Apostando Tudo escrita por Laris Neal


Capítulo 1
Capítulo Único


Notas iniciais do capítulo

Gente, finalmente estou postando algo aqui, depois de séculos! Escrevi esse conto para o concurso do Sweek chamado "#OrgulhodeSer" e ia me ajudar MUITO se vocês pudessem ir no link da história lá no site e comentar, favoritar, me seguir lá xD

https://sweek.com/story/AgIGDQkHZgABBwgJAwACAwtsCAA=

Espero que gostem, é um conto cheio de bom humor e muito romance, claro! Escrevi ouvindo e pensando no clipe "Dancing" da Kylie Minogue. Boa leitura!



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 O dia era primeiro de agosto. A primeira aula era de Linguística e Literatura e eu já estava meia hora atrasada. Chegando à faculdade, resolvi ir até a cantina tomar um café enquanto esperava para entrar na segunda aula. Eis que me deparo com a mulher mais linda da minha vida, sentada à mesa perto da parede. Ela lia um livro, as pernas cruzadas, tomando um café. Comprei um cappuccino e sentei-me a certa distância, apenas observando aquela moça tão elegante. De vez em quando, uma de suas mechas loiras caía sobre os olhos e ela logo a colocava em seu devido lugar. Quem era ela? O que estava fazendo ali? Por que eu nunca a havia visto? Aquelas perguntas rondavam minha cabeça durante um tempo.

 

 Eu estava tão interessada em decorar todos os detalhes que eu pudesse captar daquela mulher que nem percebi seus olhos cinza encarando os meus. Quando a ficha finalmente caiu, engasguei com o gole da bebida que eu havia acabado de tomar! Jesus! E agora? Pensa rápido, pensa rápido! Olhei para baixo, enxugando a boca com as costas da mão. Será que ela percebeu? Após alguns segundos, quando finalmente consegui reunir coragem para levantar a cabeça, vi que um sorriso dançava nos lábios dela. Droga, ela tinha percebido. De repente, ela se levantou. Pegou sua bolsa, jogou o papel no lixo e veio vindo em minha direção. Meu Deus do céu!

 

  Na verdade, ela necessariamente precisaria passar por mim para alcançar a saída da cantina, porém, seus olhos se cruzaram uma vez mais com os meus, enquanto ela sorria, piscando para mim. Somente percebi que eu estava segurando a respiração quando ela saiu. Respirei fundo, tentando processar aquela cena. Peguei meu celular, digitando uma mensagem. “Bruninha, corre, cola aqui na cantina AGORA!” foi o que eu mandei e em menos de cinco minutos, uma Bruna esbaforida sentou-se à minha frente.

 

— Você tá bem? Aconteceu alguma coisa? Alguém morreu? – ela perguntou atropelando as palavras.

 

— Você não sabe quem eu acabei de encontrar!

 

— Quem?! – ela perguntou curiosa.

 

— A mulher mais linda da minha vida! Não, a mais linda de toda a minha existência!

 

— Pelo amor de Deus, Jéssica! Você me chamou aqui por causa de uma mulher? – ela revirou os olhos para o meu drama.

 

— Mas Bruna, a mulher era mesmo linda! E quer saber a melhor? Ela deseja esse corpinho lindo aqui... – balancei o quadril e os ombros de leve.

 

— Sei... Não duvido nada que ela seja hetero e só te olhou porque percebeu que você não parava de encará-la... – ela cruzou os braços, arqueando a sobrancelha.

 

— Como você é estraga prazeres! – dei de ombros.

          

 Fazia apenas alguns meses que eu havia começado a conversar com a Bruna. Estávamos no primeiro ano de Letras em uma faculdade particular em São Paulo. Apesar de dividirmos a sala de aula desde o primeiro dia, somente no final de Maio é que começamos a conversar, após um trabalho em dupla. Bruna era filha de uma professora de Português e não teve como não puxar o gosto pela língua portuguesa e sua literatura. Ela gostava muito de séries, como eu, adorava música, apesar de gostar de sertanejo, coisa que eu não suportava. Mas dividíamos o mesmo interesse por livros, viagens, chocolates e garotas.

 

— Amiga, deixa eu te falar. Minha mãe vai comemorar o aniversário dela nesse final de semana e ela me deixou convidar quem eu quisesse. Vou chamar você, a Kelly, aquela minha amiga do cursinho, e a Yasmim.

