5 sentidos de Lily escrita por procópias


Capítulo 1
olfato.


Notas iniciais do capítulo

oi meninas
essa é a parte 1 de 5 da mais nova fic jily by procópias
cada capítulo vai abordar mais ou menos um sentido na convivência dos dois. ou ao menos era pra ser. não sei. fui escrevendo e o negócio só foi saindo e enfim
espero que gostem
paz



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“Eu... eu não acredito que isso táconteceno... argh. De todos os dias em que a fechadura poderia estragar, tinha que ser hoje, né? O dia em que eu estou absolutamente sequelado de não sei quantas cervejas e minhas pernas sequer aguentam levantar de novo e tudo o que eu queria era ser absorvido pela minha cama, eu estou aqui, sentado do lado de fora do apartamento, prestes a chorar – talvez eu já esteja chorando, tudo está tão lamentável— e sem conseguir entrar na porra da minha própria casa porque a chave simplesmente não funciona, e eu moro sozinho então todas as vezes que eu toquei a campainha e bati na porta foram meio que em vão e é claro que meu celular está sem bateria e...”

James Potter interrompeu seu monólogo para vomitar no chão ao seu lado antes de começar a chorar. Era um hábito já adquirido, ele começar a falar sozinho quando estava bêbado e triste -e aquela noite lhe dera várias razões para ficar bêbado e triste e sentindo pena de si mesmo. Por semanas, fora um custo criar ânimo para sair de casa e se divertir – quem consegue se divertir depois de levar um pé na bunda tão sensacional?! -, e, quando concordou em ir a um show naquele pub que vendia cerveja superfaturada e inflacionada perto da faculdade, quem está lá? Obviamente a garota que deu o pé na bunda, e claro que estava com um outro cara, ah, James Potter não podia passar seu luto em paz, não, quando ele já estava a meio caminho de superar a ex, aquilo acontece, e ugh, foi realmente necessário? O cara nem era bonito! E parecia o maior playboy-mauricinho de toda Londres!

Já não sabia dizer o que era coração partido e o que era orgulho ferido, mas tudo estava insuportável quando se juntava com a dor de cabeça, o cansaço e o fato de estar preso para fora de casa. Uma grande mistura de “por que essas coisas só acontecem comigo?” com “eu não consigo fazer nada direito”, que o fez chorar mais um pouco antes de tirar os óculos do rosto, aceitar sua patética situação e dormir encostado na porta. A luz do sol já entrava pela janela do corredor.

Acordou poucos minutos depois, caindo para trás quando a porta se abriu revelando uma Lily Evans o encarando, a expressão sonolenta rapidamente se tornando uma de nojo.

“Potter? O que você tá fazendo aqui?”

James levou alguns segundos para processar a informação e perceber que não, sua fechadura não estava com defeito. Ele apenas estava bêbado demais para chegar ao seu próprio apartamento, e, sem saber, viera incomodar sua vizinha de baixo.

“Boa noite, Lily Evans.” E completou com um sorriso amarelo.

“A sua noite parece ter sido melhor do que a minha” Lily levantou uma sobrancelha.

“Ah, talvez devesse ser, né. Sair pra beber, assistir um show, essas coisas. Mas deu ruim.”

“Claramente.” Ela respondeu, apontando para a poça de vômito ao lado dele.

James Potter estudava na mesma faculdade que Lily Evans e havia se mudado para o apartamento acima do dela há mais ou menos 6 meses. Até três meses atrás, ele achava que levavam uma relação amigável entre vizinhos, mas aparentemente ela o desprezava devido à sua falta de noção no quesito “fazer barulho e incomodar a vizinha de baixo, que por meio dos barulhos se tornou ciente de toda a sua vida sexual e preferências futebolísticas e musicais”. Talvez se James houvesse prestado atenção nos avisos de condomínio passivo-agressivos que ela deixava no quadro, ele poderia ter melhorado o comportamento antes.

Foi preciso um término doloroso de namoro que por três semanas o fez não querer transar, dançar ou assistir jogos de futebol para que Lily começasse a se preocupar com seu vizinho horrível que não fazia mais nenhum barulho. Depois daquela visita e de Lily ter confirmado que não, James não estava morto com o cadáver apodrecendo no banheiro, acabaram se aproximando – assistindo Game of Thrones aos domingos, dividindo frete de compras online e o táxi na volta de uma festa ou duas, pegando o metrô juntos para a aula às quartas e quintas de manhã, fofocando sobre os outros moradores. Lily conseguia ser bem venenosa para alguém que à primeira vista parecia ser tão certinha, e James tinha medo de perguntar o que ela falava dele para as amigas na época em que o “odiava” (sim, “odiar” entre aspas, porque afinal, você não se preocupa se alguém que você odeia de verdade morreu, certo?). Era bom ter uma amiga morando tão perto, que oferecia debates tão acalorados sobre as eleições (ele tinha uma memória muito vivída de Lily desabafando puta da vida sobre seus pais conservadores) e os filmes que ele havia recomendado e os livros que ela havia indicado e ele começara a ler todos ao mesmo tempo e não conseguia terminar nenhum.

