Ginoide escrita por Serena Blue


Capítulo 1
Capítulo Único


Notas iniciais do capítulo

Gente eu sou bem doida, decidi participar do concurso no último dia KKKKKKK mas a ideia surgiu e eu não pude deixar de escrever. Me inspirei em vários filmes futurísticos e por algum milagre eu consegui encaixar tudinho em uma one-shot.
Avisinho: as falas da Lily estão em itálico pois sua voz é robótica, assim se diferenciando da do James ;)
Acho que é só isso, boa leitura ♥



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Londres, ano de 2118.

As ruas estavam mais iluminadas do que nunca, mesmo que estivesse ainda de manhã em Londres. As luzes vinham dos mais avançados anúncios, outdoors da mais fina tecnologia que traziam com si a informação mais esperada por todos:

A F.O.H (Future of Humanity) apresenta:

Robôs por Humanos

a estreia do mais novo projeto

Amanhã às 20:00 por sobre o rio Tamisa.

Não havia uma só pessoa que não olhasse aqueles outdoors em 3D avançado, enquanto caminhavam ou dirigiam pelas ruas, e saísse comentando animadíssima sobre a estreia do projeto mais aguardado do ano. A F.O.H prometera (e aparentemente cumprira) construir robôs humanoides, isto é, com a aparência idêntica a dos humanos, que os ajudasse em tudo o que quisessem. Fazer todos os tipos de tarefas, ser seu acompanhante, seu protetor, ajudante, tudo o que os humanos quisessem que os robôs fizessem, eles fariam.

Uma vez que a tecnologia do mundo estava tão avançada, a ideia não demorou muito a surgir por parte dos funcionários da empresa, bem como o suposto apoio que os cidadãos viriam a dar. A Inglaterra seria a pioneira nesse ramo robótico, ultrapassando até a maior potência global – Os Estados Unidos – um feito que demorara séculos para se concretizar, por isso, nada poderia dar errado.

Os droids – como eram chamados – estavam sendo desenvolvidos com a mais precisão tecnológica já usada pelo homem antes, a ponto de quase se passarem realmente por humanos. Algo inacreditável, mas absolutamente viável para todos, em específico, James Potter. Com seus 26 anos, dedicava todo o seu tempo em seu trabalho, amanhã a noite seria o momento mais icônico de sua carreira. Enfim mostraria a toda à humanidade a máquina em que esteve trabalhando nos últimos seis anos de sua vida. Ele e seus companheiros, Sirius Black e Remus Lupin, empenharam-se integralmente para que aquela ginoide (como eram denominados os droids com o corpo físico de uma mulher) fosse perfeita. Um tipo de robô-exemplo em que todo o projeto se baseava.

Amanhã à noite, eles a apresentariam ao mundo. Nomearam-na Ginoide Lily, ou como James mais gostava: Lily. Dos três homens, ele é quem mais se doou ao projeto, ao construí-la. Ao montar cada detalhe, cada traço, sentia-se maravilhado ao fazê-lo, estabelecendo assim um vínculo inexplicável com a ginoide. Dera-lhe todos os traços que mais apreciava: cabelos acobreados, olhos de um verde tão intenso, misturados com o cristalino artificial das orbes, que pareciam duas brilhantes esmeraldas vívidas. O nariz fino, as sobrancelhas e a boca bem delineada faziam de Lily uma linda mulher. Pelo menos era o que parecia. O único indício de que Lily não era feita de carne e osso eram míseras linhas em sua pele, divisórias quase imperceptíveis, demonstrando que seu corpo fora minuciosamente construído.

No entanto, as míseras divisórias agora estavam deveras afastadas enquanto delicados fios translúcidos eram conectados pela extensão de seu corpo suspendido em um painel de alterações. James, Sirius e Remus estavam cuidando dos últimos detalhes às onze da noite dentro da F.O.H sendo um dos últimos funcionários a saírem da empresa. A ginoide parecia um quebra-cabeça desmontado enquanto os rapazes mantinham seus olhos vidrados na tela branca dos macro-computadores, ajeitando tudo o que podiam.

— Dicção?

— Confere.

— Reflexos?

— Tudo em ordem.

— Trejeitos?

— Perfeitos.

Cada detalhe era revisado com vigor para que fizessem de Lily uma quase humana. Conforme os minutos se passavam, James Potter ficava mais maravilhado com a sua criação. Os dados da personalidade de Lily subiam refletidos em seus óculos conforme ele abaixava a tela.

