Laranja escrita por Megara


Capítulo 1
Cobredourado




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laranja

por megara

...

Laranja abóbora, laranja-laranja ou laranja cenoura?

Bem... talvez seja laranja tangerina, pensou Angelina, mas a mera ideia da cor e de seu nome fê-la torcer o nariz em desgosto.

Nah! Os dois detestam tangerina.

Queria por que queria começar falando de cores de cabelo, mas sabia que ele reviraria os olhos para aquelas explicações de tinta e paletas e tonalidades... Arg!

Ela só queria fazer uma simples carta; algo direto, curto e que pudesse demonstrar o arrependimento que sentia de suas ações, mas seus dedos doíam e sua mão estava manchada de tinta preta.

Ela respirou fundo, sentindo o desespero ameaçar invadi-la novamente. Ela não podia se permitir perder a cabeça, por mais que uma leve relanceada de olhar ao seu redor demonstrasse quão desconfortável e deslocada ela se sentia ali.

Angelina Marie Jonhson não fora feita para aquele tipo de coisa, que envolvia discorrer sobre sentimentos, emoções e soltar palavras em folhas de papel em branco, nesse espaço de trabalho, ela não se atrevia a se meter.

Com seu corpo esguio, mente rápida e sorriso matreiro, ela sempre fora moldada psicológica e fisicamente para algo que envolvesse o movimento. Ela dançava divinamente, tinha o equilíbrio de uma bailarina e, Deus perdoasse que discordasse desse fato, ela tinha o melhor arremesso que a equipe de Quadribol da Grifinória podia contar naquele ano.

Independente de sua maestria no jogo bruxo aéreo ou sua habilidade em mexer os quadris de uma forma hipnotizante, ela se encontrava ali: um espaço bem iluminado e vazio da biblioteca, tendo companhia da eterna Madame Pince, com suas enormes sobrancelhas e olhar de águia.

Angelina quis chorar de frustração. De novo.

Ela estava presa a horas naquele lugar, esperando a inspiração bater à porta e dizê-la o que escrever naquele maldito papel.

O que, é claro, não estava acontecendo.

Tentando novamente seguir o conselho de uma de suas amigas corvinas inteligentes, Angelina começou a pensar no que a trouxera para aquela situação.

Por que eu estou aqui agora? Sentada nessa maldita cadeira procurando essas palavras que têm de ser boas o bastante, mas não são? Ela estava tentando, sabia que sim, mas não funcionava.

Pensar no início de tudo era o melhor conselho que sua amiga tinha, em suas próprias palavras, mas Angelina achava aquela uma sugestão verdadeiramente de merda.

Pela sétima vez, ela começou aquele caminho horrível de novo.

Lembrar-se de como era com seus onze anos de idade havia se tornado, ao mesmo tempo, nostálgico e doloroso. Ela podia se ver como a garota geniosa e quase inocente que havia rasgado todas as roupas de um corvino estúpido que cortara o cabelo de sua amiga; essa era a nostalgia, mas a parte dolorosa era saber que aquela inocência havia, pouco a pouco, sido substituída pela ganância e o orgulho.

Talvez devesse fazer logo sua caminhada da vergonha mental, ela queria logo terminar com aquilo.

Em seu primeiro e segundo ano como estudante grifinória, Angelina não conseguia diferenciar Friedrich e George Weasley, porém não se sentia nem um pouco incomodada por esse fato. Eles eram estúpidos e gozadores demais para seu gosto crítico e ela não queria estar perto deles de nenhuma forma.

No terceiro ano, as coisas começaram a se complicar um pouco. Ela tinha sido, finalmente, escalada para o time da Grifinória e tudo o que ela mais amava fazer era jogar. Ela ansiava por jogar, na verdade. Era seu escape, seu refúgio e tudo que nenhuma amiga podia suprir, mesmo com as risadas e a diversão.

Entretanto, no time da Grifinória era onde habitavam os dois demônios Weasley, aquelas duas pestes que faziam Angelina se encolher de raiva. Mesmo com todas as desavenças, os olhares e as brincadeirinhas idiotas, ela sabia que teria que aguentar para se dar bem no time.

Então ela fez o mais óbvio, em sua opinião. Tornou-se uma colega para os dois arteiros. Proibia-se de ranger os dentes e apertar os dedos com as piadas e até sorria um pouco com as mesmas. Ah, ela tinha sim que reconhecer: algumas das piadas dos dois eram, sim, engraçadas.

Por isso, não foi uma surpresa quando ela se viu baixando a guarda com os gêmeos. Eles eram interessantes ao seu modo, com todo aquele cabelo laranja e as sardinhas no rosto.

Hum... foi aqui mesmo que comecei a reparar nas malditas sardas. Angelina riu com amargura, mas continuou sua linha do tempo mental.

Logo, o fato de não conseguir diferenciar os dois se tornou algo mais que um problema.

