The Metaphoric Tales escrita por Elliee


Capítulo 1
Capítulo 1


Notas iniciais do capítulo

Parte Da Narrativa pessoal de Lilia



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A contagem de corpos acabara de se iniciar. Levaria, possivelmente, dias pra ser concluída, e eu não possuía nenhum interesse em ajudar na medonha tarefa.

Não. Não havia tampouco motivos para que eu me dedicasse a tal dever. Meus deveres, naquele momento envolviam ainda mais sangue do que a contagem de cadáveres depois da horrenda batalha que se sucedera na noite anterior. O cheiro de morte ainda pairava no ar, pesado. Os sobreviventes, bem menos do que em batalhas anteriores, andavam prostrados, de cabeças baixas. Aquele de fato, fora o pior verão dos últimos anos.

Eu mesma, ainda não havia me analisado friamente. Lutei na noite anterior, com a ferocidade e o ódio que apenas acompanha alguns escolhidos. Os portadores. Sabia que deveria estar sangrando ou com algo quebrado em algum lugar, mas não tinha a boa vontade de me dirigir ao Hospital. Os montes de restos do lado de dentro e de fora… Não. Nenhum motivo para me torturar pensando nas vidas que eu não havia salvo. Tinha outras a salvar.

O cansaço me puxava para baixo. Cada músculo de mim implorava fielmente por algumas horas de descanso; a lâmina, Abraxas, pesava em minha mão. Seria difícil, pensava, erguê-la novamente em qualquer futuro próximo. Não seria, porém, minha escolha fazê-lo.

As gentis palavras do Comandante não deixavam qualquer dúvida em relação a isso. Eu teria que lutar, quer fosse minha vontade ou não.

Meus olhos se fechavam com a tremenda fatiga. Encarava a cena a frente como se fosse apenas um sonho. Enxerguei sem ver, quando começaram a arder as chamas nas piras funerárias. Me peguei pensando se sequer sabiam de quem eram os braços e torsos aleatórios que se incendiavam nas valas. A fumaça piorou ainda mais a atmosfera do lugar. A apenas alguns dias pensei, aquela havia sido uma próspera cidade. A apenas alguns dias alguns dos agora cadáveres em chamas, haviam lhe oferecido uma festa, em homenagem a defesa da maravilhosa cidade de Porgraas.

Baixei a cabeça com a memória dolorosa. Eu não os pude proteger.

Eu senti a aproximação antes de que ele fizesse qualquer som. Olhei para trás, para ver o único olhar que possivelmente estava mais desolado que o meu próprio.
Metaphor.

Ele parecia destroçado, em todos os possíveis sentidos da palavra. As roupas, rasgadas e imundas. O longo cabelo preto e trançado, engordurado e manchado em vários pontos com alguma substância enegrecida e mal cheirosa, que eu não quis classificar como sangue, mesmo considerando as possibilidades. Haviam pelo menos 8 cortes longos e aparentemente profundos ao longo das pernas e braços, e mais dois, bastante salientes e ensanguentados no abdômen. Os olhos não olhavam para mim, encaravam a cena a minha frente. A mesma que eu encarava até segundos antes. As piras.

Ele se sentou no resto de muro ao meu lado, sem produzir qualquer som. Era essa uma qualidade que me enervara, no começo forçado de nossa parceria. Agora, era calmante. Pelo menos um de nós conseguia manter um mínimo de serenidade. Ou de qualquer modo, a aparência dela.

Encaramos as fogueiras sem dizer uma palavra por possivelmente, horas. Quando Meta quebrou o silêncio, eu já não me lembrava mais que ele ainda estava ali.

— Quantos você acha? Que morreram?
A pergunta inesperada me assustou, e eu levei alguns segundos pensando antes de responder.

— Quinhentos? Talvez? A contagem não terminou ainda... – minha voz saiu num engasgo, depois de tantas horas em silêncio.