E agora, após 3 meses de aproximação, estava ali, novamente incomodando Lily Evans, esmurrando sua porta e vomitando na entrada.  Mas, dessa vez, ela não parecia tão irritada. Não, Lily exibia um misto de nojo e procupação. Usava uma blusa larga da universidade, calças de moletom e chinelos, e o cabelo estava tão bagunçado como o de quem acabou de acordar devia estar. Deu um pulinho para evitar a poça de enjôos não identificados e ficou de frente para ele, ajoelhando-se. Colocando uma mão no seu ombro, observou os olhos meio inchados do choro alcoolizado.

“Potter, eu quero te dar um tapa por ter interrompido meu sono depois de uma semana infernal no trabalho e nas aulas, mas sua... condição despertou minha pena. Vou fazer um chá, você limpa isso aqui, toma um café da manhã, lava a alma e vai pra casa, ok?”

James não conseguia pensar em uma maneira em que aquele desastre de noite poderia ter acabado tão bem, mas lá estava Lily Evans sorrindo cansada para ele, oferecendo café da manhã e, talvez, um lugar realmente confortável para se sentar. Ela lhe deu a mão para ajudá-lo a se levantar, e, quando ele se firmou de pé, Lily deu um passo para trás.

Crec.

Debaixo de seu chinelo, estavam os óculos de James. Agora talvez não poderiam ser considerados óculos, mas duas lentes arranhadas soltas e uma armação quebrada.

“Porra, Lily, mas é claro que algo assim ainda iria acontecer, né? Não tem nada dando certo hoje e eu só queria tomar essa desgraça de chá que você ofereceu, mas não, meus óculos têm que quebrar e...”

“Putaquepariu, James, desculpa, eu realmente não vi que eles estavam ali, até achei estranho você estar sem, desculpa mesmo, eu prometo pagar o...” Lily olhava para ele e para a carcaça de óculos nas suas mãos, apreensiva.

“Evans, eu não tô bravo com você, eu só tô bravo com tudo, tipo cem por cento de saco cheio dessa sexta-feira, do tipo literalmente a realidade tá cagando na minha cabeça, e agora meus óculos quebraram e eu vou ficar andando por aí com fita adesiva... ok, você tem certa culpa porque pisou neles, mas assim...” e a ruiva riu. Na cara dele. Riu e bagunçou seu cabelo já forçadamente bagunçado para parecer descolado, mas que agora só fazia parecer que ele não tomava banho há dias.

“Você está rindo da minha situação?!” E Lily riu mais ainda, colocando a armação torta e sem lentes no rosto do amigo.

“Parcialmente porque é, sim, meio engraçado, e porque se eu estivesse com a cara do desgosto que esse cheiro de vômito, bebida e cigarro excessivo que você está exalando às 7 da manhã me causam, você ficaria mais ofendido ainda, o ariano dramático que é. Vamos entrar, Potter. E não pise no vômito.”

E entraram no apartamento dela. Não era exatamente aonde ele estivera tentando entrar, mas, ao se sentar no sofá desgastado, era como se houvesse acabado de chegar em casa. As janelas arejavam a sala, e o sol que já anunciava o verão – e, graças a Deus, as férias – atravessava as cortinas.

“Ei.” Lily cutucou seu ombro. “O que eu disse sobre lavar a entrada?”

“Lily, eu lá tenho cara de quem está em condições de fazer faxina a essa hora da madrugada?”

“Vá se manter ocupado, e eu juro que o café da manhã vai recompensar.”

Ugh.”  E novamente ela riu de sua desgraça (hábito que adquirira com as amigas, que riam das suas desgraças) quando ele a acompanhou até a cozinha para buscar um rodo, um pano de chão e um balde.

Foi menos psicologicamente desgastante do que ele esperava, limpar a entrada do apartamento de Lily e depois se dirigir à cozinha. O cheiro de ovos e bacon sendo fritados preenchia o cômodo, e, finalmente, a larica bateu.

Ou talvez fosse só o cheiro maravilhoso mesmo.

Comida pronta, água fervida para o chá, e os dois se sentaram na pequena mesa da pequena cozinha para o café da manhã. Há tempos James não bebia chá – sempre achara que o gosto não fazia jus ao cheiro, mas esse foi mais que bem vindo e de fato lhe deu uma revigorada. Na verdade, havia tempos que ele não aproveitava um café da manhã tão aromático.

