O ar dentro do túnel era gelado. Jonah lembrava vagamente daquele lugar, de seu batizado e a visita ao oráculo. Mas esperava que não fosse nada como o que ele tinha em mente, uma lembrança cheia de medo e choro. Irene segurava sua mão com tanta força que ele precisou olhar duas vezes para ter certeza que aquela era sua irmãzinha mesmo. Sabia que, se ela pudesse, teria mais um braço para poder buscar (ou dar, ele ainda não tinha certeza) conforto em seus três irmãos, mas até isso ser possível, Irene teria que se contentar em apenas segurar a mão de Jonah e Annabel. Mas, embora o tanto que Harmony tentava parecer durona, ele sabia que ela estava com mais medo que todos eles, medo este depositado com considerável força no braço do príncipe.

Com toda aquela compostura que tinham que manter os irmãos só tinham uns aos outros, já que o Rei a Rainha tenham que ficar, de acordo com as normas de etiqueta, mais a frente dos filhos. Desprovido de todo o nervosismo das irmãs, Jonah desviou seus olhos da cabeça de sua mãe para observar ao redor; paredes de pedra lisa e negra, pontilhada com branco de forma que parecia um céu estrelado e chão do mesmo material. Aquele lugar havia sido cavado há milhares e milhares de anos, e se encontrava no meio da ilha, onde a essência dos deuses estava mais forte que em qualquer outro lugar.

Só os sacerdotes e sacerdotisas eram permitidos de entrar nesse lugar, tirando por alguns momentos na vida de um membro da Família Real: em seu batizado, aos três anos, e na Cerimônia de Designação, que ocorria quando quer que o Coração acordasse, e quando os reis e rainhas fossem acompanhar seus filhos em ambos eventos.

Apesar de tudo isso, Jonah não estava nervoso. Como poderia? Ele não tinha a menor possibilidade de ser designado, e toda a ilha sabia disso. A Cerimônia de Designação servia para uma coisa apenas: consultar a vontade dos deuses sobre quem será o próximo rei ou rainha. A aposta de todos era Annabel. Há gerações e gerações que o mais velho dos irmãos era escolhido, e, além de tudo, a disciplina e responsabilidade da primogênita eram farejáveis de longe. Mas o nervosismo de Irene era igualmente compreensível, já que, mesmo pequena, ela era mais madura que Jonah jamais seria. Até Harmony tinha seus motivos para estar apreensiva, mas Jonah? Ele era o ser mais infantil, irresponsável e imaturo que a ilha já havia visto, e todos sabiam (ou esperavam) que os deuses tivessem noção disso. Não havia a menor chance de ele ser designado.

Por isso, quando os irmãos entraram sem seus pais na Sala de Cerimônias sem seus pais, Jonah se permitiu pensar em um total de nove piadas sobre as roupas cinza com capuzes enormes dos sacerdotes e sacerdotisas nos quatro minutos que esperaram até que alguém dissesse alguma coisa. Mas, acima de tudo, os quatro jovens olharam fixamente para o buraco no meio da sala. Uma cavidade de aproximadamente trinta centímetros de diâmetro era tão funda que se você jogasse algo lá, nunca ouviria tal coisa atingir o fundo (se é que havia um). Exatamente acima do buraco flutuava uma pedra um pouco maior que a abertura no chão que era exatamente metade branca e metade negra, com uma gema brilhante encrustada em seu centro. O Coração. A vontade dos deuses era transmitida por lá. Em cerimônias de batismo era necessário o Oráculo para ver o que os deuses diziam e interpretar o pronunciamento, mas a vontade sobre o próximo regente da ilha era tão forte que não era possível ficar menos que alguns metros de distância do Coração.

— Ele acordou hoje de manhã. O zumbido era tão alto eu era possível ser ouvido do templo de Ilo – a Sacerdotisa Chefe informou, olhando profundamente para o centro da sala.

Como se ninguém soubesse disso. Mesgasch inteira estava comentando sobre isso. O despertar do Coração. Os festivais estavam começando a ser preparados, comerciantes imaginando o quanto ganharam nas comemorações, já preparando bandeirolas com o rosto de Annabel nelas.

O Despertar dessa geração era tardio, diziam. Normalmente aconteciam até os vinte e um anos de um herdeiro, e Annabel já tinha vinte e três. Se Melody ou Irene fossem designadas, elas esperariam até essa idade para começar os Processos, o primeiro sendo a Seleção e o último, a Coroação. Jonah era tão descartado pela ilha, que parecia que todos haviam esquecido que essa era exatamente a idade dele. Mas isso não importava, certo?

Todos na sala levaram um susto quando a pedra começou a bilhar intensamente. O brilho começou na gema em seu centro e passou a ser um raio que rondava o Coração todo. Passou então a rodear os irmãos, um por um, como se os tivesse analisando, até que o raio ficou na frente deles, tomando sua decisão. Então, tão rápido que pegou todos desprevenidos, houve um clarão, e então, voltou tudo ao normal. Ou quase.

— É isso? – Jonah exclamou – Não me pareceu nada de mais.

— Hum, Jonah? – O príncipe se virou para sua irmã mais velha, que apontava, branca como o papel, para sua cabeça.

Foi quando ele olhou para cima que Jonah entendeu. Uma coroa prateada brilhava sobre sua cabeça. Ele havia sido designado.