Stellarium escrita por Acquarelle


Capítulo 15
CAP.4, Epi.3: A tristeza que senti em sua voz




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Todos voltaram sua atenção para o barulho infernal que ressoava em um dos compartimentos da espaçonave.

— Não temos mais tempo! — resmungou Rashidi, saltando para dentro da Arcadia (e pela forma que sacudiu uma das mãos, a machucou no processo). — Entrem na nave de uma vez.

— ...

Mesmo com o alarme do monstro metálico e o alerta de Rashidi, Ayase não se moveu.

Ela refletia no quanto seria maravilhoso encontrar um novo lugar para morar, mas logo afastou aqueles pensamentos. Depois de tudo o que houve em Atlansha, não seria justo ela seguir sua vida como se nada tivesse acontecido.

"Eu tenho o direito de viver?", perguntou para si mesma. "Sair daqui e... recomeçar?"

Como poderia ser feliz sabendo que tudo o que conhecia havia sido destruído? Lá no fundo, Ayase sentia que não tinha esse direito, e que se entrasse no monstro metálico que flutuava nas águas turvas, estaria traindo cada uma das espécies que se extinguiram junto ao planeta.

Pensar em um recomeço diante daquela situação não parecia o certo a se fazer. Seria como ignorar a morte de seus pais e irmãs, e também de todos os serviçais e damas de companhia que os acompanhavam para quaisquer eventos nas Terras de Cristal. Seria como ignorar a morte dos moradores de Althum e de cada uma das cidades que ela nunca visitou. Seria como ignorar a morte das criaturas que brincavam com ela durante os passeios, e também dos amigos que ela não teve a chance de conhecer. Seria como ignorar cada um dos corais que decoravam os arredores das cidades. Não seria justo viver como se nada tivesse acontecido.

— ...

Sua mente se tornava um turbilhão cada vez mais agitado, e sentindo o coração se apertar, mais uma vez ela sentiu as lágrimas se formando em seus olhos.

Void queria ter algo a dizer para aquela situação, mas palavras não pareciam suficientes para confortá-la. Mesmo sem tempo, forçá-los a entrar na Arcadia não seria uma boa ideia, mas ficar à deriva naquela área abandonada pelos Criadores também seria loucura; ele precisava fazer algo para convencer Ayase antes que a energia da Fenda-LMB se extinguisse.

Pelo pouco que Void conseguia entender, Ayase não sabia o que tinha acontecido ao planeta e por isso se recusava a ir embora sem uma resposta; uma atitude que julgou prudente. Ele pensou em contá-la sobre as raças que guardavam informações, pois assim Ayase teria um bom motivo para seguí-los, mas alguém cortou o silêncio mais depressa:

— Vai ficar tudo bem.

Nas trevas de Atlansha, a voz de Ryuuki rugiu como um trovão. Ayase finalmente ergueu a cabeça, passando a observá-lo com os olhos vermelhos e a face inchada, e apesar da expressão apática em seu rosto, Ryuuki sabia exatamente o que ela estava sentindo.

— Mudanças são assustadoras, não é? Te entendo perfeitamente. — Apesar de ter sido um mero sussurro, sua voz grave ainda demonstrava a força do Eco das Profundezas, e era difícil demonstrar qualquer sentimento por ela. — Mas não precisa ter medo, milady; estarei com você o tempo todo. Isso é uma promessa.

Ao ouvir as palavras de Ryuuki, Ayase desabou em lágrimas.

— Vo-você... você vai... ficar comigo? — perguntou ela, tentando sem sucesso limpar as suas lágrimas. As gemas irregulares passaram a se espalhar com o movimento, transformando as escamas metálicas de Ryuuki em uma pequena poça de pedras preciosas.

— Jamais te deixaria sozinha, milady — sussurrou, abaixando a sua cabeça em direção à Ayase, que a abraçou sem pensar duas vezes.

O corpo da garota era minúsculo em comparação com o Eco das Profundezas, e o abraço ficou perdido entre uma das laterais da boca do dragão-serpente. Ryuuki podia sentir o coração de Ayase pedindo para que ele não saísse dali, mas os dois não tinham tempo a perder.

— Vá para a espaçonave, certo? — pediu Ryuuki, a empurrando suavemente para que ela conseguisse se levantar. As pernas de Ayase pareciam bambas, mas ela conseguiu se manter de pé.

Obedecendo à ordem silenciosamente, Ayase foi em direção ao monstro metálico a passos curtos, e com a ajuda de Void, conseguiu passar pelos compartimentos e finalmente alcançar a entrada da nave, onde foi recebida pela expressão irritada de Rashidi. Os dois não trocaram uma única palavra, mas Ayase soltou um suspiro nervoso.

