Lady Penélope escrita por Srta Daydream


Capítulo 1
Um visitante inesperado


Notas iniciais do capítulo

Olá querido leitor!
Como vocês estão aproveitando o finalzinho do carnaval? Então, passei todos os dias escrevendo essa short fic (que inicialmente seria uma one, mas ficou grande demais).
Ela não está revisada, então pode ter alguns errinhos, por isso comentários construtivos serão sempre bem vindos.
Ah, pretendo revisar todos os capítulo em breve, não se preocupem.



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Havia uma lenda que fascinava Penélope e a aquecia nas noites mais solitárias. Certa vez, quando conseguira subornar sua tutora a levá-la a biblioteca, encontrara o volume único de Fissuras e o lera em uma só madrugada. Depois dessa vez a jovem perdeu a conta de quantas noites passou em claro, testemunhando o amor de Margarida e seu bom senhor, Sir John.

Uma passagem lhe chamara atenção, estava bem no meio do livro, em um diálogo entre Margarida e sua vó, onde a senhora contava uma lenda antiga, de fissuras abertas na Terra por corações partidos tão fortes capazes de criar vales inteiros. A garota duvidara de sua avó, claro, insistindo no romance impossível.

Sir John sorria para Margarida nos bailes e a convidava para mais de uma dança. “A convidaria para todas”, disse certa vez, fascinando tanto a protagonista como a própria Penélope. No entanto, na parte final do livro, meses após se casarem, Sir John fora consumido por uma febre terrível, abandonando Margarida nessa vida injusta e cruel. De coração partido, as lágrimas derramadas sobre o leito do amor perdido foram suficientes para criar um vale inteiro que a jovem viúva fazia questão de visitar para recordar seu amado.

Penélope considerava a lenda fascinante e quando olhava pela janela do quarto e observava os vales que circundavam a propriedade do pai, no interior da Inglaterra, se punha a imaginar como eles foram formados. Teria sido um romance arrebatador como o de Margarida e Sir John e que teve um final trágico? Ou uma desilusão profunda?

Parecia tolice acreditar em tal lenda, mas as noites em claro e a constante solidão alimentavam sua imaginação fértil.

Aquilo podia ser somente ficção, porém Penélope preferia sonhar acordada em viver um romance tão arrebatador que deixaria sua marca no mundo.

A moça suspirou em um misto de esperança e decepção. Nos romances que lia tudo parecia tão fácil. A jovem era sempre tão bela e encantadora que ficava fácil o herói se apaixonar perdidamente. Porém, Penélope não tinha nenhum atrativo. Pelo contrário, existiam inúmeros contras que impediam qualquer cavalheiro de se aproximar. Primeiro, ela nunca saia de casa. Vivia trancafiada em uma das casas de campo do pai (aquela que ninguém frequentava) e nunca recebia visitas. Fazia três anos que não via a mãe? Ou seriam quatro? Poderia muito bem ser mais que isso.

Desde que perdera os movimentos das pernas o convívio com a família ficara complicado. Tinha doze anos quando caíra a cavalo. Havia chovido na noite anterior, mas Penélope insistira em cavalgar. A vegetação ainda estava molhada e o cavalo prendera a pata em uma poça, arremessando a garota no chão na tentativa de se soltar.

Penélope ainda sentia as pernas quando acordou na manhã seguinte, com o irmão mais velho ao seu lado, no entanto, nos anos seguintes seu controle sobre elas diminuía gradativamente. E agora, aos dezessete, não conseguia sentir nada da cintura para baixo.

Seu pai contratara inúmeros médicos renomados e o diagnóstico era o mesmo: não tinha cura, não tinha explicação. Talvez fosse efeito da queda, assim como poderia ser alguma doença que se manifestou na adolescência.

No entanto, na opinião do pai, tudo estava na cabeça de Penélope. Era falta de vontade dela e para evitar o contato com a filha aleijada ele a isolara em uma casa abastada. A mãe passava a maior parte do tempo em Londres com as amigas e com o passar dos anos parara até mesmo de lhe enviar cartas.

Seu único conforto era o irmão mais velho, Philip, que a visitava sempre que podia e a levava para passeios proibidos próximos ao lago.

Penélope não era infeliz, refletiu. Era solitária e ainda não tinha nenhuma perspectiva boa o bastante, sonhava com um futuro mágico e um romance de tirar o fôlego. Toda jovem da sua idade sonhava com essas coisas, não era?