— Está tudo as mil maravilhas – Sirius bocejou sentindo o cansaço bater. – É melhor estabilizarmos a ginoide antes que dê algo errado.

— Lily – corrigiu James. Por incrível que pareça, não gostava quando a chamavam pelo nome científico ao qual fora atribuída. James sabia que ela era um droid com forma física de uma mulher e por isso chamava-se ginoide mas, preferia que a tratassem como Lily.

— Eu concordo – opinou Remus, antes que Sirius protestasse algo contra a atitude de James. Para Black pouco importava ser Lily, ginoide ou robô fêmea. – Se melhorar estraga.

Os três riram deixando a tensão se esvair pelo corpo. Com um gesto de concordância, eles apertaram o grande botão verde escrito “estabilizar” em cada um de seus computadores e, com um som rouco, as dezenas de fios ligados às articulações e ao esqueleto metálico de Lily se recolheram e logo as divisórias de sua pele artificial fundiram-se dando-lhe novamente a aparência de uma perfeita humana.

O processo demorou quinze segundos, prendendo nesse meio tempo, a completa atenção deles. A genialidade com a qual fora construída era de se maravilhar. Sem dúvida nada poderia dar errado com a Ginoide Lily. Quando enfim seu corpo se reconstruiu, ela continuou suspensa no ar, com suas costas “coladas” magneticamente ao ímã do painel cor de chumbo. Seus olhos estavam fechados, mas não tinha o semblante de quem dormia. Os lábios alinhados com firmeza lhe davam um aspecto de seriedade, como se estivesse apenas esperando algum comando para começar o ofício o qual fora programada.

— Você vem, James? – Remus perguntou depois de pegar suas coisas e parando no batente da porta, sendo acompanhado por Sirius em seu encalço.

James hesitou.

— Vocês podem ir, eu vou checar mais alguns softwares de criação – mentiu com facilidade. Remus e Sirius deram de ombros e seguiram porta a fora, deixando James e a robótica Lily, a sós.

Eles sabiam muito bem o que o amigo faria, mas não tentaram impedi-lo. Afinal, James tinha todo o direito se quisesse colocar a ginoide em funcionamento antes da grande estreia. Eles mesmos fariam isso se não estivessem tão cansados depois de um longo dia de trabalho. Por mais que Potter estivesse cansado, a excitação de ver Lily acordada, falando com ele, batia qualquer estado emocional de fadiga. Porém, antes de acionar o chip inteligente de Lily, localizado em sua nuca, rente ao começo de seus cabelos, ele foi até ela disposto a analisá-la.

Era perfeita.

Como James queria que Lily fosse real e desenvolvera esse pensamento ao longo dos anos em que a construíra. Quer dizer, ele estava muito contente que sua máquina fora criada com êxito, mas no momento, queria que a máquina fosse outra e que Lily fosse algo além de simples robotização.

Estava ficando louco, só podia ser. Contudo ali, ao encarar tão maravilhosa silhueta, a ideia não parecia tão ruim assim.

— Acho que confundi meus sentimentos com a sua tecnologia – admitiu fitando-a  na sua frente, imóvel como uma boneca. A sala em que estavam era grande e circular, a iluminação do local provinha de pilares no centro com luzes um pouco azuladas, no entanto mesmo assim não retiravam o ruivo vivo dos cabelos dela.

Como era linda. James queria tocar seu rosto impassível. Guiado por esse pensamento, ele estendeu a mão direita, lentamente, na direção da maçã do rosto dela e, sem hesitar, tocou-a. E então, tão rápido como acender uma luz, Lily abriu os olhos. Foi tão instantâneo que James levou um susto e se afastou alguns passos dela.

Com a respiração elevada por conta da adrenalina descarregada em seu sangue, ele a fitou, espantado. Lily continuava imóvel, alheia a tudo ao seu redor e não direcionava seu olhar para James e sim para um ponto reto. Ele foi incapaz de se mover ainda tentando compreender como aquilo acontecera. Afinal, não acionara seu chip inteligente. Ainda não. Também não havia apertado em nenhum botão que ligasse suas funções vitais. Sentindo-se voltar ao normal, ele manteve seus olhos fixos nela, analisando qualquer situação que explicasse aquilo tudo.