“Uau, Lily.”

“O quê?” A ruiva ergueu os olhos da xícara para encará-lo.

“Agora eu finalmente descobri de qual apartamento vinha esse cheiro de manhã.”

Ela deu de ombros, esperando que ele pensasse que as bochechas coradas fossem por causa do chá quente.

“Afinal, além de ter exagerado além da conta na bebida, o que fez sua noite tão lixo?”

“Ei, exagerar na bebida não necessariamente torna a noite lixo e você sabe muito bem disso!” Lily revirou os olhos e voltou a comer. “E ah, o de sempre, ver ex com outro cara sempre dá aquela pontada dolorida no coração.”

“Você já não estava superando a garota?” Lily perguntou. Se não estivesse tão sonolenta, talvez soaria um pouquinho mais exasperada.

“Estava, mas oras, a gente fica magoado quanto está de luto – ok, não de luto, mas sei lá, a gente terminou faz pouco tempo! - e a pessoa já está lá de amorzinho com outra. Independente de já estar mais de boa e não querendo morrer na cama o dia inteiro, ainda fica aquela chateação.”

“É, faz sentido. E nem é tão fácil de evitar a presença dela assim, né.”

“Quer dizer, eu poderia conferir se ela marcou presença nos eventos do Facebook, mas...”

“Te fez tão mal assim?”

“Bem, acho que não, eu só queria desviar do incômodo.” Lily riu.

“Você é melhor que isso, James. E aquele papo de tentar parecer que está melhor que a pessoa?”

“Mas é impossível! Se foi ela quem terminou comigo, como eu vou parecer que estou melhor? Vou só parecer forçado e patético.”

“Até porque fora da vida amorosa você também não está tão bem, né?” James a fuzilou com os olhos, ao que Lily respondeu mostrando a língua e dando uma piscadela. “Mas agora falando sério, James, isso faz parte. Você sabia que ia acabar acontecendo. E de qualquer maneira, você só viu os dois numa festa num bar. Não tem muitas conclusões a tirar, e não vale a pena se remoer por causa disso.”

“É. Você tem razão.” Ele respondeu, brincando com o bacon no prato. “Mas se eu parecer que estou mal ­– muito triste e coisa e tal – porém lidando bem com tudo isso, pode ser melhor ainda que parecer bem, porque eu não vou soar forçado – apenas maduro e, apesar de tudo, lidando com a situação.”

“Claro, não há nada que demonstre a mais pura maturidade do que planejar um comportamento com o propósito exclusivo de ‘parecer maduro’ porque é ‘mais digno’ que ‘parecer bem’.” Lily suspirou e bebeu mais um gole do chá. “Você não tem jeito, mesmo, Potter. Afinal, você superou a menina ou não?”

“Superei. Mais ou menos. O que você considera ‘superar’?” James ergueu os olhos da xícara para Lily.

“Ah, aquilo, sabe? Não ficar na cama querendo morrer achando que nunca mais vai amar de novo-“

“Evans, o amor sequer existe!” Lily ignorou a interrupção.

“Não sentir o coração apertar ao lembrar ou sentir o cheiro dela, não esperar que cada mensagem ou ligação-“

“Sim, porque as pessoas ainda fazem ligações telefônicas, tal qual neandertais.” James revirou os olhos. “Deixa eu adivinhar, não chorar ouvindo ‘a nossa música’ ou qualquer música de amor no geral-“

“Olha, músicas de amor no geral podem te fazer chorar em qualquer situação, ok?! E é permitido chorar ouvindo a ‘sua música’ mesmo depois de superar.”

“Pra falar a verdade, acho que a gente nem tem uma música ‘nossa’.” James respondeu, pensativo. “Ela gostava muito de Boys Don’t Cry e a gente ouvia demais quando estava junto. Mas era mais um gosto dela, então talvez ela não veja como ‘nossa música’.”

“Pense então como uma paisagem sonora de vocês. Aquele tun, tun, tun, tununu-tananananana, pan pan pan pa. Assim como o quarto dela é uma paisagem visual. De qualquer maneira, é difícil dissociar a música da pessoa.”

“E lembrar dela quando eu ouço não significa que não superei.”

“Exato. Não esquenta com isso, James. Você não precisou provar nada a ninguém até agora e não vai precisar depois.” Lily estendeu a mão para tocar a de James, apoiada na mesa. Os dedos dele relaxaram e se deixaram entrelaçar com os dela, e ele sentiu aquele calor da mão da amiga, quente pela xícara e pela cozinha e por ter acabado de acordar, quente como os cabelos acaju bagunçados. Sentiu o calor contrastando com suas mãos ainda um pouco frias, e depois subindo pelo braço até seu rosto, e talvez estivesse corando agora. Só talvez.

