que é apenas um apagão ou algo assim.

Assenti.

— Ótimo. Vamos ficar de vigília essa noite. Acreditamos que… é possível que você tenha sido manipulada Kells.

— O quê? — Ela riu. — Você está falando sério? Vocês acham que as árvores estão me desviando do caminho?

Falei baixo.

— Temos que manter a mente aberta para a possibilidade.

Kishan adicionou:

— E por essa razão que estamos de vigia e você não está autorizada a participar.

Ela cruzou os braços.

— Acho que sei quando estou sendo manipulada. E porque vocês dois tigres acham que sabem o que é melhor para mim? Vocês são tão… tão… homens!

— Kells! — Ambos protestamos.

— Tudo bem. Divirtam-se. E se sentem em uma faísca enquanto isso.

Kishan suspirou baixo.

— Boa noite, Kelsey.

Eu fiquei na tenda enquanto Kishan foi para fora, ficar de vigília. Dormi rápida e profundamente. Quando acordei, Kelsey havia se levantado. Kishan me disse que ela havia saído para o meio das árvores. 

Irritado por ele tê-la deixado ir até lá sozinha, saí à sua procura. Quando a encontrei, Kelsey estava parada em frente a uma árvore. Ela tinha lágrimas em seu rosto. 

— Por que está chorando?

— Eu matei uma árvore. Acho que essas árvores se alimentam de fogo e morrem quando entram em contato com a água. Tentei salvá-las, mas não tenho energia o suficiente. 

Estudei a árvore, que parecia mesmo estar morrendo. Peguei as mãos de Kelsey e as coloquei sobre o tronco. 

— Tente novamente.

Kelsey fechou os olhos e começou a emitir seu fogo para a árvore, que se inclinou levemente em sua direção, como se estivesse agradecendo. A energia de Kelsey foi diminuindo enquanto lágrimas começaram a descer pelo seu rosto. Então toquei em seus ombros, e o raio dourado surgiu em suas mãos, curando a árvore e a todas as outras em seu redor. 

— Como uma árvore curou todas elas? — perguntou virando-se para mim.

— Talvez suas raízes sejam interligadas. 

Eu afastei uma mecha de cabelos do seu pescoço e o prendi atrás de sua orelha, tocando-lhe com o polegar. O efeito foi imediato. Kelsey estremeceu e nossos olhos se encontraram. Nossos rostos se aproximaram naturalmente. Nossos lábios estavam muito próximos quando eu sussurrei:

— Talvez elas respondam ao toque.

Ficamos assim por mais alguns segundos, então Kelsey se afastou e baixou os olhos.

— Por que você tem que olhar para mim assim?

Retirei as mãos de seu pescoço e perguntei:

— Como estou olhando para você?

— Como se eu fosse um antílope. Da mesma forma que antes.

Eu sorri e a puxei para mim. Olhei para ela sério e lhe disse:

— Talvez seja porque eu esteja morrendo de fome.

— Você não comeu essa manhã? 

— Não quero comida, Kells. Estou faminto por você.

Ela ia me responder, mas eu sabia o que ela diria. Eu não queria ouvir. Pressionei meus dedos levemente em seus lábios para silenciá-la. 

— Shh… apenas me deixe aproveitar esse momento. Eu tenho pouco deles. Prometo que não irei te beijar. Só quero te segurar e não pensar em nada nem ninguém.

Kelsey suspirou e então encostou a cabeça em meu peito. Nós dois ficamos assim, juntos, em silêncio, sentindo nossos corações sincronizados. Desta vez eles não batiam acelerados. Eles batiam tranquilos, haviam se encontrado. 

Depois de alguns minutos, Ouvi a voz de Kishan irado, atrás de mim. Eu estava tão distraído que não percebi quando ele se aproximava. 

— Você já terminou de abraçar minha noiva?

Meus músculos se enrijeceram e eu me afastei. Kishan estava certo. Kelsey era sua noiva e ele tinha razão em ter ciúme.

— Estávamos curando as…

Kishan se virou e saiu.

—… árvores — Kelsey continuou às suas costas.

Nós seguimos nosso caminho em silêncio. Não havia mais o que dizer. Kishan estava magoado, Kelsey parecia desconcertada e eu, não sei dizer o que estava sentindo. Não estava arrependido, não me sentia culpado. Para mim, estar com Kelsey era o certo, o natural. 

Depois de uma hora de caminhada, chegamos a um prado, coberto por uma bela vegetação brilhante e cor de cobre e circundado por árvores brilhante em colorações semelhantes ao fogo. Estávamos apreciando a beleza do local, quando ouvimos o som de asas. 

Kishan destravou seu chakram. Eu peguei a espada de ouro e a separei em duas, jogando uma para meu irmão. Peguei a faca sai e a destravei para que ela se alongasse no tridente. Ergui o braço, pronto para lançá-la.

Ouvimos o som de um pássaro guinchando. Kelsey olhou para o céu temerosa. A criatura passou como um cometa em chamas, enegrecido nas bordas, mas queimando por dentro. Circulou inclinado no céu, a cabeça apontada para nós com um olho branco varrendo o chão como um holofote. O pássaro abriu o seu bico curvo de águia e gritou de novo, então bateu as asas mais rapidamente e desceu direto para nós. Era a fênix.

Ela pousou em um tronco caído e agarrou a madeira firmemente com as garras. Dançando para frente e para trás até que estivesse equilibrado, o pássaro dobrou as asas para trás e olhou para nós três. A voz masculina penetrou o prado. 

— Por que viram ao meu reino? — O pássaro perguntou.

— Nós procuramos pela Corda de Fogo.— Respondi

— E qual a razão para procurarem por isso?

— Queremos terminar nossa missão, levar a Durga seus presentes e recuperar nossa humanidade — Kishan respondeu.

— Para entrar em meu reino, vocês devem fazer um sacrifício para provar que são dignos.

— Diga-nos o que fazer e veremos — Prometi.

Uma gargalhada suave ecoou em torno de nós.

— Esse sacrifício não é seu para se oferecer, tigre branco. Não, o sacrifício de que preciso é de uma esposa sati. Existe apenas uma pessoa aqui capaz de cumprir o meu pedido.

Kishan e eu saltamos ao mesmo tempo, ficando à frente de Kelsey e gritamos desesperados:

— Não! Você não irá levá-la!


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