Colorado escrita por LizAAguiar


Capítulo 7
Capítulo 06




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Piper tinha que admitir, para uma vila minúscula no meio de um iceberg a festa estava sendo bem calorosa.

O centro da cidade estava apinhado de gente, o que mantinha o vento frio afastado, havia uma fogueira gigante onde um grupo de teatro, — provavelmente de alguma escola, — fazia figura com sombras em uma tela, aproveitando a luz amarelada.

Tinha todo tipo de barraquinhas de comida, a maior parte só vendia carne, mas convencer o atendente a fazer um espetinho de legumes não foi muito difícil. Nico tentava incansavelmente ganhar o primeiro prêmio na barraca de tiro ao alvo por motivos que fugiam de seu controle e de fato, depois de dias regados ao silêncio e a mais singela paz, ter todo aquele barulho e calor por perto arrancava sorrisos fáceis de seu rosto.

Isso até sua sorte acabar.

— Eu não sei o que colocaram nisso, mas está ótimo. — O filho de Hades comia uma sopa ao estilo Cup Noodles nas muitas mesas dispostas ao lado das barracas, o cheiro estava bom, mas o que tinha dentro além do macarrão era uma caixinha de surpresas, sua intuição dizia claramente que os espetinhos e refrigerante eram a melhor opção.

— Acredita que as pessoas ainda acham que a katana é a melhor espada de todas? — O sujeito que Piper sequer sabia o nome disse com indignação, o gorro preto quase tapava seus olhos e a julgar pela blusa de frio com a escrita Darth Vader é o Pai do Ano, chama-lo de nerd seria um eufemismo.

— Como alguém tem a coragem de dizer uma besteira dessas? — Reyna socou a mesa com força moderada, algumas pessoas em volta a olharam assustadas, a grega fingiu achar algo interessante para olhar no lado contrário. — Nem em tempos remotos isso era uma verdade, hoje em dia é blasfema.

— É exatamente isso que digo, elas só servem para pessoas que passaram anos aperfeiçoando a arte, como um aprendiz vai conseguir usar uma? — O garoto suspirou, como se estivesse tremendamente cansado. — Ser um mestre é tão difícil.

— Mestre? — Indagou a pretora e, por mais que a filha de Afrodite preferisse não saber, apurou os ouvidos e se concentrou para continuar com cara de paisagem.

— Conduzir as missões, não deixar ninguém se matar, administrar o jogo, você sabe. — Piper mordeu o lábio inferior, aquilo não respondia nada.

— Sim, tem razão, é bem exaustivo. — Aparentemente para Reyna era o suficiente, entretanto nunca no sentido correto. — Eu tenho que administrar um Acampamento, as vezes parece que pedir disciplina e responsabilidade dos centuriões é muito. — Olhou para Nico ao mesmo tempo em que ele o fez.

Será que deveriam interromper a conversa?

"Assim eu vou ter motivos para me livrar desse cara."

Seria o ponto alto de sua noite.

— Centuriões romanos? — Por que ele parecia tão interessando? — O máximo que fazemos é uma rodada de D&D, esse parece mais complexo, é da Wizards ou da Paizo?

"Do que pelos deuses esse cara está falando?"

Não ficaria para descobrir.

— Reyna, me empresta a chave do carro? — Todos os integrantes da mesa a fitaram, surpresos por ter aberto a boca e pelo pedido aparentemente estranho.

— O que você quer no carro? — A expressão de seu rosto era quase um você não vai dirigir, a grega conteve o máximo que pode o aumento de sua irritação.

— Esqueci meu cachecol. — Era mentira, sequer havia trazido um, porém precisava de uma desculpa e ir atrás de comida fora usada duas vezes. — Me dá a chave. — Carregou a voz de charme sem piedade alguma, ela pareceu hesitar uns alguns segundos, como se algo estivesse errado, por fim tirou o objeto do bolso e o estendeu.

— Volto já. — Disse assim que teve as chaves em mãos: também era mentira.

Andar pela multidão foi uma tarefa mais fácil do que a minutos atrás, já que boa parte finalmente havia se sentando em algum lugar para comer ou conversar, foi até o estacionamento da praça, procurando pelo antigo carro azul em meio a SUVs e caminhonetes antigas.

O vento frio a fez procurar com mais afinco pelo Mustang do século passado, a poucos metros pode vê-lo estacionado ao lado de um furgão branco, a primeira coisa que fez ao entrar foi ligar o aquecedor, sentada no banco do motorista observou os vidros esfumaçarem pelo vapor constante.