— Senhorita, que bom que já está acordada — Sua camareira adentrou no quarto com um rompante, abrindo as janelas.

— Não consegui dormir — Justificou, dando de ombros. Sempre que seu aniversário se aproximava passava noites em claro imaginando o que viria. Esse, porém, era o mais significativo. Faria dezoito anos e se não fosse sua deficiência estaria com a mãe em Londres, fazendo compras para a temporada. Penélope iria debutar. Bem, iria. Agora só lhe restava aquela casa vazia e sem vida, a mesma janela e dias tediosos.

Suspirou, pelo menos poderia ir até a biblioteca.

— Prefiro que meu chá seja servido no quarto.

— Ah, mas a senhoria não pode.

Penélope arqueou uma sobrancelha e a encarou. Ora, é claro que podia.

— Quero dizer — A empregada tratou de se corrigir parecendo um tanto constrangida — Há uma visita importante e… — Procurou nos bolsos o cartão e, não encontrando, cruzou-as na frente do corpo — A senhorita precisa descer.

Uma visita importante? Há quantos anos não recebiam uma visita assim? Bem, desde tia Canfra, Penélope supunha. A tia era mesmo uma figura.

— Alguém da família? — Perguntou, um tanto desconfiada.

— Ninguém que eu conheça, milady.

— Certo, certo. Ajude-me com as roupas.

Cerca de uma hora depois Penélope estava devidamente acomodada em sua cadeira de rodas, usando um vestido amarelo desbotado e com os cabelos presos em um coque recatado.

Joshua, o filho do jardineiro, viera correndo ajudá-la a descer. Ele sorrira uma pouco constrangido, depois a pegara no colo enquanto a camareira descia com a cadeira de rodas.

— Obrigada — Penélope sussurrou, sentindo suas bochechas ruborizarem. Detestava precisar da ajuda de Joshua, mas era necessário quando o pai dele não estava disponível.

O jardineiro era um homem mais velho que exalava uma energia contagiante. Sempre sorria para a jovem e comentava algo espirituoso enquanto a carregava. Mas seu filho parecia envergonhado e sem jeito e Penélope o imaginava correndo de medo para longe da residência.

— Ele está na sala cor de rosa — A camareira comentou enquanto a conduzia pelos corredores.

— Por que na cor de rosa? O que há de errado com a azul?

A moça inclinou a cabeça para baixo, fitando Penélope por um momento como se pensasse em contar a verdade ou não.

— O conde não enviou o dinheiro para a lenha — respondeu por fim, optando pela verdade. Mais cedo ou mais tarde a jovem descobriria.

— Está bem, gosto da sala cor de rosa.

Agora o plano brilhante do pai era matá-la congelada? Que espirituoso.

A sala cor de rosa era, como o próprio nome dizia, cor de rosa. Ele era feminino demais para receber um homem, porque era isso que o visitante era: um homem e muito provavelmente um membro da aristocracia. As cortinas eram claras e permitiam que a luz penetrasse o cômodo mesmo sem estarem abertas. Havia também móveis pequenos para o porte masculino, mas era o que Penélope podia oferecer no momento. Era isso ou morrer congelada na sala azul. Ela preferia infinitamente permanecer aquecida.

— Senhorita Pemberly — O sujeito se precipitou, saindo do lado da janela para cumprimentá-la. Parou a pouco mais de um metro e aguardou esperançoso.

Penélope permaneceu parada, os olhos azuis vidrados no rosto salpicado de sardas do rapaz. Notou a boca avermelhada e desenhada, o queixo quadrado e o nariz um pouco grande demais. O rapaz a sua frente era simplesmente perfeito e totalmente desconhecido.

Ela pigarreou, desviando o rosto enquanto procurava não corar.

— Senhor…?

— Madson, Jeremy Madson.

— Ah, olá senhor Madson! Serena, pode nos deixar a sós.

A camareira continuou parada, fitando a patroa como se aquela não fosse uma boa ideia.

— A minha virtude ficará intacta — Sussurrou, fazendo a mulher abafar um gritinho antes de sair — Fique a vontade, senhor. Aceita chá?

Jeremy concordou, observando-a se movimentar pela sala. Penélope forçava as rodas da cadeira a se moverem, parando perto o bastante da mesa de chá.