 

— Não sei, Bru... Eu tinha prometido para a minha mãe que ia dar uma sossegada em casa. Ela reclamou das minhas noitadas – revirei os olhos. — Como se eu não fosse responsável...

 

— Aposto que se você souber onde é, vai topar na hora!

 

— Por quê? Aonde vai ser essa tão famosa festa?

 

— Naquela danceteria, “Disco Tour”, que você está louca pra ir, lembra?

 

— Não acredito!!! – respondi surpresa. — Gente, vai ser minha chance de finalmente conhecer esse lugar!! Pode contar comigo!

 

— Eu sabia! – ela respondeu olhando o visor do celular. — Vamos voltar pra sala que vai começar a aula de Literatura Brasileira daqui a cinco minutos.

 

 Não preciso nem dizer que eu não consegui prestar atenção na aula, não é? Minha mente divagava no olhar daquela mulher misteriosa. Fiquei imaginando de qual curso ela seria. Será que ela realmente havia prestado atenção em mim? Ou só me olhou porque sabia que estava sendo observada? Não vou mentir, sempre me senti insegura com relação a minha própria aparência. Desde pequena tive um corpo rechonchudo, olhos muito escuros e cabelos muito lisos. Nunca fui o tipo de garota que a sociedade quis que eu fosse, e isso teve um impacto negativo em muitas partes da minha vida.

 

 Descobri minha orientação sexual aos dezesseis anos, ou seja, há apenas três anos eu me reconhecia como mulher lésbica. Durante minha adolescência tentei sair com os meninos, mas eu simplesmente não me encaixava ali. Algo estava fora de lugar e eu não sabia o que era. Foi somente quando beijei minha melhor amiga, em um jogo de Verdade ou Desafio, que comecei a, lentamente, entender o que estava acontecendo comigo. Ainda assim, tive apenas duas namoradas e algumas ficantes. Como continuei insegura com relação à minha aparência, estava sendo difícil acreditar que aquela moça realmente havia olhado para mim com algo além de curiosidade ou mero acaso. Mas isso, com certeza, não impedia que eu olhasse e desejasse as mulheres ao meu redor.

 

Durante aqueles dias eu não a vi mais pela faculdade. Quando finalmente chegou o sábado eu estava em estado de êxtase! Sempre amei músicas da Era Disco, dos anos 70 e 80, mas era difícil achar pessoas da minha idade que também gostavam; a maior parte gosta sempre dos hits do momento. Dez horas da noite e eu já estava completamente pronta: calça boca de sino, blusa cinza com brilho, sapatilha preta, o cabelo penteado e maquiagem. Após vinte minutos de metrô e sete minutos de caminhada eu cheguei a frente da danceteria. Mostrei meu RG, peguei a comanda e entrei.

 

A casa era simplesmente linda! Ambiente fresco, com os globos de luzes coloridas dançando na pista de quadrados coloridos. Eu não conseguia conter minha animação enquanto eu procurava pela Bruna, ouvindo os clássicos do ABBA, quando finalmente divisei a cabeleira loira, agitando-se de um lado pelo outro em uma mesa perto da parede. Aproximei-me, percebendo que tinham cinco pessoas junto dela. Uma delas era a Yasmim, uma garota bonita, baixinha de óculos e cabelos ruivos em um rabo de cavalo; as outras duas eram mais velhas, ambas asiáticas, imaginei serem amigas da mãe dela. E o único homem era o irmão de Bruna, seu nome era Ricardo.

 

— Jéssica! Que bom que você veio! – ela me abraçou forte, animada em me ver.

 

— Nossa, eu amei esse lugar! – respondi, enquanto ela me apresentava ao pessoal da mesa.

     

Eu ainda não conhecia ninguém da família dela nem os amigos. A Yasmim começou a conversar comigo, comentando como adorava ABBA. Quase pulei de alegria! Uma moça da minha idade que também gostava da banda! Eu estava tão entretida na conversa, rindo e falando sobre nossas músicas favoritas, que só ouvi Bruna me chamando na terceira vez em que ela falou meu nome, tocando de leve em meu braço.

 

— Jéssica, essa aqui é minha mãe, Renata!

