Stellarium escrita por Acquarelle


Capítulo 10
CAP.3, Epi.2: Informações suspeitas




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Antes mesmo que os dois se movessem, Ribbon os interrompeu ao desligar a gravidade artificial da espaçonave; os corpos de Rashidi e Void passaram a flutuar pela cabine de comandos, fazendo com que os dois voltassem sua atenção à voz infantil da inteligência artificial:

— Rashidi, Void, parem com isso agora mesmo!! Vão danificar Arcadia!

— Não enche o saco, Ribbon! Se quiser realmente ser útil, ligue a gravidade e nos mostre informações atuais sobre esse maldito planeta!

Quando a gravidade foi estabilizada, Rashidi jogou o seu corpo novamente na cadeira, esperando os dados que pediu aparecerem nos monitores holográficos à sua frente. Seus olhos (que agora já estavam no tom habitual de violeta) encaravam o monitor de Ribbon impacientemente; a inteligência artificial tinha seu próprio monitor, geralmente o utilizando para responder dúvidas ou demonstrar emoções sintéticas como se fosse um humanoide provido de sentimentos. Como o esperado, Ribbon exibiu o desenho de um rostinho redondo e amarelo com uma expressão chateada (ou seja lá o que ela quisesse transmitir) e disse:

— Enquanto Rashidi e Void estavam super ocupados discutindo e tentando destruir Arcadia, Ribbon estava escaneando Atlansha. — Neste momento, o rostinho redondo tomou uma expressão chorosa. — Como Rashidi e Void já sabem, a memória de Ribbon não está mais sendo atualizada, então Ribbon não consegue acessar o banco de dados dos Daemonias. Consta na memória de Ribbon que Atlansha era completamente diferente de agora, como Rashidi e Void puderam checar nos dados que Ribbon passou mais cedo.

— Vá direto ao ponto — murmurou Rashidi, balançando uma de suas pernas freneticamente enquanto ignorava os rostinhos que Ribbon exibia.

— De alguma maneira, algo ainda reside nesse planeta — Ela deu uma pausa, e inúmeros dados passaram a ser exibidos nos monitores secundários, inclusive os de uma imensa criatura. — Os escâneres da Ribbon detectaram uma criatura de aproximadamente 28 metros à 800 metros abaixo do nível da água. Provavelmente é por causa dela que o aglomerado está aqui.

O rosto de Rashidi ficou pálido.

— Mas o que...?! — Ele se levantou bruscamente. — POR QUE NÃO DISSE ISSO LOGO?

— Não dá para recuperarmos o aglomerado sem confrontar essa coisa? — perguntou Void; a voz abafada por seu elmo também demonstrava surpresa, mas ele parecia menos nervoso que Rashidi. Bem menos nervoso.

— Impossível — respondeu Ribbon, fazendo o rostinho choroso voltar à tela. — A criatura e o aglomerado estão muito próximos.

Rashidi passou a dar voltas pela sala, pensando em uma maneira de contornar a situação.

Quando aceitou aquela missão, não esperava ter que lidar com problemas daquele porte; precisava ser discreto (ainda mais em território inimigo), e por conta disso, teve que abrir mãos das inúmeras ferramentas que podiam lhe auxiliar em sua busca.

Sua missão havia começado há pouco tempo, e Rashidi não havia recuperado muitos fragmentos do aglomerado (a estranha energia que pediram para ele buscar não tinha um nome, então ele preferiu chamá-la dessa forma por possuir inúmeros Princípios dentro dela); se não fosse por Ribbon e Void, ele sequer conseguiria recuperar os solitários dois fragmentos que tinha, mas não podia simplesmente depender deles para tudo.

Ele cerrou os punhos enquanto olhava fixamente para a imagem da criatura; eles seriam capazes de lutar contra aquilo na condição atual? Não sabia de onde Void tirava sua energia, mas de qualquer forma seria perigoso lugar contra algo tão grande apenas utilizando a nave como apoio. Se ela quebrasse — o que era o mais provável de acontecer —, eles ficariam presos naquele planeta para sempre?

— Se demos sorte — murmurou Void, percebendo o quanto Rashidi estava quieto. —, talvez essa criatura seja um Mediador.

— Ah, é isso? — Rashidi deu um sorriso nervoso. — Você quer testar a sorte? É engraçado ouvir isso de você... Mas o que você tem a perder mesmo, não é?

Void deu de ombros.

— Se você fosse capaz de usar pelo menos dois neurônios e interpretasse os dados corretamente, iria perceber que aquela coisa está mantendo o planeta estável — disse ele, apontando para alguns dados exibidos em um dos monitores secundários; mesmo sendo de uma raça desconhecida, Void conseguia ler aqueles dados sem muitos problemas, o que sempre deixou Rashidi inconformado. — Vocês não acham estranho esse planeta ter água em estado líquido mesmo não tendo uma estrela para mantê-lo aquecido? A estrela mais próxima é essa aqui, e ela não seria capaz de levar calor para algo tão isolado. Sendo bem otimista, a temperatura média desse planeta deveria estar entre -400 e -500 ºC.

— E o que te leva a pensar que não seja o aglomerado, Void? — perguntou Rashidi, aumentando o tom de voz. — Nem mesmo nós sabemos a capacidade deles. Talvez nem a deusa saiba da capacidade deles! O aglomerado pode estar protegendo o planeta.

O monitor principal exibiu um rostinho triste.

— Aglomerados são instáveis demais para isso, Rashidi.