Lily não se moveu. Continuou com os olhos estranhamente abertos, mirando o nada em uma linha retilínea.

— Consegue me ver? – ele perguntou postando-se a sua frente, aos poucos. Nenhum movimento da parte dela. – Sabe quem você é? – era a primeira vez que, de fato, falava com a ginoide inteiramente construída.

O silêncio dela permaneceu por longos segundos até que de repente sua boca abriu-se e um som saiu por essa. Porém, o que disse não foi a resposta de nenhuma das perguntas anteriores.

Diretriz Um-meia-zero. — sua voz era doce, mas tinha um leve tom robótico.

James piscou os olhos seguidas vezes para conferir se não estava dormindo. Engoliu a saliva tentando absorver tudo aquilo e tentou mais uma vez.

— Lily, está me ouvindo? – torceu para que a resposta dela fosse afirmativa e que começasse a agir normalmente, como fora programada para fazer. Ali, presa aquele painel e permanecendo alheia a tudo, Lily transparecia de fato a imagem de um robô.

Dessa vez, ela demorou menos a responder.

Diretriz Um-meia-zero.— repetiu como antes.

James se aproximou mais uma vez para ver se alguma peça estava faltando em seu corpo. Nada, tudo permanecia intacto, o que só fazia da situação a mais bizarra possível. O semblante de Lily continuava impassível, quando na verdade deveria estar agindo de forma normal.

— Ela deveria estar me entendendo. – James foi em direção aos computadores e ligou um deles para ter acesso a inteligência artificial de Lily. Cuidando de vez em quando para ver se ela não iria realizar algum outro movimento suspeito, James conseguiu acessar os dados da ginoide para mexer em suas configurações.

Abrindo zilhões de abas, ferramentas e arquivos que com certeza um leigo em informática não faria ideia do que ele estava fazendo, James alterou aquilo que julgou necessário para o entendimento de Lily.

Esperançoso, voltou a encará-la torcendo para que tudo voltasse ao normal. Lily, porém, continuou imóvel fitando o além a sua frente sem expressar nenhuma vontade programada.

— Lily? – tentou mais uma vez. – Ginoide Lily!

E foi nesse segundo que ela piscou brevemente e começou a descer e subir seu peito deixando transparecer que estava respirando.

Desculpe, mestre. Estava em dúvida se deveria ou não atender pelo nome com o qual o senhor insiste em me chamar.— respondeu com normalidade, aparentando gestos humanos e virando seu rosto para encará-lo.

James a analisou com o cenho franzido enquanto seu cérebro trabalhava a todo vapor para tentar entender aquilo tudo.

— Sabe quem você é? – perguntou mais uma vez, receoso.

Ginoide Lily, senhor. Fui programada para ajudá-lo, assim como a qualquer outro que precisar de mim. Estou à completa disposição dos humanos.— ela respondeu prontamente com absoluta convicção.  – Gostaria que o senhor me liberasse do painel para que eu possa fazer-me mais útil ao senhor.

Ele quase riu com aquilo e, apertando algumas teclas, soltou Lily do painel que a prendia, fazendo-a conseguir caminhar até sua direção com eficiência.

— Não me chame de senhor. – pediu quase que maravilhado ao vê-la ali, com vida a sua frente, aparentando ser ainda mais bonita.

Como quiser, senhor. Como devo chamá-lo? – Lily enrugou o cenho com tanta perfeição, tal qual como os humanos faziam. Aquilo era fantástico.

— James. – decretou com um sorriso.

James— ela o imitou, sorrindo também. Como podia ser tão incrível?

Ficaram se encarando por um tempo, porém a mente de Lily não estava fervilhando em pensamentos como se encontrava a de James naquele exato momento. Lily funcionava. Lily vivia. Podia falar, andar, sorrir e fazer mais infinitas coisas as quais James, Sirius e Remus a programaram para realizar.

Quando ficar parado encarando-a pareceu, de fato, estranho, James pigarreou e voltou sua atenção ao computador na tentativa de não deixar tão evidente sua fascinação pela ginoide.

— Como se conectou sem o acionamento do chip inteligente? – inquiriu com demasiada dúvida.  

Sou acionada para cumprir minha diretriz— Lily respondeu de prontidão.

James notou mais uma vez que ela não o havia compreendido.

