Numa tarde chuvosa, o garoto estava deitado no sofá, entediado. Não tinha nada pra fazer. Nada que quisesse fazer. A televisão era só estática, já tinha lido todos os livros da casa e não tinha ninguém para brincar, pois sua mãe estava no trabalho e seu irmão, com amigos. De seu pai, ninguém sabia. Sua mãe costumava dizer, com amargura: "Ele jurou amor eterno, me encheu de filhos e sumiu por aí."

O garoto suspirou. Então ele viu uma borboleta azul voando pela sala e a seguiu, curioso. A borboleta pairou sobre as rosas num vaso de vidro e depois seguiu em frente. Em direção ao grande espelho do outro lado que refletia toda a sala. O garoto viu que ela tentava se aproximar das rosas refletidas e riu com gosto do inseto. E então, a borboleta atravessou o espelho e continuou voando até as rosas.

Chocado, ele encarou o objeto de moldura dourada. E, lentamente, tocou o próprio reflexo. Sua mão atravessou o vidro como se fosse manteiga derretida. O garoto sorriu e atravessou o espelho.

A sala espelhada era idêntica à original, porém tudo estava no lado oposto, até a foto sobre a mesa. Por um tempo, ele percorreu a sala, mas sentiu curiosidade pelo resto da casa. Foi até a escada, tropeçou e caiu dela, mas voltou para o andar de cima. De volta a sala. Surpreso com a falta de dor, tentou, novamente, descer a escada e acabou voltando a sala. Foi até a porta e tentou abri-lá, mas ela não se moveu.

Desapontado, percebeu que só podia ir até onde o espelho refletia e decidiu voltar ao mundo real. Mas quando tocou o espelho, ele estava duro. Apavorado, viu que estava preso. Bateu no vidro e gritou com todas as forças, mas nada aconteceu.

A borboleta, que olhava tristemente, bateu as asas e voou até o garoto, que a olhou. Ela se aproximou de sua orelha e sussurrou o segredo para voltar a atravessar o espelho.

Aliviado, o garoto agradeceu, devorou a borboleta, e voltou para o seu mundo.