Adotada! escrita por ArnaldoBBMarques


Capítulo 4
Pelo telefone




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— Oi dona Silvana, sou eu, a Bia.

Bia caprichou no tom frio da voz no celular. Sentia-se bastante segura e achava que era a hora de negociar.

— Queria conversar com a senhora.

Estranhou não estar escutando já uma enxurrada de impropérios e rogos que a mãe adotiva costumava despejar sempre que ela saía de casa. Após alguns segundos de silêncio, veio a resposta.

— Pois diga.

— Eu acho que a gente pode tentar de novo. Mas eu vou dizer minhas condições. Se a senhora deixar eu sair, parar de implicar com as minhas amigas, parar de implicar com as minhas roupas, eu aceito voltar.

— Mas Bia, como você acha que pode fazer exigências, se tudo o que você já teve aqui foi por concessão minha?

— Ah para com isso! Quando é que você já me fez uma concessão?

— Bia, a sua escola particular, o seu quarto, o seu armário, as suas roupas, até o fato de eu haver te adotado, foi tudo decisão minha. Nada disso foi obrigação. Então, como você acha que está em posição de exigir mais concessões? Eu é que estou em posição de tirar as concessões que eu já dei!

— Então a senhora não quer que eu volte?

— Bia, você decidiu sair sem me perguntar. Então por que eu devo perguntar a você se vou te aceitar de volta?

— Ahh mãeee na moral...

— Ué, então agora eu sou mãe? Não sou mais a dona Silvana?

Confusa com seu ato falho, Bia não respondeu. A mãe prosseguiu:

— Se você prefere seus amigos a sua mãe, vai para eles!

— Então tchau mesmo!

Bia desligou o telefone. Estava absolutamente perplexa. Tinha um roteiro pronto, mas nada do que previra aconteceu. A voz da tia cortou sua confusão com um berro:

— BIAAAA VAI VARRER O QUINTAL!

Andando com um autômato, Bia pegou o ancinho e pôs-se a juntar as folhas, esperando que o trabalho ajudasse a por seus pensamentos em ordem. Instantes atrás estava tão confiante, e agora esperava desesperadamente que uma ideia qualquer lhe surgisse na cabeça.

— MAS QUE PORCARIA DE SERVIÇO! VARRE DIREITO!

Bia sentiu as lágrimas aflorarem em seus olhos, e teve vontade de sair correndo. Mas para onde iria? Lembrou-se das palavras da mãe: vai para seus amigos. Mas quem era amigo dela agora?

Sem poder mais aguentar o clima na casa da tia, Bia saiu vagando pelas ruas esburacadas daquele subúrbio. Tinha vontade de entrar em um baile funk, dançar até cair no chão, beber todas, fazer sexo com todos os homens em fila, entrar para o crime, sei lá. Mas as palavras da mãe lhe voltavam à mente: vai para seus amigos. Onde estavam eles? Por fim lembrou de uma prima distante que também morava por ali, e era da igreja. Nunca pensara antes que ainda ia precisar dela, mas chegou à conclusão que era a única com que podia contar naquele momento. Quase sem acreditar no que estava fazendo, tocou a campainha da casa modesta.

— Oi Beth, eu estava passando por aqui, e queria falar com você. Estou com um problema. Você é da mesma igreja daquela amiga da mamãe, né? A dona Maria Lúcia. Eu estava precisando falar com ela.

Bia tinha medo que a prima viesse com um daqueles sermões de evangélico, mas Beth fê-la sentar e muito delicadamente pediu para que contasse tudo.

— Eu estou querendo voltar para a casa da mamãe, eu saí de lá mas foi besteira, aqui não está dando mais para ficar. Mas a mamãe está fazendo jogo duro, não sei o que está havendo...

— Ué, a dona Silvana não quer mais você? Não acredito!

— Não, ela quer... mas é que... eu também bati o meu pé. Falei que para eu voltar, ela tinha que mudar uma porção de coisa...

— Agora é que eu não acredito mesmo! Você é que saiu de casa, e você é que está botando banca? Depois de uma desfeita dessas? Não é hora de marra não, prima!

Bia lembrou das palavras da mãe, e sentiu-se apanhada como um passarinho que cai em um alçapão. Mas a prima continuou, gentil.

— Mas pode deixar que eu vou falar com a dona Maria Lúcia agora mesmo! Deus ajuda a gente, e a gente ajuda aos outros!


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