Romeo & Romeo escrita por Black Magic


Capítulo 1
Era uma vez.


Notas iniciais do capítulo

É com prazer que entrego a segunda one do desafio dos 100 temas.



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Era uma vez duas famílias que há cinquenta anos vivem em pé de guerra. O ódio passou de geração a geração sem ao menos os envolvidos mais novos saberem qual era o real motivo para tamanha desavença entre os De Lima e os Da Silva.

Anos se passaram, mas não as brigas. Brigas essas que deixavam o síndico do Garden de cabelos em pé e mais brancos como a neve que deveria, para ele ter a cabeça repleta de tufos esbranquiçados com apenas cinquenta e sete anos era uma tremenda afronta. Naquela manhã, o clima durante a reunião do condomínio não amenizava o seu tique nervoso de piscar sem parar o olho esquerdo enquanto tentava em vão apartar o fuzuê que as duas famílias faziam.

— Por favor, senhores — pediu pela décima vez em menos de cinco minutos — está é uma reunião voltada para resolver problemas do prédio. Vejam, foi feita para queixas importantes e relevantes... — explicou mais uma vez, mas duvidava que fosse ser ouvido por aquele bando de selvagens.

— O que quer dizer com isso, Hernandes? — perguntou Luís empertigando o corpo roliço ao se levantar e encarar o síndico — minha reclamação não é relevante? — o olhar que dirigia ao homem mais velho era de gelar a alma.

— N-não foi isso que eu quis dizer, Luís.

— A porcaria do cachorro deles não nos deixar dormir — falou Vivian se metendo na conversa, ela, mais que o marido, estava indignada — acha que isso não é relevante o bastante? Nada contra cachorros, mas precisa latir tanto? 

— Você está latindo agora e eu estou reclamando? — Perguntou Valéria, séria.

— Repete isso na minha cara!

Hernandes sentou-se no banco de madeira se sentindo derrotado e sem paciência. A dor da idade avançada se fazia presente toda vez que precisava lidar com as duas famílias que há anos somente se tratavam aos gritos. Quando era apenas um pirralho presenciou muitas das brigas dos pais e avós daquelas pessoas que hoje, brigam tanto quanto seus antepassados.  Uma discussão sem um fim.

— Tem certeza que é uma boa ideia? — Caio o olhava apreensivo.

Matheus deu de ombros se aconchegando mais ao outro na cama.

— Uma vez uma pessoa muito sábia me disse que tudo o que precisamos é de uma mão para segurar e um coração para nos entender. — Sussurrou o moreno.

Caio deixou que sua cabeça pendesse para trás ao soltar uma gargalhada.

— Não acredito que Matheus De Lima acabou de recitar Shakespeare — disse com a intenção de provocar, secando as lágrimas pela crise de riso a pouco — Mas me diga, quem é a pessoa maravilhosamente inteligente que lhe disse isso?

Um sorriso malicioso surgiu nos lábios de Matheus que começou a desferir beijos molhados no namorado, começando por seu pescoço, depois em sua face e por último tomou os lábios rosados que tanto amava beijar. O beijo fora casto e passageiro, nada que fizesse com que os dois permanecessem mais tempo embrenhados nos lençóis mais do que já haviam ficado ali.

— Foi um tal Caio Henrique Da Silva, conhece? — questionou ao se afastar.

— Ouvi falar — murmurou o menor — dizem que ele é muito lindo — brincou. Seus olhos de cor âmbar brilhavam a meia-luz.

— E gostoso. — Frisou o outro.

Caio abraçou o companheiro e recostou a cabeça em seu peito.

— Eles não vão aceitar, não vão — sua voz soou como um choramingo. Nem parecia que horas antes todo o quarto radiava calor, risadas e felicidade. Era como se toda felicidade de Caio tivesse sido sugada pelo o fantasma que o assombrava desde o início do relacionamento com o filho do inimigo de seu pai.

Matheus detestava vê-lo daquela forma tão frágil. Não quando Caio sempre foi o mais forte e perseverante entre os dois desde o dia que se conheceram em meio a uma briga das muitas que aconteciam nas reuniões de condomínio. Odiava e não entendia o porquê das duas famílias vizinhas não se darem bem, e pior, detestava que uma desavença sem sentido fosse um empecilho em seu relacionamento.  

— A pessoa maravilhosamente inteligente também me disse que a coragem cresce com a ocasião.

