Naquele dia que eu fiquei deixou plantada no banheiro do fliperama, eu fechei os meus olhos por um momento e, fiquei pensando como eu havia sido uma burra por dizer todas aquelas coisas para a minha querida Yorkie. Eu me senti estúpida, e fiquei pensando que talvez eu não devesse tê-la tratado daquela forma.  Eu estava realmente apaixonada pela mesma. Mas, eu não queria me apegar aquela pessoa maravilhosa. Eu sou um espírito livre. Gosto de ficar com quem me sinto atraída, mas não quero ficar presa, nem me comprometer numa relação.  E eu me arrependi de certo modo, pois senti que eu havia te machucado de certa forma. 

A dor que eu senti por ter sido tão estúpida e por ter sido dura comigo mesma, era bastante intensa. Eu me senti magoada. E queria madar tudo se foder. 

Então, eu abri os meus olhos, me aproximei do espelho do banheiro e olhei para mim mesma refletida naquele espelho.  Por um momento senti que eu não estava sendo eu mesma.  Eu parecia outra pessoa. 

Eu fiquei furiosa e esmurrei a porra daquele espelho. Ele se fragmentou, e então eu vi os vários fragmentos do mesmo começarem a cair no chão. 

Por trás daquele espelho falso, eu vi uma passagem. Havia uma sala com piso branco, alguns quadros nas paredes. 

Eu estava chocada com o que havia atrás do espelho daquele banheiro. E um pouco assustada também. 

Temerosa, eu resolvi explorar aquela sala escondida. 

Comecei a andar com passos curtos.  Meu corpo todo trepidava. Eu sentia os pelos do meu braço se arrepiarem. 

"Olá!", exclamei. 

Ninguém pareceu responder. Então eu tentei mais uma vez. 

"Olá? Tem alguém aí?", insisti. 

"Olá?" 

O silêncio que preenchia o lugar, me apavorava. Será que não havia ninguém ali? 

Voltei o meu olhar para trás, e parece que a passagem por onde eu havia entrado, estava fechada agora. 

Então eu continuei a perambular por ali. 

Eu fui andando até que eu vi uma cômoda com uma caixa preta. Fui na direção dela e a toquei. Ela era muito bonita. 

Fiquei tentada a ver o que havia escondido nela.  Então eu levantei a tampa da mesma e havia um pedaço de vidro. Meus olhos se arregalaram. 

Então eu ouvi uma voz. 

"Não mexa nisso!" 

Apavorada, fechei a caixa bem rápido e me voltei meu olhar para tentar descobrir de onde tinha vindo aquela voz. 

Foi então que eu vi um rapaz negro, de cabelo raspado, vestindo uma camisa de manga comprida cinza, uma calça da mesma cor, e tênis branco vindo na minha direção.  Ele parecia ter a mesma altura que eu. 

Então ele se aproximou de mim e parou.  Ele ficou me olhando fixamente. 

"Quem é você?", o mesmo quis saber. 

"Oi! Meu nome é Kelly, Kelly Booth.", balbuciei. "Quem é você?" 

"Meu nome é Bing.", ele se apresentou. 

"Bem, muito prazer.", eu o cumprimentei. 

"Como você entrou aqui?", Bing quis saber. 

"Através de uma passagem no espelho", repliquei. 

"Uma passagem no espelho?", Ele ficou confuso. 

"Sim, no espelho de uma casa de fliperama, o Tucker's, em San Junipero", explanei. 

"San Junipero? Nunca ouvi. Porque você veio até aqui?", Bing retrucou. 

"Eu vi essa passagem e fiquei curiosa. Resolvi explorar.", justifiquei. 

"Vá embora!", Bing me expulsou. 

"Por que? Eu não posso. A passagem por onde eu vim já se fechou. Não tem como voltar.", falei para ele. 

"Droga! Se eles souberem que tem uma garota no meu quarto...eu não sei quais serão as consequências.", Bing pareceu tão apavorado quanto eu estava. 

"Por que? Quem são eles?", exclamei em desespero. 

"Eles são os jurados do programa Hot Shot.  Um show de talentos que levou a única coisa que eu mais gostava nesse mundo. Uma garota chamada Abi Khan.", Bing contou. 

"Eu sinto muito", rebati. 

"Mas, pelo menos eu não tenho que ficar pedalando naquela bicicleta para conseguir juntar créditos para comprar comida, e gerar energia para quem quer que comande aqueles jurados...", o mesmo comentou. 