Eles já estavam no quinto ano quando começaram a ser sérios ao dizer: “Você realmente não sabe qual de nós é o George, Johnson” e “Eu sou o Fred, querida. Não me chame de George”. Ela somente ria, mas se recriminava mentalmente.

Ela não podia mais se esconder nos socos e nas corridas até o campo de quadribol ao reparar nos olhares intensos e nos braços que roçavam quase inocentes uns nos outros. Ela sabia que não podia dizer quem era Friedrich ou George, assim como sabia que não conseguia separar seus sentimentos confusos para com os mesmos. Eles eram tão inseparáveis em sua mente que não podia se lembrar de como não se irritar com um e não com outro.

Enfurecer-se com um e não com outro.

Sorrir para um e não para outro.

Amar um e não a outro...

Angelina podia negar, negar e negar, e dizer que não conseguia dividir seus sentimentos por que todos eles eram iguais para ambos os irmãos. Podia se enganar e dizer que era tudo desilusão, que não havia acontecido aquele toque ou aquela leve respiração próxima demais. Mas, na realidade, ela sabia, bem no fundo de seu íntimo, que a mentira escorria por aqueles pensamentos.

E, também, chegou um momento em que quando aquela grifinória olhava para seus melhores amigos, por que, sim, eles haviam se tornado seus amigos mais próximos, ela não mais mentia sobre dispensar os mesmos sentimentos para ambos. Eles, finalmente, seguiam separados em sua mente, mas ela ainda não estava perto de saber quem era Friedrich ou George.

Havia, sim, um sorriso que conseguia com sucesso aquecer seu peito, um par de olhos que ela jurava que brilhavam mais e a analisavam com mais afinco e um laranja... uma certa cor laranja que lhe tirava o juízo e lhe bagunçava os pensamento ainda mais.

Seria um laranja avermelhado, aquele?

Contudo, apenas no fim das primeiras avaliações do quinto ano, que ela secretamente soubera que sua cor preferida havia se tornado laranja. Aquele laranja esquisito, meio cenoura, que, de certa forma, se tornava fogo incandescente no sol. Aquele fogo a estava queimando, quase sem medida, e ela podia sentir a queimadura machucar.

Não obstante, Angelina se sentia tão envergonhada de si mesma, que suas bochechas, escuras devido ao tom de sua pele, conseguiam queimar e avermelhar na mais tenra lembrança daquele pequeno detalhe sobre si mesma; aquele detalhe terrível que lhe tirava a paz sempre que se pegava olhando para os gêmeos.

Angelina Johnson simplesmente não sabia quem era Friedrich ou George. Ela, simplesmente, não sabia...

Ela estava cansada da confusão e da indecisão, cansada de querer aquele laranja com tanto afinco, mas ser medrosa demais para tomar uma atitude. Angelina decidira soterrar seus medos e deixar sua inibição ser queimada pelas mechas alaranjadas, juntamente com a razão e todo o pudor. Então ela fizera o impensável.

Angelina Johnson tirou o menor palitinho para decidir sua sorte e se entregou.

Katie tinha uma garrafa de fire whiskey no quarto que roubara de um setimanista e aquela grifinória não sabia muito o que dizer da vida amorosa e das relações de Angie, seu conselho foi bem mais prático que o da outra amiga.

Enche a cara e taca o foda-se, Angelina.

Ela havia se embebedado naquela noite, longe dos olhares de sua superprotetora amiga corvina e de seus conselhos ambíguos que a faziam ainda mais melindrosa com aquele assunto.

Naquela noite, ela havia dito sim.

George Weasley havia lhe convidado para o baile de inverno, e ela dissera sim, mal podia acreditar.

Logo, o baile de inverno, sua primeira dança e sua virgindade não mais lhe pertenciam. Aquelas eram todas as memórias manchadas pela cor que ela percebeu, em um insight, ser laranja acobreado.

Suspirando, novamente, Angelina pensou nas cores.

Foi assim que ela descobriu como diferenciar os gêmeos Weasley. Não foi uma pinta, uma manchinha ou mesmo o físico que lhe deu a dica, e sim os tons de cabelo.

O que um simples desejo de foder com a saúde de seu cabelo não podia fazer? Quando tivera aquele desejo insano de tingir suas madeixas negras, graças a Merlin desisti de fazer essa merda, ela tinha aprendido, em dois dias, as mais diferentes tonalidades de cores de cabelo que existiam, seus tons, subtons, reflexos e afins. Ela podia dizer, com certeza, que seu cabelo era o chamado preto natural, que era quase igual a um simples preto-preto, mas não era bem um preto-preto.

Enfim, mesmo que sim, todos os Weasley fossem ruivos, ruivos e ruivos; mesmo assim, as cores não eram idênticas. A mãe dos garotos, Molly, tinha os cabelos mais escuros de todos eles, não chegava perto de acaju, mas também não roçava no loiro acobreado que coloria os cabelos ralos do Weasley-pai. Angelina acreditava que os filhos foram resultado daquela mistura, cada um com uma tonalidade pequenininha que os diferenciava. Por exemplo, Ginny tinha os cabelos mais claros de todos, enquanto Percy os tinha mais escuros.