— Sei disso – disse com cautela. – Porém, você só cumpre sua diretriz de ajudar as pessoas se seu chip inteligente for acionado. O que não aconteceu. Você se ligou sozinha. Como conseguiu? – voltou a perguntar com maior intensidade.

Lily não respondeu. Tampouco perpassou sinal de incompreensão. Apenas o fitou com ingenuidade como se estivesse esperando que ele lhe desse a resposta. James não conseguiu permanecer no assunto por muito tempo, estava ansioso demais para conversar com ela, ver a sua excelência em funcionamento e não esquecer nenhum detalhe de seus gestos.

— Tudo bem, depois eu vejo isso, Lily. – terminou com um sorriso conformado e fechou as muitas abas abertas de seu computador.

Por que, James, me chama de Lily?— questionou de imediato. Ele indicou com a cabeça a cadeira ao lado e Lily sentou-se com a coluna ereta em perfeita posição, coisa que jamais os humanos faziam ao sentarem-se.

— Porque é seu nome. – respondeu simplesmente. – Não é como você se chama?

Sou Ginoide Lily, James. Fui programada para ajudá-lo, assim como a qualquer outro que precisar de mim. Estou à completa disposição dos humanos. — parecia que toda vez que perguntassem algo relacionado a ela, Lily responderia com essas mesmas frases.

— Não precisa sempre repetir o seu ofício. – James riu. – Sim, você é Ginoide Lily, mas eu prefiro chamá-la só de Lily.

O que é Lily?— ela enrugou o cenho novamente, James estava gostando de vê-la fazendo aquilo.

O modo como falava, transmitindo inocência em cada um de seus gestos, o encantava de uma maneira sem igual.

— Um nome que algumas humanas recebem. Nome que remete ao lírio – explicou, tão fascinado quanto ela.

O que é lírio?— cada palavra que sua inteligência artificial não conseguia processar era uma nova pergunta.

— Uma espécie de flor. Olhe só – James abriu o navegador de seu computador e digitou “lírio” no campo de pesquisa, de imediato, várias fotos em 3D da flor rodearam ambos, lírios dos mais variados tipos e cores, enfeitando a atmosfera na qual se encontravam.

Lily olhou para todas as fotos, encantada, seu cérebro processando e absorvendo todas aquelas cores e imagens exóticas. James pôs-se a observá-la tentando tocar os lírios com as pontas dos dedos finos e delicados, de onde também se tinham aquelas divisórias mínimas que delatavam seu corpo cibernético.

Consigo captar todos os cyber pontos chamativos do lírio— proferiu enquanto mirava as imagens.

— As cores – James corrigiu. – São lindas não são?

Positivo— concordou.

— Isso não é nada, você tem que sentir a textura deles.

Ela sorriu.

Você me chamou de Lily, pois sou um lírio?

Dessa vez ele deu uma gostosa gargalhada.

— Mais ou menos isso – respondeu ainda rindo. – Dei-lhe esse nome, pois você é linda e delicada como um.

Lily o encarou e, por um momento, James percebeu que seu olhar não aparentava mais o mesmo brilho ingênuo de antes. Pareceram frios, curiosamente perscrutadores. Ele parou de sorrir para checar se tinha enxergado direito, mas quando parou para analisá-la, Lily tinha o olhar inocente de antes, como se nunca tivesse mudado, uma simples robô em funcionamento.

Eles são reais não são? Queria poder toca em um. — disse bufando e fazendo com que sua franja comprida voasse alguns centímetros longe de seu rosto.

— Bem, agora já é tarde e tecnicamente você nem deveria estar acordada, mas amanhã depois da cerimônia de inauguração eu levo você até o Hyde Park – James sugeriu com um sorriso.

Cerimonial no rio Tamisa para a inauguração dos droids. – Lily citou já estando programada para essa informação.

— Exato. Você é a atração principal. – revelou cheio de orgulho.

Depois da inauguração nós iremos ver os lírios?

— Vamos. – James concordou.

E depois?

— Bem, depois você voltará para esse laboratório para cumprir sua diretriz.

Assim que terminou sua fala, James teve certeza de que o que vira anteriormente nos olhos de Lily fora real. Mais uma vez, suas orbes verdes ficaram sem vida, calculistas como ele nunca tinha visto antes.

— Tudo bem? – quis saber, incerto.

Tudo bem, James.— no mesmo instante, tinha voltado ao normal de novo. – É melhor poupar minhas energias para amanhã.