Quando saíram da casa de Hylla, Piper estava apreensiva, sem a mínima vontade de estragar seu bom humor pacífico com um garoto qualquer, rezou aos deuses para que a situação não viesse a ocorrer, desencontros eram tão frequentes.

"Mas como semideuses não tem sorte alguma."

Fora exatamente com a trupe de irmãos que toparam primeiro. Tim, o mais novo parecia alegre e a ponto de explodir por causa do açúcar, falava sem parar ao menos para encher os pulmões de ar, os mais velhos foram educados, mas era claro sua vontade de simplesmente acabar logo com aquilo.

Depois do pequeno impasse conseguiu respirar aliviada, em uma real vontade de curtir as festividades e o fez por um bom tempo, até Reyna puxar assunto com um desconhecido qualquer.

Em momento nenhum passou por sua cabeça que teriam outra companhia, o que diriam se ele perguntasse de onde vieram, o porquê da visita ou onde estavam hospedados?

"Ninguém sabe que tem uma casa nas montanhas."

Tinha perdido sua liberdade de fala para ouvir sobre Paizo.

"Seja lá o que for isso."

Passou a contornar o volante com o indicador, a quem estava querendo enganar?

"O que pelos deuses está acontecendo com você, Piper McLean?"

Talvez fosse apenas o ambiente misturado com seus sentimentos turbulentos, talvez houvesse ficado impressionada demais com a noite anterior.

Talvez...

"Ótimo, você saiu de um problema emocional para entrar em outro."

Sem dúvida era a pior negação dos filhos de Afrodite.

Suspirou, se pondo a escrever o nome no vidro embaçado.

Quanto tempo a mais teria para descobrir o que se passava antes que a pretora se curasse?

"Aquela porcaria de remédio não fez nada mesmo, ela continua não entendendo sarcasmo e dando papo para qualquer um."

Talvez levasse meses para que realmente fosse útil.

Assim que escreveu o M alguém tentou abrir a porta, ofegou de surpresa e segurou em um sulco para mantê-la fechada por puro reflexo.

— Piper! — A voz de Reyna chegou abafada aos seus ouvidos, e irritada. — O que está fazendo aí dentro?

Soltou a porta e escorregou para o banco do passageiro ao sentir o olhar nada amigável em seu rosto, a romana sentou-se onde estava a segundos atrás de fechou a porta.

— Ainda não achou o cachecol? — Continuou a olhar o painel do carro, ainda sem reação. — Se estava com frio deveria ter dito, eu daria o meu. — Deu de ombros, se perguntando porque a última frase parecia mais irritada e repreensiva.

Ser pretora realmente não tinha nada a ver com jeito mandão.

— Onde está o Nico? — Achou melhor trocar de assunto. Arriscou encara-la por alguns instantes, tirando o cachecol com atenção que o os movimentos não necessitavam.

— Falando sobre um tal de Dungeons and Dragons com aquele cara. — Encarou-a com a surpresa estampada em sua expressão.

"Nem você sabe o nome dele!"

— Como se faz? — Reyna deixou o cachecol do colo e inquiriu uma resposta.

Do que era algo que Piper não saberia dizer.

— Como se faz o que? — Ela rolou os olhos e cruzou os braços.

— Como se faz... — E se aproximou a cada palavra dita, cada vez mais baixa, a filha de Afrodite girou o corpo para lado até estar colada a porta do carro, engoliu em seco e fez o possível para não relevar quanto seu coração estava acelerado. — Para resistir a você?

Agora os batimentos já não eram um problema, sequer era capaz de ouvir a própria respiração, sua mente se tornou tão branca quanto a neve lá fora, apenas conseguiu encara-la de volta, séria, a espera de uma resposta.

— Eu não sei. Reyna, eu... — Completamente insatisfeita com a resposta a pretora continuou a encarando, sondando seu rosto atrás de algo mais, descruzou os braços, levando o indicador até seu peito.

— Eu sei como isso funciona, já vi antes. — O murmúrio era baixo, exalava seriedade e era fácil reconhecer frustração em sua voz. — Você deveria tentar me persuadir a alguma coisa, não me mandar fazer.

A confusão que a fala trouxe a ajudou a despertar do transe, de repente seus sentidos voltaram ao normal, o coração continuava a bombear com rapidez, mas agora por outro motivo.

— Está falando do charme? — Indagou, com a descrença transbordando, mas não tanto quanto a raiva. — É disso que se trata?!