Caio riu fraco.

— Me diga, estou ficando louco? Eu estou achando você citar Shakespeare a coisa mais sensual do mundo. — confidenciou.

— Mas eu sou sensual, não só quando cito Shakespeare — lembrou arrancando mais risadas do loirinho — você é feliz comigo? Eu sou feliz com você. Então, mesmo que domingo nossas famílias se matem de uma vez, vamos ficar juntos.

— Credo, Matheus! Isso lá é jeito de encorajar alguém?

— Não se prenda aos detalhes, amor — caio adorava ser chamado de amor — vamos contar sobre nós na festa da sua irmã, sim. Estou até imaginando a cara de cu que a Larissa vai fazer quando vir você roubando a grande noite dela.

— Você não presta, Matheus De Lima.

— Eu sei, Caio Henrique Da Silva.

Os dias passaram calmamente. Era como se, nem mesmo o tempo quisesse que a semana terminasse mais rápido e, assim, chegasse finalmente o domingo onde seria o divisor de águas para alguns, de espanto para outros, mas a certeza que tudo podia terminar das piores formas e maneiras rondavam em seus ossos.

O cachorro Dos Lima continuava latindo com gosto, não deixando nem Luís nem Vivian dormirem em paz sequer uma noite. O síndico fora chamado muitas vezes nos últimos dias, ora de pijamas e pantufas, ora vestido para uma caminhada no calçadão de Copacabana. Todos os moradores do Garden desejavam o fim das discussões que não acordavam apenas Hernandes, o síndico, mas todo o prédio.

Caio por muitas vezes teve vontade de pedir para que o pai parasse de falar mal do seu namorado, mas lembrava de que o mesmo não sabia sobre seu relacionamento e, por isso, mantinha-se calado sempre que começava o assunto.

Com Matheus a situação não era muito diferente, lá, ao contrário de Caio, ele tinha que ouvir a mãe reclamar da sua sogra. Ela dizia coisas horríveis e a única coisa que podia fazer era manter-se quieto pelo menos até a festa da Larissa.

O domingo chegou e o céu amanheceu nublado. Chegava a ser engraçado como a natureza também sentia uma frente fria chegando junto de um furacão, pelo menos foi assim que Caio descreveria aquela fadiga manhã de domingo.

Os preparativos para festa de sua irmã que será na área de lazer estavam a todo o vapor. Larissa não parou um só segundo desde o dia anterior, onde saiu com a mãe a fim de comprar mais copos e encomendar mais bebidas, percebeu que as que tinham poderiam ser poucas comparadas a quantidade de pessoas que convidou para sua festa de aniversário de dezoito anos.

No fim da tarde, todos começaram a se arrumar. Caio escolheu vestir calça jeans, uma blusa social vermelha a qual deixou fora da calça mesmo e contornos completando. Ele olhou-se no espelho e murmurou a si mesmo diversas vezes que não importava o que aconteceria aquela noite, pois ele ama o Matheus e a opinião da sua família embora seja importante, não irá interferir em mais nada.

Passava das oito e meia da noite quando Matheus desceu até a área de lazer do prédio Garden. Ele sentia o nervosismo o corroer por inteiro, mas é tarde demais para voltar atrás da ideia que fora sua. Olhou ao redor e ao encontrar o que queria seguiu até lá.

— Demorei? — perguntou ao se aproximar de Caio.

Caio sufocou a vontade de abraçar o seu namorado na frente daquelas pessoas.

— Um pouco...? Não sei, Matheus. Eu estou uma pilha de nervos.

O outro concordou, pois também estava uma pilha completa e louca de nervos.

Em um canto mais afastado, bem perto da mesa de docinhos, Luís observou o filho dos Lima caminhar até o seu filho e parar para puxar assunto. Contraiu o maxilar e empertigou a barriga avantajada na tentativa de parecer mais alto. Semicerrou os olhos e seguiu atrás da esposa que conversava com umas amigas.

— Vivian — chamou — Vivian! — chamou entredentes a esposa que o olhou raivosa. Odiava quando interrompiam uma de suas conversas. Fitando mortalmente o marido, ela pediu para que falasse de uma vez.

— O que o filho dos Lima está fazendo aqui? — Inqueriu.

— Como assim? — a mulher olhou em volta — eu não o convidei.