Ele não queria desligá-la. Queria continuar ouvindo sua voz a noite toda, admirar sua beleza bem de perto, suas feições tão bem definidas, queria que ela soubesse tudo sobre ele. Que ela soubesse o quanto ele estava feliz em tê-la ali consigo. Mas era necessário que encerrasse suas atividades. Até as dele próprio, se quisesse ficar acordado amanhã à noite, deveria tirar boas horas de sono.

— Se importa de voltar para o painel? – era ali que Lily sempre havia ficado.

Nem um pouco. — ela sorriu para ele, seus movimentos perfeitamente sincronizados. E, com um olhar decidido, Lily caminhou de volta para o seu leito cor de chumbo, sem olhar para trás. Posicionou-se no painel e manteve o queixo reto.

— Até mais, Lily. – despediu-se já pronto para clicar no botão que encerraria suas atividades.

Até mais, James.— ela não o encarou. Do contrário, apenas manteve os braços caídos ao lado do corpo e o olhar fixo no mesmo ponto retilíneo de antes.

Então, com um simples toque, James desligou seu funcionamento e observou Lily fechar os olhos automaticamente e deixar seu corpo imóvel sem nenhum indício que respirava. Era duro ter aquela imagem diante de seus olhos, vê-la ali, um completo robô, tirava toda a esperança que ele tinha de Lily ser uma mulher comum.

Mas a euforia de saber que ela funcionava não abandonou seu corpo tão facilmente. James desligou todos os equipamentos da sala e saiu em disparada porta a fora, pronto para contar aos seus amigos sobre o sucesso do projeto.

Sabia que Remus e Sirius estariam em um bar ali perto, o preferido deles onde iam para relaxar antes de um dia tão importante quanto o de amanhã. E, de fato, James os encontrou a alguns quilômetros dali, compartilhando uma torre de chope enquanto conversavam de forma descontraída.

Assim que se aproximou dos dois, eles estranharam o estado no qual se encontrava: suando, a respiração entrecortada e os olhos arregalados em euforia. Não demorou muito para que tudo estivesse esclarecido. James revelou, com todos os detalhes que conseguiu lembrar, o que acabara de acontecer no laboratório com ele e com a ginoide Lily.

Remus e Sirius ficaram espantados de tal forma, que até esqueceram suas bebidas, deixando os copos cheios para envolverem-se completamente nos relatos que James contava. Era algo fascinante que seu projeto tinha dado certo, e eles não poderiam estar mais contentes.

— Não acredito, que fantástico! – exclamou Remus boquiaberto. – Nosso projeto vai ser um sucesso amanhã!

— Com certeza, Remus. – disse James, empolgado. – Mas mudanças nos planos, preciso que vocês tomem conta da Lily pela manhã e deem uma última  checada nos dados.

— E o que você vai fazer? – Sirius quis saber.

— Vou resolver umas coisas, escrever uma análise sobre o comportamento dela para poder expor amanhã. – omitiu. De fato, estava pensando em por no “papel” o máximo de detalhes sobre o comportamento de Lily na primeira noite que falou com ele, mas o que James queria mesmo fazer, era passar em uma floricultura mais próxima e comprar alguns lírios para que ela pudesse sentir sua textura. Ele mesmo não aguentaria até depois da cerimônia para levá-la ao Hyde Park.

Se despediram depois de acertarem os afazeres do agitado dia seguinte e James seguiu para casa. Animado demais para pegar no sono de imediato e escrevendo em seu bloco de notas virtual, tudo o que acontecera entre ele e a Ginoide Lily.

###

Quando o celular de James vibrou debaixo do travesseiro, ele quis tacá-lo longe, xingando seu despertador de todos os nomes que conseguia se lembrar àquela hora da manhã. O barulho insistente o forçou a abrir os olhos sonolentos, resultado de ter ido dormir muito tarde ontem, para desligar a porcaria do aparelho. Com a visão um pouco turva, ele trouxe o celular para mais perto e então constatou que não se tratava de seu despertador (que, aliás, já havia tocado e ele sequer escutou) e sim da décima chamada perdida de Sirius Black.

— Fala – pediu ainda com sono.

— James nós precisamos de você aqui na empresa agora! – a voz dele estava tensa e urgente.

