“Ela é bonita.”

“Convide-a para sair.”

“Não é uma boa ideia.”

“Ela vai te chamar de monstro.”

“Ele não precisa contar para ela que é um monstro.”

“Hohenheim não é um monstro.”

“Ela está vindo.”

As vozes não se calavam, mas após tantos anos, Hohenheim conseguia concentrar-se a ponto de fazer com que todas as almas dentro de si diminuíssem as vozes até que elas se tornassem sussurros soando ao vento.

Trisha se aproximava, segurando uma cesta de palha com produtos comprados em uma venda. O sorriso dela era sempre gentil, e o olhar atencioso. Ela era jovem, muito mais jovem que ele, centenas de anos? Mas o coração de Hohenheim saltava do peito a cada menção de suas palavras para com ele. A cada novo olhar, a cada novo sorriso.

— Olá, bom dia Hohenheim-san. — Ela moveu a cabeça para o lado, deixando uma mecha de cabelo cair displicentemente.

— Bom dia, Trisha. Está pesado? — Ele se ofereceu e pegou a cesta das mãos dela.

— Obrigada, sempre tão gentil. — O sorriso dela era iluminado, assim como sua expressão sempre suave. Nada parecia abalar seu humor.

— Eu estava pensando, se poderíamos tomar um chá. — A ousadia do pedido saiu quase como se fosse uma das almas dentro de si narrando o que precisava falar.

— Seria maravilhoso. — Ela concordou, deixando-o surpreso, assim como as milhares de almas.

O primeiro encontro foi um fiasco. Hohenheim sentiu-se deslocado e ansioso, como nunca sentiu em toda sua vida. Felizmente, Trisha havia se divertido, mesmo com o chá virando sobre a mesa e molhando seu novo vestido, e aceitou sair novamente com ele. E isso ocorreu mais algumas vezes, até ele reunir coragem e toma-la nos braços com um beijo, ao pôr do sol, ao lado da entrada de uma pequena propriedade ao topo de um morro.

Os encontros foram ficando cada vez mais comuns e ele se viu completamente apaixonado pela companhia daquela mulher, pela sua paciência, amabilidade, sensibilidade, sua voz, o seu humor, a sua beleza.

Sentia-se terrível por mentir para ela sobre suas origens, e não foi fácil contar seu passado para a mulher que ele sonhou um belo sonho, acreditando que poderia amar e ser amado.

— Você não é um monstro. — Foi o que ela disse, após ouvir tudo o que ele tinha para falar, e com isso o abraçou, aconchegando-se em seus braços sem querer sair. — Você é o homem que eu amo.

— Trisha, eu não mereço ser amado. — O tom de alerta não conseguiu afastá-la.

— E quem disse que você não merece ser amado? — Ela acariciou seu rosto, com um sorriso singelo. — Eu posso falar com eles, eu posso dizer a eles que eu o amo, e que farei de tudo para que você seja feliz. Assim, eles também irão sentir a sua felicidade. — Ela suspirou, levando a mão ao peito de Hohenheim. — Eu sinto muito pelo o que houve, mas todos merecem ser amado. E se possível, eu os amarei também, junto com você.

As lágrimas de Hohenheim molharam seu rosto e a bela Trisha passou os dedos sobre elas, pedindo para que ele não chorasse, beijando-o novamente.

“Diga, diga agora.”

“Peça ela em casamento.”

“Eu senti, um pouquinho, mas senti.”

“Ela é importante.”

“Não a deixe ir embora.”

“Cuide dela.”

“Peça.”

— Trisha, você quer se casar comigo?

— Sim, sim. — Ela o abraçou mais forte. — É claro que eu quero.

— Obrigado. — Ele sentiu o agradável cheiro de jasmim que emanava de seus cabelos, acariciou os fios, tocando os lábios na pele quente do rosto de Trisha.

O amor de Trisha era doce e natural, fazia-o sentir entre as nuvens, podendo alcançar o sol. Havia medo de se iludir e de magoá-la, mas ao lado dela, as coisas pareciam se encaixar, parecia tão certo, tão necessário. Ele a amava de corpo e alma.

Muitas almas.