— Muito menos eu — falou após morder o docinho roubado. Ele não conseguia tirar os olhos do que estava vendo e não gostava nada de ver o quanto os dois pareciam próximos demais, quase como se fosse amigos de longa data.

— Vou lá puxar as orelhas desse menino.

Antes que ele fosse, Vivian segurou seus braços com uma incrível força.

— Não. — falou baixo e contido — não vamos estragar a festa da Larissa.

— Pro inferno que deixarei esse moleque sangue-ruim perto do meu filho!

— Caio é maior de idade, sabe muito bem com quem anda. — vociferou olhando o marido e só então percebeu que o mesmo comia brigadeiro — o que é isso na sua mão? É docinho? Luís! — por pouco não gritou — a diabete, seu porcalhão.

Em um só puxão ela retirou o que restara do doce da mão do marido e saiu com Luís a seguindo reclamando que era apenas um pedaço de nada e que não o faria mal algum.

— Seu pai percebeu a gente. — Comentou Matheus.

Caio olhou por sobre o ombro e viu o pai seguindo atrás de sua mãe.

— Não reparei nisso. Como ele não veio até aqui tirar você à força?

Matheus deu de ombros.

— Talvez ele esteja de bom humor? — ergueu as sobrancelhas.

Caio riu.

— Como se fosse possível.

 

A festa seguiu-se tranquila, calma demais até. Entretanto, calmaria nenhuma fora criada pra durar para sempre e, assim, chegou a hora do parabém. Larissa se posicionou ao centro da mesa, radiando felicidade por ter todos que gosta ali consigo festejando seu décimo oitavo aniversário, o que mais poderia acontecer e desejar?

Durante a salva de palmas e as repetidas “Larissa será abençoada”, Valéria e o marido, Antônio, chegaram à área de lazer em busca do filho. Ian a casa de sua amiga e ela não compreendia o motivo do moleque fazer questão de ir numa porcaria de festa como aquela. Valéria olhou ao redor a procura do primogênito e, ao encontrar, estranhou o fato do mesmo estar perto demais do filho dos Silva.

Confusa e desconfiada, deixou o marido para trás e rumou até o filho.

— Matheus?

Matheus teve um sobressalto ao ouvir a voz da sua mãe.

— Poxa, mãe! A senhora me assuntou — o coração bateu forte contra o peito. Caio virou-se e se arrependeu de ter feito isso ao notar o olhar de desdém sobre si. 

— O que você veio fazer aqui, Matheus? — perguntou — essa gente não presta. Nenhum deles — falou encarando o menor — vamos embora agora mesmo.

A mulher fez menção de ir embora, mas Matheus a impediu.

Ela franziu as sobrancelhas o encarando.

— Mãe, eu... Eu gostaria de dizer...

— O QUE ESSA CORJA ESTÁ FAZENDO AQUI? — o berro de Luís se assemelhou a um rugido feroz, ele mal acreditava no que estava vendo.

— Estamos de saída, não precisa fazer seus shows — disse Valéria tentando em vão arrastar Matheus para fora daquele anto — por que diabos você não vem?

De repente todas as pessoas ali presentes pararam espantadas com a confusão. Claro que existiam alguns vizinhos que reviraram os olhos porque lá vinha mais uma briga Dos Lima e Dos Silva. Matheus sentia que toda a atenção estava voltada para ele e isso deixou suas mãos soadas. Olhou para Caio em busca de apoio. 

— Eu preciso contar uma coisa.

— Me conta no caminho, Matheus! Vamos embora!

— Não — falou firme — eu e o Caio queremos falar com todos vocês.

Vivian se aproximou feito um furacão no meio de todos.

— O que o meu filho tem a ver com isso?

Caio encarou os pais, os amigos de sua irmã, os vizinhos e expirou.

— Nós estamos namorando — sua voz sairá tão baixa que foi preciso que Vivian pedisse que o filho repetisse o que acabou de dizer — eu disse que nós estamos namorando.

Por um momento nem o som dos talheres batendo nos pratos foi ouvido.

— Como assim namorando? — Valéria perguntou, seus olhos esbugalhados.

— Eu e o Caio nós estamos namorando a sete meses, quase oito — explicou Matheus com uma calma que surpreendeu não só a ele, mas também a Caio.

Eles deram as mãos e as entrelaçaram.

Luís estava boquiaberto com a situação, devia ter desconfiado. Sentia-se enganado pelo próprio filho e nunca imaginou que o sangue do seu sangue seria capaz de magoá-lo tão profundamente. Como ele pode? Foi o que pensou.