Fred e George eram, por um número, diferentes. Em um três, Fred tinha suas madeixas laranjas douradas e, por um quatro, George tinha suas próprias em um laranja acobreado.

Era um tom tão pequeno, mas que para Angelina fazia toda a diferença.

Mas, aquela cabeça debaixo de cachos bem-formados logo percebeu um fato inegável. O toque que a arrepiava não era o certo, os olhos escuros que a perscrutavam não eram incessantes e o calor que a queimava era quente demais. O homem que escolhera não era o certo.

Ela descobrira, do jeito difícil, que o laranja dourado a arrepiava com somente um relancear de sorriso, enquanto o laranja acobreado precisava tocá-la para arrancar seus suspiros. Quase todos os suspiros eram de arrependimento, também, por que quando era tocada, a palavra com “F” era a vinha aos seus lábios.

E não era “Foda” que a fazia quase sangrar os lábios para não dizer nada.

Em sua escolha impensada e imatura, Angelina jogara na sorte e perdera. Agora, aquela grifinória sempre saberia quem era o certo, e no dia em que descobrira quem realmente amava, ele já pertencia a outra.

Naquele mesmo baile de inverno em que ela se manchara toda de acobreado, o dourado havia conhecido sua amiga corvina que ela havia se esforçado para convencer que, na verdade, seu príncipe encantado era George, e não havia possibilidade de ser Fred.

Ela havia aberto o caminho, mas não conseguia deixar de sentir raiva, não de Elizabeth, que sempre esteve por ela e para ela, mas sim de si mesma. Angelina sempre agia com aquela falta de noção que lhe trazia péssimos frutos.

Ela somente podia assistir, agora que Friedrich Weasley amava, sonhava e beijava outra garota, uma garota tão maravilhosa que Angie se sentia orgulhosa em dizer que era uma de suas amigas. E Angelina Johnson se encontrava fadada ao reflexo do fogo, tal qual queria queimar mas não podia. Ele não era seu, e nem nunca seria.

No fim, aquela sétima vez que relembrava sua pequena história romântica não servira para nada além de atestar que ela, na verdade, não podia ser considerada, realmente, uma pessoa corajosa.

Angelina não conseguia ver um futuro para si em que não houvessem cabelos alaranjados colorindo o travesseiro ao seu lado, mesmo que não fossem os cabelos alaranjados com o tom que ela realmente queria.

Ela era simplesmente egoísta demais para deixá-lo ir e covarde demais para terminar aquela carta de declaração.

Tão covarde que havia dito a Lizzie que estava escrevendo uma retrospectiva de seu relacionamento com George Weasley para dá-lo como presente de namoro. Uma visão sua de como fora sua trajetória ao encontrar o amor.

Angelina descobriu rápido que pensar no início de tudo não lhe traria a história de como havia encontrado e ganhado o amor, mas sim de como havia perdido aquele sentimento tão puro por uma... bobeira de adolescente.

Ela se achava muito covarde por não conseguir expor sua vergonha, mas sabia que também era corajosa o suficiente para aguentar calada o relacionamento de Fred e Lizzie e sorrir ao ver a felicidade do casal.

Era ironia do destino, tinha de ser. Como aqueles dois podiam ser tão fodidamente apaixonados? Fosse como fosse, aquela não era mais uma alça da qual Angelina podia segurar.

No fim, George Weasley merecia muito mais que Angelina Johnson, mas ela se descobrira viciada demais para deixar aquela pequena obsessão laranja se apagar.

Tampando o pote de tinta e guardando suas coisas em sua bolsa, ela deixou o papel em branco para trás e saiu da biblioteca.


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Notas finais do capítulo

Oi, pessoal! Como vocês estão?
Eu amei escrever essa oneshot, sério. Ela ficou entalada em mim por quase cinco meses, mas enfim consegui escrever tudinho do jeito que eu queria.
Algumas notas da história:
1. Eu sei que nos livros é o Fred que convida a Angelina pra ir no baile, mas nesse meu universo aqui da one, eu escolhi o George para levá-la, okay? ;)
2. Parece MESMO improvável que alguém tire outra pessoa na sorte ou que não consiga diferenciar os gêmeos por tanto tempo, mas era pra ser bem assim mesmo. [risos]
3. A Angie não é uma pessoa necessariamente ruim, ela é até humana demais. Prometo.
Eu juro que queria escrever uma drabble, mas ela parecia tão incompleta com só 500 palavras que eu simplesmente não consegui deixar no ar (bem... não podemos dizer que eu não postei; ela ficou no ar por uns dois dias).
De qualquer forma, obrigada por ler e espero mesmo que você tenha gostado.
Kisses,
Megara.
tt @ahmegaera



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