   

Meu corpo todo começou a suar frio tão logo os olhos cinza me encararam. Uma vez mais o sorriso dançava nos lábios agora pintados de vermelho daquela loira. Prendi a respiração, com a minha mente entrando em curto-circuito. Não podia ser! Não era possível! Fiquei ali parada, abrindo a boca para falar, mas sem que nenhum som saísse dela. Eu não estava preparada para encontrar aquela loira daquele jeito, usando um vestido vermelho escuro com mangas compridas, salto alto, usando um perfume que meu Deus!

 

— Você que é a famosa Jéssica... – ela brincou, aproximando-se de mim para me dar um abraço.

         

   Respira, Jéssica, respira! Inspira e expira!

 

— Pa-pa-pa Parabéns – respondi, sentindo o calor do corpo dela tão próximo ao meu.

 

— Respira... – ela sussurrou em meu ouvido e eu automaticamente me desintegrei naquele exato segundo. Assim que ela se endireitou, deu uma piscadela discreta.

 

— O que houve com você? Tá gelada. Não quer comer nada? – Bruna perguntou preocupada, segurando de leve no meu braço.

 

— Estou bem, tá tudo bem. Acho que é fome mesmo... – só se fosse fome de outra coisa, isso sim.

 

— Renata, vamos logo! O pessoal tá te esperando! – uma moça alta de cabelos ruivos e olhos verdes apareceu, segurando no braço da loira.

   

Ela sorriu para mim, pedindo licença, e acompanhou sua amiga pelo meio da multidão. Fiquei observando enquanto ela se juntava a um grupo com quatro mulheres e um homem. Conforme a música tocava, ela começou a deslizar pela pista, com as cores refletindo nos brilhos do seu vestido. Pelo que eu entendi, eles sabiam as coreografias das músicas, pois estavam em perfeita sincronia.

  

Não consegui tirar os olhos daquela cena. Suas pernas bem torneadas se moviam com agilidade, enquanto ela se colocava de um lado para o outro, mexendo o quadril, os ombros e o resto do corpo. De vez em quando as orbes cinza se dirigiam a mim, meu coração palpitava no peito, enquanto um sorriso bobo, que antes somente aparecia, resolveu ficar e dançar no mesmo ritmo dos lábios dela. Com o seu corpo colado ao das amigas, era inevitável não me imaginar naquele encaixe dos seus quadris. Eu mexia os ombros, na vã tentativa de acompanhar sua melodia e entrar em sua sincronia.

 

— Jéssica?! – Bruna me cutucou no braço e só então eu percebi que ela estava me chamando. — Você está esquisita.

 

— Está tudo bem... – engoli em seco, não sendo nem um pouco convincente.

 

— Não está não! É a quarta vez que eu te chamo! Não está me ouvindo, parece hipnotizada... Vai me contar o que está acontecendo ou o quê?

 

— Você lembra que no começo dessa semana... – meu coração deu uma pirueta dentro do peito tão forte que quase fui jogada ao chão. Renata estava andando em minha direção. — Eu falei que encontrei a mulher mais linda de toda a minha... – agora a apenas a alguns passos de chegar até mim, eu estava quase sem fôlego.

 

— Casa comigo – as palavras escorregaram dos lábios carmim da loira.

 

— Hã? – meu coração parou nesse momento. Fiquei gelada, pálida feito uma porcelana.

 

— Eu disse: dança comigo – a loira riu, e eu senti o sangue circulando por todo o meu corpo novamente.

    

Olhei rapidamente para Bruna, com os olhos estatelados no rosto, sem saber o que fazer, o que falar, onde me enfiar de vergonha. Minha amiga abriu a boca, surpresa, olhando de mim para a mãe dela, completamente atônita. Renata segurou em minha mão, puxando-me para dentro da pista de dança, e eu me deixei levar sem oferecer nenhuma resistência. Eu não sabia para onde os amigos dela haviam ido, mas quando dei por mim, estávamos uma de frente para a outra no meio da pista.

   

A música lentamente começou a tocar, enquanto Renata deslizava pelas luzes, embalada na melodia dançante. Seu vestido brilhava, iluminando seu sorriso, deixando-me tonta de paixão. Movimentando-se no seu próprio ritmo, ela ditava seus passos agora, levando-se para onde queria, completamente à vontade. Levando meu coração em cada batida, em cada movimento de quadril, em cada sorriso dirigido a mim. Eu estava completamente maravilhada, enfeitiçada, apaixonada por aquela mulher. E quando finalmente a melodia chegou ao fim, ela parou ao meu lado, quase sem fôlego, com o mesmo sorriso nos lábios.