— Senhor Madson… Senhor Madson?

Jeremy balançou a cabeça, forçando-se a prestar atenção na conversa.

— O que disse?

— Gosta do seu chá com leite?

— Não, prefiro puro, por favor.

Penélope lhe esticou a xícara e tornou a preparar outra, dessa vez com leite e três torrões de açúcar.

— Não é difícil se locomover?

Jeremy se arrependeu das palavras antes mesmo de tê-las pronunciado. Mas foi inevitável, o pensamento escapou-lhe de forma repentina.

E, ao contrário da reação que esperava, a jovem cruzou as mãos sobre o colo e levantou os olhos claros com um brilho profundo e hipnotizante que enlaçou o visitante. Ela era… Perfeita. Nenhuma palavra descreveria melhor a mulher a sua frente. A senhorita Pemberly tinha o ar frágil, mas seus olhos irradiavam força e algo mais. Um calor intenso, uma paixão pela vida.

Jeremy nunca esqueceria aquele olhar. Nunca.

— Não são ruins, só não consigo subir as escadas. Quanto a todo o resto, dou conta.

E deu de ombros como se aquilo não significasse nada.

— O que traz o senhor até Brighton? Digo, não costumamos receber muitos visitantes nessa época do ano.

“Nem em nenhuma outra”, Penélope completou em pensamento.

Jeremy tossiu, engasgando com o chá.

— Peguei um resfriado — Explicou — A senhorita sabe com Londres é nessa época, não sabe?

— Bem, senhor, não faço a menor ideia de como Londres é.

O senhor Madson a fitou por alguns segundos, absorvendo a informação.

— Oh, a senhorita ainda não debutou? Digo, Phillip me disse que a senhorita já tinha dezessete anos, então pensei que…

Ele se calou, quase acertando a própria testa com a bandeja do chá.

A primeira regra que sua mãe ressaltara efusivamente quando já tinha idade o suficiente para fazer perguntas era “nunca pergunte a idade de uma dama”, a segunda “não fale demais”. Pelo visto ele não seguira nenhuma delas.

Mas, ao contrário do ultraje que esperava encontrar no olhar de Penélope, encontrou iluminação.

— O senhor conhece Phillip? Sabe se ele está bem?

Jeremy precisou piscar várias vezes para compreender as perguntas feitas com tamanho entusiasmo.

— Sim, sim. Conheço Phillip. Dá última vez que o vi, estava em Londres comparecendo a eventos sociais. Disse algo sobre ter sido ameaçado pela mãe.

Penélope riu e esse foi o som mais encantador que Jeremy já ouvira.

— Imagino que ele esteja furioso.

— Eu diria que ele está consternado, mas tenho dó de qualquer pobre coitado que ousar atravessar seu caminho.

— Ora, falando assim meu irmão parece um monstro — A senhorita Pemberly sorriu — Ele é um irmão encantador, se isso ajuda.

— Conta muitos pontos positivos essa parte — O senhor Madson acompanhou-a, sorrindo também. Torceu os dedos mediante o silêncio que se seguiu e, dando conta da hora, levantou-se apressado. — Srta Pemberly, temo ter que partir, assuntos importantes me aguardam em Fribrith House.

Penélope o fitou um pouco confusa pela a rapidez das informações, mas assentiu.

— Estimo suas melhoras, senhor Madson.

Jeremy continuou parado, mesmo após manifestar suas intenções de partir. Olhou-a nos olhos com profundidade e mexeu as mãos estabanadamente.

— Senhorita Pemberly, eu poderia voltar amanhã e ter o prazer de sua companhia? — Ele não sabia de onde tirara coragem para fazer tal pergunta, nem sabia de fato porque voltar a vê-la lhe era tão importante. Era tediante ficar confinado em Brighton. A casa de campo do marquês era fria e vazia, muito diferente do calor e hospitalidade que tinha em Londres, com a mãe, os irmãos e a grande quantidade de primos. Talvez fosse isso, de fato.

Penélope permaneceu parada, muito ereta na cadeira de rodas, os lábios apertados em um linha fina.

Por fim, quando ele imaginava que ela nunca mais lhe dirigiria a palavra e o mandaria embora, a jovem piscou os longos e espessos cílios, sorrindo minimamente em sua direção.

— Ficaria lisonjeada, senhor Madson.


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