Perfume escrita por Luiz Gustavo
O barulho da tempestade acorda Miguel Xavier de seus devaneios, que tenta retornar a dormir, mas fracassa. Ao lado esquerdo da cama, uma bela dama, dona de cabelos castanhos, uma garota de programa de pele morena e delicada, acorrentada na cabeceira de ferro provençal. Os trejeitos da mulher lembram os de Pamela, sua finada noiva. Ele não fez questão de desamarra-la, apenas esboça um sorriso no rosto, satisfeito depois de duas transas ardentes. Xavier é um homem dominador, gosta de manter no controle, o sadomasoquismo é o seu fado. Ele se enrola em um roupão vermelho de seda, pega o celular de cima do criado-mudo, que contém algumas chamadas perdidas de um dos seus funcionários, Jake Fremont, o ligando rapidamente.
— Ainda está em Vale Verde?
— Estou na estrada a caminho de Arraial e consegui finalizar o serviço.
— Com êxito?
— Sim, matei aquele desgraçado e ainda arranjei uns cinco mil reais.
— Sabia que você era capaz disso.
— Não tive nenhuma piedade, fiz da forma que o senhor ordenou.
Jake e Xavier referem-se a um devedor de longa data do prostíbulo, que tinha fugido para um pequeno vilarejo vizinho intitulado de Vale Verde. Mas não tem como escapar da facção que comanda a cidade, a qualquer momento, pode estar na mira de uma arma com uma bala encravada no peito, o cadáver do homem está dentro do automóvel, para ser jogado na grande aérea no final de uma extensão florestal, um cemitério atônito.
— Você é muito inteligente Jake.
— Obrigado chefe.
— Você e o Tyler, são os meus braços direito.
— Eu posso te fazer uma pergunta?
— A vontade, é um homem de confiança.
— Posso ser um pouco indiscreto, mas sempre achei a morte da sua noiva, no mínimo estranha, esse atirador de elite transparecer dessa maneira. Não tem medo?
— Medo do quê?
— Do senhor ser o próximo alvo desse homem.
— Ele jamais vai fazer algo contra a mim.
— E por que não?
Xavier gargalha de uma forma irônica, Jake deduziu a resposta, não precisava de mais nenhuma palavra. O rompimento da confiança, pode ter gerado o óbito da mulher, ninguém anseia em alimentar um lobo em pele de cordeiro, talvez ela não fosse boa o suficiente para segurar o cargo de mulher de um dos homens mais ricos da costa do descobrimento. Ele desligou o telefone e caminhou em torno do ambiente, abriu as longas cortinas observando a chuva alagando a área externa.
— Pamela, você teve o que mereceu.
Um grande barulho de trovão é escutado, nos segundos posteriores a energia do distrito some gradualmente, Miguel odeia essas situações, mesmo sendo duas horas da manhã. O homem desce as longas escadarias, indo para a cozinha, pegando uma caneca de café e alguns biscoitos, acomodando-se no sofá. Aprecia a bebida quente com as rosquinhas de chocolate, depois de se alimentar, ele se pega em um leve sono, seguido de um pesado, despertando de manhã com a visão embaçada, com um dos seus funcionários adiante, trata-se de Tyler.
— Bom dia, doutor Miguel.
— Porque me incomoda tão cedo?
— São dez horas da manhã, fui ás sete no resort, mas infelizmente não te encontrei.
— Aconteceu alguma coisa?
O homem pisca algumas vezes os olhos, o cômodo estava devidamente arrumado sem nenhum vestígio de sujeira ou da guloseima que ingeriu na madrugada. A garota de programa com certeza, deve ter ido embora, ele não havia perguntado o nome daquela mulher, ela era só mais uma, descartável.
— É a respeito do assassinato da Pamela.
— Você e o Jake tiraram os últimos dias para me fazerem essas perguntas?
Tyler engoliu algumas palavras e arrumou os seus óculos, um pouco sem jeito com o patrão.
— Quem sou eu para me intrometer na vida do doutor? Presto serviços e nada mais, sou um mero vedor, cada coisa que acontece nessa cidade, devo te contar, não é mesmo? É por isso que paga muito bem o meu salário. Para fiscalizar os mínimos detalhes de Arraial.
— E aonde entra a Pamela nisso?
— O irmão dela. Ele quer a verdade, justiça. Anda perguntando a respeito de muitas coisas, quer saber da vida dos outros, incluindo a sua, creio que isso pode nos prejudicar.
— Aos negócios.
— O interesse é sempre nisso, nos negócios.
— Obrigado, Tyler, desculpe-me se fui um pouco rude, acordei de mal humor.
Tyler retirou-se do cômodo. Miguel Xavier, subiu para o quarto e vestiu o paletó, um pouco tarde para ir ao trabalho, escutou o barulho da campainha, a empregada subiu rapidamente para avisar que tinha uma visita, esperando ele na sala de estar, um homem. Ele retornou para o ambiente anterior, contemplando Levi Monteiro acomodado no estofado, as palavras de Tyler foram muito uteis.
Xavier permanece em pé, acabando por arrumar a gravata no pescoço.
— Porque me incomoda tão cedo?
— Estou investigando o homicídio da minha irmã.
— Excelente iniciativa, se depender da polícia...
— Nunca encontrarei o verdadeiro mentor.
— Claro.
— Acho estranhos os motivos que levaram a Pamela pisar no altar. Já que ela mantinha um caso com outro homem. Ou melhor dizendo, o Jonathan Sampaio.
— Do que você está falando?
— Que eu vou até o fim dessa caçada.
Levi se levanta do sofá, ficando frente a frente com Xavier.
— Toma cuidado comigo. – Avisa o proprietário do resort.
— Está me ameaçando?
— De forma alguma, mas pise no meu calo, que eu dou muito mais que um recado, entendeu? Agora, por favor, se retire da minha residência, estou um pouco atrasado para o trabalho.
O homem aponta o caminho da saída, eles não trocaram mais nenhuma palavra. Levi recolhe-se, sem ao menos se despedir. O ódio consome Miguel. Quem esse miserável pensa que é? Para chegar assim? O insultando dentro de sua própria casa? Vontade de estrangular aquele pescoço até os últimos momentos de vida. Ele pega uma pequena estatua de porcelana e joga contra a parede, que despedaça no assoalho, pondo em mente apenas ideias tétricas.
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