— Você está nessa missão há mais tempo que eu e ainda não percebeu isso? — Void parecia tão decepcionado quanto Ribbon. — Se dependesse do aglomerado, esse planeta seria apenas uma bola de gelo venenoso. Para ele se manter dessa forma, com certeza a criatura está protegendo ele, e quem melhor que um Mediador para proteger o seu planeta?

— E o que você sugere, Void? — Rashidi perguntou, percebendo segundos depois o que Void estava prestes a fazer. — N-não me diga que...

— O plano é bem simples, na verdade. Se ele está se esforçando tanto para proteger esse planeta morto, significa que há algo importante para ele aqui. Mediadores são mais inteligentes do que você pensa, e mesmo aqueles que não têm emoções complexas sabem dialogar, então tudo o que precisamos fazer é um acordo com ele.

— E se ele não estiver disposto a ouvir? E se ele não nos entender? Os aparelhos de Kolasurr não funcionam debaixo d'água.

— As ondas eletromagnéticas da Ribbon serão suficientes para isso — disse Void com veemência. — No seu lugar, eu estaria me preparando para pousar.

Rashidi engoliu seco, sentando em uma cadeira próxima ao monitor principal de Ribbon. Ajustou o modo de pouso com as mãos trêmulas, fazendo um enorme esforço para que Ribbon ou Void não percebessem o quanto ele estava nervoso. Para seu alívio, nenhum dos dois tocou no assunto.

— Rashidi, Void... — disse Ribbon, tentando chamar a atenção dos companheiros para seu monitor. — Assim que pousarmos em Atlansha, Ribbon entrará em modo de repouso para poupar a energia da Fenda-LBM. Não há indícios da energia da Fenda-LBM nessa vizinhança, então sejam rápidos, ou será muito difícil Arcadia sair daqui. Levaríamos vários anos-luzes para chegarmos a um lugar onde poderíamos usá-la novamente, então fiquem atentos a isso.

— Por que você sempre deixa para avisar essas coisas em cima da hora, maldita? — resmungou Rashidi, lançando um olhar irritado para o monitor de Ribbon.

— Porque Rashidi e Void estão sempre discutindo e interrompendo a Ribbon! — Ao terminar sua frase, o rostinho redondo de Ribbon parecia choroso, mas logo foi alterado para um mais animado. — Sequência de pouso ativada! Preparem os seus coletes salva-vidas e suas máquinas fotográficas, pois a próxima parada de Arcadia é em Atlansha!

Ribbon estava se divertindo por finalmente voltar a comandar os controles da espaçonave, enquanto Void e Rashidi permaneciam silenciosos durante o percurso. Rashidi empurrava seu corpo contra a cadeira, pressionando seus braços nos apoios acolchoados em suas laterais. Tentava, sem muito sucesso, esquecer o nervosismo que sentia ao refletir no plano de Void, que mantinha-se firme e sossegado diante da situação; secretamente, Rashidi o invejava por ser tão estável em momentos como aquele, onde pisar em território inimigo soava como um passeio agradável.

De alguma maneira, ele se sentia mais confiante por uma criatura como Void estar em seu esquadrão.

— Tente não estragar tudo. — Ele ouviu Void resmungando ao seu lado, mas permaneceu em silêncio.

Rashidi passou longos minutos encarando o monitor. Era impossível que Ribbon e Void não tivessem notado as informações da criatura que habitava naquele planeta morto, elas estavam bem nítidas na tela! Que tipo de criatura normal teria níveis tão absurdos de energia primordial? Mesmo que os escâneres da Arcadia não passassem de ferro-velho vagabundos, a existência de uma margem de erro para aquela informação era inacreditável: havia mesmo um Primordial em Atlansha? Ele não queria acreditar naquilo.

Uma frase que a deusa havia lhe dito martelava em sua cabeça; "Tenha cuidado com Primordiais". Lembrou de tê-la questionado na época, mas a deusa apenas soltou frases desconexas e o mandou embora, deixando apenas uma informação incompleta sobre algo que Rashidi sequer imaginava o motivo para ser temido.

Ele respirou fundo, tentando conter os pensamentos negativos. Cogitou deixar aquele problema nas mãos de Ribbon e Void (que aparentemente estavam tranquilos) e ir deitar, alegando que estava se sentindo mal ou algo assim, mas precisava encarar aquela situação.

"Eu sou um Vesper", pensou ele. "Não posso temer esse tipo de ameaça."

Rashidi queria confiar em sua própria consciência, mas quando notou que Arcadia havia pousado, o medo passou a lhe embrulhar o estômago.

— Pouso realizado com sucesso! — comemorou Ribbon, fazendo um rostinho feliz surgir em seu monitor.


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Notas finais do capítulo

Capítulo 3, Parte 2

E puff, primeira mudança nessa parte da história!

Não é novidade para ninguém que Ryuuki é um Daemonia (e que é inimigo natural de Rashidi, que é um Vesper), então nada mais justo começar a soltar algumas informações aleatórias a respeito dos dois. Prometo que não vai demorar muito para eu explicar a origem dessa briga, até porque eu tenho planos maravilhosos para essa revelação — e espero que os leitores também gostem quando eu o fizer.

Enfim. Eu estou me sentindo bem mais orgulhosa com a história depois dessas mudanças. Fazer com que a história se passe de uma forma mais "devagar" para que os leitores se apeguem melhor aos personagens foi a melhor ideia que tive! E até o momento isso não influenciou muito na quantidade de palavras, já que até o final do capítulo 4, a história contava com aproximadamente 20.000 palavras, então é uma média boa para um livro, já que pretendo terminá-la lá pelo capítulo 12, se tudo correr conforme o planejamento.

Obrigada por não desistirem de Stellarium!



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