Tinha a sensação de que aquele momento havia sido adiado por uma quantidade inaceitável de tempo, e mesmo assim estava incompleto.

“Você... tinha alguma música, ou paisagem sonora ou sei lá o quê, com seu ex?”

A garota baixou os olhos e deu um sorriso melancólico.

“Ela era americana, então dizia que quando tivesse que voltar pra lá, era como se estivéssemos dentro de Kathy’s Song. Sabe, do Simon and Garfunkel.” James levantou as sobrancelhas. Conhecia a música. Na verdade, aquele era um dos álbuns favoritos de seu pai. Mas a bela composição de Paul Simon para uma garota chamada Kathy não fora o que lhe chamara mais atenção naquele momento.

“Então, como você nunca chegou a mencionar para mim que é...?”

“Bi?” Lily riu. “Não sei, acho que o assunto nunca veio à tona. E talvez a acústica do meu quarto não seja tão reveladora pra você quanto a do seu é pra mim.” James riu e desviou o olhar.

“Você nunca vai deixar de me encher o saco por causa disso, né?”

“Qual é, você me deu muitos motivos!”

“Não mais!”

“E eu agradeço por isso. Mas enfim,” ela suspirou, “essa era meio que a nossa música, e acabou sendo depois do término também.”

“Complicado manter relacionamentos à distância?”

“É. Um oceano de distância e pouca grana pra ficar viajando meio que tiram um pouco a visão de futuro da relação, e não ver futuro na relação meio que tirou o propósito. E quando tira o propósito...”

“O amor acaba.”

“É, meio que mingua.” Lily levantou uma sobrancelha. “Espera, você não tinha dito que ‘Evans, o amor sequer existe’?” Completou, imitando a voz de James.

“Me deixe ser amargo! Eu posso ter superado o término, mas ainda tenho o direito de bradar frases amargas.”

“Potter, se tem algo que o jovem tem direito de ser, esse algo é amargo. Expresse a amargura como um chá de boldo embebido em chocolate 95% cacau. É uma ótima maneira de lidar com as coisas.”

“Evans, após toda essa sessão de sentimentos e chá, você está me dando conselhos irônicos?”

“Sim e não. Não é exatamente um conselho, só algo que faço às vezes.”

“Ah, mas isso eu já percebi. Você está sorrindo ou me olhando feio? Sabe que não consigo enxergar direito por causa dos óculos, né?” James indagou, apontando para as duas lentes soltas sobre a mesa. “Inclusive, acho que preciso voltar. Passar uma fita adesiva nesse troço...”

“James, me desculpa. Sério.” A garota olhou apreensiva para os olhos quase nus do amigo.

“Quê isso. Já tava meio arranhado mesmo. Então eu... já vou. Subindo.” Pegou as lentes e apontou com o polegar para a saída. Lily pareceu voltar a si e se dirigiu até a porta para destrancá-la. Abrindo-a para o corredor, virou-se para James, que a envolveu em um abraço repentino. Após os dois segundos de surpresa, ela fechou os olhos e retribuiu.

“Obrigada. Pelo chá e a comida e a conversa e tudo.” Lily sorriu, mesmo que o amigo não pudesse ver.

“Não foi nada. Obrigada você pela companhia.”

“Agradeça à rodada dupla daquele bar caríssimo.”

“Acho que prefiro minha porta de entrada limpa.”

“Por favor, não pise nos meus óculos da próxima vez.”

“Você está cheirando a cigarro e bebida, odor perfeito para um jovem amargo.”

“Ah, e você está cheirando a...”

O cabelo dela cheirava a xampu e algo como canela. Mas ela também cheirava a chá e café da manhã. Não que o bacon e ovos estivessem impregnados em Lily nem nada, mas ele pensava no cheiro, aquele cheiro de aconchego depois de uma noite de desconfortos, e pensava nela.

Interromperam o abraço, e, com um último aceno, ele subiu para o apartamento 6B.


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Notas finais do capítulo

Eaí, o que acharam? James tá menos arrombado aí, né.
Ficou legal? Mais ou menos? Desnecessário? Fofinho? Nadaver? Tá ansiosa pro próximo? Achou defeitos e quer apontá-los? Teve algo em especial que você gostou? Me conta deixando uma review!

aquele abraço e até o próximo!

p.s.: a "boys don't cry" que o James cita no capítulo é a do the cure. não sei se a onomatopeia da Lily conseguiu expressar.



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