— É. — Respondeu com obviedade.

Deuses...

— O que mais poderia... — Agarrou o pulso que até aquele momento ainda a apontava, sua ideia inicial era joga-lo para o lado, mas alguma coisa no caldeirão de sentimentos pelo qual passava a impediu, o fato da expressão de Reyna ter suavizado pareceu ajudar. — O que houve? — A voz voltou a ser suave, quase como na noite anterior. — Você parou de conversar, veio aqui procurar algo que não existe e... — Lentamente levou a mão da pretora até seu peito, a altura do coração, pouco se importando se seria possível que sentisse seu retumbar agitado sob os tecidos grossos de inverno: o gesto era mais do que suficiente.

Sua respiração estava pesada, parte por seus próprios sentimentos, parte pelo choque de olhares, mais uma vez não pode destacar o que via nos olhos da pretora, era ciente apenas da profundidade e no magnetismo intenso que empesteava a ambas.

A mão em seu peito subiu, centímetro a centímetro sem pressa, passou por seu pescoço com um toque morno e delicado, mas ainda sim capaz de fazê-la arrepiar. O polegar tocou levemente seu rosto, espalhando calor, fazendo-a suspirar de antecipação, quase como um sinal, pode vê-la deixando de adiar o momento, pouco a pouco aproximando-se mais, a ponto de sentir a respiração misturar-se com a sua, de fechar os olhos e...

— Ei! Está frio aqui fora! — Piper não soube exatamente como, mas em um estalar de dedos estava novamente com as costas apoiadas no banco, olhando para as próprias mãos no colo, Reyna abria a porta e levantava para que Nico pudesse sentar atrás. — O que vocês estavam fazendo?

"Eu não sei, e isso me assusta."

— Conversando sobre o charme. — Suspirou a resposta, sem coragem de sequer olhar para o espelho retrovisor. — E você, por que demorou?

— Mark tem um grupo de RPG, estava me convidando para jogar. — Piper não sabia quem era Mark ou o que era esse RPG, mas murmurou um legal assim que Reyna ligou o carro, o filho de Hades tagarelava sobre o que quer que fosse enquanto a grega se resumia em duas coisas, a primeira era conseguir fazer o coração se acalmar.

A segunda era que seja lá o que fosse que estivesse acontecendo: não era apenas com ela.

 

***

 

Deitou-se de bruços, de lado, — esquerdo e direito, — abraçou o travesseiro e, cansada da guerra contra a insônia colou as costas no colchão e fitou o teto como se pudesse derrete-lo.

"Pelo menos os vidros do carro estavam embaçados."

Era isso que repetia incansavelmente para si mesma, o que não ajudava em nada sua mente a parar de rodar informações e perguntas a cada segundo.

"O que pelos deuses você está fazendo?"

Não importava de que ângulo olhasse, nenhuma das duas falava de amor romântico na noite anterior, estavam desabafando, escutando como amigos faziam um com o outro, não tinha cabimento!

A filha de Afrodite coçou os olhos e suspirou longamente, era Reyna, a romana certinha e séria, a garota que junto a Nico tinha que vigiar para que não matasse ninguém.

A garota que não era ela mesma.

Um frio a zero graus surgia em seu estômago todas as vezes que imaginava a Reyna de verdade reagindo a toda confusão.

Mesmo que a parte do avental de oncinha fosse engraçada.

De tudo que sua mente notou como sendo um provável problema, o pior vinha de si mesma. Ali deitada em sua cama, horas depois, ela ainda queria que Nico tivesse demorado mais cinco minutos para aparecer.

E sua pior dúvida, a que tentava ocultar a todo custo, era se Reyna também partilhava da mesma opinião.

"Como você vai fazer para olhar na cara dela de agora em diante?"

Não poderia se esconder no quarto alegando sono toda vez que a encontrasse no corredor.

"Ou posso, desde que minha voz não falhe."

Um sorriso cresceu em seu rosto, se nem a Mãe Terra conseguia resistir a sua voz, como achou que poderia?

— Convencida. — Murmurou para si mesma, ao menos teria algo para se orgulhar daquela noite.

As repentinas três batidas na porta a assustaram a ponto de não se lembrar de ter sentado na cama, ligou o abajur e disse para a visita entrar.

Sua identidade era bem óbvia, já que Nico não teria assuntos para tratar depois da meia-noite.

— Imaginei que estivesse acordada. — Reyna murmurou assim que fechou a porta atrás de si, andou até sua cama e sem mais nenhuma palavra deitou-se.