Vivian acabou sendo aparada por amigas que a colocaram sentada, a mulher mal sentia as próprias pernas por estarem bambas. Sentiu-se burra. Logo ela que tinha um senso de perceber as coisas de longe! Como nunca reparou no próprio filho?

Valéria permanecia imóvel, embora tentasse entender o que estava acontecendo.

— Chega, Caio — disse Luís cortando o silêncio — saia de perto dele.

— Pai... Por favor... — Suplicou.

— EU DISSE PRA SAIR!

Com uma coragem comunal, Matheus se posicionou a frente do mais velho. Tentando de alguma forma o proteger ou para que ele não obedecesse às ordens do pai que o encarava como se ele fosse um erro em sua vida.

— Bom, Caio não vai a lugar algum. Nós nos amamos e vamos ficar juntos.

Nos amamos — Luís desdenhou — sua família não presta, garoto. Há cinquenta anos um dos seus parentes foi desonesto e eu não quero meu filho perto de alguém como você — disse enraivecido — colocou ideias na cabeça dele.

Vivian levantou e tocou as mãos do marido que a olhou.

— Não seja duro como seu filho.

— Não ser duro? Vivian! Olha pra esse circo! — abriu os braços, puto da vida.

— Essa briga de família realmente está indo longe demais, Luís.

No canto Larissa chorava porque sua festa havia sido arruinada.

— Então me diga — pediu Luís — o que quer eu faça? Aceite essa palhaçada?

— Que respeite! — disse Valéria encontrando a voz finalmente. Ela não podia ficar parada enquanto seu único filho era hostilizado pelo brutamonte. 

— Pai... — chamou Caio ao sair da proteção do namorado, se sentiu aquecido e agradecido por ele ter se posto a sua frente na tentativa de protegê-lo — uma vez eu li que não posso escolher como me sinto, mas posso escolher o que fazer a respeito. Então, mesmo que o senhor me odeie e queira continuar nessa rincha idiota que dura há anos com Os Lima, tudo bem, mas saiba que eu e Matheus continuaremos namorando. Permaneceremos juntos. Nos amamos, sim. Muito. 

— Não posso aceitar isso! Nossas famílias são inimigas e vocês são dois... Homens!

— Luís — Vivian tinha os olhos marejados — ouviu o que você acabou de dizer? Nós nem ao menos sabemos por qual motivo seu avô brigou com o avô da Valéria, não é? Você não tem ideia. A gente... Brigou por tanto tempo que nos acostumamos... Chega, é o nosso filho, Luís. É do Caio que estamos falando!

O homem abaixou a cabeça e suspirou.

— Eu... Bem, eu preciso... Pensar.

Dizendo isso, ele saiu porta a fora sem olhar para trás. 

Shakespeare já dizia: o amor acrescenta uma preciosa visão aos olhos. Embora Luís estivesse chateado, ele passou os últimos dias em sua casa de passeio na serra de Petrópolis pensando em tudo que ouvira aquela noite. Saiu de casa no dia seguinte pedindo que lhe dessem um tempo para assimilar tudo o que estava acontecendo em sua casa. Seu coração ainda era um poço de dúvidas e incertezas. Uma parte sua queria sentar-se com seu filho e tentar entender o que se passa em sua cabeça e a outra queria o repreender e o castigar por fazê-lo passar por isso.

Com medo de cometer algo que viesse se arrepender mais tarde, saiu de casa.

A casa de Petrópolis não era nem grande nem pequena, pertenceu ao seu avô e o seu pai deixou para ele quando veio a falecer há três anos. 

— Senhor Luís, deseja mais alguma coisa? — perguntou seu José, o caseiro.

— Não — murmurou — pode se recolher, meu amigo.

E assim fez José sem nenhuma objeção.

A luz da lua banhava a noite serena. O brilho do luar dava vida às flores que ali tinham espalhadas e bem cuidadas por todo o jardim principal. A jabuticabeira, o pé de manga e o pé de maçãs estavam aos poucos dando diversos frutos. Por pouco Luís não ronronou com todo aquele silêncio e paz de espirito, se sentia tão relaxado que se deixou ser pego pelo sono e quando acordou, se viu na varanda.

Duas semanas havia se passado, mas seu coração permanecia magoado.

