A luz do holofote posicionado a sua frente cegava-lhe. Tudo ao seu redor era escuridão, apenas aquela luz invadindo-lhe os olhos tomava forma diante de seu rosto. Podia ver, vagamente, que alguns tacos de madeira do piso refletiam aquela mesma luminosidade quente sobre o palco.

Palco. Coxias. Teste. Estava tentando um papel para uma adaptação do mais recente sucesso da Broadway. Lançou um sorriso para a escuridão da plateia vazia, com exceção apenas de três pessoas – os jurados, que eram meros vultos iluminados por uma fraca luz de mesa – e se apresentou.

— Elisa Dantas, dezenove anos. Sou de Guarulhos, São Paulo. – fez uma longa pausa para recuperar o fôlego – Vou encenar o monólogo da Sabine e cantarei The Sound of Music.

— Você tem cinco minutos – a voz de um dos jurados ecoou em tom de cansaço.

Não houve tempo maior do que um segundo para preparação. Elisa lançou-se para frente como se buscasse seu interlocutor em meio ao silêncio do teatro; as lágrimas escorrendo pelo rosto enquanto suas mãos agitavam-lhe os cabelos, formando a perfeita ilusão de desespero que ela tanto havia ensaiado para conseguir. Entretanto, quando sentia-se chegando ao grande clímax de sua performance, foi interrompida. Desta vez, uma voz feminina.

— Ok, a canção agora, por favor. – Bradou em tom impaciente.

Insegura após a interrupção, ela retornou ao centro do palco e iniciou o tão conhecido tema de A Noviça Rebelde. Sua voz soava doce mas ao mesmo tempo forte conforme ecoava pelas paredes do teatro e retornava aos ouvidos de Elisa.

— Já é o suficiente, garota – o primeiro jurado falou – Pode ir embora.

— Obrigada pela oportunidade – Ela curvou-se em agradecimento para eles. – Eu queria...

— O próximo candidato, por favor! – A segunda jurado gritou, assustando Elisa e fazendo com que ela se apressasse para fora do palco.

Saindo sem responder sequer ao “Boa tarde” que a senhora atrás do balcão de informações lhe dera, a garota parou por um instante na porta do Teatro e sentiu sua respiração acelerada; estava arfando em busca de ar.

Toda a situação parecia apenas um sonho muito estranho. Ela virou-se para a fachada cinzenta do local, contemplando o nome Teatro Carlos Gomes em letras destacadas. Estava diante de tudo que mais havia almejado: ser uma atriz conhecida e morar na cidade que sempre sonhara conhecer – Rio de Janeiro. Mal havia se instalado em uma quitinete que alugara por um mês na Penha – um bairro da Zona Norte carioca que em muito pouco lhe lembrava o bairro paulista - e correu para a rua, pedindo ajuda a estranhos para chegar até a Praça Tiradentes. E ali estava ela diante de todas as possibilidades; encarando passado, presente e futuro mesclados na fachada de pedra.

A penúltima candidata a aparecer naquele dia. Com muita sorte havia conseguido chegar no horário e participar da audição. Pensava apenas no esforço que havia feito trabalhando meio ano como garçonete para poder juntar dinheiro e passar um mês no Rio. Aquele seria apenas o primeiro teste que iria naquela semana; apesar disso, Elisa sabia que era o mais importante. Desde pequena queria participar de um musical famoso e aquela era sua grande chance.

Tentando achar um meio de sair do confuso e tumultuado Centro do Rio de Janeiro em uma típica tarde no meio da semana, a cabeça daquela jovem mulher era um misto de ansiedade, alegria e nervosismo; repetindo mentalmente as mesmas frases como um mantra:

Eles vão me chamar.

Eu tenho certeza.

Eles vão me chamar.