— O que está fazendo? — Para a filha de Afrodite o ato teria apenas uma conotação em uma situação normal.

"Mas nada aqui é normal."

— Deitando. — Piper fixou o olhar na porta, se negando a acreditar no que tinha se metido.

— Você está tomando o remédio? — Porque o contrário já parecia uma piada.

— Com um gole de néctar todos os dias antes do café-da-manhã. — A voz dela soava monótona e banal, será que fora a única afetada? — Parei de ter enjoos por causa da comida divina.

— Que bom. — Não sabia o que dizer.

— Se o Nico não tivesse aparecido. — Engoliu em seco, sentindo a tensão se espalhar pelo corpo. — Teria deixado que beijasse você?

Algo em seu corpo parou de funcionar e, Piper cogitava ser a respiração.

— Hã...Eu...B-bem... — Ou o Cérebro. Respirou fundo para se acalmar, não podia deixar as coisas como estavam. — Sim, teria.

— Isso é estranho, não é? — Sorriu resignada, apenas balançou a cabeça para que ela soubesse sua opinião. — Nunca tinha ficado com vontade de beijar você.

Assim que ouviu a última palavra uma gargalhada alta se negou a ser contida, jogou-se na cama, deixando que a tensão a horas em seu corpo saísse pouco a pouco.

— Do que você está rindo? — Reyna não parecia incomodada com sua crise de riso, talvez curiosa com o motivo.

— De tudo, é tão sem nexo e esquisito. — Respondeu em arfadas. — Eu também nunca tinha pensado em beijar você.

E pelos deuses, era a única certeza que possuía.

— Não gosto disso. — Sua alegria repentina não contagiou a romana, ela havia retirado o anel de Belona e o rodava nas mãos, encarando-o como se ali tivesse todas as respostas que necessitava. — Acho que é culpa desse lugar.

— Da casa? — Piper já vira coisas que desafiaram sua sanidade mental, mas uma casa afrodisíaca era de mais.

— Do ambiente, ninguém nos conhece aqui, deixar se levar pela situação é muito mais fácil quando as pessoas julgando não existem. — Voltou-se para o teto novamente: a graça também havia se extinto nela. — É como aqueles filmes de férias de verão: temos uma aventura longe de casa e voltamos, seguindo a vida como era antes.

— Até faz sentido. — Exceto que estavam no inverno e... — Mesmo que para semideuses isso não funciona tão bem assim.

Sua vida estava longe de ser a mesma de antes.

— Tem razão. — Disse ela. — Mas não gosto disso. — Assim que sentiu o olhar de Reyna a encarou também. — Seja lá qual for a decisão tomada aqui, vai ser diferente da que tomaríamos em casa.

— Claro. — Teve que concordar. — Se alguém me dissesse a uma semana atrás o que aconteceria fico na dúvida se bateria nela ou só acharia bizarro.

— Se importa de resolver esse quase beijo depois? — A indagou com o olhar, com nada além de uma ideia do que a pretora queria dizer. — Não quero decidir nada com a influência desse lugar.

"Decidir o que? Se vai me beijar?"

— Quer conversar sobre o que aconteceu aqui quando você voltar ao normal? — A Romana demorou alguns segundos para responder, quase como se degustasse sua pergunta.

— Não é por causa das Lágrimas de Mandrágora, mas sim. — Ela deu de ombros como pode. — Não acho que posso decidir com responsabilidade sobre isso.

— Isso o que? — Estava começando a ficar confusa.

— Se é uma aventura de verão ou não. — O olhar sério e a voz metódica a levaram para a primeira vez que topou com a pretora. — Porque se for: eu costumo enterrar bem fundo o que deixei para trás. — Sem palavras, procurou em seu rosto qualquer traço mais suave de brincadeira ou até mesmo banalidade.

"Por que isso parece tanto uma ameaça?!"

— Ok. — Murmurou, mas por reflexo do que em um ato de concordância voluntária. — Tudo bem.

— Ótimo. — Reyna parecia realmente satisfeita: exatamente como quando resolveram quem transportariam a Athena Parthenos. — Boa-noite. — Virou-se, deitando-se de lado e se cobriu.

Piper suspirou, apagou o abajur e deitou-se do lado oposto, sua previsão na noite anterior não se concretizou, havia demorado, mas conseguira dormir, nesta já não tinha tanta certeza.

"Deuses, que eu esteja errada outra vez."