Ela olhou para trás; as águas turvas de Atlansha passaram a tomar o corpo de Ryuuki, o envolvendo em ondas tão escuras quanto a eterna noite do céu em suas cabeças. Com a mesma rapidez que se formaram, elas logo se dissiparam, dando lugar ao corpo diminuto do dragão-serpente, que agora utilizava suas barbatanas como pequenas asas para se locomover até a garota.

Ayase o acolheu com um abraço.

— Você fica bem melhor assim, Ryuu! É tão mais fácil te abraçar! — sussurrou, o abraçando mais apertado. Ela sentiu algo perfurando sua pele, e ao observar melhor, percebeu que haviam pequenos chifres na cabeça do dragão-serpente; eles sempre estiveram ali?

— Se você diz... — Ryuuki respondeu, sibilando algo que parecia uma risada.

Antes que Void entrasse e fechasse a porta da sala, Ayase conseguiu dar uma última olhada em Atlansha. A tristeza voltou a transbordar em seu peito, fazendo lágrimas se formarem em seu rosto mais uma vez.

— Então... é hora de dar adeus? — perguntou a garota em um murmúrio desajeitado.

— Sim. — Ele respondeu sem cerimônia, sentindo que Ayase segurava o choro.

O olhar dos dois ficou ainda mais desamparado quando Void se afastou da porta fechada.

— Atlansha me acolheu como um lar que nunca tive — sussurrou Ryuuki, fazendo Ayase desviar sua atenção para ele. — Tive experiências maravilhosas no tempo em que fiquei aqui: conheci pessoas que apenas ignoraria em outros momentos da minha vida, conheci lugares que só costumava ver em livros e aparelhos estranhos, e também — Ele deu uma pausa, voltando seus olhos para Ayase, cuja tentativa de parar de chorar havia sido em vão. — pude conhecer você.

Ayase passou a abraçá-lo com mais força (se Ryuuki precisasse respirar, com certeza já estaria sufocando), e ele apenas aceitou aquele gesto desesperado como uma forma de desabafo da garota. As lágrimas que desciam de seu rosto começaram a se acumular no chão, e as pequenas gemas irregulares e brilhantes passaram a chamar a atenção de Ribbon.

— O que ela está fazendo? Ribbon quer saber! — perguntou a inteligência artificial, fazendo a atenção de Ayase e Ryuuki se voltarem para seu monitor. O rosto choroso de Ayase demonstrava surpresa, mas Ribbon se sentia animada por finalmente poder se apresentar: — N'no! Sou a Ribbon, a Lephancee responsável pelos comandos da Arcadia! Como você está, senhorita? Preciso da sua permissão para ativar os escâneres do Protocolo de Cadastro!

Ayase pareceu tomar um susto quando percebeu que a voz infantil vinha de um dos estranhos objetos da sala.

— O-o quê?! — Sua expressão era um misto de terror e curiosidade. — Te-tem alguém dentro daquelas... coisas?

— Deixe isso para depois, maldita — resmungou Rashidi, atirando-se em uma das cadeiras da sala e se ajustando firmemente a ela. — Apenas inicie logo o salto pela fenda-LMB. Você tinha dito que não tínhamos tempo, não?

— Ribbon só queria que Void e Rashidi andassem logo — admitiu ela, exibindo um rostinho redondo em seu monitor (que estava piscando um dos olhos e com um grande sorriso no rosto), fazendo Rashidi ficar ainda mais nervoso. — Não seria prudente deixar o salto para os últimos segundos.

Ao perceber que Rashidi a encarava de maneira irritada, ela continuou:

— Afirmativo! Trinta segundos para que a Sequência de Salto pela Fenda-LMB se inicie.

— Deixarei vocês dois cuidando disso — disse Void para Rashidi, e logo em seguida se voltou para Ayase e Ryuuki. — Vou apresentar o lugar a vocês, então me sigam, por favor.

Ayase assentiu silenciosamente, saindo do cômodo em direção à outra sala. Antes de sair, porém, ela conseguiu ouvir um sussurro desanimado vindo do objeto que se apresentou como Ribbon:

— Ribbon queria conversar mais um pouco com ela. Void é tão injusto...


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Notas finais do capítulo

Capítulo 4, Parte 3

Esse é o último capítulo do rework! A partir do próximo, só vem novidades ~

Estou ansiosa por isso, mas só de pensar que preciso revisar os capítulos com atenção redobrada, já fico com aquela pontinha de receio. Como sempre: se vocês vierem algum erro muito gritante, sintam-se livres para apontá-los.



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