Adotada! escrita por ArnaldoBBMarques


Capítulo 8
Peixe no aquário




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— São quase duas horas. Eu não falei que era para todo dia você vir direto do colégio para casa?

— Ah, mãe, eu fiquei conversando com uns colegas, só!

Bia achava que a discussão ia azedar e logo em seguida as duas iam estar gritando, como de costume. Mas a mãe tinha mudado. Falava em tom pausado e não se deixava enervar como antigamente.

— Bia, nós conversamos, e eu expliquei para você que o regime agora é outro, não foi?

— Foi...

— Eu posso mudar esse regime, mas para isso você tem que fazer a sua parte, e mostrar que pode obedecer. Se você faz o contrário e não obedece, aí eu não tenho razão para mudar o regime!

Bia escutava, contrafeita. Lá no sofá, Fernando teclava o celular sem tomar conhecimento da discussão. Na porta, Rosana chegava da escola naquele momento.

— Castiga ela, mãe!

— Tá bom, mãe, foi mal! - Bia conseguiu, por fim, destravar a língua - Eu estava com um garoto!

— Mal mesmo! Você me desobedece, e ainda me fala com desrespeito! Agora vira! - Ordenou a mãe.

Bia sentiu um frio na barriga, mas obedeceu incontinenti. Virou-se de costas para a mãe e olhou a parede nua à sua frente. Sentiu a saia azul colegial ser erguida, e em seguida a mão da mãe estalou bem forte sobre a calcinha, uma, duas, várias vezes, espalhando o ardor.

— Agora vai para o quarto e fica lá até eu chamar!

Na sala, Fernando continuava impassível e Rosana largou a mochila a um canto, cara feliz. Quando a porta do quarto se fechou, Bia pôs-se a esfregar o traseiro. Sentia a calcinha de náilon grudada na pele, e tirou-a. Ficou deitada na cama, repassando o que havia acontecido. Surpreendeu-se por não haver resistido. Mas o problema era o autocontrole da mãe, que não deixava o caldo entornar. Assim, sem a descarga de adrenalina, ela não reagia e começava até a gaguejar.

Quando dona Silvana apareceu de novo no quarto, estava tão impassível quanto antes. Mandou que Bia fosse comer alguma coisa e depois deu-lhe a lista de serviços do dia. Ocupada em varrer a sala e tirar o pó dos móveis, Bia tinha tempo para pensar. Sentia-se como um peixe em um aquário. Sabia que o espaço era limitado, mas não deixava de nadar de um lado para outro, como se fosse a algum momento encontrar a saída. Em sua intuição, a saída era encontrar alguém que quisesse viver com ela. Só assim teria sua própria casa e ficaria livre da mãe. Lembrou de Cláudio, o colega com quem ficara trocando beijos na saída, e que causara aquela bronca toda da mãe. Ele era bem bonitinho, mas era só um colega, não dava nenhum sinal de que se dispusesse a ter uma vida independente antes de terminar o colégio. Suspirou. Agora estava arrependida, pois naquele fim de semana tinha uma festa para ir, e era capaz da mãe não deixar.

— Mãe, eu posso ir na festa da Denise, esse sábado?

Bia tinha esperado uns dias antes de fazer o pedido em um tom bem humilde. A mãe fitou-a por um segundo, e perguntou:

— Se eu deixar, você é capaz de me obedecer e voltar na hora marcada?

— Volto, sim!

— Então eu vou confiar em você!

Bia estava otimista, haviam-lhe dito que naquela festa ia gente bem interessante. A mãe liberou o celular e uma roupa bem transada, antes de anunciar outra vez o horário de volta. A carona chegou e rumaram para a festa, que era em uma casa com um grande quintal.

Bia olhou em volta. Muita gente, a maioria da igreja, mas havia alguns que pareciam não ser, a julgar pelos modos. Ficou conversando um pouco com Leila. De repente viu Marcela no quintal. Lembrou-se do início de conversa que tivera com ela, que compartilhava de sua experiência de haver sido adotada, e talvez de algo mais. Bia ansiava por saber mais dela, mas estava inibida. Tinha receio de perguntar, e tinha receio das respostas que podia ouvir, caso não correspondessem à sua expectativa. Por fim tomou coragem e foi falar com Marcela.

A amiga estava serena e sorridente, como sempre. Conversaram algumas abobrinhas, mas aos poucos Bia foi direcionando a conversa para onde queria chegar. Antecipando-se, em determinado momento Marcela surpreendeu Bia com a afirmação:

— Liga não, todo mundo faz mancada. Eu também já fui morar com um cara!

Bia ficou muda um instante, antes de perguntar, curiosa:

— E deu certo?

— Claro que não! Tinha 15 anos, e o cara era só um pouco mais velho, e mó marginal!

— Aí você voltou...

— Foi aí que eu entendi as coisas. A minha mãe, que me pegou para adotar, estava até sendo legal, mas ela me prendia muito, sabe? Eu desde criança queria era ser livre, não tive família então queria logo me juntar com alguém! Mas aí eu vi que as coisas não acontecem de uma hora para a outra, tem que ser uma coisa de cada vez! Mas conta, a sua mãe te botou para fazer serviço de casa, não foi?

— Foi...

— A minha também. Para eu aprender que na vida nada é de graça! Mas eu também vi que a minha mãe é muito legal, e só quer o meu bem! Agora, eu tenho que valer o bem que ela me faz!

A conversa deixou Bia pensativa. Queria perguntar se a amiga também tinha que pedir licença para usar os aparelhos da casa, ficar de cerimônia com todos da família, e se tinha que ficar descalça, mas não teve ânimo. E também já intuía que era daquele jeito mesmo. Súbito, viu chegando um rapaz que parecia ter uns vinte anos e um jeito meio transgressor. Não perdeu tempo e foi até ele.

Dançaram e logo trocaram beijos. Bia felicitava-se da facilidade com que conseguia atrair os garotos, e olha que nem estava com aquelas roupas sexy que tinha, e que permaneciam exiladas no armário da mãe adotiva. Talvez o pessoal ali a achasse um tanto vulgar, mas que importava? Mais não fizera porque o ambiente não permitia.

Trocados telefones, Bia pegou a carona da volta. Ao chegar em casa, viu a mãe de braços cruzados.

— Passou quase uma hora além do horário!

Bia sentiu novamente o frio na barriga e um formigamento nervoso nas nádegas.


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