A antiga rainha de Mewni estava de joelhos perante o corpo de seu amante. As lágrimas insistentes se perdiam em meio a todo sangue que os rodeava. Suas mãos tremiam, com medo de tocá-lo, enquanto a dificuldade para respirar fazia seus pulmões arderem em brasa, desejando com todas as suas forças que fosse ela ali no lugar dele, mas o monstro, por outro lado, mesmo à beira da morte lhe sorria. Sorria aliviado por saber que ela estava bem, sorria ao passar apenas um de seus dedos pelo rosto tão pequeno daquela a quem deu seu amor e, agora, sua vida.

Não demorou muito até que ele perdesse a consciência e sua mão caísse sobre o próprio dorso. Ela estagnou, como se tentasse assimilar tudo. As lembranças da vida feliz que teve ao lado dele se convertiam numa angústia pungente que fazia seu coração parecer que ia parar a qualquer momento. Por que isso estava acontecendo? Seria essa sua sina cruel por ter amado um monstro? Era como se seu pior pesadelo tomasse forma. Já não bastava os monstros sofrerem, há séculos, injustiças pelas mãos de Mewni, agora mais um precisava morrer por uma rainha? Uma rainha caída, ainda por cima.

Segurou a gigantesca mão dele com toda a força que possuía e a abraçou. Lembrou-se de como ele conseguia facilmente carregá-la com apenas um de seus braços fortes e pensou no quão fatídico era o fato de que ele não o faria mais. Nem toda uma vida como rainha conseguiria transcender a felicidade que sentiu nesses poucos anos ao lado de um monstro. Em momento algum se arrependeu de largar seu antigo marido, ou seu reino, ou mesmo sua coroa. Em momento algum olhou para trás, mas agora...

Agora questionava suas escolhas. Questionava até onde ela havia sido errada e até onde era a vítima. Procurava em sua mente um modo onde ela pudesse ser feliz e o final não fosse trágico daquela forma. Talvez se tivesse se escondido melhor, ou aumentado a defesa do castelo, ou mesmo... Se tivesse matado o Alto Conselho de Magia antes de fugir.

Depositou gentilmente a mão de seu amante sobre o dorso dele novamente, agarrou sua varinha com firmeza e se levantou. As lágrimas haviam cessado, as mãos já não tremiam e por mais que o peito doesse numa profunda agonia, aquele não era o momento para ficar de luto. Havia tomado sua decisão. Não repetiria seu erro.

Não iria mais tentar ser mediadora entre mewmanos e monstros, não estaria na intersecção de dois mundos opostos. Passou tanto tempo se esforçando para fugir de um combate, ansiando viver uma vida de paz, onde pudesse ver rosas de sua sacada novamente, mas agora a batalha chegou até ela e sua covardia levou o amor de sua vida. Chamavam-na “A amante de monstros” e agora agiria como tal.

           - Desculpe Glossy. – Encarou Glossaryck uma última vez antes de se voltar a Hekapoo, aquela que Eclipsa já considerou uma amiga, mas que não hesitou na hora de atacá-la, nem se importou quando um monstro pulou na frente de seu golpe. Para ela era só mais um monstro. Ou melhor, menos um para dar trabalho.

        – Eu chamo a escuridão até mim....— Baixou seu escudo mágico logo que começou a proferir seu feitiço. Estava decidida a não permitir mais que o amor entre mewmanos e monstros fosse censurado. Naquele dia, essa proibição morreria, junto com o Alto Conselho de Magia. – ... Das profundezas da Terra e do mar....

         – ... De males antigos desconhecidos....— Conseguia repelir ou desviar dos ataques deles sem quaisquer dificuldades, talvez aquele fosse o poder real da magia negra ou talvez fosse só seu corpo reagindo ao seu coração partido, porém, em seu coração, desejava que tudo fosse diferente. A aura esverdeada de magia ao redor da varinha já não a assustava mais, pois havia entendido que aquela medida era necessário no momento. – ... Quebre aquele que não pode ser quebrado....—

         – Para a noite mais negra, prometo minha alma....— Nunca mais outro monstro morreria por alguma injustiça. Estava disposta a passar o resto de sua vida lutando por isso, garantindo a eles os direitos que mereciam. Garantindo, pelo menos, ao fruto de seu amor um mundo mais justo para viver do que aquela realidade. — ... E esmague meu coração para queimar carvão....

         – Para convocar o poder da morte.... — Estava convencida de que isso era necessário, de que aniquilar o Alto Conselho seria a única forma de proteger os monstros, e isso incluía também, protegê-la. Daria sua vida naquele segundo, se preciso fosse, para ter a certeza de que ela viveria bem. – Para ver meu inimigo...— Estagnou. Não havia percebido quando Lekmet saiu, mas agora o via bem, entre os membros do Alto Conselho de Magia carregando o fruto de seu amor, sua filha. Sua Meteora.

         - O que você fez, Eclipsa? – Hekapoo pegou a pequena “criatura” em seus braços e encarou a antiga rainha com indignação.

         - Não a machuque, por favor. – Se fosse preciso, naquele momento ela rastejaria e beijaria os pés de todos apenas para ter sua filha em seus braços.

         - Então largue a varinha. – Após as palavras de Hekapoo, ela fechou o semblante e jogou sua varinha para Lekmet.

Seu coração batia como um tambor, enquanto seus braços doíam por conta do feitiço. Tudo que sentia era vergonha e medo. Vergonha por não ter defendido os monstros antes, por não ter conseguido salvar o amor de sua vida, por não ter impedido que pegassem sua filha. E o medo vinha exclusivamente de perder sua Meteora.

Aparentava meramente um ódio intrínseco, entretanto, seu interior clamava apenas pela segurança de sua filha e um enterro digno para seu marido e foi assim que, com os olhos focados apenas em sua Meteora, sequer viu quando Rhombulus a prendeu em seu cristal. Tudo que pôde ver antes foi uma luz branca em sua direção e apenas teve tempo de desejar, com todas as suas forças, obter sua liberdade e reencontrar sua filha.