Passava das duas da tarde quando Marcus, um velho

amigo de seu avô, chegou.

— Marcus, que surpresa — disse ao cumprimentar o homem de meia-idade.

— Como vai, Luís?

— Bem, bem — Luís ajeitou-se na cadeira e pediu que servissem mais café — o que o trouxe aqui? Pensei que estivesse viajando, sabe? Aposentadoria...

— Eu viajo na próxima semana — comentou e agradeceu ao caseiro pela xicara de café que o serviu — preciso ver o meu flamengo ganhar antes de ir, não é mesmo? Será campeão com certeza.

Luís assentiu e sorriu sem mostrar os dentes.

— Vivian me ligou — Luís o olhou de esguelha — sim, não olhe para mim dessa forma, garoto. Vi sua mãe trocar suas fraudas e vi você crescer e se tornar um pai de família responsável. Então, meu querido, o que aconteceu?

E então Luís contou tudo.

Desde suas duvidas, seus anseios, seus mais profundos pensamentos. Marcus ouviu cada palavra dita pelo outro sem o interromper nenhuma vez e, quando o relato terminou, ele suspirou e ponderou no que poderia dizer ou fazer a respeito.

— Caio está namorando mesmo?

— Sim, o filho daquela... — suspirou — daquela mulher.

— Então é só este o problema? — questionou, tomando mais um gole do café.

— Isso e o fato de serem dois... Bem, homens. Não entra na minha cabeça.

— Entendo.

O canto dos pássaros preenchia a falta de vozes no ambiente, os dois velhos amigos permaneceram em um silêncio confortável até Marcus voltar a falar.

— Um banheiro.

Luís o olhou, seu cenho franzido em total confusão.

— O quê?

— Um banheiro — repetiu o velho homem — um problema no banheiro deu inicio a essa briga entre as duas famílias há anos. Eu avisei ao seu avô que era besteira iniciar um rebu desses por causa do vazamento no banheiro dos Lima.

— É verdade? Meu pai sabia disso? Sabia do motivo?

— Não. — negou e se levantou — seu pai não sabia, ele só seguiu seu avô.

Luís ficou sem palavras. Passou todos aqueles anos pensando que os motivos do ódio fosse uma atitude desonesta, mas não passava de um vazamento no banheiro e isso o deixou vermelho de vergonha. Brigar, por causa de banheiro.

— Sabe, filho, a vida é curta demais... Não deixe que uma desavença sem pé nem cabeça que começou pelo seu avô acabe com a sua família. Volte para casa.

E, dizendo isso, Marcus se despediu e seguiu seu caminho.

Luís não esperou o dia seguinte pra voltar para casa.

Assim que o convidado fora embora, ele ainda permaneceu um tempo na varanda pensando no que o homem havia dito, pensou no motivo tolo da briga, pensou nas palavras cruéis que disseram há duas semanas a seu filho mais velho. Por isso, levantou-se da cadeira, se despediu do caseiro e partiu para casa naquela tarde.

Por algum milagre divino a estrada na volta não estava engarrafada, então o homem seguiu seu caminho por horas, já era noitinha quando Luís entrou no estacionamento do edifício Garden. Saiu apressado sem cumprimentar ninguém e por pouco não colidiu com Hernandes, o síndico, que o xingou baixinho de selvagem.

— Vivian! — gritou ao entrar no apartamento — cadê você mulher?

Vivian disparou até a sala vestindo um avental verde e uma colher de pau em mãos, estava cozinhando o jantar e levou um susto ao ouvir a voz do marido.

— Luís... O que — ela o olhava sem piscar — o que está acontecendo?

— Onde está o Caio, Vivian? — ele sequer esperou a resposta, saiu disparado até o quarto do filho e, ao abrir a porta, encontrou Caio dormindo tranquilamente.

Luís se aproximou do filho e sentou-se na beira da cama.

— Caio?

As últimas semanas haviam sido um inferno para Caio, pois mesmo que tivesse prometido a si mesmo que não se importava com a reação da família, acabou por se importar. E ver seu pai sair de casa no dia seguinte de nada ajudou a melhorar a situação. 

O menor abriu os olhos e se assustou com a presença do pai ali em seu quarto.

— Pai? O que o senhor...

Luís não hesitou em abraçar o filho mais velho, o apertando de saudades.

— Desculpa, desculpa — pediu — desculpa por ser um ogro idiota.

