Davi chegou ao quarto dos meninos, onde Joaquim estava fazendo seu dever de matemática.

— Joaquim, a gente precisa conversar. Tem algo de errado com você — disse o homem, sentando-se na cama de Téo.

— Eu sei. Não consigo fazer a questão 3...

— Eu não tô falando de matemática. Tô falando do seu comportamento, que tá muito estranho.

— Eu não entendo... Por que você acha errado eu estar fazendo todos os meus deveres de casa sem ser à força e sem copiar do Samuca?

— Eu não acho isso errado, muito pelo contrário! Mas acho estranho pra você. E não é só isso que tem de estranho, você tá sempre triste ou com raiva, não se concentra mais nos ensaios...

O menino não disse nada.

— Eu sei o porquê de tudo isso — Davi continuou. — Seus irmãos me contaram. É por causa daquela Sandy, não é?

— Davi, você acha mesmo que eu ia ficar desse jeito só por causa de uma menina metida?

— Acho sim. Inclusive, sua expressão mudou totalmente só em ouvir o nome dela... Por que você não acaba logo com essas brigas? Pede desculpa pra ela.

— Impossível! Ela muito chata e irritante. Além disso, foi ela que começou.

— Os meninos me contaram. E também contaram que ela tentou pedir desculpa e você não aceitou. Então agora é a sua vez.

— Eu não acho que ia adiantar...

— Por quê?

— Eu já falei, pai, ela é muito chata e irritante. Com certeza ia me fazer ficar com raiva de novo em algum momento. Sei lá, parece que ela desperta o pior em mim, sabe?

— Caramba! Então seus sentimentos por ela são bem fortes, né?

— Claro, eu odeio ela!

— Tem certeza que é isso? Você ficaria tão afetado se essas briguinhas bobas fossem com outra pessoa?

Joaquim sabia muito bem o que Davi queria dizer, mas fingiu que não tava entendendo nada. Para sair daquele assunto desconfortável, ele preferiu prometer logo que ia pedir desculpa para Sandy e acabar com tudo aquilo.

Porém ele não tinha certeza se queria pedir desculpa para ela. Por um lado, seria bom deixar de ter tanta tristeza, raiva e desânimo, mas, por outro, Joaquim queria ter a palavra final. Então ele teve uma ideia muito melhor do que pedir perdão.

— Sandy! — Ele cutucou o ombro da menina no dia seguinte, na escola.

— Ai eu odeio que me cutuquem! — Ela empurrou a mão do menino de forma agressiva, e depois virou-se para ele. — O que você quer?

— Uma trégua.

— O quê?

— Trégua significa...

— Eu sei o que significa! Só achei estranho você chegar com essa ideia do nada...

— É que eu tô ficando cansado dessas nossas discussões diárias. O que você acha da gente ficar sem se falar até o show de talentos?

— Até o show de talentos... — Sandy ficou pensativa. — Me parece uma boa ideia. O show de talentos vai ser uma batalha grande, então por que gastar a nossa energia com batalhas pequenas, não é? — Ela estendeu a mão para Joaquim, que a apertou.

***

— Trégua, é? Eu nem sabia que vocês tavam em guerra — disse Eleanora enquanto as meninas conversavam, depois do almoço sobre Joaquim e Sandy não terem tido nenhuma treta naquele dia. — Pensando bem, até que parecia uma guerra mesmo...

— Espera — disse Janete —, se vocês só deram uma trégua, significa que vão voltar a brigar algum dia?

— A gente combinou de não se falar até o dia do show de talentos.

— Pelo menos no show de talentos vocês vão competir de verdade — falou Eleanora.

— Exatamente. E temos que poupar nossas energias até lá.

— Na minha opinião, ele devia ter pedido desculpa... — disse Janete.

— Eu também achava isso, mas não ia dar certo! O Joaquim é muito chato e irritante, ia ser impossível a gente se dar bem. Mas enfim, vamos ao assunto que interessa: o show de talentos.

— Tá. Até agora a gente só tem a música e a coreografia — falou a mais nova. — Ok, são as coisas mais importantes, mas não as únicas necessárias, a gente tem que pensar em tanta coisa ainda...

— Sim — concordou Janete. — E a primeira coisa que a gente pensar é em algum jeito de convencer a Tia Flora a nós deixar ir.

— Por quê? — Perguntou Sandy. — A gente já se inscreveu sem a autorização dela...

— Eu sei, mas eu não gosto dessa ideia da gente ir escondida.

— Não se preocupa, Janete! — Disse Eleanora. — O show de talentos vai ser numa sexta-feira à noite, a Tia Flora trabalha até bem tarde nas sextas, ela não vai descobrir nada!

— O problema não é ela descobrir ou não, o problema é a gente uma fazer uma coisa muito errada! Na verdade, eu até queria que ela fosse assistir à nossa apresentação...

— Fala sério, Janete! — Sandy falou. — Você nunca fez nada de errado na vida, uma vez não vai matar, não. E você acha mesmo que em alguma hipótese ela ia querer assitir à nossa apresentação? Por favor, né? Olha, se você ainda quiser tentar convencer a Tia Flora, faça isso sozinha, eu e a Eleanora não vamos te ajudar...