— Como é? A gente não tinha combinado de v-

— Caralho, James, é urgente! A ginoide sumiu! – ao ouvir essas simples palavras, ele pulou da cama, sobressaltado, vendo o seu quarto parecer girar pela rapidez com o qual levantara.

— Que? Como assim sumiu? – foi só o que conseguiu dizer.

— Vem para cá agora, eu e Remus estamos encrencados! – e, sem dizer mais nada, Sirius desligou a chamada deixando James totalmente alheio a tudo o que estava acontecendo.

Aquilo só podia ser um pesadelo. Como a Lily havia sumido? Ele a desligara ontem à  noite, vira suas atividades sendo encerradas! Ela não poderia simplesmente ligar-se sozinha e sair porta afora. Alguém deveria tê-la acionado, mas quem se apenas ele, Remus e Sirius conheciam os comandos para tal feito? Tudo isso não fazia o menor sentido e James precisava ir até a F.O.H se quisesse entender algo.

Com uma rapidez que nunca imaginou ter, ele vestiu uma roupa qualquer que estava em cima da sua cadeira, calçou seus tênis e fez sua higiene pessoal em menos de cinco minutos. Pegou o que precisava para entrar na empresa e foi até sua garagem, chegaria mais rápido com seu carro movido a turbinas de nitrogênio.

Em poucos minutos, ele já estava na sede da empresa e notou o caos que havia se instalado. Os funcionários dos diversos setores estavam inquietos, comentando a todo o vapor sobre “a ginoide 160 que tinha sumido”. Alguns o paravam no corredor para coletar informações, mas ele apenas desviava, alheio a tudo ao redor.

Demorando mais que o necessário por causa das intercepções, James chegou ao penúltimo andar da empresa onde ficavam os laboratórios e, consequentemente, sua sala e deparou-se com seu chefe, Alastor Moody, e seus dois amigos. Os três em uma discussão que parecia não ter fim.

— Moody não foi culpa nossa a gin-

— Ah, tenha santa paciência Lupin! Vocês ficaram responsáveis sobre a ginoide ontem à noite e agora ela some? Claro que é culpa de vocês! Potter ainda bem que chegou – disse parando de andar de um lado para o outro da sala assim que o avistou.

— O que aconteceu? – James expressou em palavras o que realmente estava em sua mente.

— Pela milésima vez, James, a ginoide sumiu! Desapareceu! Escafedeu-se! – Sirius jogou as mãos para o ar buscando ser entendido.

— Vocês já estão avisados se a ginoide 160 não aparecer até o fim do dia, vocês serão PRESOS! – e com essa declaração final, Moody mancou furiosamente até a saída batendo a porta depois de passar.

— O que vocês fizeram? – inquiriu Potter assim que os passos de Moody se encerraram ao longe.

— Nós não fizemos nada James! Chegamos aqui de manhã para por tudo em ordem conforme você tinha dito só que não tinha nada para pôr em ordem porque simplesmente não encontramos a ginoide! – dessa vez foi Remus quem parecia ter perdido a paciência que lhe restara.

— Isso é impossível! Eu falei com a Lily ontem e eu mesmo que encerrei suas atividades!

— Bom, parece que você não fez isso direito meu chapa, a não ser que ela tenha decidido sair de férias do seu ofício e vazar! Como ela é um robô acho isso meio improvável de acontecer. – Sirius sentou-se, sentindo suas pernas tremerem de tensão.

— Alguém a roubou, só pode! – James concluiu.

— Por que iam querer uma ginoide inválida? Já que, afinal, só nós sabemos como acordá-la. – proferiu Remus com igual tensão.

— O que Moody pensa é que nós sabotamos o projeto com sei lá que propósito ele tem na cabeça e pretende nos prender se a sua queridinha não aparecer! – Sirius levantou-se de novo, incapaz de ficar parado.

— OKAY! – James irritou-se – Eu vou encontrá-la, vocês não serão presos! - e sem esperar a resposta dos amigos, ele saiu como um furacão com milhões de pensamentos sondando sua mente.

Só havia uma explicação plausível para tudo aquilo e, a julgar pelos breves comportamentos estranhos de Lily ontem a noite, ela havia adquirido vontade própria. Aquilo que aparentemente era característica só dos humanos: o livre arbítrio. A ideia soou tão absurda para James que ele riu incrédulo. Como isso foi possível? Será que ele desejou tanto que Lily fosse real que agora ela era?