 

— Acho que você precisa de uma bebida! – ela brincou, puxando-me novamente pelas mãos até o bar. — O que você bebe?

 

— Batida de vinho – respondi no automático.

 

— Uma batida de vinho e uma de coco, por favor – ela pediu, logo depois voltando sua atenção para mim. Seu olhar demonstrou preocupação conforme ela me observava atentamente. — Jéssica? Está tudo bem?

 

— S-sim. Eu só... Eu só... Não imaginava que... Isso... – comecei a gaguejar e ficar com raiva de mim mesma. Pelo amor de Deus, Jéssica, recomponha-se! Fechei os olhos por um segundo, respirei bem fundo, tentando me acalmar. — Eu jamais imaginei que a moça da faculdade seria você, e muito menos que me tiraria pra dançar.

 

— E por que não? Uma moça linda como você deve estar cheia de pretendentes – ela piscou para mim. Senti minhas bochechas arderem com o elogio.

 

— Obrigada, mas você que deve estar cheia de pretendentes... Ou um namorado... – respondi rapidamente.

 

— Por que todo mundo sempre deduz que eu tenho algum homem em minha vida? – ela revirou os olhos, um pouco aborrecida. — De qualquer forma, depois que separei do pai da Bruna, comecei a me sentir mais livre e a experimentar coisas novas.

   

Ela pegou nossas bebidas e me entregou uma delas, virando-se para mim, deixando seus olhos percorrerem meu corpo para logo depois se prenderem aos meus. Seu corpo foi se aproximando do meu, colocando sua mão em minha cintura, enquanto eu me sentia cada vez mais puxada para dentro das profundezas daquele olhar. Coloquei minhas mãos em volta da sua cintura, sentindo o calor que emanava do seu corpo, agora tão perto ao meu. Seus lábios aproximaram-se dos meus, eu precisava daquele beijo, precisava sentir seus lábios macios nos meus.

 

— Eu quero você... – ela sussurrou contra minha boca. Seu hálito quente estava tão próximo, eu estava quase sentindo o seu gosto...

 

— Jéssica!!! – Bruna me cutucou no braço e só então eu percebi que ela estava me chamando. — Você está bem? O que está acontecendo?!

  

Olhei ao meu redor, Bruna e Yasmim ao meu lado, olhando-me assustadas. Na pista, Renata ainda dançava com seus amigos, movendo-se livremente pelas luzes, ora nos braços de um, ora nos braços de outra. Foi um balde de água fria! Quem mandou sonhar acordada?! Fiquei tão decepcionada que foi impossível esconder meus sentimentos. Sentei-me à mesa, ao lado do Ricardo, com a cabeça baixa entre os ombros, com vontade de sumir.

 

— Jess, você estava tão animada, o que aconteceu? – minha amiga me abraçou pelos ombros, tentando me ajudar.

     

Assim que levantei a cabeça, com as lágrimas ameaçando deslizar pelas minhas bochechas, encarei os olhos cinza diretamente, emoldurados pelos fios dourados do seu cabelo, que de vez em quando grudavam nos lábios vermelhos. Senti meu corpo arrepiar inteiro, enquanto uma vez mais eu ficava sem ar. Renata debruçou-se na mesa, deu-me um sorriso enigmático e falou comigo. Eu não entendi uma palavra do que ela disse, tão perdida entre sonho e realidade.

 

— Hã? – foi só o que consegui dizer.

 

— Eu disse: eu quero você. Dança comigo – ela repetiu, segurando em minha mão.

      

Automaticamente levantei-me, dando uma olhada para os olhos azuis de Bruna, arregalados, deixando que meus passos me levassem até o centro da pista de dança. Deixei que meu corpo acompanhasse o dela deslizando na mesma melodia, com as luzes iluminando nossas almas na mais perfeita sintonia. Dessa vez não era um sonho. Dessa vez, eu não iria ficar parada apenas esperando que algo acontecesse. Puxei-a pela cintura, apertando seu corpo contra o meu, sentindo a batida do seu coração, finalmente selando nossos lábios em um beijo apaixonado.  


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