O lápis novamente parou, assim como o coração e o mundo todo.

Conhecia pouco sobre sentimentos, mas já havia lido o suficiente para ter perfeita compreensão das arritmias que o atingiam quando era pego em flagrante pelo outro. Não que sempre tivesse o hábito de desenhar Sasuke, não, aquilo era recente... recente e viciante.

Sasuke, como sempre, fingiu não perceber, ignorou-o com sua típica arrogância, e Sai pôde soltar discretamente o ar que prendia em seus pulmões.

A cena por completo era linda. Estavam em um campo aberto, em pela primavera. O céu era alaranjado, colorido de uma forma como se a própria divindade tivesse uma palheta na mão e um pincel na outra. O sol se punha, preguiçoso, arrastando-se com tamanha lentidão que parecia querer se agarrar ao céu e não o abandonar tão cedo. As árvores possuíam suas folhas sacudidas pela brisa e algumas flores até mesmo caíam montando uma delicada cama no solo. Algumas pétalas dançavam, acompanhavam o vento como se uma valsa tocasse somente para eles. E, no meio de tudo isso, havia Sasuke, quer dizer, seria melhor dizer que, ao redor de Sasuke, havia tudo isso. E aqui a construção da frase é importante, uma vez que, veja bem, em meio a tanta beleza, o papel no colo de Sai retrava só e unicamente Sasuke...

O quê? Não pergunte. Por quê? Ele não sabia. Como? Não tinha ideia. Quando? Quando... difícil dizer...

Sai não tinha percebido que seu foco havia mudado para Sasuke até que Sasuke o notou enquanto o desenhava. A partir daí, ele contara os desenhos que havia em seu bloco, as folhas e folhas que tinha gastado apenas retratando o Uchiha em dias de treinamento, missões, descanso. As facetas de Sasuke o fascinavam, ele era melhor do que qualquer livro que havia lido! Os sorrisos raros, a seriedade, a raiva, a indiferença, a mágoa, a melancolia. Como podiam dizer que alguém como Sasuke era frio? Era uma mentira! Algo que só alguém que nunca tinha olhado bem para o Uchiha podia dizer, e seus desenhos eram a prova, todos eles, com cada emoção de Sasuke bem ali, registrados, gravados, eternizados e... para si, somente para si.

Novamente, sua mão agia no automático, cada traço tentando trazer mais um pouco de Sasuke para o papel. Os olhos negros dele eram sua perdição, desenhava e redesenhava até que transmitisse o mistério exato que possuíam. Perdia minutos ali, preciosos minutos, mas não ousava desviar sua atenção. Olhos que queria que o observassem, o nariz fino, os lábios que lhe pareciam macios e desejava conhecer, o cabelo, que acompanhava o vento com suas mechas um pouco compridas cruzando-lhe a face e que Sai desejava tocar.

Naruto também estava na cena, conversando com Sasuke, mas não se sentia inclinado a desenhá-lo, ele era apenas um personagem na cena, um detalhe tal como as nuvens, o vento, as flores...

Umedeceu os lábios secos e limpou a mão úmida na calça para segurar o lápis novamente com a firmeza necessária. Tinha pouco tempo, podia ver que a conversa de Sasuke com Naruto logo terminaria e, então, eles sairiam de sua vista.

Seu coração acelerava nessas horas, seu estômago revirava, seu cérebro buscava nos livros lidos a explicação para essas mudanças fisiológicas que o atingiam sempre quando Sasuke estava perto demais ou então prestes a deixá-lo. Já havia lido sensações semelhantes, aprendera a reconhecê-las e a classificá-las, mas...

Engoliu em seco e seu olhar novamente cruzou com o de Sasuke.

Sorriu, com certa frustração e melancolia. Sabia reconhecer, sabia classificar, mas também sabia negar... Seus desenhos seriam a única prova porque nunca admitiria para ninguém, nem para si mesmo, que havia se apaixonado por Sasuke Uchiha...