Angels cry escrita por Jess Porcino


Capítulo 1
Anjos choram?




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Anjos choram?

 

A neve, é a única coisa que consigo ver. Os pequenos flocos brancos caindo lentamente até pousarem com graça no chão esbranquiçado, boa parte das poucas árvores restantes agora se encontam cobertas por esses mesmos flocos de neve, assim como as várias pequenas elevações,de pedra talvez? Que se encontram espalhadas pelo descampado, não tive vontade de contar quantas, mas sei que são muitas. Todas elas possuem algo escrito, um nome, uma frase e uma data. Não me recordo o nome de tais elevações por mais que tente, na verdade não me lembro de muitas coisas, não sei quem sou, onde estou ou simplesmente o meu nome. Também notei algo estranho, talvez?, em mim, a neve que cai não consegue me tocar por mais que eu esteja parado aqui por um longo tempo sem me mexer. Chega a ser triste até, nada me toca, já tentei tocar em uma das elevações, mas elas simplesmente passam através da minha mão assim como os flocos de neve.

Observo novamente a neve caindo naquela imensidão branca, uma brisa sopra balançando a copa das árvores derramando um pouco da neve no chão cortando aquele silêncio sepulcral, eu queria poder sentir o frio gélido da neve na pele ou o vento bater no meu rosto e balançar meus cabelos, mas até o vento não me toca. É como se eu não existisse ali.

 

Estou aqui já faz algum tempo. Quanto? Não sei. Então porquê simplesmente não saio daqui? Não me lembro de nada antes deste lugar, é como se no fundo da minha mente uma lacuna enorme e escura se encontrasse ali que jamais pudesse ser preenchida ou recuperada, não é uma sensação boa, mas também não chega a ser ruim, só NÃO É NADA. Simplesmente nada, a não ser um vazio incômodo, mas suportável.

 

Ser ignorado por tudo está me incomodando demasiadamente.

 

Fecho os olhos apenas escutando o barulho do vento que não me toca e o balançar das folhas nas árvores e sinto que poderia estar em  paz mas… Não estou.

Vejo um esquilo sair correndo em minha direção e passar direto pelos meus pés, como se nada estivesse ali. Sinto que na verdade não estou. Aquele animal foi a primeira coisa viva e andante que encontrei naquele lugar, quando me viro para ver para onde vai algo me chama atenção, alguém para ser mais preciso.

Vejo um rapaz andar cabisbaixo pela neve, cada passo seu parecia pesar uma tonelada de acordo com o modo em que ele parecia se esforçar para concluí-los. O observo por longos minutos em seu caminhar, algo nele que me intriga, não é como se eu o conhecesse, mas por algum motivo há algo que me faz observá-lo.

 

Me aproximo devagar ele parece não notar a minha presença, eu não deveria ficar surpreso, mas por alguma razão o fato dele não me ver me trás uma sensação de angústia como se o vazio em mim aumentasse consideravelmente. Ele caminha em direção a uma das elevações que instantaneamente lembro-me de chama-se lápide. Após colocar flores a frente da lápide ele se ajoelha e com um olhar triste a acaricia. Eu fico ali na sua frente a lápide entre nós sem entender o porquê daquela reação, ele conversa com ela e é notável o seu sofrimento seja quem for o dono desta lápide era muito amado pelo outro.

 

Eu o observo ainda com aquele sentimento de Déjà vu, aqueles cabelos dourados caindo sobre os ombros em cachos perfeitos e aqueles olhos de um azul tão claro quanto o céu agora embargados pelas lágrimas os fazendo ficar mais brilhante, de alguma forma me são familiares e ao mesmo tempo estranhos. O estranho continua ali por horas creio eu, apenas lamentando, chorando, revivendo momentos que passou com o dono da lápide e eu continuo ali o observando  a sua frente sem ser notado. Não entendo porque a cada lágrima caída daqueles olhos o aperto em meu peito aumenta, quando penso que essa angústia não terá fim ele se levanta. Triste, perdido e completamente destroçado, como um anjo caído a encarar o seu desespero, as lágrimas ainda banham aquela face entristecida e aquela imagem me faz pensar se, os anjos choram? Se sim, estou presenciando tal cena.

 

Eu impulsivamente toco o topo daquela lápide e segundos depois o estranho anjo toca no mesmo lugar sua mão através da minha, mas para mim foi como se ele me tocasse como se sua mão estivesse sobre a minha, nesse momento ele me olha e eu perco o ar. Seu olhar marejado é de tal forma intenso que por um momento me perguntei se ele não estava me vendo. Esse momento durou apenas alguns segundos pois o anjo baixou seus olhos novamente para a lápide. Sim, decidi chamá-lo de anjo tal qual a sua forma se parece aos meus olhos. Ele suspira de forma pesarosa e forma um sorriso melancólico, foi aí que pela primeira vez ouço sua voz soar como um sussurro carregado pelo vento que preencheu o vazio que sentia.

 

“Sinto muito a sua falta”

 

Sinto-me impelido a respondê-lo com um “eu também sinto sua falta” mas não o faço, de qualquer forma ele não me escutará.

 

Uma leve brisa sopra balançando meus cabelos para frente dos rosto, quando os retiro encontro o anjo de olhos fechados inspirando profundamente com um mínimo sorriso nos lábios. Estaria ele sentindo alguma fragrância? Fiquei tão absorto naquela imagem que apenas notei que o vento havia me tocado quando o estranho ja se afastava. Senti-me estranho. Toquei novamente na lápide e minha mão a ultrapassou. TUDO ESTAVA NORMAL. Ao olhar para o estranho o vi se afastar com o mesmo andar pesaroso com o qual chegara, o observei de longe como um anjo caído, com suas asas destroçadas a caminhar pela neve, apenas existindo por algum motivo qualquer, até que me vi sozinho novamente naquele lugar. No silêncio novamente a curiosidade abateu-se sobre mim e dei a volta na lápide em que o anjo demonstrou profundos sentimentos. Nela estavam gravados da mesma forma que nas outras lápides uma frase, um nome e uma data, mas o que mais me chamou atenção foi o nome. Camus. Seja quem for esse tal Camus, tivera muita sorte por ter tido alguém que nutria sentimentos tão profundos para com ele. Senti-me triste de súbito ao observar aquele nome, me parecia tão conhecido, como o sabor de alguma comida da infância que esquecemos, mas a lembrança do sentimento prevalece de forma embaçada. Por algum motivo senti a necessidade de pôr em palavras aquele nome, de ouvi-lo e assim o fiz, pronunciei aquele nome desconhecido, mas com sabor agridoce de passado.

 

“Camus”

 

Sussurrei sentindo algo quente escorrer pelo meu rosto.

Porque eu estava chorando?


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