O loirinho não estava entendendo a atitude súbita do pai, mas o abraçou forte mesmo assim. Pensou que nunca mais teria esse carinho do cara que sempre admirou e ele odiava pensar que não poderia mais o abraçar do jeito que gostava.

— O que aconteceu? — perguntou.

— Me desculpe — repetiu ao se desfazer do abraço e abaixar a cabeça — eu fui um tremendo idiota com vocês, sabe? Vocês não merecem isso. Acabei estragando a festa da sua irmã que possivelmente me odeia agora — riu soprado — e por pouco não estrago seu... Bem, seu relacionamento. Desculpe-me, Caio.

 — O senhor não estragou nada, pai. — seus olhos marejaram — eu sei que o ódio pelos lima é enorme e também sei que digerir meu namoro com o Matheus não deixou as coisas mais fácies pro senhor.  

— É uma bobagem — suspirou — a desavença entre nossas famílias.

— Como assim? — Caio franziu a testa.

— Um vazamento no banheiro é a causa de toda essa confusão, acredita? Meu avô nunca contou ao meu pai o real motivo, só dizia que Os Lima não prestava e eu cego, é claro, segui tudo o que ouvi durante minha infância e adolescência.  

— Então tudo isso é por causa do vazamento no banheiro de cima?

Luís assentiu.

Caio gargalhou e Luís acabou por rir também.

— É ridículo. — decretou o mais velho.

— E quem contou isso? Foi o José?  — perguntou Caio parando de rir.

— Não — Luís negou — lembra do Marcus? O velho amigo do meu avô?

— Lembro sim! Ele contou só agora? Podia ter acabado com a briga antes.

— Concordo, mas tem como confiar em velho?

— Eu confio no senhor, por que não confiaria no Marcus?

Luís se empertigou todo pomposo voltando a sua velha postura.

— Garoto, você me respeite — disse, mas acabou por sorrir — me desculpe.

— Esquece — vociferou Caio ao abraçar o pai novamente — o senhor voltou.

Escondida pela brecha da porta, Vivian sorria com o acertamento entre os dois.  

Se há um ano dissessem a Hernandes que Silva e Lima podiam confraternizar em um churrasco, ele iria rir da cara da pessoa e depois gritar “nunca!” porque de fato é uma coisa bem estranha de se imaginar e mais estranha ainda ver acontecer.

Hernandes acompanhou de perto a mudança de clima no condomínio após a incrível oferta de paz estendida pelo o senhor Luís, aquele selvagem, logo ele havia ido pedir desculpas a matriarca da família Lima e os dois não eram totalmente amigos, apenas simpatizantes e passaram a se respeitar bem mais.

Para Hernandes, toda a situação era completamente bizarra.

Mas, agradecia profundamente que o deixaram dormir e caminhar em paz.

Foi um ano de conhecimento para o chefe da família Silva. No inicio, estranhou a presença do filho dos Lima em sua casa aos poucos, sentando com eles para jantar, amanhecendo ali e tomando o café da manhã, era de fato bastante esquisito.

Vivian não via dificuldade, embora ainda não gostasse tanto assim da sogra do filho, ela a respeitava porque se haviam aberto a temporada da paz, ela que não estragaria a paz no reino.

Larissa passou meses sem falar com o pai, voltou a falar quando recebeu um intercambio em forma de pedido de desculpas. Alguns hábitos não mudam.

Caio e Matheus estavam sentados afastados observando Antônio e Luís conversarem sobre a partida de futebol da noite passada e Caio admirava principalmente sua mãe que aos poucos ficava menos arredia com a Valéria.

— Sabe que isso tudo é obra nossa, não sabe? — Perguntou Matheus.

Caio sorriu e entrelaçou as mãos com as do namorado.

— Sim, é maravilhoso. — e realmente era.

— Eu te amo, Caio Henrique Da Silva.

Caio o olhou apaixonadamente.

— Eu também te amo, Matheus De Lima.

Talvez não seja o fim da história de Caio e Matheus, mas o início de uma nova fase para todos. 


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Notas finais do capítulo

Confesso que estou um pouco insegura com essa oneshot, embora tenha ficado feliz por conseguir terminá-la antes do fim do prazo. De todo meu coração, eu espero que gostem. Mesmo. Quem leu até aqui, obrigada por tirar um pouco do seu tempo e ler. Obrigada. MAHALO ;3