"Olha, eu sinto muito pela sua amiga. De verdade. Eu não sei o que aconteceu com ela, mas...eu estou aqui. Então...se quiser, eu posso ser sua amiga.", me ofereci. 

A expressão nos olhos de Bing era perturbadora. Parecia o olhar de alguém devastado, que perdeu tudo o que tinha e não conseguia ver um sinal de esperança. Um sinal de que as coisas iriam mudar. Ele parecia realmente abalado. 

"Obrigado", ele me agradeceu. "Eu agradeço muito a sua gentileza, Kelly". 

"De nada.", devolvi. 

Então eu tentei consolar aquele rapaz desolado. Eu coloquei minhas mãos nos ombros dele e encostei o meu cenho no dele. Ficamos refletindo por um tempo. 

Em seguida nós nos afastamos, e então eu comecei a beijar a boca dele. Senti meus lábios tocarem os dele. 

Ele então envolveu uma de suas mãos em um dos meus braços como se quisesse conter aquilo. Mas pareceu não resistir e então começou a me beijar de volta. 

Nós acabamos indo para a enorme cama dele. 

[...] 

Então, algum tempo depois nós estávamos lá, pelados debaixo do lençol. 

"Eu nunca achei que iria ter uma primeira vez com uma garota antes. Digo, eu gostava muito da Abi. Eu sonhava em poder ficar junto com ela, mas eles a levaram para um programa de entretenimento adulto, o "Wraith Babes".  Eu vi um homem fazer coisas nojentas com ela.  Ela parecia uma escrava daquele homem. Eu podia ver nos olhos dela que ela não estava gostando...a imagem dela sendo fodida naquele programa tem me atormentado todas as noites quando eu vou dormir.", Bing se lamentou. 

"Ela era minha amiga! Como puderam fazer isso com ela?", o mesmo berrou. 

"Eu realmente sinto muito pela sua amiga, Bing.  Se eu pudesse fazer algo para te ajudar...eu faria.", retruquei. 

"Ela queria ser uma grande cantora. Eu sacrifiquei meus 15 milhões de créditos para que ela pudesse realizar o sonho dela.  E aqueles caras cuspiram nela! Eles mandaram para fazer filmes pornôs!", Bing continuou a se lamentar. 

"Eu entendo a sua dor, Bing.", eu o consolei. 

"E então eu tentei resgatá-la, mas acabei ficando com esse quarto.  É melhor do que pedalar aquela maldita bicicleta. Mas, o sentimento de não ter a Abi do meu lado...dói demais.", ele comentou. 

"Eu também fiz algo que eu me arrependo. Eu briguei com uma garota que eu gostava, e então ela me deixou sozinha. E eu descobri essa passagem que me levou até você.", rebati. 

Bing voltou o olhar para mim. 

"Eu sinto muito pela sua amiga.", ele comentou. 

"Obrigada. Mas, sentir muito não vai trazer ninguém de volta. O melhor que podemos fazer é continuar com nossas vidas.", eu aconselhei ele. 

"Eu gostaria de voltar para a minha amiga, mas agora eu estou presa nesse lugar. Mas, pelo menos eu não estou sozinha." 

Bing então mudou a expressão no rosto dele e abriu um sorriso para mim. 

"E eu agora tenho você...de certa forma.", ele balbuciou. 

Então eu gargalhei. 

"Mas eu ainda tenho um trabalho. Preciso transmitir minhas mensagens 30 minutos duas vezes por semana.", Bing comentou. 

"Que mensagens?", quis saber. 

"Mensagens de sofrimento. Opressão. E que encorajam as pessoas a lutar pelo que elas acreditam.  E eu faço isso com um pedaço de vidro encostado na minha garganta.", o mesmo revelou. 

"Então é por isso que você não queria que eu mexesse naquele pedaço de vidro dentro daquela caixa preta?", indaguei. 

"Sim. Desculpa se eu fui grosso com você, é só que...isso é muito pessoal para mim. Eu realmente me sacrifiquei para estar onde eu estou. Aqui, nesse quarto com você. E eu agora vou rezar para que não descubram o nosso caso, porque eu não quero voltar a pedalar aquelas malditas bicicletas.", Bing frisou. 

"Eu posso me esconder em algum lugar quando você estiver aqui durante as transmissões.", falei. 

"Eu acho que parece uma boa ideia.", o mesmo comentou.