 

***

 

Não estava de fato errada, mas também não tinha acertado totalmente.

A verdade é que as horas de sono de Piper foram iguais a um queijo suíço: cheio de buracos.

Poderia culpar a movimentação de Reyna por seu constante acordar e dormir, — nunca vira alguém se mexer tanto dormindo, — mas isso seria injustiça, já que a única vez em que tiveram contato físico fora ao amanhecer, enquanto contava seu carneirinho de número cem.

Ainda de costas para pretora, assustou-se ao sentir o tecido do pijama ser puxado para baixo, segundos depois a cabeça dela estava encostada pouco abaixo da nuca e por ali ficou. Ao fim dos incontáveis segundos de surpresa o nervosismo passou a acelerar seu coração.

Não era só porque Reyna a ameaçara que deixaria de sentir afetada pelos acontecimentos da noite anterior.

Em sua cabeça passavam perguntas sobre como astronautas dormiam no espaço ou quem teria inventado as luvas de copos, quando o braço de Reyna escorregou por sua cintura, a abraçando sem cerimônia alguma.

— Reyna? — Murmurou, ainda com a descrença na voz. Não houve resposta além da respiração suave e compassada de quem dormia pesado.

E muito bem.

"Maldita."

Seu primeiro reflexo na situação em que se encontrava era quase não se mexer, como se isso pudesse ajuda-la em algo, com o coração mais calmo tentou ignorar o contato, — e que os deuses fossem justos, não era nada fácil, — até que minutos depois ela se afastou, girando para o outro lado.

E as dúvidas sobre o estado de consciência da romana apenas aumentavam.

Sentou-se na cama e espiou seu rosto, quase completamente coberto pelo cabelo solto e bagunçado.

— Reyna. — Chamou, quase cantando. — Você está acordada?

Ela virou outra vez em sua direção e afundou o rosto no travesseiro, o que lhe arrancou um sorriso divertido.

"Se é fingimento você merece um Oscar."

Delicadamente retirou os fios negros de seu rosto, a expressão serena e vulnerável que encontrou fez seu coração falhar uma batida.

Sabia que Reyna era bonita, — o que não exigia muito de ninguém, — era imponente, forte e confiante até em sua aparência, porém a beleza exposta naquele instante era singular, tranquila e despreocupada, algo de raridade extrema, quantas pessoas poderiam ter oportunidade de ver a pretora, de ver Reyna, com uma expressão tão suave em seu rosto?

Sem que pudesse se conter, acariciou a face da romana com o dorso da mão, não queria acordá-la, porém a pele quente e suave parecia lhe chamar.

Continuando com a exploração, seus dedos escorreram pelos cachos, escuros até onde a genética lhe permitia. Apenas com um toque Piper conseguia notar o zelo com que eram tratados, os fios eram fortes e macios, brilhavam com uma intensidade que a deixava espantada.

O suspiro longo tratou de personificar o reboliço em seu interior, mesmo com a ameaça nada encorajadora de Reyna, não conseguia se convencer de estagnar, de não se deixar levar por momentos como aqueles, de aproveitar as sensações sem nega-las, porque...

Os olhos da pretora abriram vagarosamente, perdidos e completamente confusos de sonho.

— Oi. — Sussurrou de forma suave, afagando sua testa. Sorriu, esperando que um olhar mais focado e a consciência de onde se encontrava.

O que não foi uma de suas melhores ideias, não que Piper pudesse prever o que viria a seguir.

No segundo em que ela a encarou a filha de Afrodite sentiu um ardor no braço, que de repente já se encontrava longe da romana, que deu um pulo para o lado e caiu da cama em um baque surdo, levando o bolo de cobertores consigo.

— Cacete, Reyna! — Exclamou no segundo seguinte segurando o braço que fora estapeado. — O que deu em você?!

Mais um segundo se passou e Piper viu com um frio congelante na espinha uma luz dourada muito letal cortar os panos que cobriam a pretora, foi a vez da grega cair da cama, gritando de susto.

Mais um segundo e o estrondo da porta sendo arrombada chamou a atenção de ambas para um filho de Hades ofegante e afobado.

— O que aconteceu?! — Ele gritou, olhando de uma para outra por três vezes, por fim parando da gladio empunhada. — Reyna, o que você...

— N-Nico... — A espada foi para o chão, ela estava sem ar como todos no quarto, porém ouvi-la gaguejar não deixou de ser impressionante, o olhar assustado: simplesmente surreal. — Onde eu estou?


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