Tinha livre arbítrio?

Tinha... Sentimentos?

Sentimentos por ele?

Sentiu seu coração acelerar com essa simples possibilidade.

Conseguiu sair da empresa sem muitos questionamentos e deparou-se com a imensidão de Londres. Onde a encontraria? Lily poderia estar em qualquer lugar. Levou as mãos à cabeça em um gesto desesperador. Não tinha muito tempo até a inauguração do projeto, até seus amigos serem presos injustamente.  

Então, em um lapso de memória, ele lembrou daquilo e juntou as peças.

A encontraria lá.

No Hyde Park.

###

 James não acreditou em seus próprios olhos quando a viu. Lily estava lá, do mesmo jeito que se lembrava, seus cabelos acobreados brilhavam com a luz do sol e se destacavam em meio ao verde do parque. Seu corpo estava coberto por um simples vestido bege que James separara para ela usar na cerimônia.  Porém seus pés estavam descalços e ele soube o porquê assim que se aproximou dela.

Eu queria sentir a textura — Lily disse sem fitá-lo, mas sabendo de sua presença ali. – Da grama. Do lírio— acrescentou e então ele viu que em sua mão tinha um pequeno lírio branco. – É ainda mais lindo pessoalmente.

 Um turbilhão de sensações o preenchiam agora. O alívio de vê-la salva ali. A preocupação com sua exposição ao mundo humano. A dúvida de como havia chegado ao parque. O medo de perdê-la de novo.

— Como você chegou até aqui? – ele merecia uma explicação. Sua sanidade merecia. Aquilo não era possível e ambos sabiam disso.

Ela finalmente o encarou, seus olhos verdes eram tão intensos, que James sentiu-se mais uma vez atraído por ela. Céus, como podia querer beijá-la ali e agora?

Você me deu a vida, James.— tentou sorrir. – Quando me tocou ontem a noite. Sua vontade tão desesperadora com que eu fosse real se concretizou. Eu adquiri meu livre arbítrio e soube disso no momento em que abri meus olhos.

— Mas você... Você... Não me entendeu, repetiu sua diretriz e agiu como um robô.

Eu fingi. Você realmente me fez bastante inteligente. Não sabia se podia lhe contar sobre isso, sem de fato você me desconectar para sempre. Então, enquanto eu estava com os olhos abertos, imóvel, na verdade estava pensando em algum jeito de fugir.

— Fugir? – ele estava atônito com tudo aquilo.

Eu duvidava que me deixassem sair por aí para conhecer o mundo ao meu redor, afinal o meu ofício é estar à disposição dos humanos. Porém, desisti da fuga quando eu notei o modo como você se dirigia a mim, vi que se importava comigo. Que sentia algo a mais.

Ao ouvi-la, seu coração encheu-se de esperança, talvez ela sentisse algo por ele também.

E então quando eu lhe perguntei aonde iríamos depois do Hyde Park e você me disse que eu voltaria ao laboratório, percebi que mesmo gostando de mim, eu não poderia usar isso a meu favor pois você ainda me manteria dentro daquela empresa. Foi aí quando decidi que precisava vir até aqui, em meu próprio caminho, mesmo estando vinculada a você por me dar a vida.

Em um súbito de esperança, James se aproximou de Lily, tão perto que conseguiu enxergar com maior clareza as divisões de sua pele.

— Você sente algo por mim? - foi só nisso que ele conseguiu pensar.

Lily hesitou, prestes a revelar a verdade, quando o celular de James tocou interrompendo a conversa dos dois. Sirius estava ligando e ele precisava atendê-lo.

— Achou? Achou ela? Acabou o tempo cara, Moody vai nos prender!

— Não vai, eu estou indo para aí.

 Aquilo tinha se tornado uma loucura tão grande, que os pensamentos de James não eram mais executados com clareza. Ele voltou sua atenção a Lily que o encarava com o cenho franzido. Ele a adorava quando fazia isso.

 E agora tinha a plena certeza de que estava apaixonado por ela.

— Lily, você tem que voltar. Você é a única que pode esclarecer o que aconteceu e ajudar meus amigos. Eles serão presos se eu não lhe encontrar.  

Ela desviou o olhar do seu, mirando a grama e o lírio em sua mão e permitindo-se sentir a textura uma última vez, antes de ter que servir aos humanos incessantemente. Sentiu o calor do sol penetrar seu corpo metálico e lhe causar vibrações diferentes.  