— Então tá bom — Janete suspirou.

— Tá, agora a gente tem que resolver o negócio dos figurinos — Eleanora mudou de assunto. — Já que a gente não tem dinheiro pra comprar roupas elaboradas, como as que as cantoras usam nos shows de verdade, eu pensei numa coisa: que tal se a gente pegar as nossas roupas velhas e transformá-las em novas?

— Como assim?

— Ah, tipo, eu sei costurar e a Sandy sabe... enfeitar roupas, então a gente podia...

— Ah, você tá dizendo que a gente pode customizar as nossas roupas?! — Sandy ficou bem animada com a ideia. — Que legal!

— Adorei essa ideia! — Janete também ficou animada. — É como se a gente fosse reciclar as nossas roupas... Ei! E se a gente usasse materiais recicláveis na customização?!

— Hum... Pode ser fique ser que fique legal!

Muito animadas, as Chiquititas foram à procura de roupas, agulha, linha, tesoura, materiais recicláveis ou qualquer outra coisa que pudesse ser útil na customização e botaram a mão na massa.

***

Clipe musical: "Todo Mundo Chique" por Sandy, Janete e Eleanora.

***

— Ai que fome! — Disse Eleanora quando sua barriga roncou em um momento em que estavam trabalhando na customização. — São que horas, hein?

Janete pegou seu celular e arregalou os olhos ao olhar para a tela.

— Quase 17:30! — Ela disse. — A Tia Flora já tá quase chegando, ela não pode ver essas roupas!

As meninas ouviram passos vindo lá de fora e deduziram que fosse a tia, então, às pressas, pegaram as roupas que customizavam e as levaram para o quarto.

Infelizmente, as meninas só esconderam as roupas, ou seja, não arrumaram a bagunça enorme que haviam feito na sala. Na verdade, elas mal tinham percebido o quanto haviam bagunçado (e olha que Eleanora não suportava bagunça), pois estavam muito concentradas em sua atividade.

Tia Flora quase surtou ao entrar em casa e foi gritando para o quarto das meninas.

— O QUE FOI QUE ACONTECEU AQUI? QUE BAGUNÇA É AQUELA???

— A gente tava customizando as nossas roupas — Janete não conseguia mentir. As irmãs olharam com cara feia para ela.

— COMO É QUE É? — Talvez Flora não soubesse o significado de "customização".

— A gente tá tentando transformar as nossas roupas velhas em novas — já que não tinha como anular a palavra de Janete, Sandy contou a verdade. Mas não toda... — A gente queria roupas novas, mas, já que você nunca compra nada pra gente...

— AH ENTÃO EU SOU A CULPADA DA BAGUNÇA? OLHA AQUI, MENINA, VOCÊS NÃO PRECISAM DE ROUPA NOVA, TÊM MAIS ROUPA DO QUE MUITA CRIANÇA POR AÍ, DEIXA DE SER MAL AGRADECIDA! E VÃO LOGO ARRUMAR AQUELA SALA!

— Ainda quer tentar convencer ela a nos deixar participar do show de talentos? — Eleanora cochichou para Janete enquanto arrumavam a sala, a segunda, que tinha uma expressão assustada, apenas fez que não com a cabeça.

***

— Você parecia de bom humor no ensaio, Joaquim — dizia Davi, enquanto dirigia de volta para casa após o ensaio dos Cuecas na Dó Ré Music. — Você pediu desculpa pra Sandy?

— Claro! Agora tá tudo bem — respondeu sorrindo, enquanto os irmãos o olhavam desconfiados.

Após voltarem para casa, os quatro foram comer e, após terminarem de comer, os meninos foram para o quarto.

— Por que você mentiu pro Davi? — Perguntou Téo a Joaquim, logo depois de Samuca fechar a porta do quarto.

— Do que você tá falando? — Dissimulado esse Joaquim...

— A gente ouviu você falando com a Sandy — respondeu Samuca. — Você não pediu desculpa nenhuma, só uma "trégua".

— Quer dizer que vocês tavam me espionando? E ouvindo a minha conversa?

— Sim — disse Téo, inocentemente.

— Que feio, meninos!

— Mais feio ainda é mentir pro seu pai! — Samuca falou.

— Olha aqui, eu não menti, tá? Eu praticamente pedi desculpa, aliás, o que eu fiz foi ainda melhor do que pedir desculpa! O que o Davi queria era que eu acabasse com os problemas e eu acabei. Então tá tudo certo.

— Temporariamente...

— É, mas deixa que o futuro eu resolvo depois.

As coisas realmente melhoraram, tanto para os Cuecas quanto para as Chiquititas, durante a trégua. Samuca e Téo agora podiam ser amigos de Janete e Eleanora, e Joaquim e Sandy não se estressavam mais. É preciso confessar que para Joaquim estava sendo muito difícil ignorar Sandy e, principalmente, ser ignorado por ela; ele nem sabia exatamente o porquê, mas estava. Contudo, quando ela não estava por perto, tudo ficava bem.

As duas bandas estavam bastante focadas no show de talentos. Porém um outro assunto, que não tinha a ver com Sandy, podia, mais uma vez, distrair Joaquim: futsal.