Eu senti, sem me virar para olhar, que Meta estava me encarando. Não havia em mim a coragem para encarar aqueles olhos. Eu sabia que ele diria que fora culpa dele, e não possuía em mim a força para dizer a ele que não.

Não, aquele ataque randômico a uma cidade tão isolada não fora culpa dele. Nem minha. Nem de ninguém na cidade. Não naquela cidade, pelo menos. Mas eu sabia que ele insistiria até o último segundo que fora culpa dele. Que nossa presença atraíra a atenção dos Redentores. Que se nós não estivéssemos aqui, ou não tivéssemos aceitado a festa, ou qualquer outra coisa do gênero, isso não teria acontecido.

Eu não argumentaria algo tão horrendo. Se Meta estava disposto a colocar nos próprios ombros o peso da morte de pelo menos 500 pessoas, ele poderia fazer isso sozinho. Eu não carregaria este fardo. Não dessa vez.

Troquei Abraxas de mão, e sem me virar pra ele, levantei a mão. Ele repetiu o gesto com Gungniir, e encostou a mão na minha.

— 500 vidas se perderam. Mas nós salvamos outras quinhentas. Há mais vivos do que mortos aqui, isso é o que importa. – limpei a garganta para falar, e dessa vez minha voz saiu menos coaxada.

Ele se encolheu e puxou a mão de volta.

— Então todos esses mortos não importam? – ele perguntou quietamente.

Eu me virei para encará-lo.

— Nós somos destruidores, Metaphor. Não salvadores. Fizemos tudo o que podíamos.

Ele se encolheu mais ainda, e voltou a olhar para a enorme fogueira. As chamas agora, consumiam a carne, espalhando no ar o cheiro de queimado. O cheiro de morte. Nunca antes eu havia entendido completamente essa expressão. Agora, compreendia bem até demais.

A voz irritante da comissária nos chamou de volta do nosso pequeno mundo de culpas.

— Lilia, Methapor! Nós precisamos de vocês dois la dentro.

Eu observei enquanto Meta suspirava por entre a respiração, e o olhar de tristeza era substituído pelo de frieza e cinismo. Ele estava de volta, com toda a sua armadura brilhante de autoconfiança. Toda a quietude de momentos atrás seria escondida por seu infalível humor negro. Normalmente, observar a mudança entre esses dois estados de espírito me incomodava, mas hoje não. Não tínhamos tempo para lamentar os mortos agora.

Ele me estendeu novamente a mão, e me puxou para que eu ficasse de pé. Eu não havia visto o que ele, com certeza, viu, um enorme corte na minha perna esquerda, que ia do joelho até o calcanhar. Senti minha expressão se torcendo enquanto eu avaliava o quanto aquilo iria doer, quando eu me desse conta que aquilo era um ferimento real, não apenas minha imaginação recriando todo o grotesco que presenciara nas últimas 24 horas.

— Está doendo? – Ele me encarava inquisitivo. – Eu posso te carregar, se quiser.

Cerrei os dentes enquanto a dor começava a aparecer.

— Eu vou andar.

Ele deu de ombros e me estendeu um braço de apoio. A comissária, a alguns metros, encarava a cena com cara de poucos amigos. Ela, obviamente, não gostava de mim, e obviamente, gostava de Meta. Ela virou de costas e saiu estalando os passos por entre os escombros do que quer que fosse o lugar onde estávamos. Acho que era possivelmente, uma casa, a julgar pelo estilo dos moveis ao redor. Por entre os escombros, podia-se entrever restos de tapeçarias, porcelanas e nacos de madeira. Olhei ao redor, tentando imaginar aquela minúscula ruína, como a casa de alguém. De repente me veio à mente que se aquilo era uma casa, possivelmente haveriam corpos lá. Meu estômago revirou por completo, e eu me apoiei em Meta com mais força.

Ele notou, mas em sua imensa solidariedade, não fez comentários.


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Notas finais do capítulo

Pode Sofrer Alterações



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