Irei cumprir minha diretriz. Vou ajudar você a tirá-los dessa. - afirmou, séria.

E ali, raciocinando na mais alta velocidade, Lily pensou em uma última tentativa de ser livre. E dessa vez, tinha certeza de que conseguiria.

###

 Ninguém se deixou acreditar pelo fato de um robô humanoide, a Ginoide Lily, ter adquirido vida própria. Nem mesmo Sirius e Remus, mas no fim a volta de Lily serviu para livrá-los da prisão exagerada de Alastor Moody e, o argumento aceito por todos foi que ela estava com defeito, cancelando assim sua ida até a grande cerimônia de inauguração no rio Tamisa.

Porém, as centenas de droids já construídos não perderam sua funcionalidade, que ao contrário de Lily não passavam de meros robôs com uma vida programada. Sentido-se culpado, Moody resolveu prestigiar Remus e Sirius aquela noite e que, mesmo ambos não querendo ir, foram praticamente obrigados a comparecerem por James Potter. Afinal, tudo isso havia acontecido por causa dele. Ele estragara o projeto, ele que envolvera seus sentimentos onde não deveria.

Do terraço da empresa, podia-se avistar a grande cerimônia que ocorria no rio, onde suas águas foram cobertas por gigantescos vidros cibernéticos que serviram de “chão” para as pessoas poderem caminhar por cima das águas. Estava tudo perfeito. Ao menos ele queria que estivesse.

Estamos perdendo uma bela cerimônia— Lily disse ao seu lado, enquanto também apreciava a vista panorâmica da noturna Londres.

James virou-se para ela, abatido.

— Desculpe pelo o que eu fiz. Confundi meus sentimentos com a sua tecnologia e acabei lhe tornando algo que você não pode ser. – ele depositou sua mão no rosto dela e a acariciou.

Desculpe por fazer você sofrer.— Lily esforçou-se para parecer o mais humana possível enquanto colocava seu plano em prática. – James, eu preciso que você me inative. No fim, minha diretriz sempre foi ajudar você, mas eu não posso fazer isso. Não posso lhe dar o que você realmente quer. Sabe disso, não sabe?

Ele confirmou com a cabeça, incapaz de dizer algo, apenas sentindo os olhos arderem. Algo que ela nunca saberia como é, pois sua natureza não permitia que ela o fizesse. Não permitia que ela o amasse.

E mesmo sabendo que não adiantaria, mesmo sabendo que Lily não sentiria nada com aquilo, ele a beijou.

Seus lábios selaram-se brevemente, em um singelo selinho, carregado de emoção apenas da parte dele. Como imaginava, Lily não demonstrou nenhuma reação, nenhum gesto de carinho com um beijo. Ela era um robô. Ele era um humano. Nunca poderiam ficar juntos.

 E, com um movimento preciso, James levou sua mão até a nuca de Lily e tirou de lá o chip de sua inteligência artificial, fazendo com que seu corpo caísse inerte em seus braços. James agiu conforme ela previra e  deu-lhe enfim a tão almejada liberdade.

— Até mais, Lily. – despediu-se, sozinho, pela última vez.


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Notas finais do capítulo

É isso aí gente e desculpem pelo final :(
Doeu em mim fazer Lily sem sentimentos :(
espero que tenham entendido as explicações..
Bem, trago aqui uma análise da fic feita por uma das minhas leitores mais queridas (/u/719874/) que conseguiu captar toda a essência da história e tirou as palavras da minha boca, colocando-as por escrito como eu jamais conseguiria fazer:
“eu entendi que ela não poderia ser o que ele queria
que apesar de ter sido só um toque, muitas vezes, coisas “simples” tem grandes significados
entendi que mesmo que as ações mto sentimentais do james o fazerem sofrer ele é o que todos somos: humanos
e compreendi tb que, apesar de parecer crueldade o que a lily fez, no fundo, no fundo, ela sentia o mesmo que ele, e pra vê-lo livre, longe de algo que o prendia e não o faria ir pra frente positivamente, pra vê-lo, talvez, feliz, mesmo que não fosse com ela”

É essa gente, a mensagem q eu quis trazer com Ginoide...

Muito obrigada por terem chegado até aqui..
Amo vocês !!!